D.E. Publicado em 03/12/2013 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da defesa e dar provimento à apelação do Ministério Público Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelações criminais interpostas, respectivamente, pelo Ministério Público Federal e por Marcos Aurélio Maffei contra a sentença que julgou procedente a pretensão punitiva para condenar o réu à pena privativa de liberdade de 1 (um) ano, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão e ao pagamento de 21 (vinte e um) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos pela prática do delito previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal (fls. 280/285v.).
Apela o Ministério Público Federal pleiteando o afastamento da causa de diminuição da pena fixada em 1/3 (um terço), pelo arrependimento posterior, prevista no art. 16 do Código Penal (fls. 290/292v.).
Apela a defesa com os seguintes argumentos:
Contrarrazões às fls. 305/308 e 312/319, respectivamente.
A Ilustre Procuradora Regional da República Zélia Luiza Pierdoná opinou pelo provimento do recurso da acusação e pelo não provimento do recurso da defesa (fls. 324/328).
Os autos foram encaminhados à revisão, nos termos regimentais.
É o relatório.
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VOTO
Imputação. Marcos Aurélio foi denunciado pela prática do delito do art. 171, § 3º, do Código Penal, por ter, no dia 08.11.07, sacado, em proveito próprio, a quantia de R$ 3.932,51 (três mil, novecentos e trinta e dois reais e cinquenta e um centavos), referente a auxílio-doença de Fernando Galvão Pulzi.
Narra a denúncia que o acusado, aproveitando-se da condição de coordenador da clínica onde Fernando estava internado, apoderou-se da Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS e do documento de identidade (RG) do interno, apresentando-os à agência da Caixa Econômica Federal - CEF localizada na Rua Álvaro Soares, 3, Sorocaba, SP, sacando o benefício do interno.
Consta que Roberto Delfino de Oliveira, procurador de Fernando, contestou o saque junto à CEF, que ressarciu o valor na conta do beneficiário (fls. 106/107).
Preliminar de incompetência da Justiça Federal. A defesa alega incompetência da Justiça Federal, uma vez que a Caixa Econômica Federal - CEF não foi vítima do delito.
Rejeito a preliminar.
Apurando que foi violada sua vigilância sobre a conta corrente, que constitui dever da instituição financeira, a CEF procedeu ao ressarcimento dos valores indevidamente sacados, suportando o prejuízo, razão pela qual é certo que houve lesão ao seu patrimônio e, portanto, há interesse da União, atraindo a competência para a Justiça Federal.
Princípio da insignificância. Código Penal, art. 171, § 3º. Inaplicabilidade. O princípio da insignificância é reservado para situações particulares nas quais não há relevante ofensa ao bem jurídico tutelado pela norma penal. Na hipótese, porém, do estelionato cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência, deve ser ponderado o interesse público subjacente ao objeto material da ação delitiva. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e a deste Tribunal desaconselham a prodigalização da aplicação desse princípio quanto ao delito do art. 171, § 3º, do Código Penal:
Do caso dos autos. A defesa pugna pela aplicação do princípio da insignificância, alegando que o bem jurídico penalmente tutelado não foi atingido de forma relevante.
Sem razão.
O estelionato resultou em lesão ao patrimônio de entidade de direito público, razão pela qual não se amolda ao crime de bagatela. Afastada, assim, a aplicação do princípio da insignificância.
Materialidade. A materialidade delitiva está comprovada por meio dos seguintes elementos:
Autoria. A autoria, da mesma forma, é inconteste.
Perante a Autoridade Policial, a testemunha Roberto Delfino de Oliveira declarou ser procurador de Fernando Galvão Pulzi, que se encontrava, à época, internado no Grupo de Apoio ao Combate à Droga e Álcool Santo Antônio, desde 08.10.07. Acrescentou que no dia 08.11.07 o acusado teria comparecido na agência n. 0356 da CEF, depois de ter-se apropriado da Carteira de Trabalho de Fernando e falsificado sua assinatura, efetuando saque de R$ 3.947,51 (três mil, novecentos e quarenta e sete reais e cinquenta e um centavos). Relatou que Fernando teria comentado o episódio com o acusado, informando-lhe que seu procurador havia solicitado ao banco as gravações do momento do saque, ocasião em que aquele teria admitido a conduta (fl. 8).
Interrogado na fase policial, o acusado, Marcos Aurélio Maffei, declarou que trabalhava, à época dos fatos, como coordenador da Clínica Grasa - Grupo de Apoio Santo Antônio, esclarecendo que Fernando Galvão Pulzi era um dos internos. Acrescentou que Fernando lhe teria revelado fazer jus a um benefício previdenciário, dirigindo-se o réu à agência da CEF localizada no centro do município de Sorocaba (SP), munido dos documentos pessoais do interno, a fim de colher as informações pertinentes. Relatou que apresentou aqueles documentos a um funcionário da CEF, que o teria confundido com Fernando, admitido o acusado que se aproveitou disso para apor o nome do interno no recibo de saque e retirar aproximadamente R$ 3.900,00 (três mil e novecentos reais). Revelou que o seu propósito era guardar a quantia consigo e entregá-la futuramente ao proprietário. Contou que um tio de Fernando, na condição de seu procurador, recusou-se a receber do acusado a devolução do dinheiro, pois, segundo lhe teria confidenciado o interno, pretendia ajuizar demanda contra a CEF para conseguir importância maior do que aquela sacada indevidamente. Admitiu que, em razão da recusa, usou a quantia em proveito próprio, explicando que não entregou o dinheiro diretamente a Fernando por temer que fosse usado na compra de drogas. Disse que não tentou restituir o dinheiro à CEF (fls. 85/87).
Ouvida pelo MM. Juízo, por precatória, a testemunha Fernando Galvão Puzzi declarou que à época dos fatos encontrava-se internado na clínica para reabilitação de dependência química, Grupo de Apoio Santo Antônio - Grasa, onde o acusado trabalhava como coordenador, além de ser o seu "padrinho". Acrescentou que, ao tentar receber o auxílio-doença, descobriu que o dinheiro já havia sido sacado. Relatou que, depois de comentar o episódio na clínica, o acusado admitiu espontaneamente ser o responsável pelo saque (mídia, fl. 202).
Perante o Juiz, por precatória, a testemunha Ricardo Antonio Bortolini declarou que se recordava vagamente dos fatos, em razão dos diversos procedimentos em que atuou na condição de membro da Comissão Sumariante da CEF. Informou que era Gerente-Geral da agência onde se deram os fatos (fls. 229/231).
Durante a fase judicial, a testemunha Roberto Delfino de Oliveira confirmou que é tio de Fernando Galvão Pulzi e era seu procurador à época dos fatos, relatando que tentou receber o valor referente ao auxílio-doença do sobrinho em agência da CEF, ocasião em que descobriu já ter havido o saque do benefício, contestando-o perante aquela instituição. Informou que o sobrinho relatou-lhe ter o réu admitido que fez a retirada. Disse que o acusado ter-lhe-ia telefonado e admitido ser o responsável pelo saque. Ratificou o depoimento prestado na fase policial (mídia, fl. 246).
Em suas declarações judiciais, a testemunha Roberto Carlos Coliri declarou que era caixa da agência da CEF onde os fatos aconteceram, mas não se recordava do acontecido, apenas do procedimento administrativo instaurado em razão disso, passando a descrever o método empregado na identificação dos clientes (mídia, fl. 258).
Interrogado na fase judicial, o acusado, Marcos Aurélio Maffei informou já ter sido processado por porte de entorpecente e que se tratou do vício em drogas em 2006 na mesma clínica onde ocorreram os fatos. Disse que teria recebido um telefonema do INSS informando sobre um "dinheiro" que Fernando "teria para receber", tendo-o acompanhado por diversas vezes àquela autarquia. Relatou que foi a uma agência da CEF obter informações sobre o benefício, ocasião em que um funcionário, confundindo-o com Fernando, teria informado o saldo disponível e entregue o dinheiro, admitindo o acusado que procedeu à falsificação da assinatura, que já tinha observado como era. Disse que, ao chegar à clínica, desistiu de entregar o dinheiro a Fernando, temendo que fosse gasto com drogas. Informou que um tio de Fernando, Roberto, telefonou para a clínica, dizendo-se procurador do interno, ocasião em que o acusado, perquirido sobre o saque, revelou ser o responsável, propondo-se a devolvê-lo ao procurador, porém a proposta foi recusada, sob a alegação de que a CEF instauraria demanda judicial contra o acusado. Esclareceu que não tinha intenção de ficar com o dinheiro consigo nem de prejudicar a CEF. Confirmou que os documentos do interno ficavam diretamente sob sua guarda. Informou que Roberto visitava o sobrinho mensalmente, inclusive na internação anterior, que perdurou 6 (seis) meses. Admitiu que utilizou o dinheiro em proveito próprio (mídia, fl. 258).
Dolo. Apela a defesa alegando ausência de dolo, pois o acusado não pretendia apropriar-se do dinheiro, apenas tentava evitar que Fernando o utilizasse para comprar drogas.
Sem razão.
O acusado não demonstrou que tenha agido em benefício do interno, de cujos documentos pessoais admite que se apoderou e fez uso sem autorização, nem comprovou que não tinha intenção de apropriar-se do dinheiro, porquanto admite que utilizou a quantia em proveito próprio e que não tentou ressarcir os valores à CEF ou ao seu proprietário, Fernando Galvão Pulzi.
Dosimetria. Atento às circunstâncias do art. 59 do Código Penal, o Juízo a quo fixou a pena-base em 2 (dois) anos de reclusão, vale dizer, no dobro do mínimo legal, tendo em que o réu se valeu da condição de Fernando, que estava sob seus cuidados, e das informações que obteve em razão disso para realizar a conduta.
Sem circunstâncias atenuantes ou agravantes.
A causa de diminuição prevista no art. 16 do Código Penal foi aplicada, malgrado não tenha o acusado conseguido devolver o dinheiro a Fernando, por ter sido impedido pelo seu procurador. Reduziu-se a pena para 1 (um) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, vale dizer, em 1/3 (um terço) da pena-base fixada.
A causa de aumento em razão de o crime ter sido cometido em detrimento de entidade de direito foi aplicada em 1/3 (um terço), nos termos do art. 171, § 3º, do Código Penal, resultando a pena de 1 (um) ano, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão.
Cumulou-se a pena privativa de liberdade com a pena de multa, que restou fixada em 21 (vinte e um) dias-multa, no valor unitário de 1/2 (meio) do salário mínimo vigente à época dos fatos, atualizado quando do pagamento.
Estabeleceu-se o regime inicial aberto.
A pena privativa de liberdade foi substituída por 2 (duas) penas privativas de direitos, consistentes uma em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas pelo prazo da condenação, a ser determinada pelo Juízo da Execução, e a outra em prestação pecuniária, no valor de 2 (dois) salários mínimos, em dinheiro, em favor do Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT ou de instituição a ser designada pelo Juízo da Execução (CP, art. 44, I , II e III, e § 2º, segunda parte).
Concederam-se a possibilidade de recorrer em liberdade e a gratuidade judiciária (fls. 280/285v.).
Apela o Ministério Público Federal pleiteando o afastamento da causa de diminuição de pena pelo arrependimento posterior, prevista no art. 16 do Código Penal (fls. 290/292v.).
Com razão.
Aplica-se a causa genérica de diminuição de pena do art. 16 do Código Penal quando houver a efetiva e voluntária reparação do dano pelo acusado, até o recebimento da denúncia.
A alegação de que o acusado teria tentado devolver a quantia a Roberto Delfino, procurador de Fernando Galvão Pulzi, a par de não ter sido efetiva, foi rechaçada por aquele (mídia, fl. 246).
Não tendo havido irresignação pelas partes quanto à pena pecuniária, resta mantida a condenação ao pagamento de 21 (vinte e um) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Mantenho a pena-base fixada em 2 (dois) anos de reclusão, bem como a causa de aumento em razão de o crime ter sido cometido em detrimento de entidade de direito foi aplicada em 1/3 (um terço), nos termos do art. 171, § 3º, do Código Penal, resultando a pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão, que torno definitiva.
Resta mantida a sentença nos seus ulteriores termos.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da defesa e DOU PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal para afastar a causa de diminuição pelo arrependimento posterior, prevista no art. 16 do Código Penal, resultando a pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 21 (vinte e um) dias-multa, mantida a sentença nos seus ulteriores termos.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 27/11/2013 16:39:28 |