Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 09/12/2013
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0002171-54.2013.4.03.6110/SP
2013.61.10.002171-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO : RENATO DA CRUZ OLIVEIRA
No. ORIG. : 00021715420134036110 3 Vr SOROCABA/SP

EMENTA

PROCESSO PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO EM FLAGRANTE. BUSCA NA RESIDÊNCIA DO AGENTE. AUSÊNCIA DE MANDADO JUDICIAL.
1. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que, por se tratar de crime permanente, no delito de tráfico de entorpecentes não há ilegalidade na prisão em flagrante efetuada sem mandado judicial na residência do agente, na medida em que a Constituição da República, em seu art. 5º, XI, autoriza a entrada da autoridade policial, durante o dia ou à noite, independentemente da expedição de mandado judicial.
2. Recurso em sentido estrito provido para restabelecer a prisão em flagrante e convertê-la em prisão preventiva, expedindo-se imediatamente o mandado de prisão.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso em sentido estrito para restabelecer a prisão em flagrante e convertê-la em prisão preventiva, expedindo-se imediatamente o mandado de prisão, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 02 de dezembro de 2013.
Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0002171-54.2013.4.03.6110/SP
2013.61.10.002171-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO : RENATO DA CRUZ OLIVEIRA
No. ORIG. : 00021715420134036110 3 Vr SOROCABA/SP

RELATÓRIO

Trata-se de recurso em sentindo estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra a decisão que relaxou a prisão em flagrante de Renato da Cruz Oliveira (fls. 49/51).

Alega-se, em síntese, o seguinte:

a) a ausência de mandado de busca e apreensão não pode ser tida como imprescindível à prisão em flagrante, sempre que houver autorização prévia do morador;
b) se a Constituição Federal é expressa a permitir o ingresso na residência desde que haja consentimento, não se afigura lícito exigir decisão judicial que substitua o arbítrio do indivíduo, uma vez que o direito protegido deve ser por ele avaliado;
c) a ação policial é necessária para preservar a ordem pública, sendo dever do Estado, direito e responsabilidade de todos;
d) o interrogatório do envolvido, ocasião em que esteve presente sua advogada constituída, não trouxe relatos de eventuais abusos ou ilicitudes relacionados ao ingresso na residência;
e) com o consentimento do morador, ao ingressarem na residência os Policiais Militares encontraram considerável quantidade de entorpecente e uma arma, adulterada e municiada;
f) uma vez que a polícia tomou conhecimento da prática de crime, nada há que torne ilícitas as condutas desde então adotadas;
g) deve ser decretada a prisão preventiva de Renato da Cruz Oliveira para garantir a ordem a pública e a aplicação da lei penal, nos termos da manifestação exarada a fl. 46 pelo Ilustre Procurador da República, Dr. Rubens José de Calasans Neto (fls. 49/56).
A defesa ofereceu contrarrazões (fls. 91/98).

Em juízo de retratação, a decisão foi mantida (fl. 2).

A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Janice Agostinho Barreto Ascari, manifestou-se pelo provimento do recurso em sentido estrito (fls. 74/78v.).

É o relatório.


VOTO

Renato da Cruz Oliveira foi preso em flagrante em 25.03.13 pela prática dos delitos previstos no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06 e no art. 16, parágrafo único, IV, da Lei n. 10.826/03, pois guardava em sua residência 8 (oito) tijolos de maconha, 80 (oitenta) porções de maconha, 8 (oito) "trouxas" de maconha, 178 (cento e setenta e oito) pequenas porções de maconha, 501 (quinhentos e um) "pinos" de cocaína, 291 (duzentos e noventa e um) papelotes de cocaína e 56 (cinquenta e seis) porções de substância semelhante à crack, além de 1 (uma) arma de fogo, calibre 38 (trinta e oito), com numeração de série raspada, municiada com 6 (seis) cartuchos íntegros, sem autorização.

O Sargento da Polícia Militar, Anderson Lucchi Américo Vieira, que deu voz de prisão à Renato, na data dos fatos afirmou:


É Sargento da Polícia Militar e ouviu via Copom que um carregamento de drogas estava chegando pela Rua Marrocos, nº 100. Foi ao local dos fatos com o Soldado Sakadauskas e outros policiais militares e lá conversou com uma senhora que estava nessa casa. Ela autorizou a entrada dos policiais, que revistaram o local e nada de ilícito localizaram. Os policiais notaram que essa casa, a do numeral 100 da Rua Marrocos, na verdade, é dividida em duas residências. Foi à outra porta, bateu e o indiciado aqui presente atendeu os policiais. Foi-lhe informado o porquê de estarem no local e ele autorizou a entrada dos policiais. Em busca pela residência, o Soldado Sakadauskas localizou, dentro do guarda-roupas, uma sacola contendo várias porções de substância semelhante a maconha e cocaína. Após a localização desse entorpecente, o próprio indiciado disse aos policiais que estava guardando mais drogas na cozinha e uma arma de fogo. Em cima do armário da cozinha, foi localizada uma bolsa contendo vários tabletes de substância assemelhada a maconha, várias porções de cocaína e outras de substância semelhante a "crack" e um revólver, calibre 38, com a numeração suprimida (pinada), municiado com seis cartuchos íntegros. Continuando as buscas, numa cômoda foi localizada a quantia de R$ 428,00 (quatrocentos e vinte e oito reais). A esposa do indiciado também estava pelo local com o filho de três meses e disse aos policiais que seu companheiro guardava drogas e arma em casa, mas nunca se envolveu. Em seguida, foi solicitado o apoio do canil da guarda municipal e todo o local foi mantido intacto para preservar o sítio para os cachorros. Os guardas do canil foram ao local, mas os cachorros não localizaram outras drogas. Quer deixar registrado que a advogada aqui presente foi ao local dos fatos e queria acompanhar as buscas, mas o depoente não deixou que ela entrasse no local porque toda a casa ainda não tinha sido revistada e, para a própria segurança dela, não foi permitida a entrada. (fls. 6/7)

O Policial Militar, João Rafael Sakadauskas Ferreira, que participou das buscas na residência de Renato, afirmou:


Foi com o Sargento Lucchi ao local dos fatos averiguar uma informação sobre um carregamento de drogas. Chegando na casa, notou que no mesmo numeral existem duas residências. Na primeira delas, uma senhora atendeu os policiais, autorizou a revista em sua casa e nada de ilícito foi encontrado. Em seguida, foram à outra residência, bateram à porta e o indiciado aqui presente atendeu os policiais. Ele autorizou a entrada dos policiais e o depoente localizou, dentro do guarda-roupas, uma sacola contendo varais porções de substância semelhante a maconha e cocaína. Após a localização desse entorpecente, o próprio indiciado disse aos policiais que estava guardando mais drogas na cozinha e uma arma de fogo. Em cima do armário da cozinha, foi localizada uma bolsa contendo vários tabletes de substância assemelhada a maconha, várias porções de cocaína e outras de substância semelhante a "crack" e um revólver, calibre 38, com a numeração suprimida (pinada), municiado com seis cartuchos íntegros. Em uma cômoda foi localizada a quantia de R$ 428,00 (quatrocentos e vinte e oito reais). A esposa do indiciado estava pelo local com o filho de três meses e disse aos policiais que seu companheiro guardava drogas e arma em casa, mas nunca se envolveu. Em seguida, foi solicitado o apoio do canil da guarda municipal e todo o local foi mantido intacto para preservar o sítio para os cachorros. Os guardas do canil foram ao local, mas os cachorros não localizaram outras drogas. Chegando na Delegacia, foi realizada a contagem, constatando-se que havia na casa do indiciado 08 (oito) tijolos de maconha, 88 (oitenta e oito) "trouxas" de maconha, 178 (cento e setenta e oito) "trouxas" de pequeno porte também de maconha, 501 (quinhentos e um) "pinos" de cocaína, 291 (duzentos e noventa e um) papelotes de cocaína e 56 (cinquenta e seis) porções de "crack". (fls. 9/10)

A esposa de Renato, Tais Cristina Leite, na data dos fatos relatou o seguinte:


Vivem em união estável há três anos e juntos tem um filho de três meses. Nesta noite, policiais militares foram até sua casa e chamaram seu companheiro. Ele saiu do lado de fora e ficou conversando com os policiais. Em seguida, alguns policiais entraram em sua casa e começaram a revistar o local. Estava dentro da casa quando os policiais acharam droga em cima do armário, mas não ficou olhando para saber se havia outras coisas. Sabia que ele guardava aquelas drogas na casa, mas nunca quis se envolver nesse tipo de coisa. Não se recorda de tê-lo visto armado em casa. (fl. 11)

Renato da Cruz Oliveira, interrogado pela Autoridade Policial, assim declarou acerca do ocorrido:


Neste ato constitui a sua advogada a Dra. Claudia Andreia Tarifa, OAB/SP nº 145.387, com escritório profissional à Avenida Dom Pedro, nº 301, sala 51, Centro, Salto/SP. Sua família já sabe do ocorrido. Antes do início do interrogatório, a advogada quer deixar consignado que foi ao local dos fatos, por volta de 19h15, mas foi impedida de acompanhar as buscas e ingressar na casa de seu cliente pelo Sargento Lucchi, sendo certo que seu cliente somente chegou na Delegacia às 21h20. A advogada também pede que conste que o Sargento Lucchi lhe pediu a identificação para relacioná-la no BO/PM, mas a causídica não entregou. Sobre os fatos, confessa que guardava as drogas em sua casa, mas nega a posse da arma de fogo. Afirma que, no mês passado, comprou os entorpecentes na fronteira com o Paraguai, pagou a quantia de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) e trouxe a droga de ônibus até Salto. Diz que agiu sozinho. Relata que foi ao Paraguai e perguntou na rua quem teria drogas e conseguiu o entorpecente ora apreendido. Não sabe indicar quem lhe vendeu a droga. Inquirido, afirma que sua companheira nunca vendeu nem fez qualquer ato relacionado com as drogas. Quer dizer que trabalha como marmorista, na Marmoraria Celso e a Marmoraria GV Artes em Pedra, e que o dinheiro é fruto do seu trabalho. Nunca foi preso anteriormente. (fls. 12/13)

No auto de constatação preliminar de substância entorpecente apurou-se que o material apreendido assemelha-se profundamente a crack, maconha e cocaína, possui peso total em torno de 9.311,69 g (nove mil trezentos e onze gramas e sessenta e nove centigramas). Relacionou-se quantidade e peso de cada uma das substâncias apreendidas:

a) 56 (cinquenta e seis) pedras de crack, com peso de 10,16 g (dez gramas e dezesseis centigramas);
b) 8 (oito) "trouxas" de maconha pesando de 224,23 g (duzentos e vinte e quatro gramas e vinte e três centigramas);
c) 291 (duzentos e noventa e um) papelotes de cocaína, com peso de 117,54 g (cento e dezessete gramas e cinquenta e quatro centigramas);
d) 501 (quinhentos e um) "pinos" de cocaína, pesando de 377,80 g (trezentos e setenta e sete gramas e oitenta centigramas);
e) 80 (oitenta) "trouxas" de maconha, com peso de 2.000,89 g (dois mil gramas e oitenta e nove centigramas);
f) 178 (cento e setenta e oito) "trouxinhas" de maconha, pesando de 275,78 g (duzentos e setenta e cinco gramas e setenta e oito centigramas);
g) 8 (oito) tijolos de maconha, com peso total aproximado de 6.305,29 g (seis mil, trezentos e cinco gramas e vinte e nove centigramas). (fls. 17/23)

O Ilustre 3º Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo, Dr. João José Rodrigues Neto, manifestou-se pela decretação da prisão preventiva, nos seguintes termos:


Como é cediço, os crimes em pauta são fomentadores de toda insegurança jurídica atual. Na verdade, estão na base de todas as demais modalidades criminosas, sustentando e mantendo organizações criminosas espalhadas pelo Estado. Portanto, a manutenção da custódia é necessária para que a ordem pública seja preservada e a lei penal possa ser adequadamente aplicada.
Por tais motivos, necessária a decretação da prisão preventiva.
Ante o exposto, diante das particularidades jurídicas do evento e sendo certo que a prisão do autor mostra-se necessária para a aplicação da lei penal e para a manutenção da ordem pública, requeiro seja o indiciado mantido preso cautelarmente.
(fls. 27/29)

Após a conversão da prisão em flagrante de Renato da Cruz Oliveira em preventiva, e expedido o mandado de prisão, foram encaminhados os autos à Justiça Federal de Sorocaba (SP) (fls. 28 e 34).
O MM. Juízo Federal declarou nulos todos os atos praticados pelo Juízo de Direito de Salto (SP), em razão da sua incompetência absoluta (fl. 46).
O Ilustre Procurador da República, Dr. Rubens José de Calasans Neto, manifestou-se pela decretação da prisão preventiva de Renato para garantia da ordem pública, da ordem econômica, da execução da pena e da conveniência da instrução criminal (fls. 48/48v.).
A decisão impugnada relaxou a prisão em flagrante sob o seguinte fundamento:

Nos termos do art. 5º, inciso XI da Constituição da República, a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.
A respeito da prisão em flagrante, o art. 301 do CPP prevê que qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.
O art. 302 do CPP dispõe que considera-se em flagrante delito quem está cometendo infração penal, acaba de cometê-la ou é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração.
O inciso IV do mesmo artigo prevê ainda que está em flagrante quem é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.
Sobre o estado de flagrância, Tourinho Neto¹ ensina que "Flagrante, do latim flagrans, flagrantis, traduz a idéia daquilo que está em chamas, que está crepitando. Daí a expressão 'flagrante delito' para significar o delito no momento da sua consumação".
A palavra flagrante, significando aquilo que está em chama, não quer dizer apenas aquilo que está acontecendo, mas também o fato que pode ser visto por todos, pois é assim que o fogo é.
Ocorre que muitos crimes não são visíveis como as chamas, mesmo no momento da sua consumação. E os crimes permanentes não escapam disso.
Esses casos, evidentemente, não foram contemplados pela constituição entre aqueles aptos a autorizar a violação do domicílio.
Com efeito, como qualquer um do povo ou a polícia poderia saber, com certeza, se um crime que não deixa sinais exteriores por si estaria ocorrendo em algum domicílio antes de violá-lo?
Uma busca seria necessária, pois não?
Muito tem ocorrido de a polícia, alegando ter recebido denúncia anônima da existência do crime, ter feito busca domiciliar, encontrando a materialidade do crime e efetuado prisões.
A propósito da busca domiciliar, o art. 240 do CPP determina que a busca será domiciliar ou pessoal e proceder-se-á àquela quando fundadas razões a autorizarem para, dentre algumas hipóteses, descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu ou colher qualquer elemento de convicção.
E o art. 241 do CPP, por seu turno, estabelece que quando a própria autoridade policial ou judiciária não a realizar pessoalmente, a busca domiciliar deverá ser precedida da expedição de mandado.
Ocorre que, à luz do art. 5º, inciso XI da Lei Maior, não se admite mais busca domiciliar feita pela polícia sem mandado judicial. Ou ela é feita com mandado ou pelo próprio magistrado.
Mas há casos em que a polícia afirma pedir o consentimento do morador para entrar no domicílio delas para fazer busca.
Estaria essa hipótese permitida pela Constituição e pelo CPP?
É claro que não.
Em um estado Democrático de Direito, quem autoriza a busca domiciliar é o juiz, e não a polícia. Ela não pode pedir permissão a ninguém para adentrar no seu domicílio para fazer busca, porque o ato, em si, intimida, e, por óbvio, vicia o consentimento.
As pessoas deixam a polícia entrar em suas casas, notadamente as de baixa instrução e renda, porque têm medo da truculência da polícia.
Um parêntese: quem quiser entender, na prática, do que estou a falar, assista, ainda que por alguns minutos, ao programa intitulado "24", da Rede Bandeirantes de Televisão.
Retomando.
O inciso LVI do artigo 5º da Carta da República prescreve que são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.
No caso dos autos, os policiais responsáveis pela prisão do investigado, disseram que ouviram pelo "Copom" que um carregamento de entorpecentes estava chegando no endereço dele.
Segundo consta dos autos, os policiais, ao chegarem no endereço informado, pediram a uma mulher que os atendeu para fazer busca na casa dela. Realizada a busca e nada tendo sido encontrado, os policiais teriam percebido que havia duas casas no local, tendo sido recebidos na outra casa pelo investigado.
Ainda segundo a polícia, o investigado teria autorizado a busca e teria sido preso porque no domicílio dele teriam sido encontradas maconha e cocaína.
Como se vê, a polícia não viu as chamas do crime, isto é, não presenciou o descarregamento que supostamente teria sido informado, passando a fazer busca na casa do investigado sem mandado judicial.
Aliás, em casos de denúncia anônima e de anemia probatória, como é o caso presente, tenho indeferido os pedidos de busca domiciliar apresentados pela polícia, o que evidencia, de maneira insofismável, que a polícia não pode, de modo algum, substituir-se ao juiz em casos que tais.
Como a polícia fez busca domiciliar no domicílio do investigado sem mandado judicial - e não só no dele, mas no de outra pessoa que nada tinha a ver com a investigação - a prova da materialidade do crime foi obtida por meios ilícitos, impondo-se o relaxamento da prisão.
Registre-se, outrossim, que consta dos autos que a advogada do investigado foi proibida de acompanhar a diligência policial por motivo de segurança. O argumento, todavia, não convence, ao contrário, compromete ainda mais a lisura da diligência, que já era ilícita, impedir que um civil a acompanhasse, notadamente a advogada do investigado.
Ante o exposto, RELAXO a prisão em flagrante de Renato da Cruz Oliveira, nos termos do art. 310, inciso I do CPP.
Expeça-se Alvará de Soltura em nome dele.
Aguarde-se a vinda do respectivo Inquérito Policial.
Dê-se ciência ao MPF.
(fls. 49/51).

Tráfico ilícito de entorpecentes. Prisão em flagrante. Violação de domicilio. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que, por se tratar de crime permanente, no delito de tráfico de entorpecentes não há ilegalidade na prisão em flagrante efetuada sem mandado judicial na residência do agente, na medida em que a Constituição da República, em seu art. 5º, XI, autoriza a entrada da autoridade policial, durante o dia ou à noite, independentemente da expedição de mandado judicial:

HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. PRISÃO EM FLAGRANTE. CRIME PERMANENTE. VIOLAÇÃO AO PRECEITO CONTIDO NO ART. 5.º, INCISO XI, DA CONSTITUIÇÃO. INOCORRÊNCIA. (...).
1. (...)
2. O tráfico ilícito de drogas é crime permanente, razão por que não há se falar em ilegalidade da prisão em flagrante por violação de domicílio, pois a Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XI, autoriza a entrada da autoridade policial, seja durante o dia, seja durante a noite, independente da expedição de mandado judicial.
(...)
7. Ordem de habeas corpus parcialmente concedida a fim de determinar ao Juízo das Execuções Penais que, afastada a obrigatoriedade do regime inicial fechado, proceda à fixação do regime prisional adequado ao Paciente RAFAEL ASSUNÇÃO DA SILVA, e, mediante a concessão de writ, de ofício, adote o mesmo critério em relação ao Paciente RODRIGO TEODORO ALVES CABRAL.
(STJ, HC n. 204.108, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 09.04.13)
HABEAS CORPUS. PENAL. CRIMES DE TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS E POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. PRISÃO EM FLAGRANTE. CRIME PERMANENTE. (...).
1. Tratando-se o tráfico ilícito de drogas de crime permanente, não há se falar em ilegalidade da prisão em flagrante por violação de domicílio, uma vez que a Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XI, autoriza a entrada da autoridade policial, seja durante o dia, seja durante a noite, independente da expedição de mandado judicial. Precedente.
(...)
5. Ordem parcialmente concedida, a fim de, reformando a sentença condenatória e o acórdão combatido, absolver o Paciente do delito de posse ilegal de arma de fogo, ante a constatação da atipicidade da conduta por ele praticada.
(STJ, HC n. 144.544, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 20.09.11)
HABEAS CORPUS. NARCOTRAFICÂNCIA E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. (ART. 33, CAPUT, E 35 DA LEI 11.343/06). PRISÃO EM FLAGRANTE EFETUADA NA CASA DA PACIENTE. INOCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. CRIME PERMANENTE. DILATAÇÃO TEMPORAL DO ESTADO DE FLAGRÂNCIA. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DO WRIT. ORDEM DENEGADA.
1. O crime pelo qual a paciente é acusada - tráfico de substâncias entorpecentes - permite a dilatação temporal do estado de flagrância, na medida em que possui natureza jurídica de delitos permanentes, razão pela qual a busca domiciliar e a prisão da paciente em sua casa, sem amparo de mandado judicial, não constituem violação de domicílio nem tampouco contaminam as provas colhidas.
2. In casu, não ocorreu a violação de domicílio vedada pela Constituição Federal, uma vez que o estado de flagrância permite a entrada de policiais no domicílio da paciente para interromper ou coibir a ação delituosa.
3. Parecer do MPF pela denegação da ordem.
4. Ordem denegada.
(STJ, HC n. 135.491, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 23.02.10)
PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. PRISÃO EM FLAGRANTE. ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE NA EFETIVAÇÃO DA MEDIDA. INOCORRÊNCIA. LIBERDADE PROVISÓRIA. PROIBIÇÃO DECORRENTE DE TEXTO LEGAL E DE NORMA CONSTITUCIONAL.
I - Tratando-se os delitos de tráfico ilícito de substância entorpecente e posse de arma de fogo de crimes de natureza permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, a busca domiciliar que culmina com a prisão do paciente em flagrante, não constitui ilegalidade, pois evidenciada a figura do flagrante delito, o que, a teor do disposto no art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal, autoriza o ingresso, ainda que sem mandado judicial, no domicílio alheio (Precedentes). Ademais, restaram observados os requisitos previstos no art. 304, do CPP.
(...)
Writ denegado.
(STJ, HC n. 124.444, Rel. Min. Felix Fischer, j. 19.03.09)
PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. ARTS. 33,CAPUT, DA LEI 11.343/06 E 16, PARÁGRAFO ÚNICO, IV, DA LEI10.826/03. BUSCA DOMICILIAR E PESSOAL. ALEGAÇÃO DE ILICITUDENA EFETIVAÇÃO PRISÃO. INOCORRÊNCIA. TRÁFICO ILÍCITO DEENTORPECENTES. DELITO PERMANENTE.
Tratando-se de tráfico ilícito de substância entorpecente, crime de natureza permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, a busca domiciliar e pessoal que culminou com prisão do paciente, mantendo em depósito drogas e na posse de arma de fogo, não constitui prova ilícita, pois ficou evidenciada a figura do flagrante delito, o que, a teor do disposto no art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal, autoriza o ingresso, ainda que sem mandado judicial, no domicílio alheio (Precedentes).
Habeas corpus denegado.
(STJ, HC n. 126.556, Rel. Min. Felix Fischer, j. 29.10.09)
PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.363/06. BUSCA DOMICILIAR. ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE NA EFETIVAÇÃO DA MEDIDA. INOCORRÊNCIA. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. DELITO PERMANENTE.
I - Não há ilegalidade, in casu, na busca domiciliar realizada, decorrente da prisão em flagrante por crime de receptação. Na hipótese, a esposa do paciente foi surpreendida comercializando produtos de origem criminosa, em frente à sua residência, autorizando, dessa forma, a busca domiciliar, momento em que fora apreendido em depósito, no interior da casa, para fins de difusão ilícita, 6 (seis) latas de merla e 47,13 g (quarenta e sete gramas e treze centigramas) de "maconha".
II - Ademais, tratando-se o delito de tráfico ilícito de substância entorpecente de crime de natureza permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, a busca domiciliar que culminou com a prisão do paciente em flagrante, mantendo em depósito drogas, não constitui prova ilícita, pois evidenciada a figura do flagrante delito, o que, a teor do disposto no art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal, autoriza o ingresso, ainda que sem mandado judicial, no domicílio alheio (Precedentes).
Ordem denegada.
(STJ, HC n. 108.603, Rel. Min. Felix Fischer, j. 27.11.08)
PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS-CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. SENTENÇA. NULIDADES. INOCORRÊNCIA.
- A jurisprudência dominante proclama a tese de que, tratando-se de crime de tráfico, de caráter permanente, legítima se apresenta a busca domiciliar realizada sem mandado judicial.
(...)
- Recurso ordinário desprovido.
(STJ, RHC n. 12.362, Rel. Vicente Leal, j. 19.09.02)
Do caso dos autos. A ausência de mandado judicial não invalida a prisão em flagrante de Renato da Cruz Oliveira.
Ouvido perante a Autoridade Policial, o recorrido declarou manter em guarda o entorpecente apreendido o qual por ele fora adquirido no Paraguai, mediante a paga de R$ 15.000,00 (quinze mil reais).
Em momento algum relatou abuso ou desrespeito contra si, sua mulher ou seu filho, por parte dos Policiais Militares que efetuaram a busca em sua residência.
É consabido que o local do crime é inviolável e inacessível até que se encerrem buscas e apreensões, de modo que se mostra pertinente o impedimento de acesso pela advogada do acusado ao local.
A quantidade de droga apreendida, somada ao porte de arma sem autorização, com número de série raspado, e ao depoimento prestado pelo recorrido, até o presente momento denotam a existência de organização criminosa atuante na região de Salto (SP), a justificar a conversão da prisão em flagrante em preventiva, a fim de garantir a ordem pública e a aplicação da lei penal.
Expeça-se mandado de prisão, consignando que a prescrição da pretensão punitiva estatal, com base na pena máxima, está prevista para ocorrer em 25.03.23.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso em sentido estrito para restabelecer a prisão em flagrante de Renato da Cruz Oliveira e convertê-la em prisão preventiva, expedindo-se, imediatamente, mandado de prisão.

É o voto.


Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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Nº de Série do Certificado: 5575CE3631A25D56
Data e Hora: 04/12/2013 18:36:09