Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 22/04/2014
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0029622-51.2013.4.03.0000/SP
2013.03.00.029622-7/SP
RELATOR : Juiz Convocado FERNÃO POMPÊO
AGRAVANTE : Caixa Economica Federal - CEF
ADVOGADO : SP230234 MAURICIO NASCIMENTO DE ARAUJO e outro
AGRAVADO : ORIVALDO CUNHA e outro
ADVOGADO : SP110408 AYRTON MENDES VIANNA e outro
AGRAVADO : MARIA CRUZ CUNHA
ADVOGADO : SP110408 AYRTON MENDES VIANNA
PARTE RE' : CIA EXCELSIOR DE SEGUROS
ADVOGADO : PE003069 TATIANA TAVARES DE CAMPOS e outro
ORIGEM : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA DE SANTOS > 4ªSSJ > SP
No. ORIG. : 00111358820124036104 2 Vr SANTOS/SP

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. SEGURO HABITACIONAL. FCVS. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. INTERESSE JURÍDICO. COMPETÊNCIA.
1. O Sistema Financeiro da Habitação foi criado pela Lei nº 4.380/64, de 21/08/1964. A partir de então, determinou-se a contratação obrigatória do chamado Seguro Habitacional - SH para cobrir morte ou invalidez permanente do mutuário (MIP) e danos físicos ao imóvel (DFI).
2. Por serem financiamentos habitacionais para população com faixa de renda menor, eles eram garantidos pela União, que assumia o risco para evitar que o preço do seguro fosse muito elevado. Embora os seguros fossem feitos com empresas privadas, essas seguradoras apenas intermediavam a operação. Elas recolhiam os seguros e repassavam os recursos para o fundo criado com essa finalidade. Quando ocorria sinistro, a seguradora pagava o mutuário e pedia ressarcimento ao fundo.
3. Atualmente a Caixa Econômica Federal é a responsável por representar judicial e extrajudicialmente os interesses do FCVS.
4. Após inúmeras ações judiciais discutindo a legitimidade/interesse da Caixa Econômica Federal nas ações que versam sobre o pagamento desses seguros habitacionais, o e. Superior Tribunal de Justiça aceitou o REsp nº 1.091.363/SC, de relatoria da eminente Ministra Maria Isabel Gallotti, como representativo de controvérsia repetitiva. Atualmente o feito encontra-se pendente de julgamento de novos embargos de declaração opostos contra o acórdão publicado em 14/12/2012. Entretanto, em 10/10/2012, quando do julgamento dos embargos de declaração opostos contra embargos de declaração anteriores, aquela c. 2ª Seção afirmou que "nas ações envolvendo seguros de mútuo habitacional no âmbito do Sistema Financeiro Habitacional - SFH, a Caixa Econômica Federal - CEF - detém interesse jurídico para ingressar na lide como assistente simples somente nos contratos celebrados de 02.12.1988 a 29.12.2009 - período compreendido entre as edições da Lei nº 7.682/88 e da MP nº 478/09 - e nas hipóteses em que o instrumento estiver vinculado ao Fundo de Compensação de Variações Salariais - FCVS (apólices públicas, ramo 66)".
5. Da leitura do acórdão, bem como dos votos que o integram, resta claro, a meu ver, que naquele repetitivo o objeto discutido é, somente, o interesse jurídico da CEF quando o contrato foi celebrado entre o período de 02/12/1988 (Lei nº 7682/88) e 29/12/2009 (Medida Provisória nº 478/09).
6. Assim, pedindo vênia aos entendimentos divergentes, o referido repetitivo deve apenas ser aplicado nas ações cujo objeto seja contrato celebrado entre o período de 02/12/1988 (Lei nº 7.682/88) e 29/12/2009 (Medida Provisória nº 478/09) e nas hipóteses em que o contrato estiver vinculado ao FCVS.
7. Entretanto, mesmo nas ações cujos contratos sejam anteriores à Lei nº 7.682/88, como no caso dos autos, entendo que a linha de raciocínio ali trazida deve ser seguida, qual seja: havendo o risco de comprometimento dos recursos públicos, deve integrar a lide aquele que o representa legalmente.
8. Ao analisar a argumentação trazida pelas seguradoras privadas e pela CEF, nestes autos e em outros similares, bem como da legislação sobre os seguros habitacionais e, ainda, pelas ponderações levantadas pela Ministra Maria Isabel Gallotti no precedente mencionado, reputo plausível que no futuro, quando essas ações forem executadas, possa haver pagamento das indenizações com dinheiro público, independentemente de qual período o contrato foi assinado ou de qual fundo deveria cobrir o débito.
9. Dessa forma, excluir a Caixa Econômica Federal dessas ações, seja como assistente simples, parte ou assistente litisconsorcial mostra-se, no mínimo, temerário, haja vista que, atualmente, referida empresa pública representa a União nas ações cujo objeto envolva o Sistema Financeiro da Habitação.
10. Da mesma forma, afirmar que só haveria interesse da CEF quando comprovado nos autos que o fundo do qual a indenização seria paga encontra-se deficitário também pode ensejar prejuízo ao erário público, pois, nada impede que o fundo que atualmente se encontre positivo possa estar em situação negativa quando do efetivo pagamento (execução) dos títulos judiciais.
11. Manutenção da Caixa Econômica Federal no pólo passivo da ação. Competência da Justiça Federal.
12. Agravo de instrumento provido.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, decidiu dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do voto do Senhor Juiz Federal Convocado Relator, acompanhado pelo voto do Senhor Juiz Federal Convocado Leonel Ferreira, vencido o Senhor Desembargador Federal Peixoto Junior que lhe negava provimento.


São Paulo, 08 de abril de 2014.
FERNÃO POMPÊO
Juiz Federal Convocado


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Data e Hora: 08/04/2014 22:17:03



AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0029622-51.2013.4.03.0000/SP
2013.03.00.029622-7/SP
RELATOR : Juiz Convocado FERNÃO POMPÊO
AGRAVANTE : Caixa Economica Federal - CEF
ADVOGADO : SP230234 MAURICIO NASCIMENTO DE ARAUJO e outro
AGRAVADO : ORIVALDO CUNHA e outro
ADVOGADO : SP110408 AYRTON MENDES VIANNA e outro
AGRAVADO : MARIA CRUZ CUNHA
ADVOGADO : SP110408 AYRTON MENDES VIANNA
PARTE RE' : CIA EXCELSIOR DE SEGUROS
ADVOGADO : PE003069 TATIANA TAVARES DE CAMPOS e outro
ORIGEM : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA DE SANTOS > 4ªSSJ > SP
No. ORIG. : 00111358820124036104 2 Vr SANTOS/SP

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que determinou a remessa dos autos à e. Justiça Estadual por não reconhecer a legitimidade da Caixa Econômica Federal para intervir na lide.

Em suas razões a Caixa Econômica Federal alega que possui legitimidade para intervir na lide, haja vista que administra os recursos advindos do Sistema Financeiro da Habitação - SFH, bem como do Fundo de Compensação de Variações Salariais - FCVS, garantidor das referidas apólices de seguro. Aduz que, mesmo que o contrato tenha sido assinado antes de 24/06/1988, não houve nenhuma migração de ramo após essa data, razão pela qual a apólice em comento continuou sendo pública, isto é, do ramo 66. Alega, ainda, que o comprometimento do FCVS está devidamente comprovado. Por fim, informa que o julgamento do REsp 1.091.393 ainda não transitou em julgado em virtude da existência de embargos de declaração ainda pendentes de apreciação. Requer, portanto, a antecipação da pretensão recursal para que o recurso seja recebido no efeito suspensivo e, após, a reforma da decisão para manter a CEF na lide.

Intimada, a parte agravada apresentou contraminuta (fls. 90/100).

É o relatório.



FERNÃO POMPÊO
Juiz Federal Convocado


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AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0029622-51.2013.4.03.0000/SP
2013.03.00.029622-7/SP
AGRAVANTE : Caixa Economica Federal - CEF
ADVOGADO : SP230234 MAURICIO NASCIMENTO DE ARAUJO e outro
AGRAVADO : ORIVALDO CUNHA e outro
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AGRAVADO : MARIA CRUZ CUNHA
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PARTE RE' : CIA EXCELSIOR DE SEGUROS
ADVOGADO : PE003069 TATIANA TAVARES DE CAMPOS e outro
ORIGEM : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA DE SANTOS > 4ªSSJ > SP
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VOTO

Inicialmente, mostra-se conveniente fazer um breve histórico legislativo sobre o tema objeto da controvérsia em exame.

O Sistema Financeiro da Habitação foi criado pela Lei nº 4.380/64, de 21/08/1964. A partir de então, determinou-se a contratação obrigatória do chamado Seguro Habitacional - SH. O artigo 17, inciso V, da citada lei atribuía a competência para manutenção dos seguros ao então Banco Nacional de Habitação - BNH.

Por meio do Decreto nº 73/1966 foram reguladas todas as operações de seguros e resseguros e instituído o Sistema Nacional de Seguros Privados, constituído pelo Conselho Nacional de Seguros Privados - CNSP-; Superintendência de Seguros Privados - SUSEP -; Instituto de Resseguros do Brasil - IRB -; sociedades autorizadas a operar em seguros privados; e corretores habilitados. Também disciplinava que haveria participação majoritária do governo, por meio do IRB e do BNH.

Em suma, a partir de então, as apólices (todas públicas denominadas como ramo 66) eram garantidas pelo BNH por intermédio do IRB. Através da Resolução nº 25, de 16/06/1967, do Conselho de Administração do BNH, foi criado o Fundo de Compensação de Variações Salariais - FCVS -, "com a finalidade de garantir limite de prazo para amortização da dívida aos adquirentes de habitações financiadas pelo Sistema Financeiro da Habitação".

Posteriormente, o Decreto-Lei nº 2.291, de 21/11/1986, extinguiu o BNH e transferiu suas atribuições para a CEF. Em 1987 o IRB criou o FESA - Fundo de Equalização de Sinistralidade da Apólice de Seguro Habitacional, constituído pelos eventuais superávits gerados pelo Seguro Habitacional.

Esclareço que o seguro habitacional foi instituído para cobrir morte ou invalidez permanente do mutuário (MIP), danos físicos ao imóvel (DFI) e, atualmente, também, responsabilidade civil do construtor (RCC), em contratos cujo imóvel fosse financiado pelo Sistema Financeiro Habitacional.

Por serem financiamentos habitacionais para população com faixa de renda menor, eles eram garantidos pela União, que assumia o risco para evitar que o preço do seguro fosse muito elevado. Embora os seguros fossem feitos com empresas privadas, essas seguradoras apenas intermediavam a operação. Elas recolhiam os seguros e repassavam os recursos para o fundo criado com essa finalidade. Quando ocorria sinistro, a seguradora pagava o mutuário e pedia ressarcimento ao fundo.

Em 02/12/1988 foi editada a Lei nº 7.682, que alterou o Decreto-Lei nº 2.406, de 05/01/1988. Por essa lei o FCVS começou a ser administrado pela CEF, passando a garantir, também, o equilíbrio das apólices públicas do seguro habitacional do SFH. Os recursos do FESA foram, então, transferidos para o FCVS. Ressalte-se que os recursos do FCVS só devem ser utilizados caso o FESA não tiver recursos suficientes para o pagamento das indenizações.

No ano de 1988 iniciou-se a privatização do IRB, porém, suas atividades administrativas e recursos só foram transferidos para a CEF em 2000. Saliento que a referida privatização efetivou-se apenas no final de 2013 após extensa discussão jurídica.

Em 20/11/1997, quando da edição da Lei nº 9.541, foi criado o Sistema Financeiro Imobiliário - SIF, que permitiu o financiamento imobiliário fora do Sistema Financeiro da Habitação e, com a edição da Medida Provisória nº 1.671, de 24/06/1998, foi criada a possibilidade de contratação de seguro por meio do SFH ou fora dele. Por esse novo sistema criaram-se as chamadas apólices de mercado, desvinculadas do seguro habitacional do SFH, denominada pela SUSEP de "ramo 68". Nessas apólices o risco da cobertura é da seguradora contratada, sendo que a CEF atuava apenas como estipulante na relação securitária.

Assim, desde então, os contratos poderiam ter apólices públicas (ramo 66, com garantia do FCVS) ou de mercado (ramo 68).

Em seguida, foram editadas as Medidas Provisórias nº 478/2009, de 29/12/2009, que perdeu sua eficácia em 15/06/2010 e a de nº 513/2010, de 26/11/2010, convertida na Lei nº 12.409/2011, de 25/05/2011. Por meio delas as apólices públicas (ramo 66) foram extintas e as novas contratações securitárias somente seriam possíveis com apólices de mercado (ramo 68). Entretanto, estipulou-se que o FCVS assumiria todos os direitos e obrigações do seguro habitacional do SFH e ofereceria cobertura direta aos contratos regidos pela extinta apólice. Por essa legislação também disciplinou-se que a CEF seria a responsável por representar judicial e extrajudicialmente os interesses do FCVS.

Após inúmeras ações judiciais discutindo a legitimidade/interesse da Caixa Econômica Federal nas ações que versam sobre o pagamento desses seguros habitacionais, o e. Superior Tribunal de Justiça aceitou o REsp nº 1.091.363/SC, de relatoria da eminente Ministra Maria Isabel Gallotti, como representativo de controvérsia repetitiva. Atualmente o feito encontra-se pendente de julgamento de novos embargos de declaração opostos contra o acórdão publicado em 14/12/2012. Entretanto, em 10/10/2012, quando do julgamento dos embargos de declaração opostos contra embargos de declaração anteriores, aquela c. 2ª Seção assim afirmou:


"DIREITO PROCESSUAL CIVIL. SFH. SEGURO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. INTERESSE. INTERVENÇÃO. LIMITES E CONDIÇÕES. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. ART. 543-C DO CPC.
1. Nas ações envolvendo seguros de mútuo habitacional no âmbito do Sistema Financeiro Habitacional - SFH, a Caixa Econômica Federal - CEF - detém interesse jurídico para ingressar na lide como assistente simples somente nos contratos celebrados de 02.12.1988 a 29.12.2009 - período compreendido entre as edições da Lei nº 7.682/88 e da MP nº 478/09 - e nas hipóteses em que o instrumento estiver vinculado ao Fundo de Compensação de Variações Salariais - FCVS (apólices públicas, ramo 66).
2. Ainda que compreendido no mencionado lapso temporal, ausente a vinculação do contrato ao FCVS (apólices privadas, ramo 68), a CEF carece de interesse jurídico a justificar sua intervenção na lide.
3. O ingresso da CEF na lide somente será possível a partir do momento em que a instituição financeira provar documentalmente o seu interesse jurídico, mediante demonstração não apenas da existência de apólice pública, mas também do comprometimento do FCVS, com risco efetivo de exaurimento da reserva técnica do Fundo de Equalização de Sinistralidade da Apólice - FESA, colhendo o processo no estado em que este se encontrar no instante em que houver a efetiva comprovação desse interesse, sem anulação de nenhum ato anterior.
4. Evidenciada desídia ou conveniência na demonstração tardia do seu interesse jurídico de intervir na lide como assistente, não poderá a CEF se beneficiar da faculdade prevista no art. 55, I, do CPC.
5. Na hipótese específica dos autos, tendo sido reconhecida a ausência de vinculação dos contratos de seguro ao FCVS, inexiste interesse jurídico da CEF para integrar a lide.
6. Embargos de declaração parcialmente acolhidos, sem efeitos infringentes".

Da leitura do acórdão, bem como dos votos que o integram, resta claro, a meu ver, que naquele repetitivo o objeto discutido é, somente, o interesse jurídico da CEF quando o contrato foi celebrado entre o período de 02/12/1988 (Lei nº 7682/88) e 29/12/2009 (Medida Provisória nº 478/09).

Verifico que houve, sim, um debate jurídico, suscitado pela Ministra Nancy Andrighi acerca da inexistência de interesse da CEF antes e depois desse período. Entretanto, a e. relatora Ministra Maria Isabel Gallotti ponderou que a questão não era assim tão pacífica, haja vista que os recursos da União sempre garantiram o referido Seguro Habitacional, mesmo que por intermédio dos extintos BNH ou IRB ou, ainda, com outros fundos que não o FCVS. Transcrevo aqui trecho de seu voto:


"(...)
Esclareço que não abordei, na tese repetitiva exposta à apreciação dos Colegas, o que aconteceria com os sinistros ocorridos antes da entrada em vigor da lei que atribuiu a garantia do sistema ao FCVS e nem com os sinistros posteriores a 2009.
Com a devida vênia, não considero devamos decidir - e, sobretudo, apor a chancela de "repetitivo", com as gravíssimas consequências processuais decorrentes - questão não pertinente à lide travada nos autos, não discutida pelas partes, nem pelo Tribunal de origem, questão sequer amadurecida em precedentes do STJ.
Mas, como foi trazida a questão a título de esclarecimento da tese repetitiva, tenho reparos, data venia, a fazer, quando o voto da Ministra Nancy Andrighi dispõe que a Caixa somente teria interesse para integrar a lide como assistente simples nos contratos celebrados a partir de 2 de dezembro de 1988, tomando como base a Lei n. 7.682, de 1988. Observo que essa Lei apenas passou a gestão da apólice pública para o FCVS, não foi ela que criou a apólice pública e não foi apenas a partir dela que passou a haver o envolvimento de recursos públicos federais no seguro habitacional.
Desde a Lei n. 4.380, de 1964, que criou o SFH, já tinha sido atribuída ao BNH a competência para manter seguros para os mutuários do SFH. Em 1966, pelo Decreto n. 73, foi estabelecido, em seu art. 15, parágrafo único, que a garantia das operações do SFH, que não encontravam cobertura no mercado, poderiam ser atribuídas ao BNH - porque essa apólice pública garante coberturas que não são lucrativas para o setor privado. Então, dada a amplitude de cobertura para pessoas idosas, doentes, riscos que ultrapassavam o valor até do empréstimo, havia a necessidade de cobertura pública; portanto, quem cobria isso era o BNH.
Em 1970, foi instituída, pela primeira vez, a apólice única com riscos assumidos por um consórcio, com participação majoritária do Governo, por meio do Instituto de Resseguros do Brasil e do BNH. Quando foi extinto o BNH, em 1986, foi criado pelo IRB, em 1987, esse FESA, que já era constituído por superávits do seguro habitacional, cabendo às seguradoras apenas uma fração fixa dos prêmios, ou seja, desde 1986, pelo menos, as seguradoras privadas não operavam tendo lucro no sistema, apenas prestando serviço ao sistema, e o déficit eventual era coberto pelo erário, por meio do BNH.
Após a extinção do BNH, em 1988, a apólice pública passou a ser garantida pelo FCVS. Ou seja, em 1988, realmente, foi que a garantia passou a ser do FCVS, mas antes era dada pelo BNH, e o BNH, quando de sua extinção teve suas atribuições transferidas para a Caixa. Há reiterados precedentes, desde o extinto TFR, dizendo que as atribuições do BNH, no Sistema Financeiro da Habitação, passaram para a Caixa Econômica Federal.
Portanto, essa limitação constante do voto da Ministra Andrighi, de que a Caixa só tem interesse jurídico em contratos posteriores a dezembro de 1988, além de, data venia, não corresponder ao sistema normativo anterior, em que havia garantia não o FCVS, do BNH, que foi sucedido pela própria Caixa, extravasa os termos da lide posta nesse recurso repetitivo. Ou seja, não houve discussão das partes e do Tribunal de origem sobre isso. Esse é um histórico legislativo que fiz a propósito da questão, mas que já demonstra que, data venia, não há como afirmar, com efeito repetitivo, sem que a questão tenha sido debatida nesse processo pela parte, a questão de interesse jurídico ou não da Caixa em contratos anteriores a dezembro de 1988.
Passo a analisar a situação dos contratos e sinistros posteriores a 2009, também estranha à discussão nestes processos ora em julgamento, em que os sinistros são anteriores a 2009 e, por isso, sequer foi citada essa medida provisória, que não existia na época do recurso, no acórdão recorrido.
Mas, se for para tratarmos como "obiter dictum repetitivo" dos sinistros posteriores a 2009, sem o necessário amadurecimento em precedentes anteriores do STJ, diria que, de fato, não há interesse da Caixa de integrar a lide como assistente simples, mas, sim, como parte ou assistente litisconsorcial, porque, a partir da entrada em vigor dessa medida provisória, a Caixa, além de garantir, por meio do FCVS, o equilíbrio da apólice do seguro habitacional, exerce a própria regulação do sinistro, ou seja, é ela que vai deferir ou negar as coberturas e, aí, não haverá como prosseguir a relação processual sem a presença do ente que representa o FCVS.
(...)" (o destaque não está no original)

Assim, pedindo vênia aos entendimentos divergentes, o referido repetitivo deve apenas ser aplicado nas ações cujo objeto seja contrato celebrado entre o período de 02/12/1988 (Lei nº 7.682/88) e 29/12/2009 (Medida Provisória nº 478/09) e nas hipóteses em que o contrato estiver vinculado ao FCVS.

Entretanto, mesmo nas ações cujos contratos sejam anteriores à Lei nº 7.682/88, como no caso dos autos, entendo que a linha de raciocínio ali trazida deve ser seguida, qual seja: havendo o risco de comprometimento dos recursos públicos, deve integrar a lide aquele que o representa legalmente.

Ao analisar a argumentação trazida pelas seguradoras privadas e pela CEF, nestes autos e em outros similares, bem como da legislação sobre os seguros habitacionais e, ainda, pelas ponderações levantadas pela Ministra Maria Isabel Gallotti no precedente mencionado, reputo plausível que no futuro, quando essas ações forem executadas, possa haver pagamento das indenizações com dinheiro público, independentemente de qual período o contrato foi assinado ou de qual fundo deveria cobrir o débito.

Dessa forma, excluir a Caixa Econômica Federal dessas ações, seja como assistente simples, parte ou assistente litisconsorcial mostra-se, no mínimo, temerário, haja vista que, atualmente, referida empresa pública representa a União nas ações cujo objeto envolva o Sistema Financeiro da Habitação.

Da mesma forma, afirmar que só haveria interesse da CEF quando comprovado nos autos que o fundo do qual a indenização seria paga encontra-se deficitário também pode ensejar prejuízo ao erário público, pois, nada impede que o fundo que atualmente se encontre positivo possa estar em situação negativa quando do efetivo pagamento (execução) dos títulos executivos judiciais. Para melhor compreensão da questão, peço vênia para destacar outro excerto do voto da relatora no recurso repetitivo antes citado:


"(...)
Se houver saldo negativo no mês, o FESA busca, na conta geral do FCVS e, se a conta geral do FCVS não for suficiente, em recursos orçamentários. A propósito, já foi demonstrado em memoriais apresentados por ocasião do julgamento desses embargos de declaração que a Lei Orçamentária da União em 2005, por exemplo, destinou ao FCVS, apenas para a cobertura do déficit do Seguro Habitacional, R$ 11.794.157,00 (DOU de 24.1.2005, p. 1311); em 2006, R$ 45.814.558,00; em 2007, R$ 124.325.839,00 e, em 2008, R$ 164.423.493,00. Em 2009, o orçamento da União previu R$ 138.803.475,00 para a cobertura do déficit do Seguro Habitacional; em 2010, R$ 150.461.875,00 e em 2011, R$ 235.789.672,00. Ou seja, anualmente milhões de reais do orçamento da União vêm sendo comprometidos com a garantia dessa extinta apólice pública de seguro habitacional. Isso é dado público, constante das leis orçamentárias e que não deve ser desconsiderado, especialmente no momento em que se assenta tese com efeito repetitivo, potencialmente apto a trancar o seguimento de recursos de todo o país.
O argumento de somente se houver comprovada necessidade, para cada caso concreto, de uso de recursos da União para pagamento da indenização securitária justificaria a intervenção da CEF e a competência da Justiça Federal implicaria em postergar apenas para a fase posterior ao trânsito em julgado e liquidação da sentença, ou seja, somente para os atos de execução, a competência da Justiça Federal, o que não é razoável, porque esta não é mera chanceladora de decisões da Justiça Estadual. Acarretaria completa impossibilidade de o assistente, que é quem gere o FCVS, por força de lei, poder participar da fase de conhecimento do processo e mesmo de liquidação.
(...)"(o destaque não está no original)

Neste sentido é a decisão proferida pelo e. Juiz Federal Convocado Leonel Ferreira, integrante da c. 2ª Turma desta e. Corte Regional, que cita posicionamento adotado pelo e. Desembargador Federal Nelton dos Santos:


"É cediço que o fato de se tratar de apólice pública não implica necessariamente o comprometimento do FCVS em razão de déficit do Seguro Habitacional do SFH. Nesse aspecto, adiro ao posicionamento do e. Desembargador Federal Nelton dos Santos, para admitir que a mera possibilidade de prejuízo ao FCVS com eventual condenação na demanda indenizatória é fundamento suficiente a justificar a presença da CEF no pólo passivo do feito, viabilizando a defesa dos interesses daquele fundo. Confira-se:
Em resumo, nos contratos firmados antes do advento da MP 1.671/98, a única espécie de seguro existente era a apólice pública; a partir da edição da referida medida provisória até o advento da MP 478/09, admitiu-se a contratação tanto de apólice pública quanto privada; e, por fim, para os contratos firmados após a vigência da MP 478/09, a única hipótese viável é a contratação de apólice de mercado.
Assim, a discussão acerca da legitimidade da Caixa Econômica Federal para figurar no pólo passivo do presente feito necessariamente perpassa a análise da natureza do seguro contratado, em conformidade com o que dispunha as normas vigentes à época do contrato.
No caso em análise, em que pese não haver nenhuma menção no contrato acerca do tipo de seguro contratado, a única espécie admitida à época (30.10.1989 - f. 74 deste instrumento) era a apólice pública.
Ressalte-se que nem sempre haverá comprometimento de recursos do FCVS quando tratar-se de apólice pública, mas apenas nas situações em que houver déficit do Seguro Habitacional do SFH.
De toda forma, a mera possibilidade de prejuízo ao FCVS com eventual condenação proferida nesta demanda é fundamento suficiente a justificar a manutenção da CEF no pólo passivo do presente feito, para, assim, lhe viabilizar a defesa dos interesses daquele fundo.
Assim, é de se reconhecer a legitimidade da CEF para figurar no pólo passivo do presente feito.
Ademais, anoto que não se faz necessária a integração da União à relação processual, visto que nas causas versando sobre os contratos do Sistema Financeiro de Habitação - SFH com cláusula do Fundo de Compensação de Variação Salarial - FCVS, a competência é exclusiva da gestora do referido Fundo, a Caixa Econômica Federal - CEF. (TRF3, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0008764-96.2013.4.03.0000/SP, Processo nº 2013.03.00.008764-0/SP, Decisão monocrática, Relator Desembargador Federal NELTON DOS SANTOS)
Ademais, da análise de inúmeras demandas versando sobre o tema, observa-se que a empresa pública federal vem noticiando a extinção da reserva técnica proveniente do FESA e o atual estado deficitário do FCVS aqui também demonstrado por meio dos documentos de fls. 161/329.
Assim, reputo presentes os pressupostos autorizadores da suspensão dos efeitos da decisão agravada (CPC, artigo 558), concedendo efeito suspensivo ao agravo para deferir a participação da Caixa Econômica Federal no pólo passivo da demanda, na qualidade de assistente simples, e, em conseqüência, manter a competência federal para o processo e julgamento do feito originário até final decisão deste recurso".
(TRF/3ª Região, 2ª Turma, AI nº 2013.03.00.027731-2, 19/12/2013)

Diante da fundamentação exposta, entendo que a parte agravante (Caixa Econômica Federal) deve ser mantida no pólo passivo da lide, motivo pelo qual fica mantida, também, a competência da Justiça Federal para o processamento e julgamento do feito originário.

Ante o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento.

É como voto.



FERNÃO POMPÊO
Juiz Federal Convocado


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