D.E. Publicado em 13/08/2014 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido, rejeitar a matéria preliminar, negar provimento às apelações de Joaquim Fernandes Zuniga, Espólio de Affonso Fernandes Suniga, Maurício de Oliveira Pinterich, Milton Camolesi de Almeida, Anísio Silva, João Cláudio da Silva Souza, Jonas Jamil Lessa Lopes, Paulo Pereira da Silva e Valtemir dos Santos e dar parcial provimento às apelações do Ministério Público Federal, da União Federal e de João Pedro de Moura, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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VOTO-VISTA
Pedi vista dos autos para melhor examinar a alegação de nulidade da sentença, fundada na suposta violação ao princípio da identidade física do juiz.
Em 13 de junho de 2007, na sede do juízo da causa, foi realizada audiência destinada à produção da prova oral. Referido ato foi presidido pelo então Juiz Federal Substituto Caio Moysés de Lima, como se vê do termo de f. 4.023. Depois disso, atos instrutórios outros foram praticados, mas por meio de cartas precatórias.
Em 4 de fevereiro de 2011 os autos foram à conclusão e em 3 de março de 2011 o Juiz Federal Substituto João Batista Machado proferiu sentença, conforme registros constantes às f. 5.843 e 5.878.
Prima facie, haveria violação ao princípio da identidade física do juiz, já que o magistrado sentenciante não foi o mesmo que encerrou a instrução.
Ocorre que, tanto na data da conclusão dos autos quanto na da prolação da sentença, o Juiz Federal Substituto Caio Moysés de Lima já não exercia suas funções em Ourinhos, foro da causa.
Com efeito, por força da Resolução n. 81, de 9 de setembro de 2009, do Presidente deste Tribunal Regional Federal, o Juiz Federal Substituto Caio Moysés de Lima foi removido para o Juízo Federal da 12ª Vara de Execuções Fiscais de São Paulo, cabendo destacar, ainda, que no período de 8 de outubro de 2010 a 21 de março de 2011, Sua Excelência exerceu a titularidade da mencionada vara, conforme o Ato n. 11.272, de 17 de setembro de 2010, do Presidente do Conselho da Justiça Federal da 3ª Região.
Assim, está fora de dúvida de que, ao tempo da conclusão dos autos e da prolação da sentença, o magistrado que praticou o último ato de instrução já não se encontrava, de há muito, no juízo da causa e no respectivo foro.
Por isso, o caso dos autos não é de nulidade, haja vista que, já afastado de suas funções no processo, o aludido magistrado não mais estava vinculado a sentencia-lo, nos termos do artigo 132, caput, do Código de Processo Civil.
Ante o exposto e a exemplo do que fez a e. relatora, rejeito a alegação de violação do princípio da identidade física do juiz. Quanto às questões subsequentes, igualmente acompanho o voto da e. relatora.
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RELATÓRIO
A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA (RELATORA):
Trata-se de apelações interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pela UNIÃO FEDERAL, por JOAQUIM FERNANDES ZUNIGA, ESPÓLIO DE AFFONSO FERNANDES SUNIGA, MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH, MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA, ANÍSIO SILVA, JOÃO CLAUDIO DA SILVA SOUZA, JONAS JAMIL LESSA LOPES, JOÃO PEDRO DE MOURA, PAULO PEREIRA DA SILVA E VALTEMIR DOS SANTOS contra a sentença de fls. 5.844/5.877, que julgou parcialmente procedente a ação civil pública ajuizada pelo MPF e condenou:
- os Réus JOAQUIM FERNANDES ZUNIGA e AFFONSO FERNANDES SUNIGA pela prática dos atos de improbidade descritos nos artigos 9º e 3º, da Lei nº 8.429/92, aplicando as sanções de (a) ressarcimento do dano causado, em solidariedade, decorrente de enriquecimento ilícito pelo recebimento de valor superfaturado da Fazenda Ceres, a ser revertido em favor da União Federal; (b) pagamento de multa civil, a ser revertida para a União, fixada em 2 (duas) vezes o valor do acréscimo patrimonial, em rateio, incidindo sobre o montante correção monetária pelo INPC, a partir da publicação da sentença e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação; (c) suspensão dos direitos políticos, por 8 (oito) anos, e proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio, por 10 (dez) anos;
- os Réus MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH, JOÃO PEDRO DE MOURA, MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA e ANÍSIO SILVA pela prática dos atos de improbidade descritos no artigo 10 da Lei nº 8.429/92, aplicando as sanções de (a) pagamento de multa civil, a ser revertida para a União, fixada em 1 (uma) vez o valor do acréscimo patrimonial apurado nos autos com a compra e venda da Fazenda Ceres, incidindo sobre o montante correção monetária pelo INPC, a partir da publicação da sentença, e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação; (b) suspensão dos direitos políticos, por 5 (cinco) anos, e proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio, por 5 (cinco) anos;
- o Réu PAULO PEREIRA DA SILVA pela prática do ato de improbidade administrativa de que trata o artigo 10 da Lei nº 8.429/92, aplicando as sanções de (a) pagamento de multa civil, a ser revertida para a União, fixada em 1 (uma) vez o valor do acréscimo patrimonial apurado nos autos com a compra e venda da Fazenda Ceres, em rateio com os Réus indicados na alínea ii, incidindo sobre o montante correção monetária pelo INPC, a partir da publicação da sentença, e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação; (b) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio, por 5 (cinco) anos;
- os Réus JOÃO CLÁUDIO DA SILVA SOUZA, VALTEMIR DOS SANTOS e JAMIL LESSA LOPES pela prática do ato de improbidade administrativa inscrito no artigo 11 da Lei nº 8.429/92, aplicando as sanções de (a) pagamento de multa civil, a ser revertida para a União, fixada em 5 (cinco) vezes o valor das suas respectivas remunerações da época, incidindo sobre o montante correção monetária pelo INPC, a partir da publicação da sentença, e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação; (b) suspensão dos direitos políticos por 3 (três) anos e proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio, por 3 (três) anos.
Os Réus foram condenados, ainda, a pagar custas processuais em rateio e honorários advocatícios, em rateio, fixados em R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), nos termos do artigo 20, § 3º do Código de Processo Civil.
O pedido foi julgado improcedente em relação aos corréus MIGUEL FRANCISCO SAEZ CÁCERES FILHO e RUBENS ROGÉRIO DE OLIVEIRA.
Por fim, foi determinada a expedição de ofício ao Tribunal de Contas da União e à Controladoria-Geral da União, após o trânsito em julgado da sentença, dando-lhes ciência da decisão, para informá-los da proibição imposta aos réus condenados de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário.
Em decisão de fls. 5.964/5.971, foram rejeitados os embargos de declaração apresentados pela UNIÃO FEDERAL, pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo ESPÓLIO DE AFFONSO FERNANDES SUNIGA, por JOÃO PEDRO DE MOURA, PAULO PEREIRA DA SILVA, MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH, MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA, ANÍSIO SILVA, JOÃO CLÁUDIO DA SILVA SOUZA, JONAS JAMIL LESSA LOPES e VALTEMIR DOS SANTOS.
Às fls. 5.499/5.503, foi interposto agravo retido pelos réus MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH E OUTROS, insurgindo-se contra a decisão de fls. 5.494/5.495 que indeferiu o pedido de esclarecimentos dirigido ao Perito Judicial. Alegam que o Expert não se manifestou sobre as questões formuladas, essenciais à apuração dos fatos em exame.
Em decisão de fls. 5.790/5.791, foi deferida a habilitação de CATARINA SINIGÁLIA FERNANDES, AFONSO SINIGÁLIA FERNANDES, CLÁUDIO ROBERTO SINIGÁLIA FERNANDES (e sua esposa IZILDINHA APARECIDA FUENTES FERNANDES), MARIA DE LOURDES SINIGÁLIA FERNANDES (e seu esposo JOSÉ VIDAL POLA GALÉ), AGOSTINHO SINIGÁLIA FERNANDES (e sua esposa JOZE CRISTINA PARO FERNANDES) e LUIZ ALBERTO FERNANDES, sucessores do réu AFFONSO FERNANDES SUNIGA.
Em seu recurso de apelação, JOAQUIM FERNANDES ZUNIGA alega que não cometeu qualquer irregularidade. Afirma que juntamente com seu irmão (o falecido Affonso Fernandes Suniga) vendeu a propriedade em tela - Fazenda Ceres - pelo preço de mercado, fato confirmado pelas provas documentais e testemunhais. Aduz que a fazenda possuía benfeitorias (entre as quais 30.000 cafeeiros) e maquinários, descritos na escritura de compra e venda. Esclarece que foram procurados pelo corretor Douglas Howthorne Ribas e informados de que haviam pessoas interessadas em comprar a fazenda, não sendo comprovada qualquer má-fé. Insurge-se contra os critérios adotados pelo Perito Judicial, eis que não adequados às características da região, especialmente quanto ao solo, à terra e aos índices mercadológicos e que o valor da venda corresponde ao valor de mercado, como atesta o levantamento realizado junto ao Cartório de Registro de Imóveis de Piraju. Aduz que não prospera a alegação de improbidade administrativa, vez que o negócio foi celebrado entre particulares. Afirma que não sabia que a propriedade, por ele adquirida em 14/12/1992, estava registrada com área maior; ao ter conhecimento do erro, re-ratificou a divergência junto ao Cartório de Registro de Imóveis. Devolveu ao comprador da área, a Associação de Agricultores Familiares Força da Terra de Piraju, os valores recebidos a maior (R$ 33.031,37 - trinta e três mil, trinta e um reais e trinta e sete centavos), documentalmente comprovados nos autos, o que demonstra sua boa-fé e a lisura da operação (fls. 5.977/6.004).
Nas razões de apelação apresentadas às fls. 6.005/6.014, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL requer a reforma parcial da sentença para que os corréus Maurício de Oliveira Pinterich, João Pedro de Moura, Milton Camolesi de Almeida, Anísio Silva e Paulo Pereira da Silva sejam condenados à pena de ressarcimento de danos, vez que suas condutas foram determinantes para a compra superfaturada da Fazenda Ceres. Insurge-se também contra a não aplicação da sanção de suspensão dos direitos políticos em relação a Paulo Pereira da Silva, ao fundamento de que sua incidência não está atrelada à atuação do réu como agente político, mas é pautada pela gravidade do ato de improbidade administrativa. De mais a mais, alega que o Réu Paulo Pereira da Silva, ao contrário do que consta na sentença, atuou com nítida roupagem de agente político, representando o Estado na implementação de políticas agrárias. Requer o acolhimento do recurso, ainda, para que sejam alteradas as penas de multa imputadas aos corréus Maurício de Oliveira Pinterich, João Pedro de Moura, Milton Camolesi de Almeida, Anísio Silva e Paulo Pereira da Silva, fixando-a em 1 (uma) vez o valor do acréscimo patrimonial para cada réu, e não em rateio como determinado. Postula, em acréscimo, a condenação dos corréus Miguel Francisco Saez Cáceres Filho e Rubens Rogério de Oliveira, eis que devidamente comprovado o enquadramento de suas condutas no artigo 10 da Lei nº 8.429/92, na medida em que permitiram, de forma determinante, que os corréus Maurício de Oliveira Pinterich, Paulo Pereira da Silva e João Pedro de Moura realizassem operação financeira e liberassem verba pública sem estrita observância das normas legais, concorrendo para o enriquecimento ilícito dos vendedores da Fazenda Ceres, os corréus Joaquim Fernandes Zuniga e Affonso Fernandes Suniga. Por fim, insurge-se contra a não quantificação do dano pelo juízo sentenciante, sob a alegação de que há elementos suficientes nos autos para sua apuração, especialmente os dados apurados pelo Perito Judicial.
O ESPÓLIO DE AFFONSO FERNANDES SUNIGA também interpôs recurso de apelação apontando, em sede preliminar, a ilegitimidade passiva, ao fundamento de que Affonso Fernandes Suniga faleceu antes da prolação da sentença, não sendo possível transferir aos seus sucessores a responsabilidade pelo pagamento da multa. Ainda preliminarmente aponta a nulidade da sentença por falta de quantificação do dano e por falta de fundamentação. No mérito, requer a reforma da decisão, alegando que não houve comprovação de suborno ou corrupção, caindo por terra, em conseqüência, a alegação de superfaturamento do preço da Fazenda Ceres. Afirma que as conclusões do Perito Judicial não correspondem com os valores dos imóveis da região, como fartamente demonstrado pelos documentos apresentados e pela prova testemunhal colhida (fls. 6.015/6.056).
Em suas razões de apelação, os corréus MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH, MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA e ANÍSIO SILVA apontam, em sede preliminar, a ocorrência de cerceamento de defesa, em razão do indeferimento do pedido de esclarecimentos formulado ao Perito Judicial; bem como a violação ao princípio da identidade física do juiz. Aponta, ainda, a falta de fundamentação da sentença, vez que os motivos adotados pelo juízo são absolutamente contrários às provas produzidas (fls. 6.061/6.097).
JOÃO CLÁUDIO DA SILVA SOUZA e JONAS JAMIL LESSA LOPES, em seu recurso, alegam que não houve a comprovação de sua participação nos fatos irregulares apontados nos autos, vez que apenas compuseram, por determinação verbal do Secretário Executivo do Conselho Curador do Banco da Terra, o sr. José Max Araújo Bezerra, uma equipe de investigação de natureza informativa sobre fatos pretéritos, comparando informações e colhendo documentos a fim de apurar se houve ou não irregularidade no processo de financiamento e aquisição da Fazenda Ceres. Afirmam que não foi demonstrado que agiram com negligência, imprudência ou imperícia, bem como que o dano apurado foi resultante das suas atuações. Informam que quando foram chamados a realizar a auditoria, o negócio jurídico envolvendo a aquisição da Fazenda Ceres já estava concluído e que não foi comprovada a má-fé exigida para a configuração do ato de improbidade descrito no artigo 11 da Lei nº 8.429/92 (fls. 6.105/6.124).
Os corréus JOÃO PEDRO DE MOURA e PAULO PEREIRA DA SILVA interpuseram recurso de apelação, juntado às fls. 6.148/6.213, requerendo a reforma integral da sentença ao fundamento de que não houve comprovação nos autos das irregularidades apontadas na inicial. Alegam que as provas colhidas atestam que eles não tiveram qualquer relação com a escolha da Fazenda Ceres, com a escolha dos assentados e com a forma do pagamento. Na qualidade de membros da Força Sindical, sua única função era repassar os valores para o assentamento, sem ingerência em nenhum outro ato realizado, fato confirmado pela prova testemunhal. Alegam, ainda, que não podem responder por todos os atos praticados pela entidade "Força Sindical", sendo necessária a individualização das condutas e da responsabilidade de cada um, que não praticaram o ato de improbidade referido no artigo 10 da Lei nº 8.429/92 e que a tomada de decisão acerca dos assentamentos financiados pelo Banco da Terra era da AMVAPA - Associação dos Municípios do Vale do Paranapanema. De outro lado, afirmaram que a liberação dos recursos é atribuição do Conselho Curador do Banco da Terra, sobre o qual os apelantes não possuem qualquer ingerência. Afirmam que nenhum dos fatos invocados na inicial foi comprovado, não havendo amparo para a condenação e que não houve comprovação do elemento subjetivo exigido para tipificação a conduta. Alegam que foi apurado, efetivamente, um erro na metragem da área, mas que houve a devida regularização no procedimento administrativo. De toda forma, tal irregularidade formal não caracteriza, por si só, ato de improbidade. Para finalizar, alegam os apelantes que o objeto do assentamento foi alcançado, o que demonstra que não houve nenhuma lesão ao erário. Afirmam que a terra adquirida tem potencial de produtividade e não podem ser responsabilizados pelo uso que está sendo feito. Insurgem-se contra as penalidades aplicadas, ao fundamento de que inadequadas, excessivas e desproporcionais, violando o disposto no artigo 12, parágrafo único, da Lei nº 8.429/92.
Em seu recurso, VALTEMIR DOS SANTOS alega que apenas integrou uma comissão responsável em auditar as operações envolvendo a Fazenda Ceres, tendo por atribuição analisar a aquisição sob o prisma da regularidade técnica-procedimental, já que exerce a função de administrador. Não foi incumbido de se manifestar sobre o valor da avaliação, mesmo porque não possui condições técnicas para tanto. Afirma que a atuação da Comissão foi posterior à celebração do negócio e não houve comprovação de que sua conduta caracteriza o ato de improbidade a que foi acusado e condenado. Subsidiariamente, requer a redução das penalidades aplicadas, eis que desproporcionais (fls. 6.218/6.231).
Por fim, a UNIÃO FEDERAL também apelou, pugnando pela condenação dos corréus Miguel Francisco Saez Cáceres Filho (na condição de engenheiro florestal e técnico da AMVAPA à época) e Rubens Rogério de Oliveira (na condição de Presidente do Sindicato Rural de Piraju e Diretor da Agricultura da Prefeitura Municipal de Piraju), ao fundamento de que suas condutas permitiram que os corréus Maurício de Oliveira Pinterich, Paulo Pereira da Silva e João Pedro de Moura realizassem a liberação de verba pública, sem observância das formalidades legais. Requer também seja aplicada a penalidade de ressarcimento do dano aos corréus Paulo Pereira da Silva, Maurício de Oliveira Pinterich, João Pedro de Moura, Milton Camolesi de Almeida e Anísio Silva, sendo desnecessário demonstrar o locupletamento ilícito como condição de sua incidência. Postula, ainda, seja aplicada a sanção de suspensão dos direitos políticos ao réu Paulo Pereira da Silva, sob a alegação de que a legislação não exige, para tanto, que o ato ímprobo tenha sido praticado na condição de agente público. Requer seja alterada a pena de multa imposta aos corréus Maurício de Oliveira Pinterich, João Pedro de Moura, Milton Camolesi de Almeida, Anísio Silva e Paulo Pereira da Silva, de forma que seja fixada no valor de uma vez o montante do acréscimo patrimonial para cada um, e não em rateio como determinado na sentença. Por fim, requer seja fixado o valor do dano, nos moldes apurados pelo Perito Judicial (fls. 6.240/6.249).
Contrarrazões apresentadas por MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH, MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA e ANISIO SILVA (fls. 6.257/6.261), MIGUEL FRANCISCO SAEZ CÁCERES FILHO e RUBENS ROGÉRIO DE OLIVEIRA (fls. 6.263/6.266), MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (fls. 6.277/6.282), UNIÃO FEDERAL (fls. 6.288/6.319), JOAQUIM FERNANDES ZUNIGA (fls. 6.336/6.352).
Manifestação do Ministério Público Federal atuante em segundo grau de jurisdição às fls. 6.364/6.394, opinando pelo desprovimento do agravo retido interposto por Maurício de Oliveira Pinterich; pelo desprovimento dos recursos de apelação interpostos por Maurício de Oliveira Pinterich, Milton Camolesi de Almeida, Anísio Silva, Paulo Pereira da Silva, João Pedro de Moura, João Cláudio da Silva Souza, Jonas Jamil Lessa Lopes, Valtemir dos Santos, Joaquim Fernandes Zuniga e pelo espólio de Affonso Fernandes Suniga; pelo parcial provimento dos recursos de apelação interpostos pelo MPF e pela União Federal para que: (a) os corréus Rubens Rogério de Oliveira e Miguel Francisco Saez Cáceres Filho sejam condenados pelos atos de improbidade do artigo 10 da Lei nº 8.429/92, (b) para que seja fixado o valor do dano em 54% do valor da alienação da Fazenda Ceres, (c) para que seja aplicada a sanção de ressarcimento aos cofres públicos a Maurício de Oliveira Pinterich, João Pedro de Moura, Milton Camolesi de Almeida, Anísio Silva, Paulo Pereira da Silva, Miguel Francisco Saez Cáceres Filho e Rubens Rogério de Oliveira e (d) para que seja aplicada a pena de suspensão dos direitos políticos a Paulo Pereira da Silva.
Encontram-se apensados a estes os autos da Medida Cautelar nº 0000021-07.2003.4.03.6125 e do Agravo de Instrumento nº 0013661-17.2006.4.03.0000, convertido em agravo retido.
Submeto o feito ao revisor, na forma regimental.
É o relatório.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA:10040 |
Nº de Série do Certificado: | 282B54AF1E6CA509 |
Data e Hora: | 24/02/2014 14:06:30 |
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VOTO
A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA (RELATORA):
Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal contra MIGUEL FRANCISCO SAEZ CÁCERES FILHO, MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH, PAULO PEREIRA DA SILVA, JOÃO PEDRO DE MOURA, RUBENS ROGÉRIO DE OLIVEIRA, MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA, ANÍSIO SILVA, JOAQUIM FERNANDES ZUNIGA, AFFONSO FERNANDES SUNIGA, VALTEMIR DOS SANTOS, JOÃO CLÁUDIO DA SILVA SOUZA, JOSÉ CRISTIAN DO CARMO MENDES e JONAS JAMIL LESSA LOPES, alegando que foi instaurado, no âmbito da Procuradoria da República em Marília, o Processo Administrativo Investigatório - Representação nº 17/2001, visando apurar eventuais irregularidades na aplicação de recursos públicos federais repassados através do Banco do Brasil, em cumprimento ao Programa Banco da Terra (Lei Complementar nº 93/98 e Decreto nº 3.475/00), destinados à aquisição do imóvel Fazenda Ceres, no município de Piraju/SP, com a finalidade de assentar trabalhadores rurais, vez que tais recursos teriam sido parcialmente desviados, mediante superavaliação da propriedade rural.
Segundo consta da inicial, em agosto de 2000, a Força Sindical e a Associação dos Municípios do Vale do Paranapanema - AMVAPA, representados respectivamente por seus Presidentes Paulo Pereira da Silva e Miderson Zanello Milleo (então Prefeito de Taquarituba/SP), elaboraram e encaminharam ao Conselho Curador do Banco da Terra um Programa de Reordenação Fundiária (PRF) para assentamento de trabalhadores rurais a ser implantado naquela região. De acordo com o programa, a Força Sindical ficaria como a Unidade Técnica responsável pela sua operacionalização, inclusive incumbida de analisar a carta consulta e a proposta de financiamento, além do dever de aplicar os referidos recursos próprios (no valor de R$ 128.000,00 - cento e vinte e oito mil reais) com ações de capacitação integral dos beneficiários, funcionando a FETAESP (Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Estado de São Paulo) como órgão de apoio e outras entidades como parceiras, entre as quais a AMVAPA (Associação dos Municípios do Vale Paranapanema).
Em 23 de agosto de 2000, o programa foi aprovado pelo Conselho Curador do Banco da Terra, após parecer favorável da então gerente do mencionado programa, a Sra. Beatrice Kassar do Valle, sendo disponibilizada pelo Banco da Terra para a região da AMVAPA a quantia de R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais).
Em 10 de dezembro de 2000, após exposição de dois secretários do Prefeito de Piraju e do então Prefeito, o réu Maurício de Oliveira Pinterich, 72 (setenta e dois) agricultores sem terra, pobres e com baixa instrução, resolveram criar a Associação dos Agricultores Familiares Força da Terra de Piraju, objetivando participar do programa de financiamento de compra de terras com os mencionados recursos federais, provindos do Banco da Terra e repassados pelo Banco do Brasil em Piraju.
De acordo com a inicial, a mando do réu Paulo Pereira da Silva, os réus João Pedro de Moura (assessor de Paulo Pereira da Silva), Miguel Francisco Saez Cáceres e Maurício de Oliveira Pinterich visitaram a Fazenda Ceres, no município de Piraju/SP, visando "comprá-la" aos agricultores sem terra, com os recursos já disponibilizados pelo Banco Terra. Consta ainda que a Força Sindical, por intermédio de seu Presidente Paulo Pereira da Silva, contratou e enviou três técnicos (Valter de Carvalho, Cristovão Oliveira e Américo), que orientaram os trabalhadores sem terra a escolher a Fazenda Ceres como a propriedade rural a ser comprada.
Em 28 de dezembro de 2000, após tratativas efetuadas pelo corretor de imóveis Douglas Howthorne Ribas e os réus Rubens Rogério de Oliveira, João Pedro de Moura, Paulo Pereira da Silva, Miguel Francisco Saez Cáceres Filho e Maurício de Oliveir Pinterich, os também réus Affonso Fernandes Suniga e Joaquim Fernandes Zuniga, proprietários da Fazenda Ceres, utilizando-se de formulário padrão do Banco Terra, firmaram "Declarações de Intenção de Venda" da referida fazenda à Associação de Agricultores Familiares Força da Terra de Piraju, mediante financiamento do Banco Terra, pelo preço de R$ 2.300.000,00 (dois milhões e trezentos mil reais), correspondente a R$ 3.105,62 (três mil, cento e cinco reais e sessenta e dois centavos) por hectare e R$ 7.515,60 (sete mil, quinhentos e quinze reais e sessenta centavos) por alqueires.
Informa o MPF que os proprietários ofertaram, três meses antes, a Nelson Monteiro de Souza, o alqueire da fazenda pelo valor de R$ 2.500,00/R$ 3.000,00.
Em 06 de janeiro de 2001, a Diretoria da Associação de Agricultores Familiares Força da Terra de Piraju, orientada sobretudo pelo réu Maurício de Oliveira Pinterich, convocou seus associados para deliberarem em assembléia geral extraordinária sobre a "visita, apreciação e votação do imóvel selecionado para compra", entre outros itens.
Em 08 de janeiro de 2001, os réus Affonso Fernandes Suniga e Joaquim Fernandes Zuniga providenciaram a regularização da área da Fazenda Ceres, celebrando de comum acordo com o ex-proprietário da área - o Sr. Mário Gualberto Pinto Ferraz - uma escritura pública de retificação de área, apresentada diretamente ao Cartório do 2º Tabelionato de Notas de Piraju, pela qual a área da Fazenda Ceres foi reduzida em 67,89 alqueires (164,2938 hectares), passando a contar no registro com 306,03 alqueires ou 740,5926 hectares.
Em 14 de janeiro de 2001, foi realizada a Assembléia Extraordinária acima referida e os agricultores sem terra, após visitarem a Fazenda Ceres, aprovaram a compra do imóvel com recursos financiados pelo Banco da Terra.
Em 01 de fevereiro de 2001, o réu Maurício de Oliveira Pinterich, Prefeito de Piraju, assumiu a presidência da AMVAPA (Associação dos Municípios do Vale do Paranapanema), que era uma das parceiras da Unidade Técnica do Banco da Terra (Força Sindical) na operacionalização do Programa Banco da Terra. Na mesma oportunidade, o réu Miguel Francisco Saez Cáceres Filho foi mantido como técnico da associação.
Em 19 de março de 2001, o presidente da Associação de Agricultores Familiares Força da Terra de Piraju, o Sr. Júlio Piacenza Galhardo, protocolou junto ao Conselho de Desenvolvimento Rural de Piraju uma "Carta Consulta", instruída com os documentos exigidos pelo Banco da Terra, entre os quais as declarações de intenção de venda. No dia seguinte - 20 de março - foi emitido parecer favorável e padronizado do Banco da Terra, subscrito somente pelo Presidente do Conselho Curador do Banco da Terra e Diretor de Agricultura do Município de Piraju, o réu Rubens Rogério de Oliveira. Não houve convocação nem deliberação do Conselho Curador, conforme determina a legislação (artigo 8º, aliena "d" do então Regulamento do Banco da Terra, aprovado pela Resolução nº 34/2000 do Conselho Curador).
Para elaboração da Proposta de Financiamento da Fazenda Ceres, o réu Maurício de Oliveira Pinterich contratou seu amigo pessoal Milton Camolesi de Almeida, médico veterinário e residente em outra cidade. Milton, por sua vez, contratou o engenheiro agrônomo Anísio Silva para colaborar na elaboração da Proposta.
Milton Camolesi de Almeida e Anísio Silva foram contratados para consecução da vistoria e avaliação do imóvel, definição do projeto produtivo, cálculo das prestações e definição de projetos de infra-estrutura básica. Eles não assinaram a Proposta de Financiamento da Fazenda Ceres. Milton apenas subscreveu um "Termo de Responsabilidade Técnica de Financiamento do Banco da Terra" da fazenda, face à exigência do então gerente do Banco do Brasil, o Sr. Miguel Chibano Bakr, para o pagamento dos honorários deles, já que não poderia fazê-lo sem que houvesse um responsável técnico pela elaboração da proposta.
Apurou-se, ainda, que houve falsificação da Proposta de Financiamento da Fazenda Ceres e seus projetos. É que de acordo com o avençado entre as partes, o valor da Fazenda Ceres (terra e benfeitorias) era de R$ 2.300.000,00 (dois milhões e trezentos mil reais), correspondente a R$ 3.105,62 (três mil, cento e cinco reais e sessenta e dois centavos) por hectare e R$ 7.515,60 (sete mil, quinhentos e quinze reais e sessenta centavos) por alqueires, sendo o total de 740,5926 hectares (306,03 alqueires). No entanto, conforme restou apurado pelo topógrafo Sidney Antônio Carrara, a área total da fazenda é de 731,3240 hectares (302,20 alqueires). Desta forma, o hectare da Fazenda Ceres foi pago a R$ 3.144,99 (três mil cento e quarenta e quatro reais e noventa e nove centavos) e R$ 7.610,89 (sete mil, seiscentos e dez reais e oitenta e nove centavos) por alqueire.
O valor total do financiamento foi de R$ 2.859.530,00 (dois milhões, oitocentos e cinqüenta e nove mil, quinhentos e trinta reais) e o endividamento dos beneficiários com o Banco da Terra foi de R$ 39.715,70 (trinta e nove mil, setecentos e quinze reais e setenta centavos) por família, quase o dobro do que constava no Programa de Reordenação Fundiária.
Segundo restou apurado por perícia realizada na Fazenda Ceres por equipe técnica do Ministério Público Federal, os solos existentes na fazenda, em relação à capacidade de uso, são bem inferiores aos constantes da Proposta de Financiamento, pois não existem latossolos roxo e amarelo (solos de ótima qualidade), mas sim predominância de outros tipos, bastante diversos do solo ideal, tais como: (a) litólicos (53,50% - áreas de mata e escarpadas - presença de pedras); (b) podzólicos (42% - quase toda a área de pastagem e lavouras permanentes - de difícil moto mecanização, postas pelos declives acentuados e/ou irregularidades no terreno, em decorrência de processos erosivos); (c) hidromórficos (3,30% - nas margens dos cursos d'água - sérias limitações quanto ao excesso de água - deficiência de oxigênio - impedimentos a moto mecanização); (d) uma pequena área de latossolo vermelho-escuro, cerca de 08 (oito) hectares em parte do relevo suave ondulado - topos de morros.
A mesma equipe técnica, após pesquisa detalhada, concluiu que o valor de mercado do imóvel em tela era, na época da venda, de no máximo R$ 1.297.464,00 (um milhão, duzentos e noventa e sete mil, quatrocentos e sessenta e quatro centavos), correspondente a R$ 1.774,14 (um mil, setecentos e setenta e quatro reais e quatorze centavos) por hectare ou R$ 4.293,43 (quatro mil, duzentos e noventa e três reais e quarenta e três centavos) por alqueire, demonstrando que houve um superfaturamento da ordem de 77,30%, tendo sido pago a maior a quantia de R$ 1.002.536,00 (um milhão, dois mil, quinhentos e trinta e seis reais).
Afirma o Ministério Público Federal, na inicial, que os projetos de viabilidade técnica, econômica-financeira (Projetos Produtivos) anexados à Proposta de Financiamento da Fazenda Ceres, atestando que as 72 (setenta e duas) famílias de agricultores obteriam rendimentos suficientes para seu sustento e solvência da dívida junto ao Banco da Terra, não retrataram a realidade fática existente naquela fazenda, eis que calcados em dados inverídicos.
Os documentos anexados aos autos demonstram que a análise técnica da proposta de financiamento e de seus projetos de infra-estrutura básica foi feita no mesmo dia em que eles foram entregues, autorizando concluir que os réus Paulo Pereira da Silva, João Pedro de Moura, Miguel Francisco Saez Cáceres Filho e Maurício de Oliveira Pinterich apenas quiseram cumprir mais uma das formalidades impostas pelas normas do Banco da Terra, ratificando o material que lhes foi apresentado, sem maiores conferências.
Ressalta o Parquet que a lavratura da escritura pública, seu registro no Cartório de Imóveis e a liberação do dinheiro do empréstimo foram feitos sem que houvesse aferição da real dimensão da área total da Fazenda Ceres, violando a o disposto no artigo 39, a, da Resolução 34/2000 do Conselho Curador do Banco da Terra.
Especificamente em relação ao réu Paulo Pereira da Silva, alega o MPF que em setembro/outubro de 2001, a bordo de um helicóptero, ele filmou e exibiu na mídia televisiva, em âmbito nacional, o assentamento da Fazenda Ceres, dizendo que se tratava de "obra" de sua criação, como vice-presidente do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Consta da inicial que Paulo, Presidente da Força Sindical e Coordenador Geral da Unidade Técnica do Banco da Terra (responsável pela operacionalização do projeto da Fazenda Ceres) tem estreitas ligações com o município de Piraju/SP, região onde nasceu sua esposa - Sra. Elza de Fátima Costa Pereira - e onde mora boa parte de sua família.
Alega o MPF que houve um "esquema" de atos fraudulentos, orquestrados pelos corréus Paulo Pereira da Silva (Presidente da Força Sindical e coordenador da Unidade Técnica do Banco da Terra, responsável pela operacionalização do programa da Fazenda Ceres), João Pedro de Moura (assessor do Presidente da Força Sindical), Maurício de Oliveira Pinterich (Presidente da AMVAPA e Prefeito de Piraju), Affonso Fernandes Suniga e Joaquim Fernandes Zuniga (ex-proprietários da Fazenda Ceres), contando com a elaboração de Miguel Francisco Saez Cáceres Filho (engenheiro florestal e técnico da AMVAPA), Rubens Rogério de Oliveira (Presidente do Conselho de Desenvolvimento Rural de Piraju e Diretor de Agricultura de Piraju), Milton Camolesi de Almeida (médico veterinário) e Anísio Silva (engenheiro agrônomo), desviando e dilapidando o patrimônio público, aproveitando-se e explorando agricultores pobres e com baixa instrução (quase todos analfabetos), os quais tinham "esperança" de obter um "pedaço" de terra que pudesse produzir o suficiente para o sustento de suas famílias.
Em 31 de outubro de 2001, em razão das denúncias veiculadas na imprensa nacional, os gerentes do Banco Terra, Jonas Jamil Lessa Lopes, Valtemir dos Santos e José Cristian do Carmo Mendes, subscreveram um "Relatório de Acompanhamento e Controle da Fazenda Ceres", atestando a regularidade da operação, inclusive destacando a qualidade do solo, com predominância de latossolos, e a adequação do preço pago, eis que em consonância com o valor de mercado.
Apurou o MPF, em 31 de julho de 2002, que apenas 19 (dezenove) famílias estavam residindo no assentamento, das quais apenas 14 (quatorze) trabalhavam na Fazenda Ceres, face à desistência da maioria dos beneficiários.
Requer a condenação dos Réus pelos atos de improbidade praticados, nos termos dos artigos 9º, 10 e 11, da Lei nº 8.429/92, aplicando-se as sanções previstas no artigo 12 do mesmo diploma legal.
A União Federal foi admitida no pólo ativo do feito, na qualidade de assistente litisconsorcial, conforme decisão de fl. 2.852.
Em decisão de fls. 3.650/3.653, foi deferido o pedido formulado pelo Ministério Público Federal requerendo o desmembramento do feito em relação ao correu José Cristian do Carmo Mendes, falecido em 19 de setembro de 2003.
Foi negado seguimento ao Agravo de Instrumento nº 0052907-83.2007.4.03.0000, interposto por PAULO PEREIRA DA SILVA contra a decisão proferida pelo juízo de primeiro grau que afastou a argüição de incompetência formulada pelo Réu, sob a alegação de que sua eleição ao cargo de deputado federal teria o condão de deslocar a competência do julgamento da presente ação para o Supremo Tribunal Federal.
Em 03 de março de 2011, foi proferida sentença, julgando parcialmente procedente a ação civil pública ajuizada pelo MPF e condenando:
- os Réus JOAQUIM FERNANDES ZUNIGA e AFFONSO FERNANDES SUNIGA pela prática dos atos de improbidade descritos nos artigos 9º e 3º da Lei nº 8.429/92, aplicando as sanções de (a) ressarcimento do dano causado, em solidariedade, decorrente de enriquecimento ilícito pelo recebimento de valor superfaturado da Fazenda Ceres, a ser revertido em favor da União Federal; (b) pagamento de multa civil, a ser revertida para a União, fixada em 2 (duas) vezes o valor do acréscimo patrimonial, em rateio, incidindo sobre o montante correção monetária pelo INPC, a partir da publicação da sentença, e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação; (c) suspensão dos direitos políticos, por 8 (oito) anos, e proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio, por 10 (dez) anos;
- os Réus MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH, JOÃO PEDRO DE MOURA, MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA e ANÍSIO SILVA pela prática dos atos de improbidade descritos no artigo 10 da Lei nº 8.429/92, aplicando as sanções de (a) pagamento de multa civil, a ser revertida para a União, fixada em 1 (uma) vez o valor do acréscimo patrimonial apurado nos autos com a compra e venda da Fazenda Ceres, incidindo sobre o montante correção monetária pelo INPC, a partir da publicação da sentença, e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação; (b) suspensão dos direitos políticos, por 5 (cinco) anos, e proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio, por 5 (cinco) anos;
- o Réu PAULO PEREIRA DA SILVA pela prática do ato de improbidade administrativa de que trata o artigo 10 da Lei nº 8.429/92, aplicando as sanções de (a) pagamento de multa civil, a ser revertida para a União, fixada em 1 (uma) vez o valor do acréscimo patrimonial apurado nos autos com a compra e venda da Fazenda Ceres, em rateio com os Réus indicados na alínea ii, incidindo sobre o montante correção monetária pelo INPC, a partir da publicação da sentença, e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação; (b) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio, por 5 (cinco) anos;
- os Réus JOÃO CLÁUDIO DA SILVA SOUZA, VALTEMIR DOS SANTOS e JAMIL LESSA LOPES pela prática do ato de improbidade administrativa inscrito no artigo 11 da Lei nº 8.429/92, aplicando as sanções de (a) pagamento de multa civil, a ser revertida para a União, fixada em 5 (cinco) vezes o valor das suas respectivas remunerações da época, incidindo sobre o montante correção monetária pelo INPC, a partir da publicação da sentença, e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação; (b) suspensão dos direitos políticos por 3 (três) anos e proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio, por 3 (três) anos.
Os Réus foram condenados, ainda, a pagar as custas processuais em rateio e honorários advocatícios, em rateio, fixados em R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), nos termos do artigo 20, § 3º do Código de Processo Civil.
A ação foi julgada improcedente em relação aos corréus MIGUEL FRANCISCO SAEZ CÁCERES FILHO e RUBENS ROGÉRIO DE OLIVEIRA.
Em decisão de fls. 5.964/5.971 foram rejeitados os embargos de declaração apresentados pela UNIÃO FEDERAL, pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, ESPÓLIO DE AFFONSO FERNANDES SUNIGA, por JOÃO PEDRO DE MOURA, PAULO PEREIRA DA SILVA, MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH, MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA, ANÍSIO SILVA, JOÃO CLÁUDIO DA SILVA SOUZA, JONAS JAMIL LESSA LOPES e VALTEMIR DOS SANTOS.
DAS QUESTÕES PRELIMINARES
I - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL
Após a inclusão do feito em pauta de julgamento, o réu JONAS JAMIL LESSA LOPES apresentou memoriais (fls. 6.441/6.449), sede em que, preliminarmente, arguiu a incompetência da Justiça Federal e, no mérito, apenas reafirmou os argumentos alinhavados nas razões de apelação.
O simples fato de o Ministério Público Federal figurar como autor da ação de improbidade administrativa, por si só, justifica a competência da Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da Constituição da República.
Nesse sentido, trago à colação o seguinte precedente do C. Superior Tribunal de Justiça:
Ademais, a União foi admitida nos autos na qualidade de assistente litisconsorcial, firmando, de toda a sorte, a competência da Justiça Federal, nos termos do mesmo dispositivo constitucional.
II - AGRAVO RETIDO INTERPOSTO POR MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH
Às fls. 5.499/5.503, foi interposto agravo retido pelos réus MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH E OUTROS insurgindo-se contra a decisão de fls. 5.494/5.495 que indeferiu o pedido de esclarecimentos dirigido ao Perito Judicial. Alegam que o Expert não se manifestou sobre as questões formuladas, essenciais à apuração dos fatos em exame.
O recurso deve ser conhecido, vez que sua apreciação foi devidamente reiterada quando da interposição do recurso de apelação, na forma do artigo 523 do Código de Processo Civil.
No mérito o agravo não merece ser provido.
O laudo apresentado pelo Perito Judicial, juntado às fls. 4.233/4.334, bem os esclarecimentos prestados após as manifestações das partes, anexados às fls. 4.790/4.806, é um documento técnico, produzido por profissional habilitado e auxiliar do juízo.
Todos os critérios utilizados pelo Expert foram devidamente demonstrados e justificados, sendo esclarecidas as dúvidas pertinentes suscitadas pelos interessados.
Eventual divergência com as conclusões alcançadas não é motivo suficiente para desconstituir o trabalho realizado.
De mais a mais, trata-se de prova técnica destinada a auxiliar o órgão jurisdicional, mas que não o vincula, já que é livre a formação do seu convencimento, exigindo-se, é certo, a exposição da fundamentação, por expressa determinação constitucional (CF, artigo 93, IX).
Não prospera a alegação de violação ao contraditório e à ampla defesa, vez que as partes tiveram oportunidade de se manifestar sobre o laudo pericial, apontar eventuais falhas e solicitar esclarecimentos.
Como visto nas linhas acima, o Perito respondeu às dúvidas levantadas, não sendo demonstrada a relevância e pertinência das novas questões colocadas pelo Agravante, com o intuito apenas de delongar a tramitação do feito.
III - ILEGITIMIDADE DO ESPÓLIO DE AFFONSO FERNANDES SUNIGA
Aponta o Espólio de Affonso Fernandes Suniga sua ilegitimidade passiva, ao fundamento de que Affonso faleceu antes da prolação da sentença, não sendo possível transferir aos seus sucessores a responsabilidade pelo pagamento da multa.
Sem razão.
Na inicial, foi requerida a condenação do réu Affonso Fernandes Suniga pela prática do ato de improbidade descrito no artigo 9º da Lei nº 8.429/92, qual seja, o ato que importa em enriquecimento ilícito.
O falecimento do réu no curso da ação não obsta que seus sucessores respondam pelo ato, nos limites do valor da herança, como determina o artigo 8º da Lei nº 8.429/92:
Não se aplica ao caso concreto o disposto no artigo 5º, XLV, da Constituição Federal, que trata da pena em sentido estrito, com aplicação limitada ao âmbito penal.
As sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa, quando não revestidas de natureza pessoal, podem ser transferidas aos sucessores do agente ímprobo. Como destacado pelo Ministério Público Federal, no parecer ofertado em segunda instância, configuraria absurdo lógico admitir que se impusesse ao autor do ato de improbidade o dever de ressarcir o que recebeu ilicitamente, mas permitir aos seus herdeiros que, por meio de sucessão mortis causa, tornem-se titulares desses mesmos valores (fl. 6.374).
IV - NULIDADE DA SENTENÇA POR DESRESPEITO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ
Os Réus Maurício de Oliveira Pinterich, Milton Camolesi de Almeida e Anísio Silva apontaram a nulidade da sentença ao fundamento de que ela não foi proferida pelo mesmo juiz que concluiu a instrução.
A preliminar não merece acolhida.
De um lado porque foram ouvidos réus e testemunhas residentes nas mais diversas localidades, não sendo possível ao juiz da causa colher todos os depoimentos, expedindo as competentes cartas precatórias para a realização da prova, obedecendo rigorosamente ao disposto na legislação processual.
De outro lado porque os réus não demonstraram a violação ao artigo 132 do Código de Processo Civil, que admite a possibilidade de prolação de sentença pelo juiz que não concluiu a fase instrutória, nas hipóteses em que o magistrado estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo ou aposentado. Caberia aos réus demonstrar a inocorrência de qualquer uma das situações mencionadas, nos termos do artigo 333, II, do Código de Processo Civil.
V - NULIDADE DA SENTENÇA POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO EM RELAÇÃO À QUANTIFICAÇÃO DO DANO E À INDICAÇÃO DO ENQUADRAMENTO LEGAL DOS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Ao contrário do que alegam os Réus, a sentença guerreada está devidamente fundamentada na Lei nº 8.429/92, tratando minuciosamente das condutas praticadas e da responsabilidade de cada um dos Réus.
Eventual inconformismo com a conclusão alcançada pelo juízo não constitui motivo para decretar a nulidade da decisão; a legislação possibilita a discussão sobre o mérito da demanda pelos meios adequados.
Também não há qualquer nulidade em razão da não quantificação expressa do dano na parte dispositiva da sentença, na medida em que existem provas suficientes nos autos, especialmente o laudo pericial acolhido pelo juízo, apontando o montante do prejuízo causado.
DO MÉRITO
A questão que se coloca é saber se os corréus MIGUEL FRANCISCO SAEZ CÁCERES FILHO, MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH, PAULO PEREIRA DA SILVA, JOÃO PEDRO DE MOURA, RUBENS ROGÉRIO DE OLIVEIRA, MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA, ANÍSIO SILVA, JOAQUIM FERNANDES ZUNIGA, AFFONSO FERNANDES SUNIGA, VALTEMIR DOS SANTOS, JOÃO CLÁUDIO DA SILVA SOUZA, JOSÉ CRISTIAN DO CARMO MENDES e JONAS JAMIL LESSA LOPES praticaram os atos de improbidade descritos pelo Ministério Público Federal nos autos da presente ação civil pública.
Ao que consta, as irregularidades foram cometidas na aquisição da Fazenda Ceres, localizada no Município de Piraju/SP, ocorrida no ano de 2001.
De acordo com o Programa de Reordenação Fundiária, o imóvel seria comprado com recursos públicos federais, em cumprimento ao Programa Banco da Terra, e destinado ao assentamento dos trabalhadores rurais da região.
Cumpre então verificar se as provas produzidas nos autos, especialmente a documental, a pericial e a testemunhal, corroboram a versão sustentada pelo Parquet.
I - DA PROVA DOCUMENTAL
Nos termos da Resolução nº 34/2000 (Regulamento do Banco da Terra):
O órgão gestor do Banco da Terra é o Conselho Curador e as atribuições dos Conselhos Estaduais e Municipais de Desenvolvimento Rural, na sua esfera de atuação, estão estabelecidas no artigo 8º do Regulamento, verbis:
Por sua vez, é delegada à cada Unidade Conveniada competência para estruturar uma Unidade Técnica com o propósito de executar o Programa de Reordenação Fundiária e promover a aplicação dos recursos do Banco da Terra, sendo-lhe atribuídos os seguintes encargos:
Em 29 de junho de 2000, foi firmado um Termo de Cooperação entre o Fundo de Terras e da Reforma Agrária - Banco da Terra, a Associação dos Municípios do Vale do Paranapanema (AMVAPA) e a Força Sindical, visando o desenvolvimento de ações conjuntas destinadas à implementação e gestão do Banco da Terra nos municípios associados, sendo definidas as competências de cada órgão, nos seguintes termos:
Os documentos acostados aos autos atestam que em agosto de 2000, a Força Sindical e a AMVAPA (Associação dos Municípios do Vale do Paranapanema), representados respectivamente por seus Presidentes Paulo Pereira da Silva e Miderson Zanello Milleo (então Prefeito de Taquaritinga), elaboraram e encaminharam ao Conselho Curador do Banco da Terra um Programa de Reordenação Fundiária para assentamento de trabalhadores rurais, a ser implantado na região, com as seguintes metas:
Nº de famílias área total (ha) área família (ha) custo/família(R$) custo/ha (R$)
200 2.000 10 20.000,00 1.500,00
Origem aquisição de imóveis infra-estrutura outros total
Banco da Terra 3.000.000,00 1.000.000,00 --------- 4.000.000,00
Próprios ------------- -------------- 128.000,00 128.000,00
Terceiros ------------- --------------- 348.000,00 348.000,00
TOTAL 3.000.000,00 1.000.000,00 476.000,00 4.476.000,00
Nos termos do Programa de Reordenação Fundiária (PRF), a Força Sindical atuaria como a Unidade Técnica responsável pela operacionalização do Programa, incumbida inclusive de analisar e aprovar a carta consulta e a proposta de financiamento, além do dever de aplicar os recursos próprios (R$ 128.000,00) com ações de capacitação integral dos beneficiários, funcionando a FETAESP (Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de São Paulo) como órgão de apoio e AMVAPA (Associação dos Municípios do Vale Paranapanema) como parceiras.
O Programa foi aprovado pelo Conselho Curador do Banco da Terra, no qual a Força Sindical tinha assento como conselheira, sendo destinado à região representada pela AMVAPA, composta de 15 (quinze Municípios), entre os quais Piraju, a quantia de R$ 4.000.000,00.
Na cidade de Piraju, após apresentação do projeto pelo então Prefeito e ora Réu, Maurício de Oliveira Pinterich, e por dois secretários municipais, foi criada pelos trabalhadores rurais, em dezembro de 2000, a Associação de Agricultores Familiares Força da Terra de Piraju, com o objetivo de participar do programa de financiamento de compra de terras mediante recursos federais, provindos do Banco da Terra e repassados pelo Banco do Brasil em Piraju.
Ainda em dezembro de 2000, os corréus RUBENS ROGÉRIO DE OLIVEIRA, JOÃO PEDRO DE MOURA, PAULO PEREIRA DA SILVA, MIGUEL FRANCISCO SAEZ CÁCERES FILHO, MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH, AFFONSO FERNADES SUNIGA e JOAQUIM FERNANDES ZUNIGA, utilizando-se de formulário padrão do Banco da Terra, firmaram "DECLARAÇÃO DE INTENÇÃO DE VENDA" da Fazenda Ceres à Associação de Agricultores Familiares Força da Terra de Piraju, mediante financiamento do Banco da Terra, pelo valor de R$ 2.300.000,00 (dois milhões e trezentos mil reais).
Em janeiro de 2001, os trabalhadores da Associação visitaram a Fazenda e aprovaram a compra.
Em 19 de março de 2001, o então Presidente da Associação de Agricultores Familiares Força da Terra de Piraju, o senhor Júlio Piacenza Galhardo, protocolizou carta consulta junto ao Conselho de Desenvolvimento Rural de Piraju, instruída com os documentos exigidos pelo Banco da Terra.
No dia seguinte, foi proferido parecer favorável, assinado tão-somente pelo Presidente do Conselho, o Diretor de Agricultura de Piraju, o réu Rubens Rogério de Oliveira.
Para a confecção da Proposta de Financiamento da Fazenda Ceres, Maurício de Oliveira Pinterich, então Prefeito de Piraju e Presidente da AMVAPA, solicitou a ajuda dos corréus Milton Camolesi de Almeida e Anísio Silva. Depreende-se da prova documental acostada aos autos que Anísio Silva apenas subscreveu termo de responsabilidade técnica de financiamento do Banco da Terra, como exigência para o pagamento dos honorários.
II - DA PROVA PERICIAL
De acordo com o laudo pericial juntado aos autos (fls. 4.233/4334 e esclarecimentos às fls. 4790/4806), a Fazenda Ceres apresenta as seguintes características:
Em relação ao valor da Fazenda Ceres, apurou-se que:
Levando em conta a proposta apresentada para o assentamento na Fazenda Ceres e as características do imóvel, destacou o Expert que:
Respondendo aos questionamentos formulados pelos Réus acerca da potencialidade de exploração de atividade sucroalcooleira na Fazenda Ceres, circunstância apta a valorizar a terra, informou o Perito que as áreas passíveis de cultivo da cana de açúcar, em razão da topografia, da composição dos solos e da localização, são diversas daqueles em que localizada a Fazenda Ceres. A topografia do imóvel é desfavorável à exploração da atividade sucroalcooleira, na media em que a tecnologia atual e as leis ambientais e trabalhistas conduzem à mecanização verticalizada, não havendo qualquer indicativo de propostas formuladas pela AAFFT neste sentido.
O laudo pericial foi elaborado de acordo com as normas técnicas vigentes, levando em conta as características específicas da Fazenda Ceres, não sendo apresentados pelas partes elementos suficientes a desconstituí-lo.
III - DA PROVA ORAL - DEPOIMENTOS PESSOAIS E TESTEMUNHAIS
Todos os Réus prestaram depoimentos pessoais, dos quais destacam-se as seguintes passagens:
1) MIGUEL FRANCISCO SAEZ CÁCERES FILHO - fls. 3.848/3.853
Engenheiro florestal e técnico na área agrária da AMVAPA. Prestava acompanhamento técnico aos interessados em obter financiamento pelo Banco da Terra, através de esclarecimentos e orientações. Analisava as propostas de financiamento. Disse que:
2) MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH - fls. 3.654/3.859
Prefeito reeleito de Piraju à época dos fatos. Foi um dos fundadores da AMPAVA, associação integrada por 16 municípios da região de Piraju, com o objetivo de tornar possível a cooperação entre eles em prol do desenvolvimento regional. Foi convidado pelo governador Mário Covas para integrar o braço regional do Banco da Terra, sendo informado que a Força Sindical apresentava-se como parceira do Estado na qualidade de unidade técnica do Banco da Terra. O Banco da Terra financiou onze assentamentos na região abrangida pela AMVAPA. Alega que as denúncias relativas à fazenda Ceres partiram de um adversário político seu, o advogado Francisco Mendes. Esclareceu que:
3) MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA - fls. 3.861/3.864
É médico veterinário, fez mestrado em nutrição de ruminantes e especialização em agronegócios. Ministrava curso em Avaré sobre projetos agropecuários e sobre sua participação nos fatos narrados disse que:
4) ANÍSIO SILVA - fls. 3.865/3.868
Engenheiro agrônomo e esclarece sua participação nos seguintes termos:
5) JOÃO CLÁUDIO DA SILVA SOUZA - fls. 3.890/3.895
Engenheiro agrônomo. À época dos fatos, estava cedido ao Ministério do Desenvolvimento Agrário - MDA e atuava especificamente na Secretaria Executiva do Banco da Terra, como coordenador técnico.
A função da Secretaria era assessorar o Conselho Curador do Banco da Terra, colegiado de ministros que deliberava sobre os programas de reordenação fundiária no âmbito do Banco da Terra. Esses programas fixavam metas de assentamento e produção regionais e eram elaborados pelas unidades técnicas regionais do banco. O MDA firmava termos de cooperação técnica com os Estados da federação ou com associações de municípios.
No caso dos programas do Estado de SP, os termos foram firmados com associações de municípios. A associação responsável pela região da Fazenda Ceres era a AMVAPA, a quem competia elaborar o programa de reordenação fundiária e aprovar cada uma das propostas de financiamento. Era a AMVAPA - e não o MDA - a responsável por autorizar a liberação de recursos para a compra da Fazenda.
O MDA apenas avaliava e aprovava (ou não) o programa de reordenação fundiária elaborado por cada unidade técnica e acompanhava se as metas dos programas estavam sendo atingidas e se as regras do Banco da Terra eram observadas na consecução dos programas.
O Conselho Curador fixava as verbas a serem alocadas para cada unidade técnica com base nos programas de reordenação fundiária. As verbas eram disponibilizadas às unidades técnicas não para cada um dos projetos especificamente, mas para a execução global dos programas. O MDA disponibilizava a verba de cada unidade técnica mediante depósito à disposição do agente financeiro, no caso o Banco do Brasil. Uma vez disponibilizada a verba, cabia a cada unidade técnica liberá-la aos projetos específicos apresentados ao Banco da Terra.
Em razão das denúncias formuladas na imprensa e de questionamentos suscitados por um vereador de Piraju à Secretaria Executiva do Banco da Terra, o MDA antecipou a visita à Fazenda Ceres, onde compareceram o depoente e o correu Valtemir. Tinham a incumbência específica de verificar se foram atendidas as etapas de elaboração e aprovação do projeto previstas nas normas do Banco da Terra, bem como fazer um levantamento dos preços médios de terras na região. Não foi determinado que fizessem análises técnicas da propriedade (análise de solo ou verificação das condições concretas de produtividade) pois isso não era incumbência do MDA mas sim do engenheiro agrônomo contratado pela associação de agricultores e responsável técnico pelo projeto.
A AMVAPA tinha a prerrogativa e a responsabilidade de aprovar o projeto elaborado pelo engenheiro agrônomo e liberar ou não o financiamento pleiteado.
Fizeram 2 ou 3 visitas à Fazenda Ceres e verificaram que a fazenda possuía casas de colonos e instalações para beneficiamento de café (constava da proposta de financiamento que haveria um cafezal com 8.000 pés). Havia um cafezal na fazenda. Não fizeram a medição técnica do número de pés de café que integrava o cafezal, pois este não era o objeto da visita e nem sua atribuição. Não fizeram uma análise técnica aprofundada, mas uma análise documental e visual.
Constataram que na proposta de financiamento havia menção à existência de mais benfeitorias do que aquelas efetivamente encontradas, informação que eles fizeram constar, posteriormente, no relatório de acompanhamento e controle.
Constataram que a avaliação do preço do imóvel havia sido feito com base nas benfeitorias efetivamente existentes na propriedade.
Com relação ao preço das terras na região da AMVAPA, procuraram obter o preço médio dos imóveis efetivamente vendidos ou ofertados à venda na época da visita.
O Conselho Curador do Banco da Terra não analisava o preço específico das terras que integravam cada um dos projetos financiados pelo Banco da Terra, salvo na fase de acompanhamento e controle das metas e dos parâmetros dos programas de reordenação fundiária elaborados por cada unidade técnica regional. A análise do Conselho Curador era feita a posteriori e não como condição para a aprovação de cada proposta de financiamento em particular ou para liberação dos recursos relativos a cada uma dessas propostas.
As unidades técnicas, no caso a AMVAPA, tinham a obrigação de aprovar as propostas e apresentar um relatório ao Conselho Curador sobre o emprego das verbas disponibilizadas.
Em relação à Força Sindical, pelo que se recorda o depoente ela era parceira do MDA no que se refere à capacitação dos agricultores beneficiados com os financiamentos do Banco da Terra e firmou um termo de cooperação com o MDA nesse sentido. A parceria abrangia as unidades técnicas regionais escolhidas pela Força Sindical.
Afirma que o Prefeito de Piraju era Presidente da AMVAPA participou das diligências realizadas pelo depoente, mesmo porque era ele quem poderia fornecer os recursos de logística e prestar informações importantes para a avaliação, mas esclarece que não houve qualquer tipo de interferência indevida da AMVAPA.
A respeito da qualidade do solo e do preço da Fazenda Ceres, esclareceu que:
6) AFFONSO FERNANDES SUNIGA - fls. 3.897/3.898
Era proprietário da Fazenda Ceres, juntamente com seu irmão Joaquim.
Joaquim quis vender a fazenda e ficou responsável por quase toda a negociação.
O depoente lembra de ter conversado com o Prefeito Maurício e com o corretor Douglas, mas não participou da negociação do preço, feita por seu irmão, Maurício e Douglas.
Com o pagamento recebido, quitou algumas dívidas em seu nome e de seus filhos.
7) JOAQUIM FERNANDES ZUNIGA - fls. 3.899/3.901
Era proprietário da Fazenda Ceres, com seu irmão. Não colocaram a fazenda à venda. Foi procurado pelo corretor Douglas, que propôs a venda do imóvel, informando que o interessado na compra era o Banco da Terra. Foi procurado várias vezes por Douglas, sempre recusando a proposta.
Recebeu então a visita de Douglas e do Prefeito Maurício, que informou que a Prefeitura já havia gasto muito dinheiro para tornar possível o negócio e insistiu na venda. O depoente esclareceu que precisava conversar com seu irmão e combinaram, naquela ocasião, que a comissão do vendedor seria reduzida de R$ 120.000,00 para R$ 90.000,00.
Seu irmão lhe autorizou a fazer o que quisesse e ele fez o negócio, acertando o preço do imóvel com o corretor Douglas, fixando o valor do alqueire em R$ 7.000,00. Na região, o valor cobrado era de R$ 8.200,00.
Após a concretização do negócio, surgiram notícias de que a fazenda havia sido superavaliada, razão pela qual ele contratou uma empresa (EMBRAESP) para fazer um laudo de avaliação, sendo atestado que o valor do alqueire era de R$ 8.200,00.
Sobre a retificação da área da fazenda, esclarece que a área maior já constava da escritura de compra da fazenda da antiga proprietária, senhora Ana Marques Lupo. Na época em que estava sendo concretizado o negócio de venda da Fazenda pelo Banco da Terra, constatou-se que a área real da fazenda era menor. Foi Douglas quem cuidou da retificação. O depoente não sabe dizer, portanto, porque a retificação foi feita por escritura pública e não pela via judicial. Esclarece também que posteriormente foi constatado que o agrimensor havia incluído na nova medida a área da estrada que corta a fazenda. O valor correspondente a essa área, cerca de trinta e poucos mil reais, já foi devolvido.
8) RUBENS ROGÉRIO DE OLIVEIRA - fls. 3.974/3.976
Morava e possuía um imóvel rural em Piraju à época dos fatos. Era Presidente do Sindicato Rural de Piraju.
Os governos estadual e federal decidiram fazer um assentamento rural através do Banco da Terra, em Piraju. A associação dos trabalhadores rurais, então criada (Associação de Agricultores Familiares Força da Terra de Piraju), escolheu a Fazenda Ceres. Não lembra o valor pago nem o tamanho da área.
Conhece a Fazenda Ceres e sabe que em sua área havia uma parte inapropriada para agricultura pois era reserva ambiental; que o Banco da Terra exigia que uma parte do imóvel fosse reserva ambiental. Disse que a parte remanescente da Fazenda era boa para a agricultura.
Participou da reunião realizada na Prefeitura de Piraju, na qual foi aprovada a carta consulta relativa à aquisição da Fazenda Ceres.
9) PAULO PEREIRA DA SILVA - fls. 3.979/3.980
Era Presidente da Força Sindical à época dos fatos e disse que:
10) JONAS JAMIL LESSA LOPES - fls. 3.985/3.988
Ingressou na Secretaria Executiva do Conselho Curador do Banco da Terra em agosto de 2001, após a compra da Fazenda Ceres.
Não participou de auditoria na fazenda, mesmo porque não tinha competência para fazer auditoria.
Subscreveu o relatório de acompanhamento, elaborado por 4 pessoas.
João Cláudio e Valtemir fizeram a visita in loco na fazenda para levantamento de dados, informações e documentos que pudessem elucidar os fatos.
Ratifica o relatório elaborado.
Nega que tenha ocorrido superfaturamento porque com base nas informações levantadas, o preço ficou um pouco abaixo da média da região levantada no relatório.
O poder de decisão pertinente ao contrato de financiamento e consequentemente à compra da fazenda pertencia à agência regional, estruturada pela AMVAPA, que era o consórcio responsável pela execução do programa na região.
O relatório de acompanhamento consistia numa captura de informações, dados e documentos que pudessem constatar se os procedimentos para a execução do programa pela agência regional tinham sido cumpridos. Quem determinou a elaboração do relatório foi Max Bezerra, Secretário Executivo do Conselho Curador do Banco da Terra.
Disse que de uma maneira geral a classificação do solo tem pouca influência no preço da terra; que a viabilidade financeira e técnica de um empreendimento depende mais de outros fatores, tais como o acesso, a localização, recursos hídricos, eletrificação, benfeitorias do imóvel, a tecnologia de produção, a atividade que se quer explorar. (...) a Fazenda Ceres, dentre as atividades propostas era a exploração de bovinocultura, ovinocultura, produção de café, hortaliças em estufa; que o imóvel tinha poucas limitações para essas atividades e as que tinha poderiam ser superadas por tecnologias preconizadas pelos órgãos de pesquisa; que o que foi verificado pela equipe integrada pelo depoente é que o empreendimento estava adequado aos termos do programa de reordenação fundiária.
11) JOÃO PEDRO DE MOURA - fls. 3.989/3.991
Era assessor do Presidente da Força Sindical. Não faz parte da competência da Força Sindical autorizar a compra da fazenda.
O Ministro Raul Jungman procurou a Força Sindical, que representa 800.000 trabalhadores rurais do Estado de São Paulo, para participar do projeto Banco da Terra, na qualidade de divulgador do programa e de assessoramento dos trabalhadores rurais beneficiados. A função da força sindical se limitava à promoção de palestras nas agências do Banco da Terra, com o objetivo de esclarecer as partes interessadas.
A Fazenda Ceres foi o primeiro processo feito em São Paulo em foi de competência da AMVAPA. A seleção de famílias foi feita pela AMVAPA, assim como coube à AMVAPA a indicação de técnicos para a elaboração da carta consulta e estudo da viabilidade econômica. A Força Sindical fez uma palestra na primeira fase do projeto. Não sabe como foi feita a escolha da fazenda, nega que a Força tenha tido qualquer influência na escolha.
Conheceu a fazenda depois que ela já havia sido comprada, com o objetivo de implementar vários cursos para os trabalhadores.
Disse que a Força Sindical nunca pagou honorários a peritos; tal atribuição cabia ao Banco da Terra. A Força apenas autorizava o pagamento desde que cumpridas as etapas do programa de qualificação profissional.
Sua função era dar anuência para a liberação de vários tipos de pagamento, inclusive das próprias fazendas.
Não conhece nem quem comprou nem quem vendeu a fazenda Ceres.
A Força Sindical tinha uma equipe técnica de agrônomos que era vinculada a FETAESP - Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de São Paulo; a equipe não tinha atribuição para alterar projetos, apenas o Banco da Terra podia fazê-lo.
Todos os projetos passavam pela Força Sindical para verificação do cumprimento das etapas de qualificação profissional.
Os honorários não eram destinados à associação, mas aos técnicos.
Reconhece que fez a exigência de que os técnicos tinham que dar assistência aos agricultores, porque achou um absurdo que eles ganhassem tanto apenas para elaborar o projeto e a carta consulta.
12) VALTEMIR DOS SANTOS - fls. 4.011/4.020
Trabalhava como gerente operacional no Ministério do Desenvolvimento Agrário, na secretaria do Banco da Terra, cuidando de todo o trâmite operacional envolvendo a alocação de recursos do Banco da Terra ao Banco do Brasil. Compareceu à Fazenda Ceres para verificar a consonância da proposta apresentada com as condições locais.
Foram ouvidas, ainda, diversas testemunhas, arroladas pelo Ministério Público Federal e pelos Réus, sendo relevantes para a análise da discussão os seguintes depoimentos:
1) LUÍS ANTONIO BASILE SOBRINHO - fls. 4.025/4.028
É engenheiro agrônomo e foi diretor de agricultura da Prefeitura Municipal de Piraju de 1997 a 2000. Participou do início das discussões a respeito do Banco da Terra e é contrário à proposta pois não acredita em associações, cooperativas ou sindicatos. Não acha viável que um grupo heterogêneo de pessoas trabalhe em conjunto no cultivo da terra. Não trabalhava mais na Prefeitura na época da compra da Fazenda Ceres.
Entende que a Fazenda Ceres não atende aos requisitos do programa do Banco da Terra porque a propriedade não era divisível do ponto de vista agronômico, não sendo possível distribuir os recursos hídricos em caso de divisão em glebas menores. Além disso, o terreno era muito heterogêneo.
Informou que a Fazenda sempre foi conhecida na região como produtora de café.
Prestou novo depoimento judicial, juntado às fls. 5.266/5287, esclarecendo que os agricultores selecionados eram pessoas de pouca instrução. Afirmou que parte da área da fazenda Ceres não é aproveitável para a agricultura porque é terra íngreme e com mata.
Em relação ao depoimento anterior, esclareceu que havia dito que o programa não prestava, não a fazenda, disse que o programa não prestava, que esse tipo de associação não funcionaria em lugar nenhum e que a fazenda não prestava para esse programa por que ela é indivisível. É que quando divide um imóvel rural, tem que dar ao condômino condição igual, vez que na divisão tem que dar condição igual para todos e essa não dava.Não dá para dividir em setenta e duas glebas e dar para cada um pedaço com terra plana, terreno arenoso, com "A.P.P.", com água, é isso.
2) FRANCISCO DE ASSIS NOGUEIRA RODRIGUES - fls. 4.029/4.031
É engenheiro agrônomo e em 2001 foi convidado por um grupo de pessoas da Prefeitura, da AMVAPA e da Associação de Agricultores para elaborar o projeto de viabilidade técnico-econômica do empreendimento envolvendo a Fazenda Ceres. Declinou do convite em razão do curto espaço de tempo para realizar o trabalho.
3) LUIZ OTÁVIO MOTTA - fls. 4.032/4.035
Inscreveu-se no programa do Banco da Terra, em Piraju, e foi um dos 72 beneficiários.
Participou da assembléia que antecedeu a vistoria da Fazenda Ceres e depois participou da própria vistoria.
A Força Sindical era a entidade responsável pela coordenação estadual do programa.
A AMVAPA, coordenada por Miguel Cáceres Filho, era responsável pela coordenação regional.
Após seis meses da última assembléia, em que foi deliberada a compra da Fazenda, começou a haver divergências entre os associados.
O depoente foi um dos onze que se desligou, vez que o ideal associativo não estava sendo colocado em prática.
Foi indicado, posteriormente, para exercer o cargo de coordenador técnico da AMVAPA, por indicação de Miguel Cáceres. Permaneceu na atividade por dois anos.
Não sabe informar como se deu a escolha da Fazenda Ceres e nem quem negociou o preço. Lembra que durante uma assembléia um beneficiário comentou que a fazenda estava à venda e sugeriu que a comprassem.
O valor informado e aprovado por todos era de R$ 7.500,00 o alqueire. Nada foi mencionado, na ocasião, a respeito de eventual superavaliação do imóvel. Os boatos começaram quando foi publicada uma reportagem no jornal.
4) MIGUEL CHIBANI BAKR - fls. 4.036/4.038
Era gerente da agência do Banco do Brasil em Piraju à época dos fatos.
Assinou a escritura de compra e venda da Fazenda Ceres por ordem da União Federal, que figurou no contrato como credora hipotecária.
Na qualidade de gerente, tinha que verificar se os agricultores associados tinham restrições cadastrais para o crédito, se de fato não eram funcionários públicos e se de fato eram agricultores.
Para liberar os recursos do financiamento, precisava de autorização do Conselho Curador do Banco da Terra, representado pela Força Sindical.
O Banco do Brasil é mero intermediário para o repasse dos recursos.
5) JOSÉ EDUARDO POZZA - fls. 4.039/4.041
À época dos fatos, tinha um escritório de contabilidade e prestava serviços contábeis aos antigos proprietários da Fazenda Ceres, Joaquim e Affonso.
Era também membro da cooperativa agrícola e nessa qualidade integrava o conselho municipal responsável por aprovar as cartas consulta no âmbito do Banco da Terra.
Recebeu os documentos dos 72 interessados em participar da compra da Fazenda Ceres. Estavam todos em ordem e após realizar a análise os devolveu à prefeitura.
6) JOÃO PEREIRA DE GUSMÃO FILHO - fls. 4.046/4.051
É agricultor e membro da associação de agricultores que adquiriu a fazenda Ceres, ocupando na ocasião o cargo de secretário.
Durante a campanha para a Prefeitura, Maurício Pinterich foi se apresentar ao depoente e informou-se que "o Banco da Terra caiu no meu colo", havendo a possibilidade de agricultores da região tornarem-se proprietários.
O depoente inscreveu-se no programa e foi chamado como suplente.
Posteriormente foi admitido e seu cadastro foi aprovado. Teve então que associar-se a 71 agricultores e assumiu o cargo de secretário, a pedido do então presidente da associação, Julião Galhardo, e de Gervásio Pozza, um dos secretários municipais de Maurício Pinterich.
Teve conhecimento de que a compra da Fazenda Ceres já estava mais ou menos acertada. A compra foi acertada pela diretoria executiva da associação de agricultores antes de ele tornar-se secretário. Participaram da escolha da fazenda o presidente da associação, Julião Galhardo, o secretário municipal Gervásio Pozza e o Prefeito Maurício Pinterich.
Já conhecia a fazenda e sabia que na parte boa havia cultura de café e na parte ruim, a maior, composta por morros e pedras, havia pasto.
Afirma que não assinou a escritura de compra da fazenda, muito embora estivesse presente no ato.
Posteriormente descobriu que a escritura foi passada por R$ 7.515,00 o alqueire, mas todo mundo da associação sabia que a compra da fazenda tinha sido acertada por R$ 5.500,00 o alqueire.
Afirma que não o deixaram assinar a escritura e nem ler o documento; apenas posteriormente é que teve conhecimento de seu conteúdo.
Confirma ter visto Anísio Silva e Milton Camolesi de Almeida prestando serviços à associação e sabe que eles estiveram na fazenda Ceres, mas não sabe quem os contratou. Informa que Julião e Gervásio costumavam fazer as contratações.
Não sabe se a Força Sindical teve participação na compra da fazenda. Sabia que a Força Sindical iria oferecer cursos aos membros das associações. Nunca houve, no entanto, cursos promovidos pela Força Sindical.
Os membros da associação receberam treinamento do SENAR.
Considera que o valor de R$ 5.500,00, por alqueire, já é superavaliado. Disse que:
7) WILSON INÁCIO DA SILVA - fls. 4350/4352
Agricultor, foi o primeiro beneficiário do programa da fazenda Ceres e participou de várias reuniões da associação.
Consta de seu depoimento que:
8) LUIZ OTAVIO MOTTA - fls. 5.288/5307
Foi um dos beneficiados pelo programa realizado na fazenda Ceres, mesmo sendo solteiro. É formado em zootecnia.
Em relação à área, disse que "tem uma grande área que é reserva local e tem umas dezoito nascentes de água e tem a área agricultável e enfim, acredito que de vinte a trinta por cento é reserva local".
Quanto aos demais beneficiados, esclareceu que era um pessoal "simples, mas a grande maioria era alfabetizada e só que eram simples".
Informou que foi realizada uma assembléia entre os trabalhadores e eles escolheram a fazenda Ceres por eliminação das demais. Na ocasião foram apresentadas pelo menos três outras opções. Disse também que houve discussão sobre o preço da fazenda e a compra foi aprovada após visita dos interessados ao local.
A fazenda foi vendida por R$ 2.300.000,00, aproximadamente R$ 7.000,00/R$ 7.500,00 o alqueire, que era o preço de mercado à época.
Informou que as outras opções apresentadas tinham valor bem superior.
9) DOUGLAS HOWTHORNE RIBAS - fls. 5.327/5353
É corretor de imóveis e participou da venda da fazenda Ceres. Afirma que foi adotado o valor de mercado, mas o preço era tão bom que não havia outro imóvel nas mesmas condições, todos eram bem mais caros.
Procurou o proprietário da fazenda Ceres, o Sr. Joaquim Zuniga, e perguntou se ele tinha interesse em vender o imóvel.
Teve conhecimento de que a AMVAPA estava procurando uma fazenda e ofereceu então à fazenda Ceres. Conversou então com Gervázio Pozza, responsável pela AMVAPA.
Já havia levado outras pessoas interessadas na compra da fazenda.
Boa parte da área da fazenda não era aproveitável, mas o preço do alqueire compensava. Nos casos em que a área aproveitável era maior, quase de 100%, o preço subia para R$ 20.000,00 o alqueire.
Joaquim pediu o valor de R$ 2.300.000,00, sem margem de negociação. A comissão paga pelo negócio foi de R$ 90.000,00.
Disse que houve uma re-ratificação da escritura porque foi constatada uma divergência com a área topográfica. A alteração foi feita pelo proprietário Joaquim, diretamente no cartório.
10) GERVAZIO POZZA FILHO - fls. 5.383/5407
Jornalista. Integrava a equipe da Prefeitura de Piraju quando o projeto do Banco da Terra foi autorizado para o Estado de São Paulo. Também fazia parte da AMVAPA e foi designado para auxiliar o projeto.
Foi procurado pelo corretor de imóveis Douglas e indagado se havia interesse da AMVAPA em comprar a fazenda Ceres. O depoente orientou Douglas a procurar o "Zilo" (Luiz Antônio Basile Sobrinho), secretário ou diretor da agricultura, e a associação.
Também foi procurado por outros corretores, oferecendo outros imóveis.
Acredita que 30% da área da fazenda Ceres é inaproveitável.
Foi pago o preço de mercado.
A decisão pela compra da fazenda foi tomada depois da visita feita ao imóvel pela associação dos agricultores e pelos técnicos contratados pelo programa.
O conjunto probatório revela a existência de inúmeras irregularidades no Programa de Reordenação Fundiária envolvendo a compra da Fazenda Ceres, irregularidades que caracterizam, inequivocamente, atos de improbidade administrativa.
Por óbvio que tal conclusão não se apresenta de forma imediata e não emerge da análise pontual dos atos praticados por cada Réu, mas é alcançada através do exame conjunto de tudo quanto restou apurado na fase de investigação administrativa pelo Ministério Público Federal e na fase judicial.
Inicialmente foram treze Réus denunciados; com o óbito de José Cristian houve o desmembramento e a ação prosseguiu em relação aos demais.
A maneira mais didática de compreender o envolvimento de cada um é, na esteira do raciocínio desenvolvido pelo juízo a quo, analisar as atuações dos dois principais decisórios, quais sejam, de um lado o Banco da Terra, a AMVAPA, a Prefeitura e a Força Sindical e de outro lado os proprietários vendedores do imóvel rural.
1) AMVAPA - PREFEITURA DE PIRAJU - BANCO DA TERRA - FORÇA SINDICAL
A compra da Fazenda Ceres para assentamento dos agricultores, mediante financiamento do Banco da Terra, foi previamente acertada entre os interessados no negócio, antes mesmo que se verificassem as condições da terra a ser adquirida e o interesse dos agricultores que ali iriam residir e trabalhar.
O então Prefeito de Piraju, Maurício de Oliveira Pinterich, ao ter conhecimento do projeto financiado pelo Banco da Terra, começou a procurar no município algum imóvel compatível com a proposta, movimentando, a partir daí, toda a máquina administrativa para alcançar seu objetivo.
O corréu Rubens Rogério de Oliveira, então Diretor de Agricultura de Piraju e Presidente do Conselho de Desenvolvimento Rural de Piraju, emitiu sozinho parecer favorável na carta consulta formulada pelo presidente da Associação de Agricultores Familiares Força da Terra de Piraju, em tempo recorde, qual seja, um dia após a apresentação do documento. Não houve convocação do Conselho de Desenvolvimento Rural e nem deliberação acerca da questão, como exige o artigo 8º, alínea 'd' do Regulamento da Terra então vigente:
Segundo restou apurado no processo administrativo perante o Ministério Público Federal, embora o Conselho tivesse oito membros, além do Presidente, o único conselheiro que assinou a "suposta" ata da reunião ocorrida em 20 de março de 2001 foi José Eduardo Pozza, que confirmou que assinou o documento dias depois da data nele aposta, a pedido de Rubens Rogério de Oliveira, fato confirmado em juízo, como se vê à fl. 4.039, ao esclarecer que:
Por sua vez, o secretário do Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural, o senhor Paulo Sérgio Vianna Mattosinho, que subscreveu a ata, afirmou que não se lembrava da reunião.
Uma vez aprovada a carta consulta, a proposta de financiamento e seus projetos foram entregues a Miguel Francisco Saez Cáceres Filho que, na mesma data, na condição de técnico da área agrária da AMVAPA, subscreveu parecer favorável ao financiamento, sem realizar qualquer análise aprofundada. Isso ocorreu em 23 de março de 2001, três dias após a aprovação da carta consulta.
Embora Miguel tenha afirmado que anteriormente já havia comparecido algumas vezes à Fazenda Ceres, o fato é que um mais aprofundado estudo deveria ser realizado no momento do parecer, em que todas as questões técnicas envolvidas deveriam ser abordadas.
Mas não foram.
Tal parecer subscrito por Miguel também foi assinado por Maurício de Oliveira Pinterich e João Pedro de Moura, na qualidade de assessor do Presidente da Força Sindical.
A decisão favorável (aprovação do financiamento), assinada por Miguel, Maurício e João Pedro, foi comunicada à Associação de Agricultores Familiares Força da Terra de Piraju, emitindo-se então um certificado atestando que a associação estava apta a participar do Programa no Banco da Terra.
Para elaboração da Proposta de Financiamento da Fazenda Ceres, o réu Maurício de Oliveira Pinterich contratou Milton Camolesi de Almeida, médico veterinário e residente em outra cidade. Milton, por sua vez, contratou o engenheiro agrônomo Anísio Silva para colaborar na elaboração da Proposta.
Milton Camolesi de Almeida e Anísio Silva foram contratados para consecução da vistoria e avaliação do imóvel, definição do projeto produtivo, cálculo das prestações e definição de projetos de infra-estrutura básica. Eles não assinaram a Proposta de Financiamento da Fazenda Ceres. Milton apenas subscreveu um "Termo de Responsabilidade Técnica de Financiamento do Banco da Terra" da fazenda, face à exigência do então gerente do Banco do Brasil, o Sr. Miguel Chibano Bakr, para o pagamento dos honorários deles, já que não poderia fazê-lo sem que houvesse um responsável técnico pela elaboração da proposta.
Apurou-se, ainda, que houve falsificação da Proposta de Financiamento da Fazenda Ceres e seus projetos. É que de acordo com o avençado entre as partes, o valor da Fazenda Ceres (terra e benfeitorias) era de R$ 2.300.000,00 (dois milhões e trezentos mil reais), correspondente a R$ 3.105,62 (três mil, cento e cinco reais e sessenta e dois centavos) por hectare e R$ 7.515,60 (sete mil, quinhentos e quinze reais e sessenta centavos) por alqueires, sendo o total de 740,5926 hectares (306,03 alqueires). No entanto, conforme restou apurado pelo topógrafo Sidney Antônio Carrara, a área total da fazenda é de 731,3240 hectares (302,20 alqueires). Desta forma, o hectare da Fazenda Ceres foi pago a R$ 3.144,99 (três mil cento e quarenta e quatro reais e noventa e nove centavos) e R$ 7.610,89 (sete mil, seiscentos e dez reais e oitenta e nove centavos) por alqueire.
Na ocasião, Paulo Pereira da Silva era Presidente da Força Sindical e era assessorado por João Pedro de Moura.
A Força Sindical, como já mencionado nas linhas anteriores, era a unidade técnica responsável pela operacionalização do Programa Banco da Terra.
Tanto Paulo Pereira da Silva tinha conhecimento da negociação envolvendo a Fazenda Ceres, que mencionou tal projeto, como um de seus principais, quando em campanha política do seu partido (PTB).
Ora, não é crível que na condição de Presidente da Força Sindical e tendo conhecimento das relevantes funções exercidas pela entidade no programa do Banco da Terra, o réu não se preocupasse em acompanhar, passo a passo, a regularidade da negociação. A Fazenda Ceres mostrava-se nitidamente inadequada aos objetivos lançados, fato efetivamente constatado pelo laudo pericial, mas ainda assim foi adquirida com recursos públicos.
A participação de seu assessor na negociação, João Pedro de Moura, é incontestável. Conforme depoimentos prestados pelas testemunhas, João Pedro participou inclusive da visita feita pelos agricultores à Fazenda Ceres antes da tomada da decisão "oficial" aprovando o imóvel, fato que demonstra que desde o início a Força Sindical, representada por Paulo Pereira e João Pedro, estava envolvida nas irregularidades.
A prova documental apresentada atesta que era bastante amplo o raio de atuação da Força Sindical, abrangendo desde a participação na aprovação da carta consulta até a aplicação de recursos próprios (com ações de capacitação integral dos beneficiários).
O depoimento prestado pelo gerente do Banco do Brasil em Piraju, o senhor Miguel Chibani Bakr, destaca a importância da atuação da Força:
Em outubro de 2001, após diversas denúncias veiculadas na imprensa envolvendo a aquisição da Fazenda Ceres, o Ministério do Desenvolvimento Agrário determinou a realização de uma auditoria, designando os corréus João Cláudio de Souza, Jonas Jamil Lessa Lopes, Valtemir dos Santos e José Cristian do Carmo Mendes (excluído do pólo passivo da presente ação) para tal mister.
João Cláudio, Jonas, Valtemir e José Cristian elaboraram um relatório de acompanhamento e controle da fazenda Ceres, concluindo que:
(fls. 02/18 do Apenso XII)
As conclusões lançadas pelo relatório, além de se mostrarem totalmente dissociadas da realidade, não apresentaram qualquer fundamento teórico que lhes desse suporte. Trata-se, a bem da verdade, de documento produzido com a única finalidade de justificar as irregularidades já cometidas, com o nítido intuito de legalizá-las.
Depreende-se dos depoimentos prestados pelos corréus que não foram feitas análises aprofundadas para a elaboração do relatório, mas simples coleta e reunião de informações, sem qualquer rigor técnico.
2) PROPRIETÁRIOS/VENDEDORES DA FAZENDA CERES
Joaquim Fernandes Zuniga e Affonso Fernandes Suniga eram os antigos proprietários da Fazenda Ceres e decidiram vendê-la após serem consultados pelo corretor de imóveis Douglas Howthorne Ribas.
O corretor Douglas disse que procurou Joaquim e Affonso quando teve conhecimento de que a AMVAPA estava procurando uma fazenda para assentamento de trabalhadores mediante financiamento do Banco da Terra.
Alguns detalhes curiosos envolvendo a transação.
Affonso e Joaquim firmaram as "Declarações de Intenção de Venda" para a Associação de Agricultores Familiares Força da Terra de Piraju/SP, relativa à Fazenda Ceres, em formulário padrão do Banco da Terra, pelo preço de R$ 2.300.000,00 (dois milhões e trezentos mil reais), em 28 de dezembro de 2000.
No entanto, apenas em 14 de janeiro de 2001 é que os agricultores pertencentes à associação referida aprovaram a compra da fazenda.
Também posteriormente foi apresentada a Proposta de Financiamento ao Banco da Terra, indicando o mesmo valor do imóvel, com base nos dados levantados pelos corréus Milton Camolesi e Anísio Silva.
Ou seja: tudo indica que houve um pré-acertamento do preço do imóvel, de forma a não haver qualquer empecilho na negociação.
O depoimento prestado pela testemunha Francisco de Assis Nogueira Rodrigues confirma este entendimento ao afirmar que:
É interessante ressaltar que o mesmo imóvel (Fazenda Ceres) havia sido oferecido para venda três meses antes ao fazendeiro Nelson Monteiro de Souza, pelo valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) o alqueire, equivalente a R$ 1.239,60 (um mil, duzentos e trinta e nove reais e sessenta centavos) o hectare.
Esclarecedoras as informações colhidas do depoimento da testemunha João Pereira de Gusmão, membro da AAFFT que exercia, à época dos fatos, a função de secretário:
De tudo quanto apurado, é incontestável a participação dos doze corréus denunciados (MIGUEL FRANCISCO SAEZ CÁCERES FILHO, MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH, PAULO PEREIRA DA SILVA, JOÃO PEDRO DE MOURA, RUBENS ROGÉRIO DE OLIVEIRA, MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA, ANÍSIO SILVA, JOAQUIM FERNANDES ZUNIGA, AFFONSO FERNANDES SUNIGA, VALTEMIR DOS SANTOS, JOÃO CLÁUDIO DA SILVA SOUZA e JONAS JAMIL LESSA LOPES) nas irregularidades envolvendo a aquisição da Fazenda Ceres.
Para a compra do imóvel foram utilizados recursos públicos, sem que fossem respeitadas as condições impostas pela legislação.
Ao contrário do que determinam as regras legais, primeiramente eram realizados os atos e somente depois eram cumpridas as formalidades, com o nítido propósito de "encobrir" as falcatruas cometidas.
Como se já não bastasse a gravidade das condutas praticadas, os corréus prejudicaram inúmeras famílias de agricultores rurais, de pouca ou nenhuma instrução, que foram iludidas com a possibilidade de ter uma terra própria e dela extrair seu sustento.
Pessoas simples e trabalhadoras firmaram dívidas de aproximadamente R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), cada uma, com a ilusão de que o financiamento que lhes fora concedido seria pago com a produção.
Infelizmente, não foram informados de que a terra então adquirida estava muito longe de produzir o que foi divulgado.
A um só tempo foram feridos os princípios que regem a administração pública, especialmente os da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, inscritos no caput do artigo 37 da Constituição Federal, e configurados os atos de improbidade administrativa descritos nos artigos 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/92, verbis:
Por todo o exposto, está devidamente configurada a participação dos doze corréus denunciados (MIGUEL FRANCISCO SAEZ CÁCERES FILHO, MAURÍCIO DE OLIVEIRA PINTERICH, PAULO PEREIRA DA SILVA, JOÃO PEDRO DE MOURA, RUBENS ROGÉRIO DE OLIVEIRA, MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA, ANÍSIO SILVA, JOAQUIM FERNANDES ZUNIGA, AFFONSO FERNANDES SUNIGA, VALTEMIR DOS SANTOS, JOÃO CLÁUDIO DA SILVA SOUZA e JONAS JAMIL LESSA LOPES), merecendo reforma a r. sentença recorrida na parte em que julgou improcedente a pretensão em relação aos corréus MIGUEL FRANCISCO SAEZ CÁCERES FILHO e RUBENS ROGÉRIO DE OLIVEIRA.
As disposições inscritas na Lei nº 8.429/92 aplicam-se tanto ao agente público (aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função na administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual) como àquele que, mesmo não ostentando tal condição, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta, como determinam os artigos 2º e 3º.
O artigo 12 da Lei nº 8.429/92 disciplina as sanções a serem aplicadas aos agentes que praticam os atos de improbidade, na medida de sua responsabilidade e levando em conta a extensão do dano causado e o proveito patrimonial obtido pelo agente - quando o caso, nos seguintes termos:
A r. sentença recorrida aplicou as seguintes penalidades:
Os Réus foram condenados, ainda, a pagar custas processuais em rateio e honorários advocatícios, em rateio, fixados em R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), nos termos do artigo 20, § 3º do Código de Processo Civil.
As sanções impostas foram aplicadas com razoabilidade e proporcionalidade, considerando as condutas praticadas por cada um dos Réus, merecendo algumas alterações nos pontos a seguir indicados.
Requerem a UNIÃO FEDERAL e o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL a reforma parcial da sentença para que os corréus Maurício de Oliveira Pinterich, João Pedro de Moura, Milton Camolesi de Almeida, Anísio Silva e Paulo Pereira da Silva sejam condenados à pena de ressarcimento de danos, vez que suas condutas foram determinantes para a compra superfaturada da Fazenda Ceres.
Os recursos não merecem ser providos neste item.
As provas colhidas nos autos, embora atestem que os Réus tiveram participação decisiva na compra da Fazenda Ceres, valendo-se das funções então exercidas para alcançar suas finalidades, não autorizam concluir que eles obtiveram qualquer vantagem econômica pessoal. Nada foi demonstrado neste sentido, sendo desproporcional a aplicação da pena de ressarcimento e suficientes as sanções já impostas.
Requerem o acolhimento dos recursos, ainda, para que sejam alteradas as penas de multa imputadas aos corréus Maurício de Oliveira Pinterich, João Pedro de Moura, Milton Camolesi de Almeida, Anísio Solva e Paulo Pereira da Silva, fixando-a em 1 (uma) vez o valor do acréscimo patrimonial para cada réu, e não em rateio como determinado pelo juízo.
Com razão os apelantes.
A multa prevista na lei de improbidade tem natureza civil, sancionatória e caráter educativo, devendo ser aplicada a cada um dos réus no valor fixado pelo juízo a quo, não em rateio, mas individualmente.
Embora para efeitos de análise tenham sido destacados os diversos núcleos decisórios (AMVAPA, Força Sindical, Prefeitura de Piraju, Banco da Terra, proprietários da Fazenda), as condutas dos Réus foram individualizadas e configuram, cada uma, atos graves de improbidade a ensejar a responsabilidade individual, inclusive na fixação da multa.
Insurgem-se também contra a não aplicação da sanção de suspensão dos direitos políticos em relação a Paulo Pereira da Silva, ao fundamento de que sua incidência não está atrelada à atuação do réu como agente político, mas é pautada pela gravidade do ato de improbidade administrativa. De mais a mais, alegam que o Réu Paulo Pereira da Silva, ao contrário do que consta na sentença, atuou com nítida roupagem de agente político, representando o Estado na implementação de políticas agrárias.
De início, cumpre destacar que a aplicação da sanção de suspensão dos direitos políticos não está vinculada à atuação do réu como agente político, sendo equivocado afirmar que ela só se aplica aos casos em que comprovado o nexo entre a função exercida e a irregularidade praticada.
Certamente não foi esta a pretensão do legislador porque se o fosse tornaria expressa tal condição, considerando sua natureza restritiva a direito fundamental expressamente consagrado no texto constitucional.
A pena de suspensão deve ser aplicada em razão da gravidade do ato e considerando a proporcionalidade em relação à conduta do agente.
O réu Paulo Pereira da Silva, na condição de Presidente da Força Sindical, ratificou inúmeras irregularidades cometidas na aquisição da Fazenda Ceres, não tomando as cautelas devidas e desejadas de um agente político.
No entanto, sua participação nos fatos não enseja a aplicação da pena de suspensão, com todas as conseqüências daí decorrentes, especialmente a sua condição atual, de deputado federal eleito democraticamente.
Pelas mesmas razões, deve ser acolhido o pedido formulado pelo Réu João Pedro de Moura para que seja afastada a pena de suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos, por se revelar medida desproporcional às irregularidades cometidas.
Por fim, insurgem-se o Ministério Público Federal e a União Federal contra a não quantificação do dano pelo juízo sentenciante, sob a alegação de que há elementos suficientes nos autos para sua apuração, especialmente os dados apurados pelo Perito Judicial.
Também aqui com razão.
As provas documentais e pericial juntadas aos autos são claras e expressas ao apontar o exato valor do dano causado ao patrimônio público, qual seja, R$ 1.150.000,00 (hum milhão, cento e cinqüenta mil reais), equivalente a 54% (cinqüenta e quatro por cento) do valor da venda da Fazenda Ceres, não havendo justificativa a postergar a fixação para a fase executiva.
Em face de todo o exposto, nego provimento ao agravo retido, rejeito a matéria preliminar, nego provimento às apelações dos réus e dou parcial provimento às apelações do Ministério Público Federal e da União Federal para estipular o pagamento de multa civil aos corréus Maurício de Oliveira Pinterich, João Pedro de Moura, Milton Camolesi de Almeida, Anísio Solva e Paulo Pereira da Silva, fixando-a em 1 (uma) vez o valor do acréscimo patrimonial para cada réu, assim como para quantificar o dano causado, no valor de R$ 1.150.000,00 (hum milhão, cento e cinqüenta mil reais), equivalente a 54% (cinqüenta e quatro por cento) do valor da venda da Fazenda Ceres, bem como dou parcial provimento à apelação de João Pedro de Moura para afastar a condenação de suspensão dos direitos políticos pelo prazo de cinco anos, na forma da fundamentação.
Traslade-se cópia desta decisão aos autos da Medida Cautelar nº 0000021-07.2003.4.03.6125 e do Agravo de Instrumento nº 0013661-17.2006.4.03.0000 em apenso.
É como voto.
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