D.E. Publicado em 08/04/2014 |
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EMENTA
PENAL - APELAÇÃO CRIMINAL - SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA (ART. 337-A, I, DO CÓDIGO PENAL) E SONEGAÇÃO FISCAL (ART. 1º, I, DA LEI 8.137/1990) - PRELIMINARES DEFENSIVAS REJEITADAS - MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS PROVADAS - DOLO COMPROVADO - PROVA DO "ANIMUS REM SIBI HABENDI" - DESNECESSIDADE - SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA - CONCURSO DE CRIMES - SONEGAÇÃO FISCAL E SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA - RECONHECIMENTO DO CONCURSO FORMAL HETEROGÊNEO EM CONCORRÊNCIA COM O CRIME CONTINUADO - APLICAÇÃO APENAS DA CAUSA DE AUMENTO CONCERNENTE A CONTINUIDADE DELITIVA - DOSIMETRIA DAS PENAS E REGIME PRISIONAL ALTERADOS - ADOÇÃO DA DOSIMETRIA DA PENA IMPOSTA APENAS PELA PRÁTICA DO DELITO DE SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA - ARTIGO 337-A DO CÓDIGO PENAL -EM CONSEQUÊNCIA DA NOVA PENA IMPOSTA ALTERADO O REGIME PRISIONAL PARA O INICIAL ABERTO - RECURSO DA DEFESA A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO.
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ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes os acima indicados, ACORDAM os Desembargadores da Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, nos termos do relatório e voto do Senhor Relator, constantes dos autos, e na conformidade da ata de julgamento, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado, à unanimidade, rejeitar as preliminares suscitadas pela Defesa e, no mérito, por maioria, dar parcial provimento ao recurso interposto pela Defesa do réu ROBERTO PRIMON para, afastando a aplicação do artigo 69, do Código Penal, reconhecer a ocorrência do concurso formal de delitos, bem como do crime continuado, aplicando somente o acréscimo relativo a esta última previsão, conforme precedentes citados no voto, do que resulta a pena de 02 (dois) anos, 04 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão e 12 (doze) dias-multa, substituída por duas restritivas de direitos, mantendo, quanto ao mais, a sentença nos termos em que lançada.
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VOTO-VISTA
Inicialmente, cumpre registrar o respeito e admiração que nutro pelo Eminente Desembargador Federal Paulo Fontes, salientando que o meu pedido de vista se assentou na necessidade de uma análise mais detida dos autos para formação de minha convicção.
Roberto Primon apela, sustentando o seguinte:
O Ministério Público Federal apresentou contrarrazões (fls. 509/519).
A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 522/540).
O Eminente Relator Desembargador Federal Paulo Fontes rejeitou as preliminares e, no mérito, deu parcial provimento ao recurso da defesa "para, afastando a aplicação do artigo 69, do Código Penal, reconhecer a ocorrência do concurso formal de delitos, bem como do crime continuado, aplicando somente o acréscimo relativo a esta última previsão, conforme precedentes acima citados, do que resulta a pena de 02 (dois) anos, 04 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão e 12 (doze) dias-multa, substituída por duas restritivas de direitos, mantendo, quanto ao mais, a sentença nos termos em que lançada" (fl. 556).
Acompanho o Eminente Relator quanto à rejeição das preliminares e comprovação da materialidade e autoria na conduta.
É o voto.
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DECLARAÇÃO DE VOTO
Examino o caso específico destes autos em face da condenação do réu Roberto Primon pelas condutas previstas nos arts. 1º, I, da Lei nº 8.137/90 e 337-A, I, do Código Penal, mais atentamente em relação à dosimetria da pena e ocorrência ou não de bis in idem, ou seja, da possibilidade de dois aumentos pelo concurso formal e continuidade delitiva.
A matéria a ser dirimida diz respeito à vedação ou não de cumulação de acréscimos em razão de reconhecimento da ocorrência destes dois institutos distintos, previstos, respectivamente, nos artigos 70 e 71 do Código Penal.
Para melhor compreensão do tema, mister é a descrição fática contida na denúncia, verbis:
"nos períodos de dezembro de 2004. fevereiro de 2005. abril de 2005 a junho de 2005 e dezembro de 2005, o denunciado ROBERTO PRIMON, na qualidade de administrador e representante legal da empresa "Metalúrgica Bonna Ltda", omitiu nas Guias de Recolhimento de Fundo de Garantia e Informações à Previdência Social - GFIP, o valor total das remunerações pagas e creditadas aos segurados empregados e contribuintes individuais, nos meses de fevereiro a dezembro de 2004 e fevereiro a dezembro de 2005, incidindo na imputação prevista no artigo 337-A do Código Penal, e igualmente, com igual conduta, no período descrito, o réu reduziu indevidamente as contribuições sociais destinadas a outras entidades e fundos, quais sejam, salário educação e contribuições destinadas ao INCRA, SESI, SENAI e SEBRAE, incidindo o réu, também, na imputação prevista no art. 1º, I, da L. 8.137/90, gerando com suas condutas os Autos de Infrações - AI nºs 37.177.982-0, 37.177.980-4 e 37.177.981-2, gerando um prejuízo ao erário no valor total de R$ 180.163,09 (cento e oitenta mil, cento e sessenta e três reais e nove centavos)".
Verifico que o eminente relator acolheu a orientação jurisprudencial no sentido de que, na ocorrência de concurso formal e o crime continuado, aplica-se apenas a causa de aumento referente à continuidade delitiva sobre a pena do delito mais grave, evitando-se, assim, a ocorrência de bis in idem. Como, no caso dos autos, os delitos prevêem as mesmas penas, aplicou a pena de um deles aumentada apenas em razão da continuidade delitiva.
E, para tanto, aplicou o entendimento majoritário do E. Superior Tribunal de Justiça, consubstanciado na seguinte ementa:
"CRIMINAL. HC. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. UNIFICAÇÃO DE PENAS. CONCURSO FORMAL. CONTINUIDADE DELITIVA. DUPLA MAJORAÇÃO DA REPRIMENDA IMPOSSIBILIDADE. BIS IN IDEM. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA.
Esta Corte já se posicionou no sentido de que nas situações em que configuradas as duas hipóteses de aumento da pena concernentes ao concurso material e à continuidade delitiva, admite-se apenas uma exacerbação, qual seja, aquela relativa ao crime continuado, sob pena de bis in idem. Precedente do STJ. Deve ser cassado o acórdão recorrido para afastar do quantum da pena a ser cumprida pelo paciente a majoração relativa ao concurso formal. Devendo ser realizado novo cálculo da reprimenda pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região com a incidência, apenas, da exacerbação decorrente da continuidade delitiva. Ordem concedida, nos termos do voto do relator".
(STJ, 5ª Turma, HC Nº 20060248284, DJ 04/06/2007, decisão unânime em 24/04/2007).
Refletindo sobre a matéria, frente ao entendimento de tratar-se de institutos distintos, à primeira vista, senti que poderia haver o cúmulo das majorantes, sem se falar em bis in idem.
Ocorre que o presente caso diz respeito aos mesmos crimes continuados que tiveram sempre as mesmas vítimas (omissão dos valores pagos e creditados aos empregados e contribuintes individuais de contribuições previdenciárias, tendo como vítima o INSS) e redução indevida de contribuições sociais destinadas a outras entidades e fundos, quais sejam salário-educação e contribuições destinadas ao INCRA, SESI, SENAI E SEBRAI.
Faço a diferenciação entre os mesmos crimes e mesmas vítimas no decorrer da continuidade delitiva e os diversos (crimes e vítimas) também em face da continuidade, porque o Egrégio Supremo Tribunal Federal reconhece a possibilidade de cúmulo de majorações, a exemplo do seguinte acórdão:
"DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIMES DE ESTELIONATO. CONCURSO FORMAL E CONTINUIDADE DELITIVA (CRIME CONTINUADO). ARTIGOS 70 E 71 DO CÓDIGO PENAL. "HABEAS CORPUS". ALEGAÇÃO DE "BIS IN IDEM". INOCORRÊNCIA.
Correto o acórdão impugnado, ao admitir sucessivamente, os acréscimos de pena, pelo concurso formal, e pela continuidade delitiva (artigos 70 e 71 do Código Penal), pois o que houve, no caso, foi, primeiramente, um crime de estelionato consumado contra três pessoas e, dias após, um crime de estelionato tentado contra duas pessoas inteiramente distintas.
Assim, sobre a pena-base deve incidir o acréscimo pelo concurso formal, de modo a ficar a pena do delito mais grave (estelionato consumado) acrescida de, pelo menos, um sexto até metade, pela co-existência do crime menos grave (art.70).
E como os delitos foram praticados em situação que configura a continuidade delitiva, também o acréscimo respectivo (artigo 71) é de ser considerado.
Rejeita-se, pois, com base, inclusive, em precedentes do S.T.F., a alegação de que os acréscimos pelo concurso formal e pela continuidade delitiva são inacumuláveis, em face das circunstâncias referidas.
"H.C" indeferido".
(STF HC nº 73.821-4, rel. Min. Sydney Sanches, dec. 25/6/1996, DJ 13/09/96, DE. Unânime, 25/6/1996) (negritei).
O voto cita opinião do Ministério Público atuante nos autos que ponderou correta a majoração pelo concurso formal e também para a continuidade delitiva porque o primeiro acréscimo decorreu da pluralidade de lesados e diversidade de patrimônios, no primeiro dos delitos narrados na denúncia. O segundo, resultou da cadeia de delitos, eis que, outra ação delituosa, praticada dois dias após a perpetração do anterior ilícito, novamente contra pluralidade de lesados e patrimônios, esta foi reconhecida como fato ilícito de continuação dos delitos anteriores.
Cita, ainda, jurisprudência da Terceira Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do Rio de Janeiro consubstanciada na seguinte ementa:
"CRIMES DE ESTELIONATO - CONCURSO FORMAL E CONTINUIDADE DELITIVA - INOCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM - APELAÇÃO DEFENSIVA A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
- As regras do concurso formal e da continuidade delitiva não são reciprocamente incompatíveis e não respondem por qualquer excesso na apenação quando aplicadas corretamente. Como quando numa ação delituosa, há pluralidade de lesados e de patrimônios atingidos (concurso formal), e, em conduta ilícita subseqüente, ocorrida dois dias após a consumação daquele "golpe", o agente pratica novo crime, contra outras pessoas e patrimônios distintos dos anteriores, reconhecendo-se a segunda ação como continuidade da primeira.
Em tal hipótese, não há que se cogitar de bis in idem e sim em fórmula ficta, representativa de benefício para o apenado.
Recurso desprovido".
(TACRJ ACR nº 55.725/95, rel. Juíza Telma Musse Diuana, dec. Unânime em 7/3/1996).
O entendimento sobreveio no sentido de que não encontrava respaldo legal o pedido do réu para afastar o aumento pelo concurso formal, quando presentes este e a continuidade, considerando-se que não se confundem os institutos do concurso formal e do crime continuado.
Assim, podendo ocorrer o cúmulo das majorantes ou não, dependendo do caso concreto, extrai-se, da situação fática descrita nos autos, que os crimes cometidos em continuidade se deram com as mesmas pluralidades de condutas (art.337-A e Lei nº 8.137/90) atingindo sempre as mesmas pluralidades de vítimas (INSS e INCRA, SESI, SENAI E SEBRAI) e, pelas suas homogeneidades, ensejam um só aumento pela continuidade delitiva, consoante assentado pelo Desembargador Paulo Fontes em seu voto.
Desse modo, acompanho o relator.
É o voto.
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RELATÓRIO
O EXMº. SRº. JUIZ FEDERAL CONVOCADO CARLOS FRANCISCO:
Trata-se de Apelação Criminal interposta pela Defesa do réu ROBERTO PRIMON em face de sentença proferida pela MM. Juíza da 2ª Vara Federal de Santo André-SP, que condenou o réu ROBERTO PRIMON pelas condutas previstas nos artigos 1º, I, da Lei 8.137/90 e 337-A, I, do Código Penal, em concurso material, condenando pelos crimes à pena definitiva de 02 anos, 04 meses e 24 dias de reclusão, mais o pagamento de 12 dias-multa; para cada um, que somadas em face do concurso material de crimes totalizou 04 anos, 09 meses e 18 dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, além do pagamento de 24 dias-multa, fixado no valor equivalente a meio salário mínimo atualizado, nos moldes do artigo 49, § 1º do CP (fundamentação da sentença de fls.458/464).
Consta da denúncia (fls.247/249) e de seu posterior aditamento (fls. 298/299), em apertada síntese que, nos períodos de dezembro de 2004. fevereiro de 2005. abril de 2005 a junho de 2005 e dezembro de 2005, o denunciado ROBERTO PRIMON, na qualidade de administrador e representante legal da empresa "Metalúrgica Bonna Ltda", omitiu nas Guias de Recolhimento de Fundo de Garantia e Informações à Previdência Social - GFIP, o valor total das remunerações pagas e creditadas aos segurados empregados e contribuintes individuais, nos meses de fevereiro a dezembro de 2004 e fevereiro a dezembro de 2005, incidindo na imputação prevista no artigo 337-A do Código Penal, e igualmente, com igual conduta, no período descrito, o réu reduziu indevidamente as contribuições sociais destinadas a outras entidades e fundos, quais sejam, salário educação e contribuições destinadas ao INCRA, SESI, SENAI e SEBRAE, incidindo o réu, também, na imputação prevista no art. 1º, I, da L. 8.137/90, gerando com suas condutas os Autos de Infrações - AI nºs 37.177.982-0, 37.177.980-4 e 37.177.981-2, gerando um prejuízo ao erário no valor total de R$ 180.163,09 (cento e oitenta mil, cento e sessenta e três reais e nove centavos).
A denúncia foi recebida em 09/12/2009 (fls.300/301).
Houve apresentação de defesa preliminar (fls.321/325). Na audiência de instrução e julgamento não foram ouvidas testemunhas de acusação e foram ouvidas as testemunhas de defesa (fls. 353, 354 e 367/368 -por meio digital, audiovisual),e por fim, o réu foi interrogado (fls.400/401).
As partes apresentaram alegações finais às fls. 438/449 e 451/456. A sentença condenatória foi proferida às fls. 458/464, publicada em 04/05/2012 (fl. 465).
A Defesa apelou demonstrando seu inconformismo, requerendo a reforma da sentença condenatória, aduzindo em suas prolixas razões de apelo (fls.480/505), em síntese:
a.1)- Preliminarmente requer: o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva estatal pelo advento da prescrição em sua modalidade retroativa;
a.2)- nulidade da sentença por falta de fundamentação que limitou-se a examinar apenas a existência da inexigibilidade de conduta diversa aventada pela Defesa;
a.2)- invoca violação ao sistema acusatório e ao princípio do contraditório, bem como, ao artigo 155 do CPP, em razão da condenação ter se dado unicamente com base no auto de infração fiscal - procedimento administrativo;
b)- Mérito: requer o afastamento da regra do concurso material de crimes, pois, com o advento do artigo 337-A do CP aplica-se no que tange às contribuições previdenciárias este tipo penal e não o artigo 1º, I, da L. 8137/90, tendo havido dupla incriminação - odioso bis in idem, uma vez que se puniu o apelante duas vezes pela suposta violação do mesmo bem jurídico tutelado.
c)- Houve inversão do ônus da prova, pois, em nenhum momento a acusação produziu prova suficiente para afastar a presunção de inocência do réu que alegou causa excludente de culpabilidade - dificuldades financeiras, não cabendo ao réu comprovar sua inocência.
d)- alega ausência de materialidade e autoria delitivas, bem como, não agiu o réu com dolo (elemento subjetivo do tipo).
e)- Por fim, interpõe a presente apelação para fins de prequestionamento aos dispositivos infraconstitucionais e constitucionais citados, para fins de eventual recurso especial ou extraordinário às Cortes Supremas.
Com as contrarrazões ministeriais (fls. 509/519), vieram os autos a esta E. Corte Regional, tendo o Ministério Público Federal se manifestado pelo improvimento do recurso ora interposto (fls. 522/540).
À revisão na forma regimental.
É O RELATÓRIO.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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VOTO
O EXMº. SRº. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES:
Antes de adentrar a análise do mérito recursal propriamente dito, é dever tratar das preliminares arguidas pela Defesa do apelante.
I- Preliminares:
a)- Primeira preliminar: Prescrição.
Passo a enfrentar a alegação deduzida pela Defesa do réu no sentido de que encontra-se extinta a punibilidade do delito, pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal.
O delito de supressão de contribuição previdenciária, bem como, de sonegação tributária, atribuídos ao réu referem-se às contribuições relativas aos períodos de 02/2004 a 12/2004 e 02/2005 a 12/2005 e correspondem aos Autos de Infrações - AI nsº 37.177.982-0 (fl.11), 37.177.980-4 (fl.185) e 37.177.981-2 (fl.266).
No entanto, tratando-se o crime do artigo 1º, I, da L. 8.137/90 de delito de natureza material, o termo inicial da prescrição é contado a partir da constituição definitiva do crédito tributário (Súmula Vinculante nº 24 do STF). O mesmo raciocínio jurídico se exige do crime de sonegação de contribuições previdenciárias previsto no artigo 337-A do CP, o qual demanda a constituição definitiva do crédito.
Os Autos de Infrações referidos foram lavrados em 05 e 13 de agosto de 2008, tendo nestas datas ocorrido o lançamento tributário (fls. 11, 185 e 266) não havendo nos autos nenhum elemento no sentido de ter havido impugnação administrativa. Da leitura do ofício de fl. 260, expedido pela Delegacia da Receita Federal do Brasil em Santo André/SP, depreende-se que tais créditos previdenciários e tributários foram inscritos em Dívida Ativa da União desde 24 de dezembro de 2008, tendo sido a denúncia e aditamento recebida em 09/12/09 (fls. 300/301) somente após o encerramento do procedimento administrativo, respeitando-se a citada Súmula Vinculante (condição objetiva de punibilidade para os crimes tributários materiais).
No caso dos autos, o réu foi condenado pelos delitos de sonegação de contribuição previdenciária (artigo 337-A, III, do CP) e sonegação fiscal (artigo 1, I, da L. 8.137/90) às penas de 02 (dois) anos, 04 meses e 24 dias de reclusão, para cada um dos crimes, sendo que o aumento de 1/5 (um quinto) em razão da continuidade delitiva não é considerado para fins de cômputo do prazo prescricional.
Assim, e tendo-se operado o trânsito em julgado para a acusação, a pena de 02 (dois) anos de reclusão prescreve em 04 (quatro) anos, a teor do que dispõe o artigo 109, V, do Código Penal.
Ora, tendo sido recebida a denúncia em 09 de dezembro de 2009 (fls.300/301), e considerando que não corre o prazo prescricional antes da constituição definitiva do crédito previdenciário e tributário na esfera administrativa, tem-se que não restaram ultrapassados 04 anos entre a data da inscrição do débito na dívida ativa da União (24/12/08 - fl.260) e a data do recebimento da denúncia (9/12/09- fls.300/301), primeiro marco interruptivo da prescrição. Tal lapso temporal também não restou superado entre esta data e a publicação da sentença condenatória (fl.465 - 04/05/2012), e tampouco entre a data da publicação da sentença condenatória e o presente momento.
Não é cabível, pois, falar em ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal, conforme pretendido pela Defesa.
b)- Segunda preliminar. Ausência de fundamentação da sentença.
Não há que se falar em nulidade da sentença por ausência de fundamentação, pois, ao contrário do sustentado pela defesa, houve a devida fundamentação com relação à materialidade e autoria delitivas, não se limitando a Juíza sentenciante a analisar apenas a tese defensiva de inexigibilidade de conduta diversa em razão das dificuldades financeiras sustentada pelo réu, como quer fazer crer a Defesa.
Analisando-se a r. sentença recorrida, observa-se que tanto a fundamentação utilizada para a condenação do réu, quanto as razões para a fixação da reprimenda penal são suficientes, tendo a Juíza sentenciante fundamentado o édito condenatório na comprovação da materialidade e autoria dos delitos e na ausência de provas das teses defensivas esposadas em suas alegações finais de fls.451/456 pela Defesa (fundamentação da sentença às fls. 460-verso e 464), estando a sentença ora objurgada devidamente motivada e alicerçada no artigo 93, inciso IX da CF/88.
Quanto à alegada falta de fundamentação para condenar o réu com a aplicação da regra do concurso material, quando o próprio órgão acusador o denunciou por crimes tipificados no artigo 337-A, III, do CP e artigo 1º, I, da L. 8.137/90 em concurso formal (artigo 70 do CP), confunde-se com o mérito e como tal será analisado.
c)- Terceira preliminar. Ausência de inquérito policial e de produção de provas pelo MPF. A aguerrida Defesa alega ainda que o órgão acusador não requereu instauração de inquérito policial, não arrolou qualquer testemunha, limitando-se apenas a solicitar declarações do imposto de renda da empresa - IRPJ e do réu - IRPF. Aduz que a Juíza sentenciante suprindo esta deficiência, foi buscar fora do contraditório os elementos probatórios para condenar o réu, com violação ao sistema acusatório e ao princípio da imparcialidade do Juiz, pois, de ofício, ao arrepio da lei, determinou a expedição de ofício à Receita Federal para aparelhar o aditamento da denúncia.
Inicialmente quanto à alegação de que o órgão acusador não se valeu de inquérito policial, não arrolou testemunhas, valendo-se apenas de procedimento administrativo fiscal, razões não assiste à Defesa.
Como é cediço, é plenamente dispensável o inquérito policial quando já existam elementos que permitem a propositura da ação penal. No presente caso, a materialidade delitiva já se mostrava suficientemente comprovada pelo procedimento administrativo fiscal encaminhado pela Receita Federal, e por sua vez, os indícios de autoria se revelaram pelo contrato social e posteriores alterações, no qual consta o réu como sócio-gerente da empresa "Metalúrgica Bonna Ltda", mostrando-se, portanto, absolutamente despicienda a prévia instauração de inquérito policial.
A jurisprudência, por sua vez, vem rechaçando a hipótese de indispensabilidade do inquérito policial, desde que os fatos constatados por outro meio de prova atestem a presença da materialidade e dos indícios de autoria. Confira-se:
Note-se que o próprio artigo art. 39, § 5º, do CPP, diz expressamente que o Ministério Público pode denunciar lastreado em outros meios de prova.
Descabida também a alegação de que a denúncia é inepta por não arrolar testemunhas. Consigno que os requisitos essenciais para a denúncia são: descrição dos fatos em todas as suas circunstâncias e qualificação do acusado ou apresentação dos sinais característicos que possam identificá-lo. A classificação do crime (o réu se defende dos fatos descritos na denúncia e não da sua capitulação legal) e o rol de testemunhas se houver (pode não haver rol de testemunhas) são requisitos não essenciais que se revestem de mera irregularidade (artigo 41 do CPP).
d)- Quarta preliminar. Violação ao sistema acusatório. Quanto à alegada violação ao sistema acusatório, tenho que não merece guarida a argüição da Defesa, na medida em que tal princípio é mitigado no processo penal, por força do que dispõe o artigo 156 do Código de Processo Penal, para fazer prevalecer a busca pela verdade real.
Assim, transcrevo o aludido dispositivo, que estabelece o seguinte:
Desse modo, estará autorizado o Juiz a determinar a realização de diligências de ofício, sempre que tiver em mira a busca da verdade real, para dirimir dúvidas sobre pontos relevantes do processo.
Com efeito, a Magistrada ao determinar a expedição de ofício à Receita Federal (fl.288) a pedido do Ministério Público Federal (fls.252/254), teve como finalidade trazer para os autos a certeza sobre eventual parcelamento ou pagamento do débito tributário, objeto da presente ação penal, com repercussão no deslinde do feito, pois, caso a empresa do réu tivesse aderido a um programa de parcelamento, haveria a suspensão do processo ou até mesmo extinção do processo, na hipótese de quitação da dívida, não se podendo olvidar também, que os crimes descritos nos artigos 337-A do CP e art. 1º e incisos da L. 8.137/90, em razão de sua natureza material, dependem da constituição definitiva do valor sonegado (condição objetiva de punibilidade - Súmula Vinculante nº 24). Assim a iniciativa tomada pela Juíza foi em consonância com o artigo 156, II, CPP, a fim de servir de lastro para a prolação de sua sentença, quer seja absolutória, quer condenatória, não havendo que se falar em violação ao sistema acusatório.
e)- Quinta preliminar. Violações ao princípio do contraditório e ao disposto no artigo 155 do CPP. De fato, o sistema jurídico-constitucional brasileiro não admite nem tolera a possibilidade de o Estado condenar o réu com apoio exclusivo em prova penal produzida, unicamente, na fase investigatória, sob pena de afronta aos basilares e caros princípios do contraditório e da ampla defesa.
Observo, entretanto, que a condenação do réu, ora apelante, não foi fundamentada apenas em elementos informativos colhidos apenas na fase extraprocessual, mas se amparou também no interrogatório do réu, secundado pelos depoimentos das testemunhas, realizados no decorrer da instrução criminal, sob o crivo do contraditório (fundamentação de fls.460-verso e 462).
Nesta linha de raciocínio colaciono os seguintes julgados de nossa Corte Superior:
Ademais, os documentos obtidos na fase de inquérito ou como peças de informação, apesar de terem sido obtidos antes mesmo do início da ação penal, estão submetidos ao contraditório e à ampla defesa. Não é nem mesmo de se falar em provas irrepetíveis, que teriam sido admitidas de qualquer modo, mas de provas que, por sua essência, são permanentes e passíveis de contestação a todo momento.
Destarte, na ação penal, foi oportunizada, sob o crivo do contraditório, a plena defesa do denunciado. Ao se manifestar, em seu interrogatório e em alegações finais, não trouxe aos autos nenhuma prova documental capaz de abalar a Representação Fiscal para Fins Penais - procedimento administrativo fiscal, bem como a constituição definitiva do crédito tributário e, portanto, houve justa causa para a ação penal que culminou com a condenação do réu.
Preliminares argüidas pela Defesa rejeitadas.
II - Materialidade.
A materialidade delitiva restou comprovada pela Representação Fiscal para fins Penais nº 1.34.011.000479/2008-87 (fls.03/228), devidamente concluído, acompanhado de farta documentação, que resultou no valor total indevidamente sonegado (R$180.163,09, valor este, à época dos fatos, portanto, não atualizado), detalhados nos Autos de Infrações - AI nºs 37.177.982-0 (fl.11) e pelo discriminativo de débito que o acompanha (fls. 14/20); 37.177.984-4 (fl.185) e pelo discriminativo de débito que o acompanha (fls.188/192); 37.1777.981-2 (fl.266) e pelo discriminativo de débito que o acompanha (fls.267/271). Por fim, há notícias nos autos de que o crédito tributário encontra-se definitivamente constituído (fl.260), pressuposto este necessário para a tipificação do delito, nos termos da Súmula Vinculante nº 24 do STF.
III - Autoria.
Por sua vez, a autoria delitiva também está amplamente demonstrada nos autos, haja vista que o Contrato Social da empresa e demais alterações (fls. 47/64 - cláusula sétima - fl.59), atestam que o réu era quem de fato administrava empresa, exercendo o cargo de sócio gerente, evidenciando-se, assim, a sua responsabilidade penal, tendo o réu, ainda, confessado o delito.
De fato, conforme se infere das suas declarações prestadas em interrogatório judicial (fls. 400/401), ROBERTO confessou, que à época dos fatos delituosos narrados na denúncia, era o proprietário da empresa, exercendo com exclusividade a sua gerência e administração, alegando, porém, versão exculpatória de que a sonegação de contribuição previdenciária e sonegação fiscal se deu em decorrência das dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa, tendo títulos protestados e sendo obrigado a demitir boa parte de seus funcionários.
Com efeito, o Auto de Infração - AI nº 37.177.982-0 dá conta das contribuições destinadas à Seguridade Social, correspondentes à parte dos segurados empregados e contribuintes individuais, decorrentes das remunerações pagas, que foram omitidas nas Guias de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social - GFIP-s, apuradas no período de 02/04 a 12/04 e 02/05 a 12/05 (discriminativo sintético de débito às fls.17/18), e portanto, deixaram de ser informadas no prazo legal à autoridade fazendária competente.
Já o Auto de Infração - AI nº 37.177.984-0 diz respeito às contribuições destinadas à Seguridade Social, decorrentes das remunerações pagas aos segurados empregados e contribuintes individuais, que foram omitidas nas Guias de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social - GFIP´s, apuradas no período de 02/04 a 05/04 e 08/04 a 12/04, e portanto, deixaram de ser informadas no prazo legal à autoridade fazendária competente. Ainda, reduziu indevidamente as contribuições sociais a cargo dos empregados, incidindo, assim, na conduta de sonegação de contribuição previdenciária.
E, por fim, o Auto de Infração - AI nº 37.1777.981-2 diz respeito às contribuições destinadas à Seguridade Social, decorrentes das remunerações pagas aos segurados empregados e demais fatos geradores de contribuição social, que foram omitidas nas Guias de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social - GFIP´s, apuradas no período de 02/04 a 05/04, 08/04 a 12/04 e 05 e 12/05. Ainda, reduziu indevidamente as contribuições sociais destinadas a outras entidades e fundos, tais como, salário educação, INCRA, SENAI, SESI e SEBRAI, incidindo, também, na conduta de sonegação fiscal.
A par do que ficou constatado nos autos, o dever de declarar ao INSS as contribuições da empresa devidas sobre as remunerações pagas aos seus empregados e contribuintes individuais, bem como, as contribuições destinadas a terceiros a cargo da empresa, devidas sobre as remunerações paga aos seus empregados e ao segurado empresário, por meio dos formulários previstos na legislação previdenciária (GFIP), é atributo inerente ao responsável legal da sociedade empresária, visto que têm ele o poder de gestão, inclusive prevista no contrato social. Daí decorre o vínculo dele com o sujeito passivo da obrigação tributária.
De outra feita, cabia ao apelante controlar a própria atividade da empresa, mantendo escrituração regular de seus negócios, levantando demonstrações contábeis periódicas, visando atender sua própria necessidade, a de terceiros e, sobretudo, a de cunho fiscal.
IV- Dolo.
O dolo se encontra presente. Os crimes de sonegação fiscal e sonegação fiscal previdenciária, tipificados nos artigos 1º da Lei nº 8.137/90 e 337-A, III, do Código Penal, exigem supressão ou redução de tributos ou contribuições, pela conduta de omitir informações, ou prestar declarações falsas às autoridades fazendárias, como é exatamente o caso dos autos.
Consigno que é irrelevante perquirir sobre a comprovação do elemento subjetivo (dolo), porquanto o tipo penal de sonegação de contribuição previdenciária é de natureza formal, e exige apenas o dolo genérico consistente na conduta omissiva de suprimir ou reduzir contribuição social previdenciária ou qualquer acessório.
Neste sentido julgado desta Colenda 5ª Turma, verbis:
Portanto, entendo provado o dolo na conduta do réu que deixou de informar nas GFIPs os valores das remunerações pagas ou devidas aos empregados e aos contribuintes individuais que lhe prestaram serviço, suprimindo assim contribuições devidas pela empresa, tanto para a previdência social, quanto para terceiros.
Assim sendo, restaram demonstradas, in casu, a autoria e a materialidade dos delitos, bem como o elemento subjetivo do tipo penal imputado ao apelante. Passo a análise das demais alegações de defesa de inversão do ônus da prova e de presença de uma excludente da culpabilidade.
V- Dificuldades financeiras. Inexigibilidade de conduta diversa.
Alega a Defesa do réu, ora apelante, dificuldades financeiras atravessadas pela empresa aptas a justificar a excludente de culpabilidade. Alega ainda, que houve inversão do ônus da prova, pois, a presunção de inocência prevalece mesmo diante de uma eventual incerteza acerca da ocorrência de uma causa de justificação ou exclusão de culpabilidade. Segundo a Defesa caberia ao órgão acusador fazer prova da inexistência da excludente.
Não restou comprovada a existência da causa supralegal de exclusão de culpabilidade consistente na inexigibilidade de conduta diversa. A simples alegação de dificuldade financeira, se não lastreada em robusta prova documental, não é suficiente para excluir a culpabilidade do réu, conforme já se decidiu, in verbis:
Ressalte-se que, nos casos de crimes que não envolvam diretamente bens jurídicos relacionados à pessoa natural, faz-se necessária uma maior comprovação da causa supralegal de excludente de culpabilidade, o que não ocorreu nestes autos.
Sendo que a prova testemunhal, por si só, com alegações genéricas de dificuldades financeiras por ter conhecimento que empresa passou por dificuldades em razão da crise do mercado, de ter atravessado uma época difícil, de instabilidade da empresa com "altos" e "baixos" e de que o acusado tinha um padrão de vida muito modesto (depoimento de Luiz Magalhães a fl. 353, Sérgio Pinto a fl.354 e Luiz Batista a fl. 368 - gravação audiovisual), também não seria suficiente para a demonstração da penúria econômica da empresa.
Consigno que embora tenha sido alegado pela Defesa comprometimento do patrimônio do sócio e o réu ter alegado em seu interrogatório judicial que teve títulos protestados e que foi obrigado a demitir funcionários da empresa, não trouxe aos autos qualquer documento que comprovasse que a empresa pertencente ao réu tivesse títulos protestados, sofrido execuções fiscais ou ações trabalhistas, concordata, etc. Deveria a defesa ter trazido maiores elementos de convencimento aos autos, o que, porém, não foi feito, de forma que entendo não ter ficado demonstrado nos autos os requisitos para a aplicação da exculpante, já que simples afirmações de dificuldades financeiras não têm, por si só, o condão de demonstrar não pudesse o acusado agir de forma diversa.
E por fim, a alegação de Defesa, de que houve decréscimo patrimonial do apelante em razão das dificuldades financeiras, nenhuma guarida merece, pois, como bem colocado pela douta Juíza sentenciante:
Conclui-se, portanto, que as eventuais dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa não foi devidamente comprovada, não havendo provas suficientes a excluir a ilicitude do fato ou a culpabilidade do agente.
VI- Inversão do ônus da prova.
Nesse contexto, verifica-se que os argumentos da defesa de que o ônus da prova quanto à suposta excludente de culpabilidade alegada pela própria Defesa caberia ao órgão acusador, resulta em mera tese defensiva, desprovida de lastro probatório, que não pode ser acolhida.
Frise-se que o Diploma Processual Penal, nos termos de seu artigo 156, é categórico quando determina que "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer".
Ora, como é cediço ofertada a peça acusatória, cabe ao Ministério Público a prova da materialidade e da autoria; compete-lhe provar os fatos delituosos e sua realização pelo acusado. Por outro lado, se a Defesa invoca uma causa excludente de antijuridicidade (estado de necessidade p. ex) ou de culpabilidade, como no caso concreto (dificuldades financeiras -causa supralegal de exclusão da culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa). Assim, como a Defesa alegou tal dirimente, cabia a ela o ônus de provar, pois, a prova da alegação incumbe a quem a fizer, é o princípio dominante em nosso código.
Aliás, a posição da nossa Egrégia 5ª Turma, a respeito do tema, não discrepa desse entendimento, como segue:
A prova trazida pela acusação, somada a própria confissão do réu, e as circunstâncias que envolveram os fatos, além do procedimento administrativo fiscal instaurado pela Receita Federal, todo esse conjunto de provas foi bem sopesado na sentença condenatória, não havendo que se falar em ocorrência de inversão do ônus da prova no decorrer da instrução criminal, como pretende fazer crer a defesa.
A constatação de que incumbe ao Ministério Público um ônus da prova mais significativo no processo penal, se comparado aquele do autor no processo civil, apesar de ser razoável, deve ser tomada "cum grano salis".
É que mesmo o processo penal tem natureza dialética e a verdade da decisão é retirada do embate das teses. No caso de fatos "impeditivos, modificativos ou extintivos", mesmo no processo penal, eles não fazem parte da prova da materialidade e autoria, mas se revestem de caráter de "contraprova" e, por isso, atraem mesmo o ônus da defesa em prová-los.
VII- Do concurso de crimes e da continuidade delitiva.
Por fim a marvótica Defesa, alternativamente, requer ainda, caso mantida a sentença condenatória, ora objurgada, que seja afastada, no seu entender, a equivocada imputação e condenação pelo crime tipificado no artigo 1º, I, da L. 8137/90, pois, teria cometido apenas o crime previsto no artigo 337-A, III, do CP, uma vez que os incisos I e II do art. 1º da citada Lei, foram tacitamente revogados pela L. 9.983/00 que inseriu o art. 337-A no CP. Pretende seja afastada a regra do concurso material (somatória de penas), permanecendo apenas a condenação pela infração ao disposto no art. 337-A, III, do CP, em continuidade delitiva, e por fim, a conversão da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direito, com a alteração da fixação do regime semiaberto para o aberto.
ROBERTO PRIMON, foi denunciado pelo Ministério Público Federal pela prática dos delitos previstos no art. 1º, inciso I, da Lei nº 8137/90 e no art. 337-A, inciso I, do Código Penal, combinados com o art. 70 e com o art. 71, ambos do Código Penal (denúncia de fls. 247/249 e aditamento às fls.298/2990), porque, na qualidade de administrador e representante da empresa "Metalúrgica Bonna Ltda.", teria omitido em GFIP o total das remunerações pagas aos segurados empregados e contribuintes individuais, suprimindo, dessa forma, contribuições devidas à Previdência Social (evento 01) e contribuições destinadas a terceiros(INCRA, SENAI, SESC, SEBRAE e Salário-Educação - sonegação fiscal- evento 02), durante o período compreendido entre fevereiro a dezembro de 2004 e fevereiro a dezembro de 2005, restando caracterizado, assim, os crimes previstos nos artigos 1°, inciso I, da Lei nº 8.137/90 e 337-A do CP.
Não há assim o alegado bis in idem relativamente às imputações dos delitos de sonegação de contribuição previdenciária e sonegação fiscal, já que se trata de delitos autônomos, configurando-se assim, o concurso formal de delitos, já que o agente, com uma só ação, praticou mais de um crime, devendo incidir, in casu, a regra prevista no artigo 70, do Código penal.
Nesse sentido:
Observe-se, ademais, que além do crime formal, os delitos foram praticados durante 18 meses, o que atrai também a aplicação da figura do crime continuado.
Diante dessas circunstâncias, acolho a orientação jurisprudencial no sentido de que, na concorrência entre o concurso formal heterogêneo e o crime continuado, aplica-se apenas a causa de aumento referente à continuidade delitiva sobre a pena do delito mais grave, evitando-se, assim, a ocorrência do "bis in idem".
Nesse sentido:
VIII- Dosimetria das penas.
Inicialmente, ressalto que as penas previstas nos preceitos secundários dos delitos descritos no artigo 1º, da Lei 8.137/90 e artigo 337-A, do Código Penal, são idênticas, assim como, caso concreto, as circunstâncias judiciais e o número de condutas praticadas, não há que se falar, portanto, em delito mais grave para o novo cálculo da dosimetria da pena, até mesmo porque ambas foram fixadas no patamar mínimo legal, sem recurso da acusação.
Nesses termos adoto a dosimetria da pena imposta pela prática do delito descrito no artigo 337-A, do Código Penal.
Atenta às diretrizes do artigo 59 do Código Penal, a douta Juíza sentenciante verificou pelas informações criminais constantes dos autos que o acusado é primário e não possui antecedentes criminais a desfavorecê-lo, fixando a pena-base no patamar mínimo legal, ou seja, 02 anos de reclusão, além do pagamento de 10 dias-multa.
Sem circunstâncias agravantes ou atenuantes.
Na terceira fase de fixação da pena, verifica-se que os crimes foram praticados em concurso formal e continuidade delitiva, razão pela qual deverá incidir um patamar de aumento, referente à continuidade delitiva, nos termos já expostos.
Isto posto, verifico que a Juíza sentenciante se valeu de acórdão relatado pelo Desembargador Federal Nelton dos Santos, relativamente ao crime de apropriação indébita previdenciária, descrito no artigo 168-A, do Código Penal, adotou-se o critério de aumento decorrente da continuidade delitiva segundo o número de parcelas não recolhidas, nos seguintes termos: "de dois meses a um ano de omissão no recolhimento das contribuições previdenciárias, o acréscimo é de 1/6 (um sexto); de um a dois anos de omissão, aumenta-se 1/5 (um quinto); de dois a três anos de omissão, ¼ (um quarto); de três a quatro anos de omissão, 1/3 (um terço); de quatro a cinco anos de omissão, ½ (um meio); e acima de cinco anos de omissão, 2/3 (dois terços) de aumento." (TRF 3ª Região, Segunda Turma, ACR nº 11780, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos).
Tal critério deve ser estendido aos crimes de sonegação de contribuição previdenciária e sonegação fiscal, pois também se trata de ausência de recolhimento mensal de contribuições previdenciária e fiscal e resguarda a isonomia entre casos semelhantes e é proporcionalmente razoável ao caso de delitos tributários.
A pena base foi fixada no mínimo legal e as condutas foram praticadas pelo apelante no período de 18 meses, devendo incidir a causa especial de aumento de pena prevista no artigo 71, do Código Penal, utilizando o critério acima, a Juíza sentenciante aumentou no patamar de 1/5 (um quinto), tornando definitiva a pena em 02 (dois) anos, 04 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão e 12 (doze) dias-multa, que torno definitiva.
Por fim, como conseqüência da nova dosimetria da pena imposta, fixo o regime inicial de cumprimento como o aberto.
Presentes os requisitos constantes do artigo 44, do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, consistentes em uma prestação pecuniária no valor de 10 salários mínimos e uma de prestação de serviços à comunidade. As entidades beneficiadas pelas penas restritivas de direitos ora fixadas deverão ser definidas pelo Juízo das execuções.
IX- Prequestionamento.
Invoca por fim, a combativa defesa do apelante, para fins de prequestionamento, violação a dispositivos legais e constitucionais citadas no bojo da apelação; observo, no entanto, não haver qualquer violação à lei federal (art. 156, 381,III e 386,III, VI, todos do CPP; 110,§§1º e 2º e 119, todos do CP) ou constitucional (art. 5º, XL, LVII, 93,IX e 103-A da CF/88], pois as provas coligidas nos autos foram suficientes para a formação da livre convicção motivada da Juíza, que adotou fundamentação adequada para impor ao réu o decreto de condenação.
Diante do exposto, rejeito as preliminares suscitadas e, no mérito, dou parcial provimento ao recurso interposto pela Defesa do réu ROBERTO PRIMON para, afastando a aplicação do artigo 69, do Código Penal, reconhecer a ocorrência do concurso formal de delitos, bem como do crime continuado, aplicando somente o acréscimo relativo a esta última previsão, conforme precedentes acima citados, do que resulta a pena de 02 (dois) anos, 04 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão e 12 (doze) dias-multa, substituída por duas restritivas de direitos, mantendo, quanto ao mais, a sentença nos termos em que lançada.
É COMO VOTO.
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