Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 30/06/2014
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000847-65.2004.4.03.6103/SP
2004.61.03.000847-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal NERY JUNIOR
APELANTE : Ministerio Publico Federal
PROCURADOR : FERNANDO LACERDA DIAS e outro
APELANTE : Uniao Federal
APELADO(A) : VIACAO CAPITAL DO VALE LTDA e outro
: RENE GOMES DE SOUZA
ADVOGADO : SP071403 MARIA LUCIA CARVALHO SANDIM e outro

EMENTA

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSELHO DE CONTRIBUINTES. DECISÃO. ANULAÇÃO. PEDIDO JURIDICAMENTE POSSÍVEL. ILEGITIMIDADE PASSIVA. COISA JULGADA MATERIAL. PRELIMINARES AFASTADAS. SENTENÇA CITRA PETITA. NULIDADE. INAPLICABILIDADE DA TEORIA DA CAUSA MADURA.


Embora a Lei 7.347/85 vede a veiculação da ação civil pública para pretensões que envolvam tributos, a Constituição Federal estabeleceu, no art. 129, III, que é função institucional do Ministério Público, dentre outras, a proteção do patrimônio público e social.
O pedido é juridicamente possível, estando presente a legitimidade e o interesse processual do Ministério Público Federal para propor a presente ação civil pública, que é o instrumento processual adequado para discussão da pretensão, ante a legitimação ad causam que o texto constitucional lhe confere para defender o patrimônio público, não se aplicando à hipótese o parágrafo único do artigo 1º da Lei 7.347/1985.
A legitimidade passiva dos réus é evidente. A desconstituição da eficácia do ato administrativo questionado nos autos repercutirá no âmbito dos interesses individuais dos requeridos, possuindo estes interesse na defesa da validade da decisão proferida pelo Conselho de Contribuintes.
A coisa julgada administrativa não impede a análise da matéria pelo Poder Judiciário ante a garantia da inafastabilidade da jurisdição, insculpida no art. 5º, XXXV da Constituição Federal que dispõe: a lei não excluíra da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de lesão.
A sentença acolheu as preliminares e extinguiu o feito sem julgamento de mérito, ante a falta de interesse de agir, impossibilidade jurídica do pedido e legitimidade passiva em relação em relação ao Ministério Público Federal, sem analisar as condições da ação em relação à União, permanecendo o interesse no prosseguimento do feito ao litisconsorte remanescente, implicando em julgamento citra petita que torna nulo o jugado recorrido.
Não se pode prosseguir no julgamento do mérito da questão, visto que não houve extinção do processo em relação à União. O disposto no § 3º do artigo 515 do CPC autoriza o Tribunal a enfrentar o mérito da causa quando o processo for extinto sem julgamento do mérito, no entanto, não houve tal decreto em relação à União, estando-se diante de nulidade da decisão, e não de decisão validade que não tenha apreciado o mérito da questão, ficando o Tribunal de impedido de suprimir instâncias.
Apelações providas. Sentença anulada.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento às apelações, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 05 de junho de 2014.
NERY JÚNIOR
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000847-65.2004.4.03.6103/SP
2004.61.03.000847-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal NERY JUNIOR
APELANTE : Ministerio Publico Federal
PROCURADOR : FERNANDO LACERDA DIAS e outro
APELANTE : Uniao Federal
APELADO(A) : VIACAO CAPITAL DO VALE LTDA e outro
: RENE GOMES DE SOUZA
ADVOGADO : SP071403 MARIA LUCIA CARVALHO SANDIM e outro

RELATÓRIO

Trata-se de  apelações interposta pelo Ministério Público Federal (fls. 768/780) e União contra a sentença que julgou extinto o processo, sem resolução de mérito, acolhendo as preliminares de falta de interesse de agir, impossibilidade jurídica do pedido e ilegitimidade passiva.

A presente ação civil pública foi proposta pelo Ministério Público Federal em desfavor da União, Viação Capital do Vale Ltda. e Rene Gomes de Souza, com o objetivo de desconstituir os efeitos da decisão consubstanciada no acórdão nº 101.93.617 da Primeira Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, proferida nos autos do processo administrativo fiscal nº 13884.000120/99-37, reconhecendo sua ilegalidade, com restabelecimento da autuação fiscal.


Expôs o autor na inicial que a empresa ré sofreu ação fiscal referente aos exercícios de 1993 a 1997, a partir de requisição do Ministério Público Federal, sendo lavrado auto de infração, ante a constatação de omissão da declaração de receitas tributáveis, com repercussão de mais de R$ 19.000.000,00 (dezenove milhões de reais) em tributos suprimidos, fato enquadrável no artigo 1º, inciso I da Lei nº 8.137/90.


Dispôs que a ré Viação Capital do Vale Ltda. foi autuada, tendo interposto recurso à Delegacia de Julgamento de Campinas, a qual manteve a autuação, decisão da qual interpôs novo recurso ao Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, tendo sido reformada a decisão, ao fundamento de que as provas trazidas ao processo administrativo eram insuficientes para assegurar de forma irrefutável a diferença encontrada, asseverando que os meios de prova apresentados que recomendariam um melhor aprofundamento na ação fiscal e uma investigação na situação patrimonial das pessoas envolvidas.


Apontou o autor que a decisão revelou-se ilegal ao concluir que parte do débito foi alcançado pela decadência, adotando interpretação diversa do Superior Tribunal de Justiça, que o raciocínio desenvolvido foi objeto de embargos de declaração por parte da Fazenda Nacional, os quais foram rejeitados.


Sustentou o autor que houve evidente equívoco na decisão, pois as provas apresentadas no processo administrativo são suficientes para comprovar as alegações de prática de sonegação.


Aduziu que em investigações paralelas às medidas adotadas pela Receita Federal, consistente nos autos do Procedimento Criminal Diverso n º 98.0404498-6, apenso ao Inquérito Policial 2001.61.03.000258-2, constam documentos que reforçam a conclusão de que a empresa é contumaz na prática sonegação fiscal.


Sublinha que o corréu Rene Gomes de Sousa, diretor da empresa, exercia a gerência de direito e de fato, devendo responder com seu próprio patrimônio pelos tributos em referência, para cuja supressão contribuiu ativamente.


Concluiu que a decisão proferida pela Primeira Câmara do Conselho do Ministério da Fazenda no processo nº 13884000120/99-37 está eivada de flagrante ilegalidade, pois ignorou as provas do crime de sonegação fiscal tipificado no artigo 1º, inciso I da Lei 8.137/90, e requereu provimento para desconstituir os efeitos da decisão, com restabelecimento da autuação fiscal.


Requereu ainda que fosse reconhecido por sentença a corresponsabilidade do réu Rene Gomes de Sousa, determinando-se à União que promova a inclusão em dívida ativa dos referidos débitos.


Acostados à inicial vieram os documentos de fls. 23/787. Atribuiu-se à causa o valor de R$ 19.792.952,04.


A parte ré contestou o feito às fls. 812/822 arguindo preliminarmente carência da ação decorrente da inexistência de interesse processual (inadequação da via eleita), sustentando no mérito a legalidade da decisão.

A União apresentou contestação, arguindo preliminares de ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal, impossibilidade jurídica do pedido e falta de interesse processual. No mérito defende a legalidade da decisão do Conselho de Contribuintes, asseverando que a decisão fez coisa julgada administrativa (fls. 834/45).


O Ministério Público Federal apresentou réplica às fls. 848/55.


As partes foram intimadas para especificarem as provas a serem produzidas, tendo a parte ré apresentado os documentos de fls. 868/77, sem requerer outras provas. O Ministério Público Federal postulou o julgamento antecipado do feito e a União requereu sua exclusão do polo passivo, ante a ausência de interesse de agir, e posterior inclusão no polo ativo, pleiteando a procedência da ação (fls. 880/97), o que foi deferido às fls. 928.


Os réus apresentaram alegações finais às fls. 940/52.


Em sentença proferida às fls. 956/62 a ação foi julgada extinta, sem julgamento do mérito, nos termos do artigo 267, inciso VI, do Código de Processo Civil, acolhendo-se as preliminares de falta de interesse de agir, impossibilidade jurídica do pedido e a ilegitimidade passiva.


O Ministério Público Federal interpôs apelação às fls. 977/88, pugnando pela reforma da sentença, sustentando que restou demonstrada a existência do interesse de agir, ante a violação ao patrimônio público, eis que a decisão impugnada ao anular o auto de infração, impediu a existência de um crédito em favor da União, pois os tributos não ingressaram nos cofres públicos.


Aduz que o Ministério Público Federal possui interesse jurídico em discutir a validade e a existência do crédito tributário, pois sua constituição foi erigida a condição de procedibilidade da tutela penal, assim tendo em vista que as condutas do réu Rene Gomes de Souza podem ser caracterizadas, em tese, como como penalmente típica, com procedimentos criminais já em curso, a persecução penal ficaria obstada, se mantido o ato administrativo impugnado.


Defende presença do requisito da possibilidade jurídica do pedido, pois o artigo 1º da Lei nº 7.347/85 tem a finalidade de impedir que o Ministério Público Federal tutele direitos dos cidadãos, coletivos ou individuais homogêneos em matéria tributária em face da Fazenda Pública, o que não é o caso dos autos, que visa restaurar um auto de infração com reflexos no patrimônio público e na pretensão da persecução penal.


Reitera que a decisão administrativa impugnada foi proferida pelo Conselho de Contribuinte, não existindo no Direito Brasileiro o contencioso administrativo, cabendo ao Poder Judiciário apreciar toda lesão ou ameaça de lesão a direito.


Sobre a inadequação da via eleita, expõe que a pretensão veiculada nesta ação não envolve a responsabilização penal quem quer que seja, mas a desconstituição de decisão do Conselho de Contribuintes, apresentando-se a ação civil pública como instrumento jurídico adequado para a discussão do mérito da ação.


Expõe que a legitimidade passiva dos réus é evidente, pois estes têm interesse jurídico em sustentar a validade da decisão administrativa impugnada, sendo que a União foi citada para integrar a lide, pois o Conselho de Contribuintes é órgão sem personalidade jurídica, tendo a relação jurídica se completado validamente.


Ressalta que mesmo com a exclusão do Ministério Público Federal da lide, isso não acarretaria a extinção do processo, pois o mesmo prosseguiria com a União no polo ativo, sendo imperioso que proceda à análise do mérito da ação.


Requereu a reforma da sentença e o retorno dos autos para análise de mérito, ou caso esta Corte entender cabível, o julgamento direto do mérito, nos termos do artigo 515, § 3º do CPC, condenando os réus nos termos da inicial.


A União interpôs recurso de apelação às fls. 992/1006 reafirmando seu interesse em participar da demanda, tendo em vista que o objeto é a defesa do patrimônio público e social, que constitui interesse difuso.


Aduz que o objeto desta ação cinge-se ao controle da legalidade na cobrança de tributo de contribuinte que presta serviço público de transporte coletivo na cidade de São José dos Campos, em flagrante ofensa aos princípios da livre concorrência, moralidade administrativa e supremacia do interesse público, que vem burlando a legislação fiscal em detrimento de muitos.


Requereu que a sentença fosse declarada nula, pois somente se pronunciou em relação a um dos co-legitimados, acolhendo as preliminares em relação ao Ministério Público Federal, omitindo-se em relação à União, que integra o polo ativo da ação.


Requereu que fosse dado provimento a seu recurso, a fim de que fosse declarada a nulidade da sentença, com a devolução dos autos à primeira instância, determinando-se que o mérito fosse analisado, ou que se aplique o disposto no artigo 515, § 3º do CPC.

Os réus apresentaram contrarrazões às fls. 1017/1037, requerendo a manutenção da sentença.


Remetidos os autos a esta Corte, o Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso do autor (fls. 1176/78).


É o relatório.


Dispensada a revisão nos termos regimentais.






VOTO

Trata-se de apelações interpostas pelo Ministério Público Federal e pela União, objetivando a reforma da sentença que, nos autos da ação civil pública, extinguiu o feito sem julgamento de mérito.


Antes de analisar os recursos interpostos, cumpre destacar que o Ministério Público Federal sustenta na inicial que o auto de infração fiscal constatou omissão na declaração de receitas tributáveis, com repercussão de mais de R$ 19.000.000,00 (dezenove milhões de reais) em tributos suprimidos e que as provas trazidas ao processo administrativo eram insuficientes para assegurar de forma irrefutável a diferença encontrada.


As preliminares devem ser afastadas.


Embora a Lei 7.347/85 vede a veiculação da ação civil pública para pretensões que envolvam tributos, a Constituição Federal estabeleceu, no art. 129, III, que é função institucional do Ministério Público, dentre outras, "promover o inquérito e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos".


Nesse sentido, como destacado pelo Min. Ricardo Levandowski, DJe 24.11.2010, em voto-vista no julgamento do RE 576.155/DF:


(...)

Note-se que o dispositivo constitucional, ao referir expressamente a proteção ao patrimônio público como objeto da ação civil pública, tornou inequívoca a possibilidade da sua utilização para tal fim, o que não decorria literalmente do rol constante do art. 1º da Lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), mas, agora, a ele se deve considerar incorporado.

Não faria mesmo sentido que qualquer cidadão pudesse propor ação popular visando anular ato lesivo ao patrimônio público (art. 5º, LXXIII, da Constituição) e que o Ministério Público, como defensor de toda a sociedade, não tivesse legitimidade para fazê-lo por meio de ação civil pública.

(...)

5. O parágrafo único do art. 1º da Lei 7.347/85, acrescentado pela MP 2.180-35/01, prevê o descabimento da ação civil pública para veicular pretensões que envolvam tributos. Mas deve ser interpretado em conformidade com a Constituição, e não de modo a infirmar o disposto no seu art. 129, III, já transcrito.



Tal entendimento é perfeitamente aplicável à hipótese dos autos, em que se tem o parquet tentando impedir suposta lesão ao erário, em razão do objeto da presente ação, que busca anular a decisão do Conselho de Contribuintes, que invalidou auto de infração, impedindo a existência do crédito tributário e, por consequência o ingresso do numerário de elevada monta em favor dos cofres públicos, portanto, visa à proteção do patrimônio público, sendo que a questão tributária figura apenas como pano de fundo.


Por conseguinte, o pedido é juridicamente possível, estando presente a legitimidade e o interesse processual do Ministério Público Federal para propor a presente ação civil pública, que é o instrumento processual adequado para discussão da pretensão, ante a legitimação ad causam que o texto constitucional lhe confere para defender o patrimônio público, não se aplicando à hipótese o parágrafo único do artigo 1º da Lei 7.347/1985.


Igualmente devem ser afastadas as preliminares de ilegitimidade passiva e coisa julgada administrativa, apontadas em contrarrazões.


A eventual desconstituição da eficácia do ato administrativo questionado nos autos repercutirá no âmbito dos interesses individuais dos requeridos, possuindo estes interesse na defesa da validade da decisão proferida pelo Conselho de Contribuintes, inclusive quanto ao réu Rene Gomes de Souza, visto que há pedido específico de reconhecimento de sua responsabilidade, nos termos dos artigos 135, III e artigos 137, I do Código Tributário Nacional.


Dessa forma, a legitimidade passiva dos réus é evidente, inclusive em obediência aos princípios constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa, com todos os recursos a ela inerentes.


A coisa julgada administrativa não impede a análise da matéria pelo Poder Judiciário ante a garantia da inafastabilidade da jurisdição, insculpida no art. 5º, XXXV da Constituição Federal que dispõe: a lei não excluíra da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de lesão.


Nesse sentido:



PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO .RESPONSABILIDADE CIVIL. FUNDAÇÃO DE DIREITO PRIVADO. PREJUÍZOS DECORRENTES DE MÁ-GESTÃO E DE DESVIO DE VERBAS PÚBLICAS. EX-PRESIDENTE DA ENTIDADE. SÚMULA 07/STJ. APROVAÇÃO DE CONTAS PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. NATUREZA ADMINISTRATIVA. EXCLUSÃO DE APRECIAÇÃO PELO PODER JUDICIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. DIVERGÊNCIA INDEMONSTRADA. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA DOS ACÓRDÃOS CONFRONTADOS.
1. O Recurso Especial não é servil ao exame de questões que demandam o revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, em face do óbice erigido pela Súmula 07/STJ.
2. Ação de Responsabilidade Civil ajuizada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios em face de ex-gestor de fundação, entidade civil sem fins lucrativos, em razão de má gestão e desvio de verbas ensejadoras de prejuízos à entidade no valor de R$ 4.857.086,53 (quatro milhões, oitocentos e cinqüenta e sete mil, oitenta e seis reais e cinqüenta e três centavos).
3. In casu, o reconhecimento da responsabilidade civil do demandado, ora Recorrente, pelos prejuízos suportados pela Fundação ProEducar Informática Educacional, em razão de irregularidades na gestão da referida entidade, e a condenação ao pagamento, a título de danos materiais, da quantia de R$ 4.857.086,53 (quatro milhões, oitocentos e cinqüenta e sete mil, oitenta e seis reais e cinqüenta e três centavos), decorreu de minuciosa análise do conjunto fático-probatório encartado nos autos, notadamente a análise de parecer contábil elaborado pelo Parquet do Distrito Federal, consoante se infere de excerto do voto condutor do acórdão recorrido (fls. 424/736).
4. Carece de prequestionamento a matéria não abordada em nenhum momento no iter processual, salvo em embargos de declaração, por isso que não se configura violação ao art. 535, do CPC. Precedentes do STJ: EDcl no AgRg no Ag 691.757/SC, DJ de 06.03.2006 e EDcl no REsp 446.889/SC, DJ de 22.8.2005.
5. In casu, a questão relativa à incompetência da Justiça local, para processar e julgar o feito sub examine, não foi abordada em nenhum momento no iter processual, salvo em embargos de declaração, opostos em face do acórdão de Apelação, que em nada omitiu, posto não suscitada a questão.
6. A ausência de similitude fática entre os acórdãos confrontados conduz à inadmissibilidade do Recurso Especial interposto com fulcro no art. 105, inciso III, alínea "c", da Constituição Federal.
Precedentes do STJ: EREsp 692.204/RJ, PRIMEIRA SEÇÃO, DJ de 04/09/2009; REsp 855.181/SC, SEGUNDA TURMA, DJ de 18/09/2009; e REsp 1099539/MG, PRIMEIRA TURMA, DJ de 13/08/2009.
7. É que o acórdão recorrido analisou a competência da Justiça Comum Estadual para decidir ação de responsabilidade civil ajuizada contra gestor de fundação pública, com supedâneo no art. 159 do CC/1916; e os acórdãos paradigmas, ao revés, examinaram a competência da Justiça Federal para julgar Crime de Responsabilidade de ex- Prefeito, em razão de malversação de verbas federais (RESP 613.462/PI); e demanda instaurada contra ex-prefeito para apuração de desvio de verbas públicas federais (CC 41.635/RS).
8. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido.(REsp 991.176/DF, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/12/2010, DJe 08/04/2011)

Passo a considerar o pedido de nulidade da sentença, requerido pelos apelantes.


Conforme relatado, a União apresentou defesa e posteriormente requereu a desconsideração da contestação ofertada, bem como sua exclusão do polo passivo e inclusão no polo ativo, bem como a procedência da ação, o que foi deferido, conforme decisão de fls. 928.


A sentença acolheu as preliminares e extinguiu o feito sem julgamento de mérito, ante a falta de interesse de agir, impossibilidade jurídica do pedido e legitimidade passiva em relação em relação ao Ministério Público Federal, sem analisar as condições da ação em relação à União.


Dessa forma, permanece o interesse no prosseguimento do feito ao litisconsorte remanescente, implicando em julgamento citra petita que torna nulo o jugado recorrido.


Assim, deve ser acolhida a preliminar de nulidade da sentença arguida pelos apelantes.


Entretanto, não se pode prosseguir no julgamento do mérito da questão, em aplicação ao art. 515, § 3º, do CPC, visto que não houve extinção do processo em relação à União, pois o feito foi sentenciado somente em relação ao Ministério Público Federal, sem pronunciar-se em relação ao litisconsorte remanescente.


O disposto no § 3º do artigo 515 do CPC autoriza o Tribunal a enfrentar o mérito da causa quando o processo for extinto sem julgamento do mérito, assim, inexistindo tal decreto em relação à União, está-se diante de nulidade da decisão, e não de decisão validade que não tenha apreciado o mérito da questão, ficando o Tribunal de impedido de suprimir instâncias.


Nesse sentido:


PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RECONHECIMENTO PELO TRIBUNAL A QUO DE JULGAMENTO EXTRA PETITA. JULGAMENTO DO MÉRITO. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DO ARTIGO 515, § 3º DO CPC. INAPLICABILIDADE. ERROR IN PROCEDENDO. SUPRESSÃO PELO JUIZ SINGULAR E NÃO PELO TRIBUNAL. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA.

A sentença proferida citra petita padece de error in procedendo. Se não suprida a falha mediante embargos de declaração, o caso é de anulação pelo tribunal, com devolução ao órgão a quo, para novo pronunciamento. De modo nenhum se pode entender que o art. 515, §3º, autorize o órgão ad quem, no julgamento da apelação, a 'completar' a sentença de primeiro grau, acrescentando-lhe novo(s) capítulo(s).

In casu, não há que se falar em interpretação extensiva ao artigo 515, § 3º, do CPC, quando nem sequer houve, na sentença, extinção do processo sem julgamento do mérito, requisito este essencial à aplicação do artigo 515, § 3º, da Lei Processual Civil.

Recurso provido. (REsp 756844/SC, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 15/09/2005, DJ 17/10/2005, p. 348)



PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO - IPTU - SENTENÇA CITRA PETITA - ANULAÇÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM MANTIDA.

1. Considera-se citra petita a sentença que não aborda todos os pedidos feitos pelo autor.

2. Na hipótese dos autos, havendo julgamento aquém do pedido, correto o encaminhamento dado pelo Tribunal de origem de anular a sentença para que outra seja proferida.

3. Recurso especial improvido.

(REsp 686961/RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/04/2006, DJ 16/05/2006, p. 205)



Anoto ainda, ser desnecessário a oposição de embargos de declaração, podendo a nulidade da sentença citra petita ser decretada inclusive de ofício.


Nesse sentido colhe-se o julgado:


PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA CITRA PETITA. CASSAÇÃO DE OFÍCIO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. POSSIBILIDADE. INTERPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. DESNECESSIDADE. NULIDADE RELATIVA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.

1. A nulidade da sentença citra petita pode ser decretada de ofício pelo Tribunal de origem, sendo desnecessária a prévia oposição dos Embargos de Declaração.

2. Ainda que a violação da legislação federal ocorra no julgamento da Apelação, é necessário protocolar os Embargos de Declaração para fins de prequestionamento.

3. Agravo Regimental não provido.

(AgRg no REsp 437.877/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/11/2008, DJe 09/03/2009)


Ante o exposto, voto por dar provimento aos recursos do Ministério Público Federal e da União para declarar nula a sentença e determinar o retorno dos atos para análise do mérito ou pronunciamento do que se entender de direito, em vista o julgamento citra petita da sentença.






NERY JÚNIOR
Desembargador Federal Relator


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Signatário (a): NERY DA COSTA JUNIOR:10037
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Data e Hora: 24/06/2014 14:35:53