D.E. Publicado em 16/05/2014 |
|
|
|
|
|
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, por unanimidade, de ofício, anular o processo quanto ao crime de furto qualificado, desde o recebimento da denúncia, inclusive, determinando a extração de cópia integral dos autos e remessa ao Juízo de Direito da 4ª Vara Criminal da Comarca de Guarulhos/SP; e por maioria, negar provimento à apelação do Ministério Público Federal; e dar provimento à apelação do réu JUAN CARLOS para absolvê-lo da imputação do crime do artigo 289, § 1º, nos termos do artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, nos termos do voto do Relator, acompanhado pelo voto do Desembargador Federal José Lunardelli, vencido o Juiz Federal Convocado Hélio Nogueira, que dava parcial provimento ao recurso ministerial e dava provimento à apelação da defesa, em menor extensão.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | MARCIO SATALINO MESQUITA:10125 |
Nº de Série do Certificado: | 24FC7849A9A6D652 |
Data e Hora: | 07/05/2014 20:10:08 |
|
|
|
|
|
RELATÓRIO
O Juiz Federal Convocado Márcio Mesquita (Relator):
O Ministério Público Federal denunciou, em 29/09/2006, JUAN CARLOS CASTANEDA DE LA CRUZ, JOSE LUIS OCHOA DE LA ROCA e JOSE PAULO LOPEZ QUINTEROS, qualificados nos autos, de nacionalidade peruana, nascidos, respectivamente, aos 24/06/1969, 21/12/1966 e 07/02/1954, como incursos nos artigos 155, §4º, incisos II e IV, e 289, §1º, todos do CP - Código Penal, em concurso material. Consta da denúncia:
A denúncia foi recebida em 29/08/2006 (fls. 109/110).
Após instrução, sobreveio sentença, da lavra da MM. Juíza Federal Noemi Martins de Oliveira, publicada em 19/03/2007 (fl. 618), que:
a) condenou o réu JUAN CARLOS CASTANEDA DE LA CRUZ como incurso nos artigos 155, §4º, inciso II, e 289, §1º, do CP, às penas, respectivas, de 02 anos, 02 meses e 20 dias de reclusão e 11 dias-multa, no valor unitário mínimo, e de 03 anos de reclusão e 10 dias-multa, no valor unitário mínimo, totalizando, em razão do concurso material, 05 anos, 02 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 21 dias-multa;
b) absolveu o réu JOSE LUIS OCHOA DE LA ROCA da imputação do artigo 289, §1º, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso VI, do CPP - Código de Processo Penal, e condenou-o como incurso no artigo 155, §4º, inciso II, do CP, à pena de 02 anos e 08 meses de reclusão, em regime inicial aberto, e 13 dias-multa, no valor mínimo legal, substituindo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, consistentes: i) prestação pecuniária equivalente a 10 cestas básicas, no valor de cem reais cada, destinada a entidade social a ser eleita pelo Juízo da execução, e ii) pagamento de 10 dias-multa no valor de 1/30 do salário mínimo;
c) absolveu o réu JOSE PAULO LOPEZ QUINTEROS das imputações formuladas na denúncia, com fundamento no artigo 386, inciso VI, do CPP.
Apela o réu JUAN CARLOS (fl. 645). Razões às fls. 707/716 pedindo a fixação de regime inicial menos gravoso para o cumprimento da pena.
O Ministério Público Federal também apela (fls. 647/655). Requer a) a condenação do réu JOSÉ LUIS também pelo crime de moeda falsa; b) o reconhecimento dos maus antecedentes de JUAN CARLOS e JOSÉ LUIS; c) seja afastada a atenuante da confissão espontânea de JUAN CARLOS.
Contrarrazões da Defesa de JUAN CARLOS e JOSE LUIS (fls. 675/681).
A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra da Dra. Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, opinou pelo provimento do recurso da Acusação e pelo desprovimento do recurso da Defesa (fls. 718/729).
É o relatório.
Ao MM. Revisor.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | MARCIO SATALINO MESQUITA:10125 |
Nº de Série do Certificado: | 24FC7849A9A6D652 |
Data e Hora: | 12/02/2014 16:26:53 |
|
|
VOTO
O Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA (Relator):
QUANTO AO CRIME DE FURTO QUALIFICADO, o processo deve ser anulado desde o recebimento da denúncia, inclusive, por incompetência da Justiça Federal.
Tratando-se de crime de furto em que figura como vítima particular, não havendo portanto qualquer interesse da União ou de suas autarquias e empresas, a competência da Justiça Federal somente se justificaria se houver conexão probatória ou instrumental com o crime de moeda falsa, nos termos do artigo 76, inciso III do Código de Processo Penal.
A conexão probatória ocorre quanto a prova de um crime influa na prova do outro ou, de alguma forma, seja conveniente que as provas sejam feitas no mesmo processo.
No caso dos autos, as condutas são distintas, mesmo que tenham sido praticadas pelo mesmo autor e na mesma ocasião. Uma situação é a conduta do furto, qualificado pela fraude, em que um agente se aproximou do balcão, distraiu a vítima e outro agente se apoderou da valise, e a outra conduta é a simples posse da cédula falsa que foi descoberta quando os réus foram presos pela conduta do furto. Não há nenhuma influência da prova de um fato na prova do outro fato.
Note-se que a denúncia não imputa aos réus a conduta de tentar passar as cédulas falsas no mesmo balcão do hotel, caso em que poderia se cogitar de conexão instrumental. Ao contrário, a denúncia imputa aos réus o crime do artigo 289, §1º do CP - Código Penal, na modalidade "guardar", surpreendidos portanto as cédulas quando foram presos pelo crime de furto, já no estacionamento do hotel.
Dessa forma, a prova do crime de moeda falsa restringe-se ao encontro das cédulas em poder do réu, ou seja, resume-se ao testemunho do policial que encontrou a moeda falsa no bolso de um dos acusados.
Já a prova do crime de furto é diversa, posto que alcança o esquema fraudulento para distrair a atenção da vítima, proprietária do computador, bem como a subtração propriamente dita, sendo necessária a oitiva dos policiais, da vítima do furto, e da funcionária do hotel.
Como se vê, nem as testemunhas sequer são as mesmas, exceto os policiais que efetuaram a prisão e que não presenciaram nenhuma tentativa, por parte dos réus, de passar moeda falsa.
Dessa forma, não havendo conexão probatória ou instrumental, cabe à Justiça Federal julgar apenas o crime de sua competência, qual seja, o de moeda falsa, e à Justiça Estadual o crime de furto.
No sentido de que, ausente a conexão probatória ou instrumental, não se justifica a prorrogação de competência da Justiça Federal, ainda que ambos os crimes tenha sido praticados pela mesma pessoa e nas mesmas circunstâncias de tempo e local, situa-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
Assim, anulo o processo, relativamente ao crime de furto qualificado, desde o recebimento da denúncia, inclusive, restando prejudicadas as apelações quanto ao ponto, e determino a extração de cópia integral dos autos e remessa ao Juízo de Direito da 4ª Vara Criminal da Comarca de Guarulhos/SP
QUANTO AO CRIME DE MOEDA FALSA, examino primeiramente a apelação do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL.
O recurso não prospera. Com o corréu JOSÉ LUIS, foi encontrada a quantia de $142,00 (cento e quarenta e dois dólares), cujas notas se revelaram verdadeiras, conforme laudo de fls.330-334.
Ademais, não há nos autos nenhuma prova, nenhuma declaração no sentido de que JOSÉ LUIS, ao menos, tivesse conhecimento da existência das cédulas falsas encontradas no bolso de JUAN CARLOS.
Desse modo, não prospera a apelação do Ministério Público Federal, sendo de rigor a manutenção da absolvição de JOSÉ LUIS com relação ao delito de moeda falsa.
Quanto à apelação do réu JUAN CARLOS, comporta provimento para absolver o réu.
É certo que a materialidade delitiva restou comprovada pelo laudo pericial de fls. 330-334, que examinou 04 (quatro) cédulas de $100,00 (cem dólares) apreendidas em seu poder, de numeração AB 65839937, FL 46295693B e FL 36295195B, concluindo pela autenticidade da primeira e pela falsidade das três últimas notas e que se trata de falsificação não grosseira, com capacidade de enganar o homem médio.
Também é certo que a autoria restou comprovada nos autos. As cédulas falsas foram encontradas em poder do acusado quando da realização da revista pessoal por ocasião do flagrante pela prática do delito de furto. Contudo, aduz o réu que desconhecia a falsidade das cédulas.
Contudo, não restou comprovado o elemento subjetivo do tipo, eis que no crime de moeda falsa o dolo inclui o conhecimento da falsidade. Nesse sentido a observação de José Silva Júnior, "in" Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial, de Alberto Silva Franco e outros, Ed.RT, 6ª ed., pg.3.349, quanto ao parágrafo 1º do artigo 289 do Código Penal: "o dolo aqui exigido também é o genérico, ou seja, basta o conhecimento por parte do introdutor ou passador de que a moeda é falsa".
A constatação do dolo, nos casos em que o agente nega o conhecimento da falsidade, deve ser feita de acordo com as circunstâncias em que se deu a introdução da moeda em circulação, e de sua apreensão. Nesse sentido situa-se a boa orientação jurisprudencial, v.g.:
Na se verifica, pelas circunstâncias fáticas, prova cabal para a condenação, haja vista que a afirmativa do acusado de que desconhecia a falsidade das notas apreendidas é plausível. Confira-se do excerto:
Resta evidente que o objetivo do acusado era furtar a valise e que a pergunta sobre a cotação da moeda estrangeira serviu apenas de desculpa para justificar sua presença no saguão do hotel, sem despertar maiores suspeitas. Tal fato é corroborado pela troca das valises.
Se o objetivo fosse efetuar o câmbio das cédulas falsas, como se explica o fato de o acusado já portar consigo uma valise, do mesmo tipo que a da vítima, para efetuar a troca?
É evidente que o furto fraudulento já estava previamente planejado, provavelmente com visitas anteriores ao local, onde foi identificada a potencial vítima. Os acusados entraram no hotel, fizeram uma pesquisa de cotação, observaram o local, a vítima com a maleta contendo o notebook, saíram, retornaram, se aproximaram do balcão, distraíram a recepcionista, perguntando sobre a cotação do dólar e JUAN efetuou a troca das valises.
Quando o acusado nega o conhecimento da falsidade, o dolo só pode extraído das circunstâncias de sua conduta exterior, como, por exemplo, quanto tenta efetuar compras de pouco valor para obter troco, ou quando tenta fugir ao ser abordado pela polícia, o que não ocorreu no presente caso.
Ademais, o local em que se deu a prisão não é uma casa de câmbio, mas sim o próprio saguão de um hotel. Percebe-se claramente que foi todo um esquema armado para obter a valise.
Além disso, o réu é estrangeiro, portava nota também verdadeira, negou o conhecimento da falsidade, a conduta imputada a ele é apenas de guarda não de introdução em circulação, não existindo nos autos nenhuma outra circunstância que permita superar essa negativa de conhecimento da falsidade, que é verossímil. Então, na presença de dúvida razoável, de se decidir em favor do réu.
Portanto, inexistindo prova indene de dúvidas acerca do conhecimento da falsidade das notas, impõe-se a absolvição de JUAN CARLOS, relativamente ao crime de moeda falsa.
E, absolvidos os réus, restam prejudicadas as questões levantadas na apelação do MPF quanto à dosimetria da pena.
Pelo exposto, de ofício, anulo o processo quanto ao crime de furto qualificado, desde o recebimento da denúncia, inclusive, determinando a extração de cópia integral dos autos e remessa ao Juízo de Direito da 4ª Vara Criminal da Comarca de Guarulhos/SP; nego provimento à apelação do Ministério Público Federal; e dou provimento à apelação do réu JUAN CARLOS para absolvê-lo da imputação do crime do artigo 289, § 1º, nos termos do artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, expedindo-se alvarás de soltura clausulados.
É como voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | MARCIO SATALINO MESQUITA:10125 |
Nº de Série do Certificado: | 24FC7849A9A6D652 |
Data e Hora: | 01/05/2014 11:35:25 |