Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 17/12/2014
EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0007487-68.2009.4.03.6181/SP
2009.61.81.007487-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
EMBARGANTE : MARCIO OSMAR CHAER
: FERNANDO PORFIRIO
ADVOGADO : SP174378 RODRIGO NASCIMENTO DALL ACQUA e outro
EMBARGADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00074876820094036181 1P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PENAL E PROCESSO. EMBARGOS INFRINGENTES EM APELAÇÃO CRIMINAL: CRIME DE CALÚNIA. ART. 138 C.C. 141, II, AMBOS DO CP. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. ART. 397, III, CPP. FATO ATÍPICO. EMBARGOS INFRINGENTES PROVIDOS.
1. Os acusados veicularam matéria jornalística por eles subscrita e publicada no jornal eletrônico "Consultor Jurídico" no dia 6 de fevereiro de 2009, intitulada "Medo da verdade mobiliza parceiros de Protógenes", relacionada às investigações sobre a prática, em tese, de crimes cometidos no curso da chamada Operação Satiagraha, pelo Delegado de Polícia Federal Protógenes Queiroz, na qual constou que depois de emprenhar-se pessoalmente para impedir a investigação, o Procurador da República Roberto Antonio Dassié Diana passou a acusar policiais federais de desviarem produtos apreendidos em outros inquéritos.
2. A divergência, no caso, resume-se ao fato de que o artigo 319, do Código Penal, que tipifica o crime de prevaricação, exige que, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal, o funcionário público pratique ato contra disposição expressa de lei.
3. Constitui atribuição institucional dos membros do Ministério Público Federal, prevista no artigo 129, inciso VII, da Constituição Federal, e no artigo 9º, da Lei Complementar 75/93, o dever de exercer o controle da atividade policial. Portanto, a conduta de "acusar policiais federais de desviarem produtos apreendidos em outros inquéritos" não contraria disposição expressa de lei. Ao contrário, trata-se de cumprimento de dever legal.
4. Como bem salientado no voto vencido, no trecho da matéria em que se afirma ter havido empenho pessoal do ofendido para impedir a investigação, poderia, em tese, constituir infração ao princípio da impessoalidade, mas "a suposta violação ao princípio da impessoalidade não poderia, para fins penais, ser equiparado a violação a letra expressa de lei, em razão do princípio da reserva legal."
5. Ausentes todos os elementos do crime de prevaricação, não se pode dizer que os acusados imputaram falsamente fato definido como crime ao Procurador da República, devendo ser mantida a sentença que absolveu sumariamente os réus, nos termos do artigo 397, III, do Código de Processo Penal.
6. Embargos infringentes providos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento aos embargos infringentes e de nulidade, nos termos do voto do Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO (Relator), no que foi acompanhado pelos Desembargadores Federais MARCELO SARAIVA, PEIXOTO JUNIOR, LUIZ STEFANINI e COTRIM GUIMARÃES. Ausente, justificadamente, o Juiz Federal Convocado MARCIO MESQUITA, por encontrar-se em gozo de férias.



São Paulo, 04 de dezembro de 2014.
Antonio Cedenho
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): ANTONIO CARLOS CEDENHO:10061
Nº de Série do Certificado: 775D502D1EFFAB423271D7F5825DA08F
Data e Hora: 10/12/2014 22:30:02



EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0007487-68.2009.4.03.6181/SP
2009.61.81.007487-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
EMBARGANTE : MARCIO OSMAR CHAER
: FERNANDO PORFIRIO
ADVOGADO : SP174378 RODRIGO NASCIMENTO DALL ACQUA e outro
EMBARGADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00074876820094036181 1P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:

Trata-se de Embargos Infringentes interpostos por FERNANDO PORFÍRIO e MÁRCIO OSMAR CHAER em face do v. Acórdão de fls. 266/266vº, proferido pela E. 1ª Turma desta Corte que, por maioria, deu provimento à apelação ministerial para reformar a sentença de absolvição sumária dos acusados pela prática do delito previsto no artigo 138, c.c. artigo 141, inciso II, ambos do Código Penal, e determinou o retorno dos autos à Vara de origem para a regular instrução processual, nos termos do artigo 399 e seguintes, do Código de Processo Penal, nos termos do voto da Exma. Desembargadora Federal Vesna Kolmar (relatora), no que foi acompanhada pela Exma. Juíza Federal Convocada Sílvia Rocha, vencido o Exmo. Desembargador Federal José Lunardelli que negou provimento ao recurso.

A ementa foi lavrada nos seguintes termos:

"PENAL. APELAÇÃO. ARTIGO 138 C.C 141, II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. ARTIGO 397 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. HIPÓTESE NÃO CONFIGURADA. RECURSO PROVIDO.
1. Acusados denunciados pela prática do delito previsto no artigo 138 c/c artigo 141, ambos do Código Penal.
2. Hipótese de absolvição sumária prevista no artigo 397 do Código de Processo Penal não configurado na espécie. "In casu", consoante se extrai dos elementos de prova que acompanham a denúncia, os acusados subscreveram duas matérias jornalísticas divulgadas pelos sítio "Consultor Jurídico" atribuindo ao Procurador da República Roberto Antonio Dassié Diana a conduta de empenhar-se pessoalmente para impedir a investigação contra o Delegado Federal Protógenes Queiroz, fato que em tese se subsume ao tipo penal previsto no artigo 319 do Estatuto Repressivo, uma vez que o membro do Ministério Público tem como uma de suas atribuições constitucionais o controle externo da atividade policial. Dessarte, se tal imputação for falsa, conforme afirma a vestibular acusatória, estará configurado o delito de calúnia, uma vez que os acusados atribuíram ao Procurador da República fato definido como crime de prevaricação. Dessa forma, diversamente do apontado no "decisum" ora atacado, não há falar, neste momento inicial da instrução criminal, em evidente atipicidade da conduta, o que possibilitaria a absolvição sumária dos acusados, razão pela qual é de rigor a reforma da decisão, para que a presente pretensão punitiva tenha regular processamento.
3. Apelação do Ministério Público Federal a que se dá provimento."

Em suas razões recursais (fls. 270/278), os embargantes requerem a prevalência do voto vencido, que negou provimento ao recurso do Ministério Público Federal, mantendo a sentença que absolveu sumariamente os acusados da prática do delito previsto no artigo 138, c.c. artigo 141, inciso II, ambos do Código Penal, nos termos do artigo 397, inciso III, do Código de Processo Penal.

Os embargos foram admitidos por decisão da Exma. Desembargadora Federal Vesna Kolmar (fl. 280).

A Procuradoria Regional da República requer seja negado provimento aos embargos infringentes (fls. 283/289).

É o relatório.

À revisão.


Antonio Cedenho
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): ANTONIO CARLOS CEDENHO:10061
Nº de Série do Certificado: 602B748827A71828
Data e Hora: 18/08/2014 15:49:07



EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0007487-68.2009.4.03.6181/SP
2009.61.81.007487-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
EMBARGANTE : MARCIO OSMAR CHAER
: FERNANDO PORFIRIO
ADVOGADO : SP174378 RODRIGO NASCIMENTO DALL ACQUA e outro
EMBARGADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00074876820094036181 1P Vr SAO PAULO/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:

Consta da denúncia que Fernando Porfírio e Márcio Osmar Chaer, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, caluniaram funcionário público, o Procurador da República Roberto Antonio Dassié Diana, em razão de suas funções, imputando-lhe falsamente fato definido como crime de prevaricação.

Narra a peça acusatória que:

"Roberto Antonio Dassié Diana, Procurador da República lotado na Procuradoria da República em São Paulo, representou criminalmente contra os jornalistas FERNANDO PORFÍRIO e MÁRCIO OSMAR CHAER em razão da matéria por eles subscrita e publicada no jornal eletrônico 'Consultor Jurídico' no dia 6 de fevereiro de 2009 (fls. 02/06).
Na matéria jornalística em questão, intitulada "Medo da verdade mobiliza parceiros de Protógenes", lê-se às fls. 40/43:
'O Ministério Público Federal, o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República e o comando do Tribunal Regional Federal da 3ª Região estão trabalhando para abortar as investigações sobre os desvios na chamada Operação Satiagraha.
(...)
O cerco a Mazloum e aos delegados que investigam as ações clandestinas de Protógenes extrapola o objeto da ação. Depois de emprenhar-se pessoalmente para impedir a investigação, o procurador da República Roberto Antonio Dassié Diana passou a acusar policiais federais de desviarem produtos apreendidos em outros inquéritos.'
Diante da matéria acima transcrita, referido Procurador da República encaminhou esclarecimentos ao Conjur, demonstrando que os fatos narrados eram inverídicos, afirmando que sua atuação no Procedimento Investigatório Criminal n.º1.34.001.005360/2008-10, que apura o desaparecimento de drogas e outros objetos apreendidos no âmbito da Polícia Federal, não guarda nenhuma relação com os autos do IPL n.º 2008.61.81.011893-2, em andamento na 7ª Vara Criminal Federal, que apuram supostos desvios da Operação Satiagraha. E mais, que referido PIC foi instaurado mediante a notícia de outros procuradores acerca das irregularidades ocorridas em alguns inquéritos policiais. Por fim, esclarece que o PIC em comento não objetiva investigar certos e determinados policiais federais, mas sim o desaparecimento de materiais apreendidos pela polícia federal, independentemente de quem tenha(m) sido seu(s) autor(es).
Todavia, novamente, em reportagem publicada em 07 de fevereiro de 2009, os jornalistas acrescentaram nova informação inverídica, no sentido que Roberto Antonio Dassié Diana teria instaurado um procedimento para apurar desvios dos policiais federais que atuaram na investigação contra Protógenes (fls. 45/46):
'Procurador nega ajuda para proteger Protógenes. A procuradoria da República de São Paulo enviou nota à revista Consultor Jurídico em defesa da atuação do procurador Roberto Antonio Dassié Diana nas investigações sobre as ações clandestinas do delegado Protógenes Queiroz no comando da Operação Satiagraha. Segundo a nota, o procurador 'não realizou qualquer ato para impedir as investigações'.
(...)
Segundo a nota da Procuradoria da República em São Paulo, o procurador da República "atua desde 2003 na atividade de controle externo da Polícia Federal, que inclui investigação e apresentação de denúncias criminais contra policiais Federais'. E que iniciou procedimentos para apurar suposto desvio de policiais envolvidos na investigação contra Protógenes antes de se manifestar nos autos da Satiagraha.'
Como visto, os autores das reportagens, mais do que emitirem crítica à atuação do Procurador da República Roberto Antonio Dassié Diana nos autos do inquérito nº 2008.61.81.011893-2, em trâmite perante a 7ª Vara Federal de São Paulo - crítica que se inseriria à liberdade de comunicação - ultrapassaram os limites desta liberdade de comunicação, que, como toda liberdade garantida constitucionalmente, não é ilimitada, e imputaram falsamente ao Dr. Roberto Antonio Dassié Diana fato definido como crime, atingindo, desta forma, sua honra subjetiva e objetiva.
De fato, foi imputado ao ofendido a conduta de acusar os policiais federais que investigavam os abusos cometidos na "Operação Satiagraha" de desviarem produtos apreendidos em outros inquéritos, para satisfazer sentimento pessoal, sendo a imputação falsa, já que, segundo, Roberto Antonio Dassié Diana, jamais acusou determinados policiais federais de serem autores do desaparecimento de materiais, mesmo porque as investigações não foram concluídas. E mais, ressaltou em seu depoimento na CPI das Escutas Telefônicas que não possui qualquer interesse pessoal na demanda (fls. 47/112).
Ao fazer mencionadas afirmações, os jornalistas estão imputando o delito de prevaricação a Roberto Antonio Dassié Diana, porquanto, segundo eles, ele teria praticado ato de ofício contra disposição expressa de lei para satisfazer sentimento pessoal, qual seja, favorecer o "parceiro" Protógenes e esconder a verdade, prejudicando investigação criminal.
A falsidade da imputação é demonstrada ainda, pelos documentos juntados às fls. 08, 10/11, 13/23, 24/28, 29/38, nas quais demonstram que o procedimento instaurado para investigar o sumiço de bens apreendidos pelos policiais federais em nada tem relação com a Operação Satiagraha, tampouco houve a apuração de autoria destes sumiços, o que comprova a deturpação intencional dos fatos, por parte dos denunciados, em evidente 'animus caluniandi'.
Note-se que, mesmo após ter a vítima encaminhado nota ao site, esclarecendo as falsas imputações que lhe foram feitas, houve nova veiculação de matéria afirmando que o Procurador da República teria instaurado investigação para apurar desvios dos policiais que investigavam Protógenes (fls.45).
Portanto, os jornalistas, ao imputarem falsamente o delito de prevaricação ao referido Procurador da República, em razão de sua função, praticaram, em tese, o delito tipificado no artigo 138 combinado com o artigo 141, II, do Código Penal.". (fls. 122/125).

Os ora embargantes requerem a prevalência do voto vencido do Exmo. Desembargador Federal José Lunardelli que negou provimento ao recurso do Ministério Público Federal, mantendo a sentença que absolveu sumariamente os acusados da prática do delito previsto no artigo 138, c.c. artigo 141, inciso II, ambos do Código Penal, nos seguintes termos:

"Em sessão realizada em 12 de abril de 2011, esta Egrégia Turma, por maioria, deu provimento ao recurso do Ministério Público Federal e determinou o retorno dos autos à origem para regular instrução processual, com fundamento no art. 399 e seguintes do Código de Processo Penal, nos termos do voto da Relatora, acompanhada pelo voto da Juíza Federal Convocada Sílvia Rocha.
O meu voto foi no sentido de manter a r. sentença recorrida, para absolver sumariamente os réus, com fundamento no art. 397, inciso III, do Código de Processo Penal, da prática do crime capitulado no artigo 138 c.c o art. 141, II, ambos do Código Penal.
O crime imputado aos acusados é de atribuir ao Procurador da República, Dr. Roberto Antonio Dassié Diana, falsamente, fato definido como crime.
Segundo a denúncia "foi imputado ao ofendido a conduta de acusar os policiais federais que investigavam os abusos cometidos na 'Operação Satiagraha' de desviarem produtos apreendidos em outros inquéritos para satisfazer sentimento pessoal, sendo a imputação falsa, já que, segundo Roberto Antonio Dassié Diana, jamais acusou determinados policiais de serem autores do desaparecimento de materiais, mesmo porque as investigações não foram concluídas" (fls. 124). O sentimento pessoal satisfeito seria "favorecer o 'parceiro' Protógenes e esconder a verdade, prejudicando a investigação criminal".
O crime imputado ao Procurador da República, Dr Roberto Diana, seria o de prevaricação, capitulado no art. 319 do Código Penal, in verbis:
"Art. 319. Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal."
Nos termos da notícia veiculada pelos acusados, o Procurador da República ofendido teria iniciado procedimento para apurar suposto desvio de produtos apreendidos em outros inquéritos por policiais envolvidos na investigação de Protógenes.
Consta, ainda, da reportagem que: "Segundo a nota da Procuradoria da República em São Paulo, o procurador da República 'atua desde 2003 na atividade de controle externo da polícia Federal, que inclui investigação e apresentação de denúncias criminais contra policiais Federais".
Verifica-se, portanto, que a matéria, embora possa revelar uma interpretação equivocada das situações processuais na qual o Procurador da República atuou, não lhe imputa a prática de um crime.
Isso porque o ato de investigar o "desvio de produtos apreendidos em outros inquéritos", realizado por policiais federais, não contraria disposição expressa em lei. Pelo contrário, trata-se de atribuição legal do ofendido, no âmbito de sua função institucional de controle externo da Polícia Judiciária (Polícia Federal), determinar a prática de atos investigatórios de eventuais condutas ilícitas com possível envolvimento de policiais federais.
Claro está que o art. 319 do Código Penal exige que, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal, o funcionário público pratique ato contra disposição expressa de lei, que, no caso, não ocorreu.
De outra parte, como bem salientado pela magistrada sentenciante, no momento em que uma das matérias afirma ter havido "empenho pessoal" do ofendido para impedir investigação "das ações clandestinas de Protógenes", por si só, apesar de indicar interesse ou sentimento pessoal, não se verifica imputação em todos os seus elementos do crime de prevaricação, como seria de rigor para se poder afirmar a existência de calúnia.
Isso porque, como muito bem fundamentado na r. sentença recorrida:
"Deveras, de acordo com a manifestação ministerial, ofertada após a resposta à acusação, haveria calúnia nesta parte da matéria na medida em que o afirmado "empenho" pessoal para impedir a investigação violaria o princípio da impessoalidade.
Ora, crime de prevaricação encontra-se capitulado no capítulo de crimes contra a administração pública praticados por funcionário público, de modo que, se a ausência da impessoalidade fosse suficiente para a configuração do delito, não seria necessária a presença dos outros elementos objetivos do tipo penal em questão (artigo 319, do Código Penal). Bastaria para que se configurasse o delito a pretensão de satisfação de interesse pessoal. Em outras palavras: o móvel ilícito, de per si, configuraria o crime." Grifei.
Tem-se, portanto, que a suposta violação ao princípio da impessoalidade não poderia, para fins penais, ser equiparado a violação a letra expressa de lei, em razão do princípio da reserva legal.
O Estado Democrático de Direito exige, para a aplicação de regras incriminadoras, o cumprimento de garantias sem as quais o cidadão estaria sujeito ao arbítrio institucionalizado. Imprescindível, então, que as proibições do Direito Penal sejam de todas conhecidas, e sejam precisamente delimitadas.
Por isso o elemento normativo do tipo "contra disposição expressa de lei" não pode ser equiparado a "contra disposição do princípio da impessoalidade" (ou da obrigatoriedade), pois, somente a lei, em sentido formal, pode estabelecer com segurança as prescrições penais, indicando quais condutas devam ser proibidas ou obrigatórias sob ameaça de sanção penal.
Diante de tais considerações, entendo que os fatos narrados na denúncia não descrevem prática contrária "a disposição expressa de lei" e, portanto, não tipificam o delito previsto no art. 319 do Código Penal (prevaricação), motivo pelo qual não se pode dizer que os denunciados imputaram fato definido como crime ao Procurador da República.
De rigor, a absolvição.
Diante do exposto, nego provimento ao recurso do Ministério Público Federal." (fls. 263/264).

O voto vencedor, por sua vez, deu provimento ao recurso, determinando o retorno dos autos à Vara de origem para a regular instrução processual, nos termos do artigo 399 e seguintes do Código de Processo Penal, verbis:

"Na hipótese dos autos, conforme se extrai da r. sentença, a MMª. Juíza "a quo" absolveu sumariamente acusados por entender que os fatos narrados na denúncia evidentemente não constitui o crime de calúnia (art. 138 do Código Penal).
Dispõe o mencionado preceito normativo :
"Art. 138. Caluniar alguém, imputando-se falsamente fato definido como crime:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa."
O mencionado dispositivo prevê sanção para a conduta de ofender a honra (objetiva) alheia mediante a imputação falsa de fato definido como crime.
Na hipótese dos autos, consoante se extrai dos elementos de prova que acompanham a denúncia, os acusados subscreveram duas matérias jornalística divulgadas pelos sítio 'Consultor Jurídico" atribuindo ao Procurador da República Roberto Antonio Dassié Diana a conduta de empenhar-se pessoalmente para impedir a investigação contra o Delegado Federal Protógenes Queiros, fato que em tese se subsume ao tipo penal previsto no artigo 319 do Estatuto Repressivo, uma vez que o membro do Ministério Público tem como uma de suas atribuições constitucionais o controle externo da atividade policial.
Destarte, se tal imputação for falsa, conforme afirma a vestibular acusatória, estará configurado o delito de calúnia, uma vez que os acusados atribuíram ao Procurador da República fato definido como crime de prevaricação.
Dessa forma, diversamente do apontado no "decisum" ora atacado, não há falar, neste momento inicial da instrução criminal, em evidente atipicidade da conduta, o que possibilitaria a absolvição sumária dos acusados, razão pela qual é de rigor a reforma da decisão, para que a presente pretensão punitiva tenha regular processamento.
Por esses fundamentos, dou provimento à apelação ministerial e determino o retorno dos autos à origem para a regular instrução processual nos termos do artigo 399 e seguintes do Código de Processo Penal." (fls. 261/261vº).

Em que pese o entendimento manifestado no voto vencedor, entendo que deva prevalecer o entendimento esposado pelo voto vencido, que manteve a sentença que absolveu sumariamente os acusados da prática do delito previsto no artigo 138, c.c. artigo 141, inciso II, ambos do Código Penal.

Depreende-se dos autos que os acusados veicularam matéria jornalística por eles subscrita e publicada no jornal eletrônico "Consultor Jurídico" no dia 6 de fevereiro de 2009, intitulada "Medo da verdade mobiliza parceiros de Protógenes", relacionada às investigações sobre a prática, em tese, de crimes cometidos no curso da chamada Operação Satiagraha, pelo Delegado de Polícia Federal Protógenes Queiroz.

Na matéria jornalística, dentre outras coisas, constou que: "Depois de emprenhar-se pessoalmente para impedir a investigação, o procurador da República Roberto Antonio Dassié Diana passou a acusar policiais federais de desviarem produtos apreendidos em outros inquéritos.".

A divergência, no caso, resume-se ao fato de que o artigo 319, do Código Penal, que tipifica o crime de prevaricação, exige que, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal, o funcionário público pratique ato contra disposição expressa de lei que, no meu entender, não ocorreu.

Isto porque constitui atribuição institucional dos membros do Ministério Público Federal, prevista na Constituição Federal e na Lei Orgânica do Ministério Público da União, o dever de exercer o controle da atividade policial.

Dispõe o artigo 129, inciso VII, da Constituição Federal, que:

"Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
(...)
VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior;"

E o artigo 9º, da Lei Complementar 75/93, estabelece que:

"Art. 9º O Ministério Público da União exercerá o controle externo da atividade policial por meio de medidas judiciais e extrajudiciais podendo:
I - ter livre ingresso em estabelecimentos policiais ou prisionais;
II - ter acesso a quaisquer documentos relativos à atividade-fim policial;
III - representar à autoridade competente pela adoção de providências para sanar a omissão indevida, ou para prevenir ou corrigir ilegalidade ou abuso de poder;
IV - requisitar à autoridade competente para instauração de inquérito policial sobre a omissão ou fato ilícito ocorrido no exercício da atividade policial;
V - promover a ação penal por abuso de poder."

Portanto, a conduta de "acusar policiais federais de desviarem produtos apreendidos em outros inquéritos" não contraria disposição expressa de lei. Ao contrário, trata-se de cumprimento de dever legal.

Ademais, como bem salientado no voto proferido pelo Exmo. Desembargador Federal José Lunardelli, no trecho da matéria em que se afirma ter havido empenho pessoal do ofendido para impedir a investigação, poderia, em tese, constituir infração ao princípio da impessoalidade, mas "a suposta violação ao princípio da impessoalidade não poderia, para fins penais, ser equiparado a violação a letra expressa de lei, em razão do princípio da reserva legal."

Ausentes todos os elementos do crime de prevaricação, não se pode dizer que os acusados imputaram falsamente fato definido como crime ao Procurador da República, Dr. Roberto Antonio Dassié Diana.

Assim, deve ser mantida a sentença que absolveu sumariamente os réus, nos termos do artigo 397, III, do Código de Processo Penal.

Desta forma, deve prevalecer integralmente o voto vencido, que negou provimento ao recurso do Ministério Público Federal.

Com tais considerações, DOU PROVIMENTO aos embargos infringentes.

É o voto.


Antonio Cedenho
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): ANTONIO CARLOS CEDENHO:10061
Nº de Série do Certificado: 775D502D1EFFAB423271D7F5825DA08F
Data e Hora: 10/12/2014 22:29:59