Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 16/01/2015
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0004823-25.2013.4.03.6181/SP
2013.61.81.004823-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO(A) : CARLOS ALBERTO BRILHANTE USTRA
ADVOGADO : DF036595 OCTAVIO AUGUSTO GUEDES DE FREITAS COSTA
RECORRIDO(A) : ALCIDES SINGELLO
ADVOGADO : SP015193 PAULO ALVES ESTEVES e outro
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : ALCIDES CINTRA BUENO falecido
: OCTAVIO GONCALVES MOREIRA JUNIOR falecido
No. ORIG. : 00048232520134036181 5P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. DENÚNCIA. OCULTAÇÃO DE CADÁVER. REGIME MILITAR. INDÍCIOS DE MATERIALIDADE E AUTORIA. PRESENÇA. RESTOS MORTAIS NÃO LOCALIZADOS. CRIME PERMANENTE. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. SUJEIÇÃO DO BRASIL ÀS DECISÕES DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. CASO GOMES LUND. DESAPARECIMENTO FORÇADO. NATUREZA PERMANENTE DO DELITO. EQUIVALÊNCIA COM A OCULTAÇÃO DE CADÁVER. NÃO APLICAÇÃO DA LEI DE ANISTIA. INVALIDADE PERANTE A CONVENÇÃO AMERICANA E OS PRINCÍPIOS DO DIREITO INTERNACIONAL. CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE. DISTINÇÃO. ENTENDIMENTO DO STF SOBRE A LEI DE ANISTIA. ADPF 153. COMPATIBILIDADE COM A DECISÃO INTERNACIONAL.

1 - Indícios da adoção de procedimentos destinados a ocultar e dificultar a localização do cadáver. Tentativas de localização infrutíferas até a data de hoje.
2 - Conhecimento pelos agentes do DOI-CODI da identidade de Hirohaki Torigoe desde sua captura. Sepultamento com nome distinto. Negativa de informações à família.
3 - Indícios de materialidade e autoria presentes.
4 - A ocultação de cadáver é crime permanente, cuja consumação se protrai no tempo até a localização do cadáver ou restos mortais. Precedente do STF. Inocorrência da prescrição.
5 - A Lei de Anistia abrange delitos cometidos entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979. Como o cadáver ou restos mortais não foram localizados, sendo o crime permanente, não se verifica a anistia.
6 - A sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos no "Caso Gomes Lund (Guerrilha do Araguaia) e outros vs. Brasil" é de observância obrigatória pelo Brasil, que reconheceu a jurisdição da Corte através do Decreto 4463/2002.
7 - A ressalva temporal feita pelo Brasil quando do reconhecimento da jurisdição da Corte ("fatos posteriores a 10 de dezembro de 1998") foi levada em conta na decisão. Entendimento de que o desaparecimento forçado é conduta permanente que, portanto, ultrapassa o marco temporal em questão.
8 - Ocultação de cadáver ainda em curso que se mostra equivalente ao conceito de desaparecimento forçado utilizado pela Corte.
9 - Inaplicabilidade da Lei de Anistia aos casos de desaparecimento forçado e execução extrajudicial. Regime de exceção vivido pelo Brasil e por outros países latino-americanos. Jurisprudência sedimentada da Corte Interamericana, baseada nos princípios e normas da Convenção Americana e do Direito Internacional.
10 - Decisão do E. STF na ADPF 153. Recepção da Lei de Anistia pela Constituição de 1988. Tal decisão não se mostra incompatível com a decisão da Corte Interamericana. Controle de convencionalidade que não se confunde com o controle de constitucionalidade.
11 - A jurisprudência do STF reconhece a necessidade de a norma ser compatível tanto com a Constituição quanto com a Convenção Americana, como nas decisões que resultaram na Súmula Vinculante nº 25.
12 - Ademais, o STF confere hierarquia supralegal aos tratados previstos no art. 5º, §2º, da Constituição.
13 - Competência da Corte Interamericana reconhecida pelo Brasil para interpretar e aplicar a Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de São José da Costa Rica.
14 - Recurso a que se dá provimento.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento ao recurso em sentido estrito do Ministério Público Federal, nos termos do relatório e votos que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 01 de dezembro de 2014.
PAULO FONTES
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0004823-25.2013.4.03.6181/SP
2013.61.81.004823-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO(A) : CARLOS ALBERTO BRILHANTE USTRA
ADVOGADO : DF036595 OCTAVIO AUGUSTO GUEDES DE FREITAS COSTA
RECORRIDO(A) : ALCIDES SINGELLO
ADVOGADO : SP015193 PAULO ALVES ESTEVES e outro
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : ALCIDES CINTRA BUENO falecido
: OCTAVIO GONCALVES MOREIRA JUNIOR falecido
No. ORIG. : 00048232520134036181 5P Vr SAO PAULO/SP

VOTO CONDUTOR

Ressalto inicialmente meu profundo respeito e admiração pelo E. Des. Fed. André Nekatschalow, a quem peço vênia para divergir, observando, contudo, que o voto de Sua Excelência no presente caso, como em tantos outros, é fruto de reflexão pessoal autêntica e profunda, sempre em busca da resposta judicial mais correta e adequada. Divido o meu pensamento em três partes para enfrentar o presente recurso: i) Elementos fáticos - indícios de materialidade e autoria; ii) Da natureza permanente do crime de ocultação de cadáver; iii) Decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso "Gomes Lund e outros vs. Brasil" : observância necessária.


I - ELEMENTOS FÁTICOS - INDÍCIOS DE MATERIALIDADE E AUTORIA


Inicialmente, vislumbro, nos autos, indícios suficientes de materialidade e autoria para o recebimento da denúncia.

Com efeito, o Ministério Público Federal imputa aos denunciados CARLOS ALBERTO BRILHANTE USTRA e ALCIDES SINGILLO o crime consistente na ocultação do cadáver do militante Hirohaki Torigoe, morto em 05 de janeiro de 1972.

Hirohaki Torigoe, estudante de medicina, era militante político dissidente do regime militar, atuando segundo os autos na facção denominada MOLIPO, dissidência da ALN. Os militantes pertencentes ao MOLIPO foram intensamente procurados por agentes do DOI-CODI durante os anos de 1971 e 1972, tendo sido toda a direção do movimento morta naquele período.

Segundo a versão oficial, Hirohaki Torigoe foi morto ao resistir à prisão no dia 05 de janeiro de 1972. Como portava documentos em nome de Massahiro Nakamura, a requisição de autópsia, o próprio laudo pericial, o sepultamento e o registro de óbito foram todos feitos sob esse último nome. A denúncia dá conta de que o denunciado BRILHANTE USTRA, ouvido pelo Ministério Público Militar em 15 de outubro de 2009, afirmou que os agentes não tinham conhecimento da verdadeira identidade do militante, o que era comum acontecer, e por isso ele foi enterrado com o nome falso que utilizava.

O Ministério Público Federal contesta a versão e traz elementos suficientes a embasar sua tese.

Ao que tudo indica, os agentes do DOI-CODI, quando se confrontaram com Torigoe, no dia de sua morte, sabiam de quem se tratava, pois era um dos militantes mais procurados, com mandado de prisão contra si expedido pela Justiça Militar e divulgação de sua foto e nome verdadeiro veiculados em cartazes constantes dos autos. Segundo duas testemunhas, que estavam presos naquele dia nas dependências do DOI-CODI em São Paulo, ouviram quando a prisão de Hirohaki Torigoe foi anunciada pelos agentes, aduzindo ainda que, ao contrário da versão oficial, ele chegou vivo à repartição e foi torturado antes de sua morte.

No mesmo sentido, os documentos trazidos com a denúncia atestam que a morte de Hirohaki Torigoe somente foi noticiada pela imprensa escrita em 20 de janeiro de 1972, 15 dias após o óbito. Contudo, relevante documento avistável no volume 2 do Procedimento Investigatório Criminal-PIC anexo (volume que se encontra sob a capa de "apenso"), às fls. 270 e seguintes, consistente em "reunião da CI de 12 de janeiro de 1972" - onde CI significa "comunidade de informações" - contém a informação de que Torigoe fora morto, do que se infere o conhecimento de sua identidade.

Portanto, é razoável nessa fase processual inferir-se que os agentes do DOI-CODI sabiam da identidade de Torigoe já no momento de sua captura e morte e, mesmo assim, fizeram-no sepultar sob nome falso, dificultando a identificação do túmulo pela família que até hoje não localizou os seus restos mortais - apesar das inúmeras tentativas de que dá conta a denúncia, capitaneadas pelo Ministério Público Federal.

A certidão de óbito foi, pois, lavrada em nome de Massahiro Nakamura, avistável às fls. 256 do mesmo apenso mencionado acima. Importante também o documento de fls. 255, em que o Delegado titular da DEOPS, encaminhando a certidão em questão, informa ao Juízo da Auditoria da 2ª Região Militar que Hirohaki Torigoe "foi sepultado com o nome de Massahiro Nakamura."

A família de Torigoe, segundo depoimento de seu irmão constante dos autos, chegou a se dirigir ao DOI-CODI mesmo antes da divulgação da morte pela imprensa, em busca de notícias suas, tendo recebido a resposta de que ele não havia dado entrada naquela repartição. Posteriormente, obteve a retificação judicial do registro de óbito, que foi então lavrado corretamente, com o nome de Hirohaki Torigoe, conforme se observa da certidão constante às fls. 147 do volume 1 do PIC apenso - tendo sido feito o registro em 27/12/1972 por determinação judicial. Quanto à localização do corpo, a família tentou ainda durante o regime militar a sua localização no cemitério de Perus, não obtendo êxito, tendo sido feitas novas tentativas de identificação já sob a nova ordem constitucional, por iniciativa do MPF, como dito acima, também sem sucesso.

Assim, presentes os indícios de materialidade do crime de ocultação de cadáver, vislumbram-se da mesma forma indícios de autoria pelos denunciados.

Quanto ao Delegado ALCIDES SINGILLO, à época lotado na DEOPS, tomou declarações em 24/01/1972 do verdadeiro Massahiro Nakamura, estudante de economia, que compareceu à repartição por ter lido a notícia da morte de Torigoe e também que ele utilizava falsamente o seu nome. Parte do depoimento está transcrito na denúncia, havendo, pois, indícios de que ALCIDES SINGILLO ao menos teria se omitido do seu dever legal de retificar o registro de óbito e fazer à família de Torigoe as comunicações devidas.

Quanto a CARLOS ALBERTO BRILHANTE USTRA, foi o comandante operacional do DOI-CODI-II Exército entre 28 de setembro de 1970 e 23 de janeiro de 1974, havendo nos autos notícia de diversos desaparecimentos, mortes e episódios de tortura ocorridos nas dependências sob sua chefia, havendo ainda informações de que tinha absoluto controle sobre as atividades dos seus subordinados. A denúncia enumera outros casos em que os militantes foram enterrados com nomes falsos, dificultando a localização dos seus corpos pelos familiares e eventuais apurações. O MPF chega a invocar a teoria do domínio do fato que, segundo Cezar Roberto Bitencourt, foi desenvolvida na Alemanha sobretudo por Claus Roxin, para dar conta de crimes cometidos pelos nazistas, afirmando este último autor que "quem ocupasse uma posição dentro de uma chamado aparato organizado de poder e dá o comando para que se execute um crime, tem de responder como autor e não só como partícipe, ao contrário do que entendia a doutrina dominante na época", sendo, pois, de acordo com esse enfoque, necessário examinar quem detém o "controle final do fato".

Assim, presentes indícios capazes de propiciar a abertura da ação penal.


II - DA NATUREZA PERMANENTE DO CRIME DE OCULTAÇÃO DE CADÁVER

Aqui, pedindo vênias ao E. Relator, que trilhou caminho distinto, e indo diretamente ao ponto, adoto a tese que penso majoritária na doutrina e na jurisprudência de que o crime de ocultação de cadáver tem natureza de crime permanente, isto é, segue sendo consumado enquanto o cadáver ou restos mortais não são localizados, o que, de igual modo, impede o fluxo do prazo prescricional.

Precedente do Supremo Tribunal Federal tratou a matéria da seguinte maneira:

EMENTA: HABEAS-CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO PRATICADO CONTRA MENOR, COM QUATRO ANOS DE IDADE, E OCULTAÇÃO DE CADÁVER. ALEGAÇÕES DE ATIPICIDADE DO CRIME DE OCULTAÇÃO DE CADÁVER, FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA DE PRONÚNCIA E INCOMPATIBILIDADE ENTRE QUALIFICADORAS E AGRAVANTES. 1. Retirar o cadáver do local onde deveria permanecer e conduzi-lo para outro em que não será normalmente reconhecido caracteriza, em tese, crime de ocultação de cadáver. A conduta visou evitar que o homicídio fosse descoberto e, de forma manifesta, destruir a prova do delito. Trata-se de crime permanente que subsiste até o instante em que o cadáver é descoberto, pois ocultar é esconder, e não simplesmente remover, sendo irrelevante o tempo em que o cadáver esteve escondido. Crime consumado, que pode ser apenado em concurso com o de homicídio. 2. Sentença de pronúncia que atende às exigências mínimas do artigo 408 do CPP e suficientemente fundamentada. A pronúncia, sentença processual que é, deve conter apenas sucinto juízo de probabilidade, pois, se for além, incidirá em excesso de fundamentação, o que pode prejudicar a defesa do paciente. 3. Os crimes imputados e as qualificadoras constam da denúncia e seus aditamentos. Na pronúncia o Juiz não deve excluir as qualificadoras, salvo as manifestamente improcedentes, levando em conta que não é de rigor nem recomendável cuidar de circunstâncias agravantes ou atenuantes, que permanecerão no libelo crime acusatório a fim de serem submetidas ao soberano Tribunal do Júri. 4. Habeas-corpus conhecido, mas indeferido.
(HC 76678, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Segunda Turma, julgado em 29/06/1998, DJ 08-09-2000 PP-00005 EMENT VOL-02003-03 PP-00434)

Ora, no presente caso, como descrito no item anterior, as condutas objetivaram não a simples remoção do cadáver, mas, nos exatos termos do precedente supracitado, consistiram na adoção de procedimentos capazes propriamente de ocultá-lo. Não encontrados até hoje os restos mortais de Hirohaki Torigoe, não há que se falar na prescrição do delito, nem na aplicação da Lei de Anistia (Lei 6.683/79), que no seu artigo primeiro abrange delitos cometidos no lapso temporal compreendido entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979.

A natureza permanente desse delito está igualmente reconhecida na decisão Gomes Lund da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que é tratada abaixo.


III - DECISÃO DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS NO CASO "GOMES LUND E OUTROS VS. BRASIL" : OBSERVÂNCIA NECESSÁRIA


É sabido que, após as assombrosas práticas verificadas na Segunda Guerra Mundial, consolidou-se no cenário internacional uma maior preocupação com a proteção dos direitos humanos, sobrevindo a adoção de normas como a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 e de mecanismos de proteção dotados de maior eficácia. Atribuem-se a esse contexto, igualmente, as transformações observadas no Direito Constitucional de diversos países, com a explicitação dos direitos fundamentais e a propagação do controle de constitucionalidade das leis. O Direito Internacional, por sua vez, postulará maior amplitude e força frente à outrora intocável soberania dos Estados; são criados sistemas regionais de proteção dos direitos humanos, como a Convenção Europeia dos Direitos do Homem de 1953, que criou a Corte Europeia dos Direitos do Homem, sediada em Estrasburgo, na França, com jurisdição sobre todos os países membros do tratado.


Seguindo a lógica dos sistemas regionais de proteção dos direitos humanos, em 1969 foi adotada a Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de São José da Costa Rica. O Brasil ratificou a referida Convenção em 25/09/1992, tendo ela sido promulgada através do Decreto 678, de 06/11/1992. Posteriormente, após aprovação do Congresso Nacional, foi reconhecida como obrigatória a competência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, nos termos do Decreto 4463, de 08/11/2002:


Art. 1o É reconhecida como obrigatória, de pleno direito e por prazo indeterminado, a competência da Corte Interamericana de Direitos Humanos em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José), de 22 de novembro de 1969, de acordo com art. 62 da citada Convenção, sob reserva de reciprocidade e para fatos posteriores a 10 de dezembro de 1998.

Vê-se, pois, que o Brasil somente reconheceu a competência da Corte posteriormente à ratificação, e fê-lo com as ressalvas da reciprocidade e "para fatos posteriores a 10 de dezembro de 1998."

Em 24 de novembro de 2010, adveio sentença oriunda da Corte Interamericana no "caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia) vs. Brasil", com importantes consequências para o caso sub examine.

Nessa decisão, que trata do desaparecimento de militantes envolvidos na Guerrilha do Araguaia, no seu parágrafo de nº 256, consta que "este Tribunal dispõe que o Estado deve conduzir eficazmente a investigação penal dos fatos do presente caso, a fim de esclarecê-los, determinar as correspondentes responsabilidades penais e aplicar efetivamente as sanções e consequências que a lei disponha." Obriga, ainda, a:

b) determinar os autores materiais e intelectuais do desaparecimento forçado das vítimas e da execução extrajudicial. Ademais, por se tratar de violações graves de direitos humanos, e considerando a natureza dos fatos e o caráter continuado ou permanente do desaparecimento forçado, o Estado não poderá aplicar a Lei de Anistia em benefício dos autores, bem como nenhuma outra disposição análoga, prescrição, irretroatividade da lei penal, coisa julgada, ne bis in idem ou qualquer excludente similar da responsabilidade para eximir-se dessa obrigação, nos termos dos parágrafos 171 a 179 desta Sentença,

Nos parágrafos a que remete, a Corte Interamericana aplicou sua jurisprudência, afirmada em relação a outros países latino-americanos que também enfrentaram regimes de exceção, no sentido da invalidade das leis de anistia, nos contextos analisados, perante o Direito Internacional.

Importante salientar que a ressalva temporal feita pelo Brasil no Decreto 4463/2202 ("fatos posteriores a 10 de dezembro de 1998") foi levada em conta pela Corte (parágrafos 15 a 19 e 181). A Corte reconhece a validade da ressalva temporal, mas aduz que, em sua jurisprudência constante,

"este Tribunal estabeleceu que os atos de caráter contínuo ou permanente perduram durante todo o tempo em que o fato continua(...) a Corte recorda que o caráter contínuo ou permanente do desaparecimento forçado de pessoas foi reconhecido de maneira reiterada pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos, no qual o ato de desaparecimento e sua execução se iniciam com a privação da liberdade da pessoa e a subsequente falta de informação sobre seu destino, e permanecem até quando não se conheça o paradeiro da pessoa desaparecida e os fatos não tenham sido esclarecidos." (parágrafo 17 da sentença)

Passo a tecer algumas considerações que entendo relevantes para o deslinde do presente feito:

- Primeiramente, penso não haver dúvidas de que o Brasil está sujeito à jurisdição da Corte Interamericana, pelos atos de ratificação e reconhecimento da competência da Corte acima mencionados;

- Por outro lado, entendo que a decisão do STF na ADPF 153, que considerou ter sido a Lei de Anistia recepcionada pela Constituição de 1988, não representa óbice ao cumprimento da decisão da Corte Interamericana;

- Isso porque cabe precipuamente à Corte Interamericana o chamado "controle de convencionalidade" das leis e atos normativos que se mostrem incompatíveis com a Convenção Americana, controle este que também pode e deve ser exercido pela jurisdição nacional;

- A necessidade de compatibilidade normativa tanto com a Constituição Federal quanto com a Convenção Interamericana fica muito clara com a decisão do STF no HC 90172/SP, que culminou na Súmula Vinculante nº 25, que veda a prisão civil do depositário infiel. Tal modalidade de prisão foi considerada incompatível com o Pacto de São José da Costa Rica, embora seja permitida pela Constituição brasileira. Assim sendo, a Lei de Anistia pode igualmente mostrar-se compatível com a Constituição e incompatível com a Convenção;

- Ademais, a adesão à Convenção levou ao reconhecimento de uma regra de competência - a da Corte Interamericana de Direitos Humanos - para apreciar soberanamente casos em que se alegue o descumprimento da Convenção;

- Ainda nessa linha de raciocínio, é mister salientar que o Supremo Tribunal Federal reconhece aos tratados sobre direitos humanos, mesmo àqueles previstos no art. 5º, §2º, da Constituição, hierarquia supralegal;

- Por fim, os autores mais abalizados do Direito Internacional afirmam que a obrigatoriedade de observância pelo Brasil ocorre tanto diante da coisa julgada quanto da "coisa interpretada", ou seja, o país deve aplicar o entendimento consagrado pela Corte a outros casos que envolvam a mesma matéria.


Fixada a obrigatoriedade de dar cumprimento à decisão da Corte, de forma genérica, faz-se necessário esclarecer alguns aspectos pertinentes ao presente feito. Apesar da diferença de nomenclatura - pois não temos no nosso direito interno as figuras legais do "desaparecimento forçado" e da "execução extrajudicial" - é certo que podemos associá-las aos delitos de ocultação de cadáver e homicídio. No caso dos autos, como o cadáver e os restos mortais de Hirohaki Torigoe não foram ainda encontrados, aplicam-se as considerações da Corte sobre a permanência e continuidade do ilícito consistente no desaparecimento forçado, acima explicitadas, sendo necessário dar cumprimento à decisão que determina a investigação, processamento e julgamento das infrações. Restam afastadas, assim, de acordo com o entendimento da Corte Interamericana, tanto a prescrição do delito quanto a eventual aplicação ao caso da Lei de Anistia.

Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso e receber a denúncia em face de CARLOS ALBERTO BRILHANTE USTRA e ALCIDES SINGILLO.


PAULO FONTES
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES:67
Nº de Série do Certificado: 3DDA401E3F58F0FE
Data e Hora: 13/01/2015 14:31:32



RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0004823-25.2013.4.03.6181/SP
2013.61.81.004823-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO(A) : CARLOS ALBERTO BRILHANTE USTRA
ADVOGADO : DF036595 OCTAVIO AUGUSTO GUEDES DE FREITAS COSTA
RECORRIDO(A) : ALCIDES SINGELLO
ADVOGADO : SP015193 PAULO ALVES ESTEVES e outro
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : ALCIDES CINTRA BUENO falecido
: OCTAVIO GONCALVES MOREIRA JUNIOR falecido
No. ORIG. : 00048232520134036181 5P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra a sentença de fls. 634/635 que reconheceu a prescrição e decretou extinta a punibilidade dos réus com base no art. 107, IV, do Código Penal c. c. o art. 397, IV do Código de Processo Penal.

O Ministério Público Federal recorre com os seguintes argumentos:

a) os fatos narrados na denúncia amoldam-se ao tipo do art. 211 do Código Penal, que prevê conduta permanente e não instantânea de efeitos permanentes, como mencionado pelo Juízo a quo e, consequentemente, não ocorreu a prescrição, que nunca se iniciou;
b) não estão presentes os requisitos para que as condutas praticadas pelos agentes estatais sejam beneficiadas pela Lei de Anistia (Lei n. 6.683/75), ainda que considerada a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal nos Autos da ADPF n. 153/DF;
c) as condutas imputadas aos acusados constituem-se crimes de lesa-humanidade e não podem deixar de ser punidas com fulcro em causas extintivas da punibilidade como a prescrição e anistia;
d) a inicial narrou conduta grave e permanente que sequer cessou até o hoje e, portanto, não se operou a prescrição ou outra causa extintiva da punibilidade, razão pela qual, o presente recurso deve ser recebido e provido (fls. 640/671).

Carlos Alberto Brilhante Ustra oferece contrarrazões em que sustenta o quanto segue:

a) não é responsável pela ocultação do cadáver de Hiroaki Torigoe;
b) após 42 (quarenta e dois) anos, o cadáver não mais será encontrado, pois perdeu suas características;
c) a melhor classificação do delito imputado ao recorrido é de crime instantâneo de efeito permanente, sujeito à prescrição, contada a partir de sua consumação;
d) o intuito da presente ação penal é quebrar a segurança jurídica;
e) imagine-se que a morte de Hiroaki Torigoe não se enquadrasse na Lei n. 6.683/79 e que fosse cometida arbitrariamente, ainda assim, atualmente, estaria extinta a punibilidade pela prescrição, tornando desarrazoada, desproporcional e incompreensível a punição de agentes, hoje, pelo crime de ocultação do cadáver, pois o crime principal estaria prescrito e o acessório não;
f) não se pode aceitar o caráter permanente do crime de ocultação de cadáver, pois era público e notório o local onde se encontram os restos mortais do de cujus;
g) ao contrário do que sustenta a denúncia, os dados do de cujus não foram forjados, pois ele próprio vivia de forma ilegal;
h) prequestiona a tentativa de violação aos arts. 2º, 5º, XXXVI, XXXVII e XL, da Constituição da República (fls. 683/696).

Alcides Singillo apresenta contrarrazões nos seguintes termos:

a) com a promulgação da Lei n. 6.683/79, ocorreu a anistia quanto à suposta prática de crime contra Aluízio Palhano Pedreira;
b) é ilegal os recorridos serem julgados após a anistia, pelos supostos crimes praticados nas dependências do DOI, porque estaria ferido o princípio norteador da anistia;
c) não há provas dos fatos alegados na inicial (fls. 699/711).

O Juízo a quo manteve a sentença recorrida por seus próprios fundamentos (fl. 712).

Manifesta-se a Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Rose Santa Rosa, pelo provimento do recurso (fls. 715/720v.).

Dispensada a revisão nos termos regimentais.

É o relatório.


VOTO

Os recorridos foram denunciados pelo delito do art. 211 do Código Penal, uma vez que, em decorrência do óbito de Hirohaki Torigoe em 5 de janeiro de 1972, ocultaram o respectivo cadáver.
Segundo a denúncia, o falecido era membro de organização de esquerda denominada Movimento de Libertação Popular - Molipo, dissidência da Ação Libertadora Nacional - ALN, constituída em 1971 a partir do retorno de um grupo de 28 (vinte e oito) militantes treinados em Cuba. Esclarece que, em 1971, o Molipo começou a ser atingido pelos órgãos de repressão, sendo que no período entre novembro de 1971 e outubro de 1972, pelo menos 15 (quinze) dos seus integrantes morreram quando se encontravam sob o poder (custódia) do Estado. Desses integrantes, 10 (dez) morreram em São Paulo. Em relação a 5 (cinco) desses casos, verificou-se o mesmo método de eliminação dos vestígios do crime: a) os documentos de identificação dos cadáveres foram dolosamente falsificados, malgrado o conhecimento da sua real identidade; b) a notícia da morte das vítimas ("em confronto com os órgãos de segurança") divulgada depois de vários dias da ocorrência; c) as famílias tomavam conhecimento do fato pela imprensa, quando já sepultados os cadáveres; d) o local exato do sepultamento era omitido nas certidões de óbito; e) os cadáveres foram sepultados de modo a dificultar ou impossibilitar sua localização nos cemitérios de Vila Formosa e de Perus.
No caso de Hirohaki Torigoe, a denúncia aduz que a vítima era alvo de perseguição pelos órgãos de repressão política em São Paulo, os quais tinham pleno conhecimento da verdadeira identidade do cadáver. Nesse sentido, consta documento existente no Arquivo Nacional (lista de foragidos difundida pelo Ministério do Exército), datado de 8 de junho de 1971, no qual se registra o nome, qualificação e fotografia, com solicitação de sua prisão (indiciado em terceiro inquérito sobre atividades da VPR). Ainda, o II Exército difundiu também o Relatório Periódico de Informações n. 12/71 (RPI n. 12/71), com esses dados e codinomes. Há, conforme a denúncia, 1.293 páginas de documentos relacionados à vítima e pertencentes ao DEOPS armazenadas no Arquivo Público do Estado. Nos arquivos do DEOPS, os resumos dos registros policiais da vítima somam 6 (seis) páginas datilografadas. Em 1970, foram lançadas 13 (treze) anotações no prontuário da vítima, dentre as quais assalto a um "Peg-Pag" e a um carro-forte do Banco Nacional. Em 10 de agosto de 1979, uma testemunha informou que a vítima morava na região da Liberdade e frequentava um restaurante chinês (a denúncia registra pormenores desse registro, além de outras informações constantes do prontuário, como a decretação de sua prisão preventiva em 24.12.70). Em janeiro de 1971, sobreveio nova decretação de prisão preventiva. Em maio de 1971, indiciamento em Inquérito Policial Militar (IPM), como elemento de alta periculosidade e intensamente procurado. Consta também pedido de condenação à morte apresentado pelo Procurador Militar à 2ª Auditoria de Guerra de São Paulo. Havia um cartaz com o nome e a fotografia da vítima sob o título "Bandidos Terroristas Procurados pelos Órgãos de Segurança Nacional". Disso tinha ciência a vítima, cujo irmão Shunhiti Torigoi, relatou, em dezembro de 1971, que aquele lhe confidenciara pressentir que seria preso e morto (era o único vivo dentre os que figuravam no cartaz). Conclui a denúncia que os órgãos de repressão em São Paulo (DOI-CODI do II Exército e DEOPS) estavam empenhados em "persegui-lo e matá-lo" (fl. 14), tendo prévio conhecimento de sua identidade e das atividades armadas por ele realizadas.
Assim é que, em 5 de janeiro de 1972, subordinados do acusado Carlos Ustra "lograram alcançar Torigoe" (fl. 15). Acrescenta que a vítima foi levada com vida ao DOI-CODI, onde foi torturada antes de morrer, ao contrário do que consta na requisição do exame necroscópico e no laudo respectivo. O Ministério Público Federal fundamenta essa afirmação com base nas declarações de duas testemunhas que se encontravam nas dependências do DOI-CODI naquela ocasião, a saber: a) Francisco Carlos de Andrade e (b) André Tsutomu Ota, também membros da organização, os quais, detidos, ouviram os policiais referirem-se à captura de "Décio", codinome da vítima, que se encontrava ferida. Esta dizia que não tinha medo dos policiais, ouvindo-se ruídos de paus e ferros, seguindo-se silêncio. Segundo os "torturadores" (sic, fl. 17), a vítima teria sido presa na rua e reagido, daí a razão por que foi ferido (cfr. fls. 15/17). Essas declarações são roboradas pelo documento denominado "Reunião da Comunidade de Informações em São Paulo", encontrado nos arquivos do DEOPS, ata de reunião datada de 12 de janeiro de 1972, segundo a qual dentre as baixas na organização incluía-se a da vítima, vale dizer, Hirohaki Torigoe ("Décio" ou "Rubens"). Essa ata confirma que a vítima foi capturada justamente porque sua identidade era conhecida e que o anúncio de sua morte foi feito à comunidade de informações menos de 7 (sete) dias antes da família tomar conhecimento do fato por intermédio da imprensa, isso em 19 de janeiro de 1972.
Segue-se então, na denúncia, a descrição das condutas comissivas e comissivas por omissão praticadas no DOI-CODI para a ocultação do cadáver da vítima (item 2.3, fls. 19/22). Aduz que agentes desse órgão (a) mentiram aos pais da vítima, sonegando-lhe dolosamente informações sobre o paradeiro de seu falecido filho, "a tempo de concluírem a consumação do crime de ocultação do cadáver" e (b) postergaram em 15 (quinze) dias a divulgação da morte do "terrorista", sob a falsa alegação de que a apuração da sua verdadeira identidade foi demorada. Esclarece que os pais das vítimas foram até o DOI-CODI antes da divulgação da notícia do óbito, mas os funcionários do destacamento sonegaram-lhe a informação de que seu filho fora morto naquele local e que seu corpo fora clandestinamente sepultado sob nome falso (transcreve declarações, fls. 19/20). Segundo documentos, a notícia de que Hirohaki Torigoi morreu após tiroteio com agentes de segurança somente foi publicada nos jornais 15 (quinze) dias após o óbito, quando já oculto o cadáver. Segundo os noticiosos, afora a dinâmica do evento, somente então foi divulgada a notícia "porque os documentos encontrados em poder do terrorista identificavam-no como Massahiro Nakamura (...). Após intensa e prolongada busca nos arquivos datiloscópicos foi levantada a verdadeira identidade do morto" (fl. 21). Essa informação é falsa, conforme declarações das testemunhas Francisco Carlos de Andrade e André Tsutomu Ota, segundo as quais os responsáveis pela prisão e interrogatório já conheciam desde o início a identidade da vítima. O mesmo vale em relação à ata da reunião da comunidade de informações datada de 12 de janeiro de 1972 (cfr. supra).
A denúncia passa então a tratar das condutas comissivas e comissivas por omissão praticadas no DEOPS e voltadas à ocultação do cadáver. Nesse tópico, a denúncia aborda aspectos concernentes (a) à requisição de exame, (b) ao laudo de exame de corpo de delito, (c) à certidão de óbito, (d) a Alcides Singillo, (e) ao cemitério, (f) aos pais e ao irmão da vítima e, por fim, (g) ao inquérito civil público instaurado pelo Ministério Público Federal para apuração dos fatos.
A requisição de exame elaborada no DEOPS contém falsidade ideológica, pois atribui o nome de Massahiro Nakamura ao cadáver, que segundo esse documento foi conduzido despido ao IML por viaturas do DOI, devendo o laudo ser remetido ao DEOPS. Consta ainda a entrada no IML às 21h30 do dia 05.01.72 e a anotação de terem sido extraídos do cadáver 7 (sete) projéteis de arma de fogo, os quais foram entregues ao Dr. Cintra (DEOPS). O corpo foi submetido à necropsia elaborada pelo Dr. Isaac Abramovitch e sepultado em local não indicado no cemitério de Perus, às 14h do dia 07.01.14, tendo sido, o sepultamento, realizado pelo necrotério do IML. O óbito foi registrado no cartório do Jardim América. As requisições dos laudos somente foram obtidas por familiares de desaparecidos políticos na década de 1990.
O laudo de exame de corpo de delito foi registrado no dia 13.01.72, subscrito pelos legistas Isaac Abramovich e Abeulard Orsini, segundo os quais "nos foi apontado (o cadáver) como sendo o de Massahiro Nakamura". Foi registrado com nome falso após a reunião da comunidade de informações (cfr. supra), o que comprova, diz a denúncia, a omissão deliberada em informar ao IML a verdadeira identidade do cadáver. Apenas a cópia do IML ficou preservada e oculta, somente tendo sido encontrada após a nova ordem constitucional, durante o Governo Orestes Quércia, depois da notícia da existência de vala clandestina no cemitério de Perus. Os laudos assinalados com a letra "T", a designar que o morto foi classificado como "terrorista".
A certidão de óbito foi lavrada com base nos dados falsos fornecidos pelo DEOPS e pelo DOI-CODI, assim reproduzidos pelo IML (dados de Massahiro Nakamura). Não consta dela a localização exata do sepultamento, mas apenas referência ao cemitério de Perus. Figura como declarante o PM lotado no IML, Miguel Fernandes Zaninello, já falecido. A declaração de óbito por PMs só era autorizada na ausência dos demais legitimados, conforme estabelece o Decreto n. 4.857/39. No entanto, não foram procurados familiares para fazer essa declaração, seja os da vítima, seja os de Massahiro Nakamura (omissão dolosa para perpetrar o delito de ocultação de cadáver, conclui a denúncia).
Alcides Singillo era Delegado de Polícia lotado no DEOPS e colheu declarações do verdadeiro Massahiro Nakamura em 24.01.72, mas absteve-se de promover a retificação perante o Cartório de Registro Civil, o IML e a Justiça Militar. A comunicação de sepultamento sob o nome falso somente foi informada em julho de 1972, em atendimento à solicitação do Ministério Público Militar para remeter a certidão de óbito de Hirohaki Torigoe. José A. da Silva, escrivão, informou ao Delegado Titular Alcides Cintra Bueno, já falecido, que Hirohaki Torigoe foi sepultado com o nome de Massahiro Nakamura (cfr. fl. 31). Pelo Ofício n. 567/72, de 18.07.72, foi encaminhada à Auditoria Militar a certidão de óbito de Hirohaki Torigoe, que foi sepultado com o nome de Massahiro Nakamura (não foi encaminhada a certidão de óbito da vítima, mas sem referência à troca de nomes).
O cemitério de Perus, inaugurado em 1971 (fl. 35), até hoje tem o registro de Hirohaki Torigoe e continua mantido em erro. Inumou-se o corpo de Massahiro Nakamura em 08.01.72 e, em 06.10.76, o corpo foi exumado e reinumado, sempre na sepultura n. 65, da Quadra n. 2, Gleba n. 1, da Rua n. 15.
Os pais e o irmão da vítima, durante anos, foram impedidos de exumar o cadáver sepultado com o nome de Massahiro Nakamura, o que lhes impediu de verificar se o corpo seria realmente da vítima.
Foi instaurado inquérito civil público pelo Ministério Público Federal. Nele, em 25.09.07, foi atendida a requisição ministerial para exumar os despojos inumados na sepultura n. 1.250 (antiga n. 65). Foi elaborado o Laudo Antropológico n. 35/07, segundo o qual nenhuma das ossadas seria compatível com a da vítima. Em 02.09.08, peritos do IML atenderam à requisição do MPF para exumar ossadas de outra sepultura, mas em 2009 o laboratório Genomic atesta que os restos mortais periciados não são da vítima.
O Ministério Público Federal assim sintetiza as condutas delitivas: a) sepultamento clandestino do cadáver em 7 ou 8 de janeiro de 1972; b) falsificação dos documentos de óbito; c) negativa aos pais da vítima que esta estaria custodiada no DOI-CODI antes da divulgação do óbito; d) retardamento em 2 (duas) semanas da divulgação do óbito; e) omissão dos documentos da vítima (a denúncia refere-se a "todos os perseguidos políticos", fl. 36) sepultada com nome falso ou como indigente; f) proibição aos familiares que exumassem ou trasladassem o corpo sepultado sob o nome de Massahiro Nakamura.
Sobre a autoria delitiva, particularmente quanto ao acusado Carlos Alberto Brilhante Ustra, esclarece ter sido comandante operacional daquela unidade entre 28 de setembro de 1970 e 23 de janeiro de 1974, conhecido pelo codinome "Dr. Tibiriçá", sob cujo comando havia um efetivo de 250 (duzentos e cinquenta) homens. Afirma que o DOI-CODI do II Exército "foi, notoriamente, um dos piores e mais violentos centros de repressão política do regime ditatorial" (fl. 38). Cita monografia do coronel Freddie Perdigão Pereira nesse sentido, bem como o trabalho Direito à Memória e à Verdade. Quanto aos fatos objeto da denúncia, acrescenta:

(...) na condição de comandante do Destacamento de Operações Internas do II Exército, confessadamente dirigido as atividades dos executores dos atos comissivos e comissivos por omissão voltados a essa finalidade. (destaques no original, fl. 39)

As atividades são aquelas mencionadas nos itens a a f acima.
A denúncia reporta versão e declaração oferecida pelo acusado, ouvido em 15 de outubro de 2009, pelo Ministério Público Militar, segundo a qual a vítima morreu na rua, em combate com seus subordinados, que reagiram, tendo sido levado o corpo ao DOI e, em seguida, feito contato com o DOPS para encaminhamento ao IML para autópsia e abertura de inquérito (fls. 42/44).
A denúncia contraria a versão do acusado, pois (a) as testemunhas Francisco Carlos de Andrade e André Tsutomu Ota, como dito acima, ouviram a vítima quando trazida para a unidade; b) fac-símiles do jornal O Estado de São Paulo, "assim como os demais veículos da imprensa escrita" (fls. 42/43) somente divulgaram o falecimento no dia 20 (vinte), portanto 15 (quinze) dias após o óbito; c) a vítima era intensamente procurada, o que contraria a versão do réu de que teria demandado, a identificação, prolongada busca nos órgãos respectivos; d) a ata da reunião da comunidade de informações (12.01.72) também demonstra a ciência de que o morto não era Massahiro Nakamura, mas o procurado "terrorista" do Molipo, Hirohaki Torigoe; e) as testemunhas já referidas aduzem que o verdadeiro nome do preso foi anunciado pelos agentes responsáveis pela sua prisão antes do óbito. A denúncia acrescenta que o réu confessou saber a verdadeira identidade do falecido ("apesar de se saber, através de fotografias, o nome de nascimento, foi enterrado com o nome dos documentos que portava ao morrer") (fl. 43).
A denúncia refere-se à testemunha André Ota, segundo a qual a tortura e os interrogatórios eram realizados sob ordens do acusado Carlos Alberto Brilhante Ustra. No mesmo sentido, ex-presos políticos e o ex-"analista de informações" Marival Chaves Dias do Canto, para quem se desenvolveu uma cultura de matar e depois "criar um teatrinho para justificar a morte ou, então, chamar o legista para enterrar naquele cemitério clandestino" (fl. 44), aduzindo que entre 1969 e 1972 foi o período em que se mais matou e mais se ocultaram cadáveres.
Sobre a autoria delitiva atribuída ao acusado Alcides Singillo, aduz a denúncia que esse réu esteve lotado no Departamento de Ordem Política e Social de São Paulo - DEOPS/SP entre 1º de abril de 1970 e 25 de abril de 1975, condição em que deixou de comunicar a correta identificação e localização do corpo da vítima à sua família, ao cemitério onde supostamente sepultado e ao Cartório de Registro Civil onde o óbito foi registrado, contribuindo desse modo para a ocultação dos restos mortais.
Ao tomar as declarações de Massahiro Nakamura, em 24 de janeiro de 1972, deixou de cumprir sua obrigação legal de promover a devida retificação dos dados falsos do falecido no Cartório de Registro Civil, no IML e no cemitério, em conformidade com as obrigações estabelecidas nas Convenções de Genebra I II e IV (1949) relacionadas ao tratamento dos cadáveres vítimas de hostilidades (cfr. fl. 47). A denúncia cuida de discorrer sobre o dever do acusado:

O especial dever de agir deflui, pois, do risco provocado por conduta omissiva anterior dolosa do próprio denunciado e da conduta comissiva de outra autoridade da mesma delegacia, consistente no preenchimento de requisição de laudo necroscópico com dados sabidamente falsos, com o fim de promover a ocultação do cadáver e dos vestígios do homicídio. (destaques no original, fl. 49)
Por fim, a denúncia formula pedido de condenação dos réus pelo delito do art. 211 do Código Penal, requerendo a aplicação de agravantes (cfr. fls. 50/52).
Discutir a validade da Lei n. 6.683, de 28.08.79, conhecida como Lei da Anistia, não é tarefa profícua, considerando que o Supremo Tribunal Federal já proclamou não somente essa validade mas também sua abrangência bilateral:

EMENTA: LEI N. 6.683/79, A CHAMADA "LEI DE ANISTIA". ARTIGO 5º, CAPUT, III E XXXIII DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL; PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO E PRINCÍPIO REPUBLICANO: NÃO VIOLAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIAS HISTÓRICAS. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E TIRANIA DOS VALORES. INTERPRETAÇÃO DO DIREITO E DISTINÇÃO ENTRE TEXTO NORMATIVO E NORMA JURÍDICA. CRIMES CONEXOS DEFINIDOS PELA LEI N. 6.683/79. CARÁTER BILATERAL DA ANISTIA, AMPLA E GERAL. JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA SUCESSÃO DAS FREQUENTES ANISTIAS CONCEDIDAS, NO BRASIL, DESDE A REPÚBLICA. INTERPRETAÇÃO DO DIREITO E LEIS-MEDIDA. CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA A TORTURA E OUTROS TRATAMENTOS OU PENAS CRUÉIS, DESUMANOS OU DEGRADANTES E LEI N. 9.455, DE 7 DE ABRIL DE 1997, QUE DEFINE O CRIME DE TORTURA. ARTIGO 5º, XLIII DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. INTERPRETAÇÃO E REVISÃO DA LEI DA ANISTIA. EMENDA CONSTITUCIONAL N. 26, DE 27 DE NOVEMBRO DE 1985, PODER CONSTITUINTE E "AUTO-ANISTIA". INTEGRAÇÃO DA ANISTIA DA LEI DE 1979 NA NOVA ORDEM CONSTITUCIONAL. ACESSO A DOCUMENTOS HISTÓRICOS COMO FORMA DE EXERCÍCIO DO DIREITO FUNDAMENTAL À VERDADE. 1. Texto normativo e norma jurídica, dimensão textual e dimensão normativa do fenômeno jurídico. O intérprete produz a norma a partir dos textos e da realidade. A interpretação do direito tem caráter constitutivo e consiste na produção, pelo intérprete, a partir de textos normativos e da realidade, de normas jurídicas a serem aplicadas à solução de determinado caso, solução operada mediante a definição de uma norma de decisão. A interpretação/aplicação do direito opera a sua inserção na realidade; realiza a mediação entre o caráter geral do texto normativo e sua aplicação particular; em outros termos, ainda: opera a sua inserção no mundo da vida. 2. O argumento descolado da dignidade da pessoa humana para afirmar a invalidade da conexão criminal que aproveitaria aos agentes políticos que praticaram crimes comuns contra opositores políticos, presos ou não, durante o regime militar, não prospera. 3. Conceito e definição de "crime político" pela Lei n. 6.683/79. São crimes conexos aos crimes políticos "os crimes de qualquer natureza relacionados com os crimes políticos ou praticados por motivação política"; podem ser de "qualquer natureza", mas [i] hão de terem estado relacionados com os crimes políticos ou [ii] hão de terem sido praticados por motivação política; são crimes outros que não políticos; são crimes comuns, porém [i] relacionados com os crimes políticos ou [ii] praticados por motivação política. A expressão crimes conexos a crimes políticos conota sentido a ser sindicado no momento histórico da sanção da lei. A chamada Lei de anistia diz com uma conexão sui generis, própria ao momento histórico da transição para a democracia. Ignora, no contexto da Lei n. 6.683/79, o sentido ou os sentidos correntes, na doutrina, da chamada conexão criminal; refere o que "se procurou", segundo a inicial, vale dizer, estender a anistia criminal de natureza política aos agentes do Estado encarregados da repressão. 4. A lei estendeu a conexão aos crimes praticados pelos agentes do Estado contra os que lutavam contra o Estado de exceção; daí o caráter bilateral da anistia, ampla e geral, que somente não foi irrestrita porque não abrangia os já condenados --- e com sentença transitada em julgado, qual o Supremo assentou --- pela prática de crimes de terrorismo, assalto, seqüestro e atentado pessoal. 5. O significado válido dos textos é variável no tempo e no espaço, histórica e culturalmente. A interpretação do direito não é mera dedução dele, mas sim processo de contínua adaptação de seus textos normativos à realidade e seus conflitos. Mas essa afirmação aplica-se exclusivamente à interpretação das leis dotadas de generalidade e abstração, leis que constituem preceito primário, no sentido de que se impõem por força própria, autônoma. Não àquelas, designadas leis-medida (Massnahmegesetze), que disciplinam diretamente determinados interesses, mostrando-se imediatas e concretas, e consubstanciam, em si mesmas, um ato administrativo especial. No caso das leis-medida interpreta-se, em conjunto com o seu texto, a realidade no e do momento histórico no qual ela foi editada, não a realidade atual. É a realidade histórico-social da migração da ditadura para a democracia política, da transição conciliada de 1979, que há de ser ponderada para que possamos discernir o significado da expressão crimes conexos na Lei n. 6.683. É da anistia de então que estamos a cogitar, não da anistia tal e qual uns e outros hoje a concebem, senão qual foi na época conquistada. Exatamente aquela na qual, como afirma inicial, "se procurou" [sic] estender a anistia criminal de natureza política aos agentes do Estado encarregados da repressão. A chamada Lei da anistia veicula uma decisão política assumida naquele momento --- o momento da transição conciliada de 1979. A Lei n. 6.683 é uma lei-medida, não uma regra para o futuro, dotada de abstração e generalidade. Há de ser interpretada a partir da realidade no momento em que foi conquistada. 6. A Lei n. 6.683/79 precede a Convenção das Nações Unidas contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes --- adotada pela Assembléia Geral em 10 de dezembro de 1984, vigorando desde 26 de junho de 1987 --- e a Lei n. 9.455, de 7 de abril de 1997, que define o crime de tortura; e o preceito veiculado pelo artigo 5º, XLIII da Constituição --- que declara insuscetíveis de graça e anistia a prática da tortura, entre outros crimes --- não alcança, por impossibilidade lógica, anistias anteriormente a sua vigência consumadas. A Constituição não afeta leis-medida que a tenham precedido. 7. No Estado democrático de direito o Poder Judiciário não está autorizado a alterar, a dar outra redação, diversa da nele contemplada, a texto normativo. Pode, a partir dele, produzir distintas normas. Mas nem mesmo o Supremo Tribunal Federal está autorizado a rescrever leis de anistia. 8. Revisão de lei de anistia, se mudanças do tempo e da sociedade a impuserem, haverá --- ou não --- de ser feita pelo Poder Legislativo, não pelo Poder Judiciário. 9. A anistia da lei de 1979 foi reafirmada, no texto da EC 26/85, pelo Poder Constituinte da Constituição de 1988. Daí não ter sentido questionar-se se a anistia, tal como definida pela lei, foi ou não recebida pela Constituição de 1988; a nova Constituição a [re]instaurou em seu ato originário. A Emenda Constitucional n. 26/85 inaugura uma nova ordem constitucional, consubstanciando a ruptura da ordem constitucional que decaiu plenamente no advento da Constituição de 5 de outubro de 1988; consubstancia, nesse sentido, a revolução branca que a esta confere legitimidade. A reafirmação da anistia da lei de 1979 está integrada na nova ordem, compõe-se na origem da nova norma fundamental. De todo modo, se não tivermos o preceito da lei de 1979 como ab-rogado pela nova ordem constitucional, estará a coexistir com o § 1º do artigo 4º da EC 26/85, existirá a par dele [dicção do § 2º do artigo 2º da Lei de Introdução ao Código Civil]. O debate a esse respeito seria, todavia, despiciendo. A uma por que foi mera lei-medida, dotada de efeitos concretos, já exauridos; é lei apenas em sentido formal, não o sendo, contudo, em sentido material. A duas por que o texto de hierarquia constitucional prevalece sobre o infraconstitucional quando ambos coexistam. Afirmada a integração da anistia de 1979 na nova ordem constitucional, sua adequação à Constituição de 1988 resulta inquestionável. A nova ordem compreende não apenas o texto da Constituição nova, mas também a norma-origem. No bojo dessa totalidade --- totalidade que o novo sistema normativo é --- tem-se que "[é] concedida, igualmente, anistia aos autores de crimes políticos ou conexos" praticados no período compreendido entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979. Não se pode divisar antinomia de qualquer grandeza entre o preceito veiculado pelo § 1º do artigo 4º da EC 26/85 e a Constituição de 1988. 10. Impõe-se o desembaraço dos mecanismos que ainda dificultam o conhecimento do quanto ocorreu no Brasil durante as décadas sombrias da ditadura.
(STF, ADPF n. 153, Rel. Min. Eros Grau, j. 29.04.10)
A título de prequestionamento, o Ministério Público Federal invoca diversos dispositivos constitucionais, mas não esclarece em que medida seria possível conciliar a pretendida declaração de inconstitucionalidade com o decidido pelo Supremo Tribunal Federal.
Os princípios que regem a cidadania e a dignidade da pessoa humana (CR, art. 1º, II e III), a harmonia entre os Poderes, ou melhor, a legalidade (CR, art. 2º), o objetivo da República Federativa do Brasil no sentido de construir uma sociedade livre, justa e solidária (CR, art. 3º, I), a prevalência dos direitos humanos (CR, art. 4º, II), a igualdade entre homens e mulheres (ou talvez o princípio da legalidade) (cfr. fls. 670v., 656v.) (CR, art. 5º, II), o devido processo legal (CR, art. 5º, LIV), conforme se percebe, são referidos na medida em que seu caráter principiológico e geral faculta, com efeito, que sob eles sejam incluídos diversos argumentos - não destituídos de algum significado político - reveladores de um certo inconformismo em relação ao reconhecimento, pelo Supremo Tribunal Federal que, em uma palavra, a lei é válida e aplicável igualmente aos integrantes dos organismos do Estado e aos que agiam contra este.
Propugna o Ministério Público Federal, contudo, que se exerça um controle de "convencionalidade":

Outrossim, o julgamento da ADPF não esgotou o controle de validade da Lei de Anistia, pois atestou a validade da Lei nº 6.683/79 com a Constituição da República brasileira, mas não em relação ao direito internacional. O STF efetuou o controle de constitucionalidade da norma de 1979, mas não se pronunciou a respeito da compatibilidade da causa de exclusão da punibilidade com os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Estado brasileiro. Ou seja, não efetuou - até porque não era esse o objeto da ação - o chamado "controle de convencionalidade" da norma. (fl. 660v.)

A primeira alegação quanto a esse ponto consiste no fato de o Brasil ter sido condenado por decisão cogente e vinculante pela Corte Interamericana de Direitos Humanos de 24 de novembro de 2010, no caso Gomes Lund:
E, como sabido, em 24 de novembro de 2010, o Brasil foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Gomes Lund ("Guerrilha do Araguaia", ocasião em que a Corte afastou os efeitos da Lei da Anistia brasileira e condenou o Brasil a não mais invocá-la como óbice à investigação de casos de graves violações de direitos humanos. Esta decisão da Corte Interamericana impõe ao Estado brasileiro o dever de investigar e sancionar as graves violações aos direitos humanos referentes ao período da ditadura militar brasileira (...). (fl. 662)
Essa decisão é transcrita nas razões de apelação (fls. 662v./663v.), dando ensejo à invocação dos arts. 4º, II, 5º, §§ 2º e 3º, da Constituição da República e do art. 7º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias:

Art. 4º. A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
(...)
II - prevalência dos direitos humanos (...)
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
§ 2º. Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
§ 3º. Os tratados e as convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.
Art. 7º. O Brasil propugnará pela formação de um tribunal internacional dos direitos humanos.

O Ministério Público Federal menciona o artigo 68.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica):

Art. 68
Os Estados-Partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes.

Desse conjunto de dispositivos, extrai a acusação a seguinte conclusão:

Até que o STF venha a se posicionar sobre a decisão da Corte no caso em tela - o que, se ocorrer em sentido contrário, pode abrir uma crise internacional para o país - todos os magistrados devem cumprir a decisão mais recente, proferida pelo Tribunal competente. (destaques no original, fl. 665)
Essa ordem de argumentação é associada a dispositivos da própria Convenção segundo os quais os Estados-Partes comprometem-se a respeitar os direitos e liberdades nela reconhecidos (na Convenção) e a garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa que esteja sujeita à sua jurisdição, sem discriminação alguma por motivo de raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição social (art. 1º, 1), ressalvado que, se o exercício desses direitos ainda não estiver garantido por disposições legislativas ou de outra natureza, os Estados-Partes comprometem-se a adotar, de acordo com as suas normas constitucionais e com as disposições da Convenção, as medidas legislativas ou de outra natureza que forem necessárias para tornar efetivos tais direitos e liberdades.
Em última análise, pretende o Ministério Público Federal que seja "cumprida" a decisão proferida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos em 24 de novembro de 2010, sob o fundamento de que esta de certo modo prevalece sobre a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na ADPF n. 153, afastando a declaração de sua validade e abrangência.
Não consta, porém, que a decisão proferida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos tenha obliterado a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal. Nestes autos, aquela é meramente citada sem que se identifiquem efetivamente seus efeitos para a economia deste processo, isto é, em que medida seus efeitos criam, extingam ou modificam direitos de caráter processual ou de direito material no que respeita ao regular andamento da ação penal. Em princípio, o juiz goza de independência no âmbito de sua função jurisdicional, cumprindo-lhe aplicar a lei ao caso concreto mediante o exercício de seu entendimento, segundo o Direito. Essa atividade somente é obstruída em decorrência de decisão que tenha a propriedade de substituir ou, de qualquer modo, reformar sua decisão. Os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil não afetam esse pressuposto, que de resto é facilmente compreensível. Nem é preciso maiores digressões, pois o fenômeno é, na sua natureza, idêntico ao que ocorre no âmbito das obrigações assumidas pelo Brasil no âmbito interno. Daí que não há razão, de caráter processual, para não guardar a tradicional reverência ao julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal.
Para além de uma eventual propriedade jurídica da decisão proferida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos quanto ao efetivo andamento desta ação penal, a ordem de problemas propostos pelo Ministério Público Federal evoca a consideração dessa mesma decisão - ou de outras de caráter análogo - da perspectiva hermenêutica, singelamente, não desconsiderando os tratados, em si mesmos, e sua aplicabilidade pelo juiz, não mais para simples "cumprimento", mas sim por entender ser correta em seu conteúdo.
A dificuldade aí surgida, porém, deve ser apreciada com alguma cautela. Pois nada indica que o entendimento segundo o qual os pactos posteriores tenham, nos limites de sua compreensão tradicional no País, a propriedade de gerar efeitos retroativos, ressalvadas as exceções conhecidas, dentre as quais a própria anistia: prescrever efeitos jurídicos para fatos ocorridos anteriormente à sua vigência é medida que, usualmente, não se admite.
Fato é, contudo, que no caso específico dos autos não foram deduzidas alegações suficientemente persuasivas para que seja proclamada a invalidade da Lei da Anistia. Com efeito, os argumentos deduzidos nas razões de apelação do Ministério Público Federal, na sua essência, versam sobre os aspectos meramente formais decorrentes dos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, sem precisar, de modo claro, em que medida, afora a citada decisão da Corte Interamericana, o conteúdo da Lei da Anistia contraria um ou outro dispositivo estabelecido em norma internacional (cfr. fls. 659/666v.) Será no tópico concernente à prescrição (tema a ser analisado abaixo), que o órgão ministerial sustenta que o fato imputado aos acusados consiste em "crime contra a humanidade" (fl. 666v.). Ainda que para o limitado efeito de sustentar a imprescritibilidade, convém observar que, no ponto, há algo de contraditório:

Segundo a jurisprudência assente da Corte Interamericana de Direitos Humanos as graves violações a direitos humanos que configuram crimes contra a humanidade são caracterizadas pela prática de atos desumanos, como o homicídio, a tortura, as execuções sumárias, extralegais ou arbitrárias, e os desaparecimentos forçados, dentre outros, cometidos em contexto de ataque generalizado e sistemático contra uma população civil, em tempo de guerra ou paz.
Este é precisamente o caso descrito nos autos, pois induvidoso o caráter desumano das práticas adotadas pelos denunciados no contexto já referido, que, ao ocultarem o cadáver de Hiroaki Torigoe, privam até os dias atuais - por mais de quarenta anos - seus familiares de verem respeitados seus direitos à verdade e ao sepultamento digno dos restos mortais da vítima. (fl. 667)

Surge aqui a dificuldade em se reconhecer como de lesa-humanidade a ocultação de cadáver, remanescendo insuscetível de punição - por força da Lei da Anistia - a tortura e o homicídio que estão contidos na abrangente descrição dos fatos na denúncia. Não seria possível isolar o fato de seu contexto, mas daí se segue a dificuldade de aduzir nesse mesmo contexto proposições reciprocamente excludentes: o fato principal, cuja maior gravidade é evidente, é imune aos argumentos fundamentados no seu caráter de lesa-humanidade, ao contrário do fato subalterno, de menor gravidade, e que pode ser entendido como mero expediente para assegurar a impunidade quanto ao primeiro.
Tais ponderações conduzem à conclusão seguinte: não há fundamento consistente para proclamar a invalidade da Lei n. 6.683, de 28 de agosto de 1979.
Prossegue o Ministério Público Federal no sentido de que os fatos objeto da denúncia não se encontram abrangidos pelos dispositivos dessa Lei, em especial no que se refere ao período por ela mesma definido em relação ao qual haveria a extinção da punibilidade, conforme consta de seu art. 1º:

Art. 1º É concedida anistia a todos quantos, no período compreendido entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações vinculadas ao poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares (vetado).
§ 1º - Consideram-se conexos, para efeito deste artigo, os crimes de qualquer natureza relacionados com crimes políticos ou praticados por motivação política.
§ 2º - Excetuam-se dos benefícios da anistia os que foram condenados pela prática de crimes de terrorismo, assalto, seqüestro e atentado pessoal.
§ 3º - Terá direito à reversão ao Serviço Público a esposa do militar demitido por Ato Institucional, que foi obrigada a pedir exoneração do respectivo cargo, para poder habilitar-se ao montepio militar, obedecidas as exigências do art. 3º.

Entende o Ministério Público Federal que somente os fatos ocorridos entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1975 foram anistiados. No caso, como se trata de crime permanente (questão discutida abaixo), isso não se verifica.
Sem prejuízo do tema relativo à natureza do crime de ocultação de cadáver, uma leitura atenta da denúncia não sugere que expressamente tenha descrito condutas atribuídas aos acusados praticadas para além dos limites supramencionados: o acusado Carlos Alberto Brilhante Ustra exerceu o cargo de comandante operacional do DOI-CODI do II Exército entre 28 de setembro de 1970 e 23 de janeiro de 1974 (fl. 34) enquanto que o acusado Alcides Singillo esteve lotado no Departamento de Ordem Política e Social de São Paulo - DEOPS entre 1º de abril de 1970 e 25 de abril de 1975 (fl. 46). Dado que a acusação concentra-se nas condutas por eles praticadas na condição de agentes do Estado, resulta daí evidente que os fatos efetivamente ocorreram no período abrangido pelo art. 1º da Lei n. 6.683/79.
Não passa despercebido que a denúncia refere-se às condutas "comissivas e comissivas por omissão" (cfr. fls. 19 e 22), pois é intuitivo que o delito de ocultação de cadáver é comissivo, ensejando a cautela não somente de descrever as condutas "positivas" como aquelas "negativas" que, de alguma forma, concorrem para o resultado. Tais condutas, nesse ponto, são aquelas da denúncia e, enquanto tais, quedam-se no período já mencionado. Outro problema, escusado dizer, consiste na natureza mesma do crime (permanente, fatos posteriores etc.). Aqui, apenas, rejeita-se a alegação de inaplicabilidade da Lei por esse motivo.
Não tenho dúvida a respeito de que o delito do art. 211 do Código Penal, na sua modalidade "ocultar", é de natureza permanente. Como é sabido, no crime permanente a conduta do agente subsiste a integrar o tipo penal ao longo do tempo, de modo tal que, enquanto não cessar essa atividade, está a perpetrar o crime. Daí que o Ministério Público Federal ressalta, por outro fundamento, que a Lei da Anistia é inaplicável à espécie, visto que não gera efeitos para o futuro: na parte ulterior à vigência dessa Lei, afirma a acusação, não há a extinção da punibilidade.
O argumento, porém, não me parece persuasivo. A pretensão punitiva surge com a prática do delito, cumprindo ao Estado exercê-la adequadamente para assim dar ensejo à aplicação da lei penal. A pretensão punitiva, segundo a denúncia, surgiu no interregno acima indicado mas foi extinta em razão da anistia: àqueles fatos, portanto, não é mais correto falar em punibilidade.
Posteriormente à Lei da Anistia, contudo, não constato a efetiva prática de condutas típicas que ensejariam a subsistência do delito. Como dito acima, o delito permanente assim é qualificado exatamente porque a conduta do agente subsiste a tipificar-se como crime: o agente perpetra o crime. Sendo crime comissivo, escusado dizer, continua na sua atividade comissiva, como ocorre no eloquente caso do delito de sequestro. Pois a vítima não é devolvida à liberdade por causa da conduta do agente do delito que, de algum modo, a mantém cativa.
Não constato a existência desses pressupostos no caso presente. Pelo que se infere da denúncia, o corpo da vítima foi ocultado em janeiro de 1972. A participação dos acusados nesses fatos deu-se então, daí surgindo a pretensão punitiva. Esta foi extinta (anistia) e, para que surgisse novamente nova pretensão punitiva, cumpria ser indicada a prática de atos comissivos perpetrados pelos acusados posteriormente à anistia e que de algum modo contribuíssem para o resultado (integrassem o nexo causal). Quanto a esse aspecto, a própria denúncia implicitamente reconhece tratar-se de delito comissivo.
Conforme o art. 13 do Código Penal, o resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. Por sua vez, dispõe o art. 29 do Código Penal que quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade. Sendo assim, toma-se por "causa" a ação descrita na denúncia e da qual o resultado depende e é por ela que os réus sujeitam-se à responsabilidade penal.
O que se pretende dizer será talvez melhor compreendido se considerado o disposto no art. 5º, XLIII, da Constituição da República:

Art. 5º
(...)
XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evita-los, se omitirem (...)
Como se percebe, a norma constitucional não admite uma distinção baseada na "natureza jurídica" do crime. A proibição à anistia não decorre de uma ou outra classificação doutrinária - como o é a distinção entre crimes instantâneos e permanentes - para permitir ou não que o legislador conceda anistia a quem tenha efetivamente praticado um crime. É o próprio crime, como tal, expressamente citado, que não pode ser objeto de anistia. Daí que o intérprete não está, à luz dessa norma, autorizado a introduzir uma distinção pela qual crime de uma ou outra classificação doutrinária ou "natureza jurídica" sejam excluídos da discricionariedade legislativa.
Nada impede, portanto, que sobrevenha lei ordinária (aqui não se está a emprestar efeitos retroativos à norma constitucional) que conceda anistia a um crime de natureza permanente (que não seja hediondo).
O que ocorre nessa hipótese é o seguinte: concedida a anistia, dada a natureza permanente do delito, cumpre determinar se o agente subsiste na atividade criminosa, daí seguindo-se não somente exercer a pretensão punitiva, mas envidar esforços para fazer cessar a atividade criminosa. Pois não se concebe que o Estado tolere, sem mais, a prática do crime, a principiar com a prisão em flagrante etc. Os fatos passados tiveram sua punibilidade extinta. O mesmo não ocorre com os posteriores, pelos quais subsiste a tipificação e que enseja a repressão estatal.
Embora a denúncia faça sucessivas referências à não-localização do corpo da vítima, malgrado os esforços dos parentes e do próprio Ministério Público Federal, que para essa finalidade instaurou inquérito civil público, em razão do qual foram feitos exumações e laudos nos cadáveres encontrados, o fato que não chega a descrever de que modo a atual conduta dos réus contribui para esse resultado. Pode-se supor que eventualmente os réus tivessem conhecimento do local em que estariam os restos mortais da vítima. Tal não é contudo afirmado e, pelo contexto da denúncia, não haveria como se fundamentar uma afirmação dessa natureza.
As condutas efetivamente descritas concernem à transferência do corpo da vítima do DOI-CODI para o DEOPS e deste para o IML, de onde seguiu para o cemitério de Perus, local em que foi sepultado sob o nome de terceiro. A ocultação de cadáver decorre da fraude na documentação para tais transferências, necropsia e sepultamento, bem como no fato de ter sido sonegada à imprensa e aos familiares da vítima a ocorrência do óbito, certamente para assim dissimular o ocorrido (tortura, homicídio), dificultando-se a eventual apuração de responsabilidades dos agentes do Estado. Em razão dessas condutas é que houve a ocultação de cadáver e por esses fatos é que estão sendo acusados os réus. Desses fatos surgiu a pretensão punitiva, a qual foi extinta pela anistia. A mera natureza permanente do crime de ocultação de cadáver não faz ressurgir a pretensão punitiva. Pois nos crimes permanentes há de subsistir a atividade criminosa ao longo do tempo. A denúncia, contudo, não fundamenta seu pedido condenatório em uma suposta ulterior atividade criminosa que, por si mesma, teria feito surgir (ou, o que dá no mesmo, subsistir) a pretensão punitiva. Daí que aqueles fatos foram efetivamente abrangidos pela anistia.
A relevância do tema concernente à prescrição fica algo prejudicada.
O Código Penal, art. 111, III, diz que, nos crimes permanentes, a prescrição começa a correr "do dia em que cessou a permanência". Assim, subsistindo a tipificação do fato, fenômeno que ocorre por causa da atividade delitiva do agente, resulta evidente que não está a correr o prazo prescricional. Não há referência à atividade criminosa dos agentes posterior à Lei da Anistia que poderia - como se pretende - postergar o início da fluência do prazo prescricional. Contudo, a própria aplicação desse dispositivo fica prejudicada na medida em que, por oura razão, já não há mais pretensão punitiva passível de ser extinta pela prescrição.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso.

É o voto.


Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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