Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 28/09/2010
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007690-19.1999.4.03.6104/SP
1999.61.04.007690-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal LAZARANO NETO
APELANTE : NOEDES DANTAS DA SILVA
ADVOGADO : TELMA RODRIGUES DA SILVA
APELADO : CIA DE TRANSPORTES INTEGRADOS LLOYDBRATI
ADVOGADO : VALDIR ALVES DE ARAUJO
APELADO : Uniao Federal
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE PINHEIRO DE AMORIM

EMENTA

ADMINISTRATIVO - DANOS MATERIAIS E MORAIS - ACIDENTE DE VEÍCULOS - FALECIMENTO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO - CULPA RECÍPROCA - INOCORRÊNCIA.
1. A empresa ré, subsidiária de sociedade de economia mista, embora pessoa jurídica de direito privado, submete-se à regra estampada no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, porquanto desempenhava atividade de interesse público.
2. Em se tratando de responsabilidade objetiva, o Estado responde por comportamentos comissivos de seus agentes independentemente de culpa, impondo-se, apenas, a demonstração do dano e do nexo causal.
3. Para que se reconheça a concorrência de culpas, a conduta do autor do dano e a da vítima devem figurar como causas jurídicas do dano, ou seja, devem concorrer para o resultado danoso. No caso vertente, entretanto, as provas coligidas não indicam que a vítima contribuiu para o acidente. Teoria da causalidade adequada.
3. Nesse passo, é devido o pensionamento mensal, a título de danos materiais, na fração de 2/3 da remuneração percebida pela vítima (2,13 salários mínimos, conforme declinado na peça inicial, fato este incontroverso, porquanto não objeto de impugnação específica), até quando completaria 25 anos de idade; a partir daí, reduzida para 1/3 da referida remuneração, até quando completaria 65 anos de idade
4. Compensação pelos danos morais fixada no montante de quinhentos salários mínimos, valor que hoje atingiria R$ 255.000,00 (duzentos e cinquenta e cinco mil reais). Precedentes desta Corte e do C. STJ.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Desembargador Federal Mairan Maia - a Desembargadora Federal Regina Costa retratou-se, acompanhando-o - vencido o Relator que dava parcial provimento à apelação.


São Paulo, 16 de setembro de 2010.
Mairan Maia
Relator para Acórdão


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): MAIRAN GONCALVES MAIA JUNIOR:36
Nº de Série do Certificado: 4435DC38
Data e Hora: 17/09/2010 14:18:23



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007690-19.1999.4.03.6104/SP
1999.61.04.007690-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal LAZARANO NETO
APELANTE : NOEDES DANTAS DA SILVA
ADVOGADO : TELMA RODRIGUES DA SILVA
APELADO : CIA DE TRANSPORTES INTEGRADOS LLOYDBRATI
ADVOGADO : VALDIR ALVES DE ARAUJO
APELADO : Uniao Federal
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE PINHEIRO DE AMORIM

VOTO-VISTA

Pedi vista dos autos para melhor exame da matéria fática posta a deslinde.


Trata-se de ação de indenização ajuizada por Noedes Dantas da Silva em face de Companhia de Transportes Integrados Lloyd Brasileiro - LLOYDBRATI -, objetivando indenização por danos morais e materiais decorrentes do falecimento de seu irmão, Adelcio Dantas da Silva, em acidente de veículos.


Narra a autora que caminhão de propriedade da ré transitava no mesmo sentido de direção da vítima na pista da direita e, ao realizar conversão à esquerda, no intuito de ingressar na pista cujo tráfego fluía em sentido contrário, provocou o acidente que resultou na morte de seu irmão. Aduz imprudente o motorista do rebocador, bem como presentes a culpa "in eligendo" e "in vigilando" da empresa demandada. Informa, outrossim, que dependia economicamente do irmão.


Por meio do Ofício nº 118/99-PSU/STS, da Advocacia Geral da União, informou-se ao juízo que a Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro - LLOYDBRAS - sofreu processo de liquidação extrajudicial, sendo transferidos à União, na qualidade de sucessora, todos os seus direitos e obrigações, nos termos da Lei nº 9.617/98. À fl. 120, a União Federal esclareceu que a empresa LLOYDBRAS era acionista majoritária da ré.


Citada a União Federal e, regularmente processado o feito, a sentença julgou improcedente o pedido.


Em apelação, a autora pugnou pela reforma da sentença.


Nos termos do voto do E. Desembargador Federal Relator, reconheceu-se aplicável ao caso a regra geral vigente no ordenamento jurídico, correspondente à responsabilidade subjetiva (artigo 159, CC/16; artigo 186, CC/02), porquanto o condutor do caminhão não ostentava a qualidade de agente público. Considerando a manobra arriscada do funcionário da empresa ré, bem como as condições do pneu traseiro do ciclomotor da vítima, reputou-se configurada a culpa concorrente, nos termos do artigo 945 do CC/02. Salientou-se que, embora este dispositivo não apresentasse correspondente no CC/16, assim já se entendia em sede jurisprudencial. Nesse passo, ao julgar parcialmente procedente o pedido de indenização formulado, o E. Relator reduziu em 50% o montante das indenizações pelos danos materiais e morais ocorridos, ex-vi do artigo 945 retrocidado.


É o breve relato.


Cumpre examinar, inicialmente, a natureza da responsabilidade da ré.


A empresa demandada, Companhia de Transportes Integrados Lloyd Brasileiro (LLOYDBRATI), foi constituída como subsidiária da Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro (LLOYDBRAS), consoante escritura de constituição juntada às fls. 122/143. Esta última, por sua vez, foi instituída pela União Federal, ostentando a qualidade de sociedade de economia mista.


A criação da Companhia LLOYDBRAS, acionista majoritária da ré, foi autorizada pelo Decreto-Lei nº 67/66. Transcrevo os dispositivos que interessam ao deslinde da causa, in verbis:


CAPÍTULO II
Da Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro
SEÇÃO I
Da Constituição da Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro
Art. 5º Fica a União autorizada a constituir, na forma desta lei, uma sociedade por ações que se denominará Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro.
Art. 6º A C. N. L. B. terá sede na cidade do Rio de Janeiro, Estado da Guanabara, e por objeto a exploração do transporte marítimo.
SEÇÃO V
Dos favores e obrigações atribuídos à C.N.L.B.
...
Art. 19. A União Federal poderá incumbir à Sociedade a execução de serviços condizentes com a sua finalidade, para o que destinará recursos financeiros especiais.
Art. 20. A C.N.L.B. não fará transporte gratuito, salvo de seu pessoal, nos têrmos de seu regulamento e sempre a serviço da emprêsa.
Parágrafo único. Os transportes requisitados pelas Emprêsas ou Órgãos de direito público só serão atendidos mediante empenho prévio de verbas.
Art. 21. As relações entre a C.N.L.B. e a Comissão de Marinha Mercante serão as mesmas que as leis e regulamentos estabelecem para vigorar entre aquela Comissão e as Companhias de navegação de propriedade privada.
§ 1º Fica assegurada à C.N.L.B. o direito de representação no colegiado da C.M.M. sendo o Presidente da Sociedade membro nato daquela Comissão.
§ 2º Fica assegurada à C.N.L.B. a prioridade de registro de afretamento para o fim de ser estendido à mesma igual benefício de preferência que gozava o Lloyd Brasileiro.
§ 3º Fica assegurada à C.N.L.B. a prioridade para transporte de cargas de repartições públicas, autarquias, órgãos da administração descentralizada e sociedades de economia mista, a fim de ser estendido à mesma igual benefício de preferência que gozava o Lloyd Brasileiro - P.N.

Extrai-se dos artigos supra que a atividade fim da empresa LLOYDBRAS atende a interesse público, tanto que recebia para consecução de seus objetivos "recursos financeiros especiais", a teor do artigo 19. Vale ressaltar que as sociedades de economia mista, embora pessoas jurídicas de direito privado, submetem-se à regra estampada no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, sempre que desempenharem serviço público, ou seja, responsabilizam-se objetivamente pelos comportamentos comissivos de seus agentes. Na verdade, integram a estrutura da administração pública indireta.


Assim é a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello (in , Curso de Direito Administrativo, Malheiros Editores, 14ª edição, 2002, p. 196):


"No que atina à responsabilidade destas empresas pelos danos que causarem a terceiros em virtude da condição de prestadores de serviço público, atualmente é certo que se governa na conformidade dos mesmos critérios que se aplicam ao Estado; ou seja: os da responsabilidade objetiva, pois assim é, segundo doutrina e jurisprudência, a responsabilidade pública.
...
Isto por força do precitado art. 37, § 6º, da Constituição, que estabelece para as pessoas de Direito privado prestadoras de serviço público a mesma responsabilidade que incumbe às pessoas de Direito Público (...)".

Reconhecendo a responsabilidade objetiva da LLOYDBRAS, trago à colação o seguinte aresto do Tribunal Regional Federal da 5ª Região:

CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE A BORDO DE NAVIO. ROMPIMENTO DE ESTRUTURA. QUEDA DO AUTOR DE MASTRO DE VANTE. SEQUELAS PERMANENTES. OMISSÃO DA UNIÃO EM PROCEDER AO REPARO. DANOS MORAIS. PROCEDÊNCIA. MANUTENÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. 1. De acordo com a melhor doutrina, a teoria do risco administrativo prevista no art. 37, parágrafo 6º, da CF, prescinde da demonstração da culpa da Administração ou de seus agentes, bastando apenas que a vítima demonstre a ocorrência do evento danoso em virtude de ação ou omissão do ente público. 2. No caso dos autos, restou demonstrado que o dano moral consistente nas sequelas físicas permanentes (artrodese - perda de articulação do punho esquerdo -, déficit no movimento da mão esquerda, encurtamento na perna esquerda e rigidez na articulação dos joelhos) provocadas pelo acidente em serviço sofrido pelo autor que despencou do mastro de vante do navio Itaquatiá (de propriedade da então Companhia de Navegação Lloyd, hoje sucedida pela União) em face do rompimento de sua estrutura que se encontrava corroída por ferrugem, havendo, inclusive, relato de testemunha de que por diversas vezes fora solicitado o reparo do referido mastro sem sucesso, fato este que acarreta a obrigação da Administração em indenizar o demandante pelo evento danoso ocorrido. 3. Diante da gravidade do evento danoso, tenho que deve ser mantida a condenação da União em indenizar o autor por danos morais na quantia de R$ 100.000,00, considerando a alta gravidade do evento danoso, caracterizada pelas sequelas permanentes e pela dor causada ao demandante pelo extenso período de recuperação sem o sucesso necessário para o retorno às atividades laborativas, corroborado, inclusive, pela percepção de auxílio suplementar ao benefício acidentário. 4. Sobre o montante indenizatório deverão incidir de juros de mora no percentual de 0,5% (meio por cento) ao mês a contar do evento danoso (17/03/1989) até a data da sentença (06/06/2005), eis que a quantia fixada na sentença corresponde ao valor expresso em Reais do que seria devido à época do acidente quando a moeda vigente era o Cruzado Novo, portanto, apenas a partir de 06/06/2005 aplicar-se-ão juros moratórios com base na taxa SELIC, já que a natureza da referida taxa não permite a cumulação com outro índice de atualização, seja de juros, seja de correção monetária. 5. Não há sentido em desatualizar monetariamente o quantum indenizatório fixado em Reais na sentença (como não poderia ser diferente) até a data do evento danoso (onde a moeda vigente era o Cruzado Novo) para, em seguida, aplicar a correção monetária até 06/06/2005, uma vez que chegaríamos aos mesmos R$ 100.000,00 (cem mil reais), por óbvio. 6. Redução da verba honorária de 10% sobre o valor da condenação para o valor de R$ 7.500,00, levando-se em consideração a relativa complexidade da causa discutida nos autos e o tempo de duração do feito (ajuizamento em 1998), nos termos do art. 20, parágrafo 4º do CPC. 7. Apelação e remessa oficial parcialmente providas. (g.n.)
(AC 200705000619483, Desembargador Federal Francisco Wildo, TRF5 - Segunda Turma, 04/09/2009)

De acordo com o artigo 3º de sua escritura de constituição, a empresa ré, LLOYDBRATI, tinha por objeto social "explorar a coordenação dos serviços de transportes de mercadorias por via marítima, rodoviária, ferroviária e aérea, porta a porta, na importação e exportação no país e no exterior e internamente o transporte de quaisquer mercadorias das fábricas ou depósitos para qualquer destino" (fl. 127), atividades congêneres às de sua acionista majoritária. Deve receber, portanto, o mesmo tratamento quanto à responsabilidade civil. Equipará-la às empresas privadas para fins de responsabilização redundaria em verdadeira desigualdade.


Quanto ao motorista do rebocador, entendo que o título jurídico da investidura não é relevante para a caracterização da responsabilidade pública. Convém tão-somente que o comportamento ilícito seja imputável ao Estado (ou outras pessoas, de direito público ou privado, prestadoras de serviços públicos). Em outras palavras, é suficiente que atue na qualidade de agente público, o que ocorreu no caso vertente, conforme se extrai da atividade fim de sua empregadora: o transporte de cargas.


Como, com razão, assevera Hely Lopes Meirelles (in Direito Administrativo Brasileiro, 32ª Edição, Editora RT, 2006, p. 654):


"Para a vítima é indiferente o título pelo qual o causador direto do dano esteja vinculado à Administração; o necessário é que se encontre a serviço do Poder Público, embora atue fora ou além de sua competência administrativa".



Nesse diapasão, a hipótese tratada nos autos enquadra-se na teoria da responsabilidade objetiva, segundo a qual o Estado responde por comportamentos comissivos de seus agentes independentemente de culpa, impondo-se, apenas, a demonstração do dano e do nexo causal.


Assim leciona o Professor Hely Lopes Meirelles (op. cit., p. 654):


"Nessa substituição da responsabilidade individual do servidor, pela responsabilidade genérica do Poder Público, cobrindo o risco da sua ação ou omissão, é que se assenta a teoria da responsabilidade objetiva da Administração, vale dizer, da responsabilidade sem culpa, pela só ocorrência da falta anônima do serviço porque esta falta está, precisamente, na área dos riscos assumidos pela Administração para a consecução de seus fins."

Ora, caso se tratasse de responsabilidade subjetiva, o responsável pela obrigação seria o próprio condutor e não a pessoa jurídica empregadora. Recorde-se que os artigos 932 e 933 do atual Código Civil, modificando a anterior previsão do Código Civil de 1916, que considerava presumida a responsabilidade do empregador pelos danos ocasionados pelo empregado, passou a ter a hipótese como de responsabilidade objetiva, como alertam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery (in Código Civil Comentado, 6ª edição, Editora RT, 2008, p. 757, nota 2 ao art. 933):


"Responsabilidade objetiva. A norma determina que os responsáveis indicados no CC 932 I a V respondam objetivamente pelos danos causados diretamente pelas pessoas mencionadas nos mesmos dispositivos legais".

Superado esse ponto e, antes de adentrar ao exame do contexto fático da controvérsia, mister analisar as implicações da concorrência da culpa da vítima no tocante à responsabilidade objetiva do Estado (ou de outras pessoas, de Direito Público ou Privado, prestadoras de serviços públicos).


É pacífico o entendimento de que, ao lado de outras causas exculpantes (assim como o caso fortuito e força maior, à guisa de ilustração), a culpa exclusiva da vítima tem o condão de afastar a responsabilidade civil, ensejando a ruptura do nexo causal.


Em relação à culpa concorrente, não obstante o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, demandar tão somente a comprovação do dano e do nexo causal, reconhece-se, em sede doutrinária e jurisprudencial, sua incidência nos casos de responsabilidade objetiva, permitindo-se a redução da indenização.


Nesse sentido, os seguintes julgados do C. Supremo Tribunal Federal:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DAS PESSOAS JURIDICAS DE DIREITO PÚBLICO E DAS PESSOAS JURIDICAS DE DIREITO PRIVADO PRESTADORAS DE SERVIÇO PÚBLICO. Constituição Federal, art. 37, par. 6.. I. - A responsabilidade civil das pessoas juridicas de direito público e das pessoas juridicas de direito privado prestadoras de serviço público, responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo, ocorre diante dos seguintes requisitos: a) do dano; b) da ação administrativa; c) e desde que haja nexo causal entre o dano e a ação administrativa. II. - Essa responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo, admite pesquisa em torno da culpa da vítima, para o fim de abrandar ou mesmo excluir a responsabilidade da pessoa jurídica de direito público ou da pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público. III. - No caso, não se comprovou culpa da vítima, certo que a ação foi julgada improcedente sobre o fundamento de não ter sido comprovada a culpa do preposto da sociedade de economia mista prestadora de serviço. Ofensa ao art. 37, par. 6., da Constituição. IV. - R.E. conhecido e provido.
(RE 178806, CARLOS VELLOSO, STF - DJ 08/11/1994)

Responsabilidade objetiva do Estado. Ocorrencia de culpa exclusiva da vítima. - Esta Corte tem admitido que a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito público seja reduzida ou excluida conforme haja culpa concorrente do particular ou tenha sido este o exclusivo culpado (Ag. 113.722-3-AgRg e RE 113.587). - No caso, tendo o acórdão recorrido, com base na analise dos elementos probatorios cujo reexame não é admissivel em recurso extraordinário, decidido que ocorreu culpa exclusiva da vítima, inexistente a responsabilidade civil da pessoa jurídica de direito público, pois foi a vítima que deu causa ao infortunio, o que afasta, sem duvida, o nexo de causalidade entre a ação e a omissão e o dano, no tocante ao ora recorrido. Recurso extraordinário não conhecido.
(RE 120924, MOREIRA ALVES, STF - DJ 27-08-1993)

Doutrina de escol, a despeito de divergir quanto ao fundamento da repartição da responsabilidade, esposa a mesma orientação. Cito:


"Contudo, quando se trata de reponsabilidade do Estado a questão já se controverte e não mais exsurge pacífica.
Aliás, seria impróprio falar em "concorrência de culpas", usando a expressão no plural, pois se a responsabilidade do Estado é objetiva, porque sustentada na teoria do risco administrativo, segundo a dicção do art. 37, § 6º, da CF/88, não se pode falar em "culpa" do Poder Público, exceto naquelas hipóteses em que sua responsabilização só pode ocorrer com fundamento na culpa aquiliana, como ocorre com a chamada faute du service (...).
...
Força convir e confessar, entretanto, que a jurisprudência vem se manifestando em sentido contrário ao aqui defendido, admitindo a concorrência de culpa da vítima, para efeito de redução do valor da indenização, na proporção de sua participação culposa.
A questão colocada é de difícil solução até porque poderá conduzir a injustiças e iniqüidades.
Isto porque, na hipótese de faute di service - a falta ou falha do serviço, em que se fala em culpa anônima da Administração e, por exceção, o Estado só responde mediante verificação de culpa, poder-se-á, de lege lata, em "concorrência de culpas", ou seja, a recíproca contribuição para a eclosão do evento. Contudo, em sendo objetiva a responsabilidade do Estado, não haveria tal "concorrência", pois deste se inexige comportamento culposo.
Diante disso, por força de evidente discrímen e ofensa à isonomia, quer parecer que se poderá aplicar, por analogia e tendo em vista o princípio da eqüidade, o art. 945 do CC e, então, reduzir eqüitativamente a indenização, segundo o grau da culpa da vítima, embora não se cuide de "compensar culpas"". (Tratado de Responsabilidade civil do Estado: doutrina e jurisprudência - Rui Stoco. - 7ª Edição revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 1096/1097)

"Se houve concorrência de culpa entre a vítima e o Estado, há o compartilhamento da responsabilidade civil, o que não significa afirmar que a indenização devida corresponderá a exatos 50% do valor estimado.
Esse é um exemplo claro da necessidade de verificar o elemento subjetivo atinente à atuação estatal, para apurar a responsabilidade civil do Estado". (Curso de direito administrativo - Marçal Justen Filho. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 803/804)

Feitas essas ponderações, tendo em vista que a imprudência do condutor do rebocador se revelou incontroversa ao longo da instrução processual, cumpre apreciar se a vítima de alguma forma contribuiu para o acidente. Nesse desiderato, transcrevo a conclusão do laudo de exame pericial lavrado pelo Departamento Estadual de Polícia Científica (fls. 13/25), in verbis:


"Diante do exposto, cumpre salientar que o condutor do Cavalo-Mecânico deveria aguardar condições favoráveis para efetuar a manobra retro, a fim de não interceptar a passagem dos outros veículos, que trafegavam pelas duas pistas da avenida Osvaldo Aranha".

Segundo apurado pela perícia, o acidente ocorreu quando o condutor do cavalo mecânico, transitando pela pista da direita, efetuou conversão à esquerda, sem observar os cuidados necessários, ou seja, sem verificar se existiam ou não outros veículos transitando pela pista paralela da esquerda, no mesmo sentido.


Extrai-se do excerto supra que a causa determinante do acidente consistiu na manobra imprudente do condutor do caminhão. Essa conclusão decorreu das condições da pista, da mecânica do acidente e do estado dos veículos após a colisão, o que é corroborado pelos depoimentos testemunhais prestados à autoridade policial.


Por outro lado, consta do parecer técnico que o pneu traseiro do ciclomotor da vítima estava liso, inexistindo vestígios de derrapagem ou frenagem relacionados ao ocorrido.


Evidentemente, como asseverado no voto do E. Desembargador Federal Relator, as condições da mobilete poderiam dificultar e até mesmo impossibilitar sua eficaz frenagem. No entanto, esse reconhecimento não implica a conclusão de que era possível, diante das circunstâncias que envolveram o acidente, o acionamento tempestivo dos freios, tampouco que o resultado seria diverso caso a vítima assim procedesse.


Para que se reconheça a concorrência de culpas, a conduta do autor do dano e a da vítima devem figurar como causas jurídicas do dano, ou seja, devem concorrer para o resultado danoso.


Ora, com a máxima vênia do entendimento exposado pelo eminente Relator, não me parece que, de algum modo, o fato de o pneu estar "liso" ou "careca" tenha concorrido para o acidente.


Entende-se por concausa a condição necessária para o dano, isto é, elemento sem o qual o acidente não teria ocorrido.


As regras de experiência comum indicam que os pneus "carecas" têm sua capacidade de frenagem reduzida, de modo que fica mais difícil evitar a colisão; mas também mostram que, em geral, deixam marcas ou registro de frenagem ou derrapagem, ainda que leves.


Contudo, não foi o que constatou a perícia, a qual concluiu pela ausência total de marcas de derrapagem ou frenagem. Essa constatação constitui forte indício de que na realidade os freios não foram acionados, hipótese essa que não pode ser afastada, o que não leva a um juízo seguro de que houve culpa concorrente.


Recorde-se que, mesmo se o freio tivesse sido acionado e o pneu não estivesse "careca", teria havido a colisão; portanto, esta teria ocorrido independentemente da condição do pneu traseiro da mobilete.


Com efeito, as provas produzidas conduzem à presunção de que não tenha havido qualquer frenagem por parte do condutor da mobilete e, ainda que ocorresse de forma deficiente, esta não teria concorrido para o acidente, quero dizer, não poderia ser considerada concausa.


Vale frisar que, a teor do diposto no artigo 333, inciso II, do Código de Processo Civil, incumbe ao réu o ônus da prova relativo à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Desse ônus não se desicumbiu a ré.


Ademais, a lei brasileira, no tocante à responsabilidade civil, adotou a teoria da causalidade adequada, isto é, somente o fato idôneo ou adequado para produzir o dano deve ser levado em consideração para o estabelecimento de responsabilidade. E, consoante demonstrado nos autos, esse fato consistiu na conduta extremamente imprudente do condutor do rebocador, reveladora de culpa grave.


Essa é a lição de José de Aguiar Dias (in Da Responsabilidade Civil - Volume II, 5ª Edição revista e aumentada. Editora Forense, p. 313/315):

"Se embora culposo, o fato de determinado agente era inócuo para a produção do dano, não pode ele, decerto, arcar com prejuízo nenhum".
...
"O que se deve indagar é, pois, qual dos fatos, ou culpas, foi decisivo para o evento danoso, isto é, qual dos atos imprudentes fez com que o outro, que não teria conseqüências, de si só, determinasse, completado por ele, o acidente. Pensamos que sempre que seja possível estabelecer inocuidade de um ato, ainda que imprudente, se não tivesse intervindo outro ato imprudente, não se deve falar de concorrência de culpa. Noutras palavras: a culpa grave necessária e suficiente para o dano exclui a concorrência de culpas."

Tratando de situação semelhante, decidiu o E. Tribunal Regional Federal da 1ª Região:


CIVIL. ADMINISTRATIVO. ACIDENTE DE TRÂNSITO COM VÍTIMA FATAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA UNIÃO. 1. O conjunto probatório dos autos indica que o acidente que causou a morte de Mariano Lourenço dos Santos foi provocado pela imprudência do policial rodoviário federal ao obstaculizar a passagem dos veículos para atravessar a pista, a fim de determinar a parada de outro automóvel que vinha em sentido oposto, para fiscalizá-lo, sem atentar para as condições de tráfego naquela hora e o local do acidente. 2. A responsabilidade da União por danos causados pela ação de seus agentes é objetiva, sendo necessário provar apenas a ação, o resultado e o nexo de causa e efeito entre ambos, nos termos do art. 37, §6o, da Constituição. 3. Diante das condições do local onde ocorreu o acidente, conforme descritas no Boletim de Ocorrência juntados aos autos ( fls. 27/28) e dos testemunhos colhidos ( fls. 243; 244/245 e 267/268), difícil seria a frenagem, com segurança, pelo condutor do veículo sinistrado, guardando ou não distância de segurança em relação ao veículo que trafegava em sua frente, o que afasta a culpa concorrente ou exclusiva da vítima. 4. Analisando detidamente os autos, não vejo nenhuma prova, sequer algum documento que comprove a dependência da autora ao filho, vítima do acidente. Pelo contrário, ela própria afirma na inicial que aufere renda mensal equivalente a dois salários mínimos. E apesar de alegar às fls. 03, no item 14, que "tem sérios problemas de saúde, necessitando por vezes, dispender todos os proventos da aposentadoria com médicos e remédios", nada comprovou nesse sentido e nem quanto a outros possíveis gastos que possui. Por outro lado, não seria crível que o falecido, recebendo uma renda mensal de pouco mais de quatro salários mínimos para seu sustento e de mais 04 dependentes (esposa e três filhos), pudesse repassar a quantia equivalente a um salário para sua mãe, até porque ela já recebia benefício previdenciário no valor aproximado de dois salários mensais, o que equivalia a metade dos ganhos de seu filho. 5. Além do mais, não há nada que comprove a dependência da autora ao falecido, o que era ônus dela, nos termos do art. 333, I, do CPC, razão pela qual, o pedido de pagamento de um salário mínimo mensal, a partir do óbito de seu filho, até a data em que ele completaria 70 anos, não merece amparo. 6. Danos morais fixados em R$ 40.000,00, sobre os quais incidirão correção monetária a partir desta data e juros moratórios, a partir do evento danoso (16.10.1997), pelos seguintes percentuais: 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor do novo Código Civil (11/01/2003), e 1% (um por cento) ao mês, a partir de então. 7. Sucumbência recíproca e de monta equivalente, aplicando-se o art. 21 do CPC para dividir equitativamente a verba honorária, reciprocamente compensada, nada mais sendo devido a este título. Metade das custas em reembolso pela União, vez que a outra metade que caberia à autora, fica suspensa, nos termos do artigo 12, da Lei1.060/50, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita. 8. Apelação da autora provida parcialmente.(AC 199936000010567, JUIZ FEDERAL CESAR AUGUSTO BEARSI (CONV.), TRF1 - QUINTA TURMA, 27/07/2007)

Vencida essa questão, destaco que a indenização por danos morais tem por finalidade compensar prejuízos de ordem extrapatrimonial, não sendo, por sua natureza, ressarcíveis. Não se confundem, portanto, com os danos patrimoniais, estes sim, suscetíveis de recomposição ou, se impossível, de indenização pecuniária.


Segundo ensinamento de Yussef Said Cahali, in Dano Moral, 2ª edição, Editora Revista dos Tribunais, p. 21, considera-se dano moral:

"Tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado, qualifica-se, em linha de princípio, como dano moral; não há como enumerá-los exaustivamente, evidenciando-se na dor, na angústia, no sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente querido falecido; no desprestígio, na desconsideração social, no descrédito, à reputação, na humilhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, na depressão ou no desgaste psicológico, nas situações de constrangimento moral."

Acresça-se à conceituação acima as lições de Cleyton Reis em sua obra Avaliação do Dano Moral, 4ª edição, Editora Forense, p. 15:


"É inquestionável que os padecimentos de natureza moral, como, por exemplo, a dor, a angústia, a aflição física ou espiritual, a humilhação, e de forma ampla, os padecimentos resultantes em situações análogas, constituem evento de natureza danosa, ou seja, danos extrapatrimoniais.
Todavia, esse estado de espírito não autoriza a compensação dos danos morais, se não ficar demonstrado que os fatos foram conseqüência da privação de um bem jurídico, em que a vítima tinha um interesse juridicamente tutelado."

Na mesma esteira, leciona Maria Helena Diniz que "os lesados indiretos e a vítima poderão reclamar a reparação pecuniária em razão de dano moral, embora não peçam um preço para a dor que sentem ou sentiram, mas, tão-somente, que se lhes outorgue um meio de atenuar, em parte, as conseqüências da lesão jurídica por eles sofrida" (in Curso de Direito Civil Brasileiro, 7º volume: responsabilidade civil - 21ª edição - São Paulo: Saraiva, 2007).


Justamente por engendrarem lesões a direitos de personalidade, tais como a vida, integridade física, honra, intimidade e outros, os danos morais não apresentam natureza econômica, mostrando-se inviável a avaliação pecuniária precisa de sua extensão. Assim, na apuração do quantum de indenização, deve-se observar a dupla finalidade de que se revestem: de um lado, compensar ou confortar o lesado; de outro, desestimular e até mesmo punir o causador do ilícito.


Tem-se, dessarte, que a reparação dos danos morais, seja pela sua natureza, seja pela sua finalidade, não pode ser reduzida a mero cálculo matemático. Especialmente no caso vertente, em que se busca amenizar a dor e o sofrimento da autora, abalada pelo falecimento de seu irmão, bem como assegurar sua sobrevivência, pois dependente da vítima, reputo inaplicável a redução da indenização, ainda que tivesse sido demonstrada a culpa concorrente da vítima.


Noutro giro, o ressarcimento dos danos materiais tem por objetivo reconstruir o estado das coisas, como se não houvesse ocorrido o ato ilícito, de forma a recompor a situação pessoal e patrimonial do lesado. No entanto, no âmbito da indenização por dano moral, a situação é diversa, e a restituição ao "status quo ante" não é o objetivo primário perseguido.


No caso vertente, demonstrada a condição de dependente da autora, impõe-se a responsabilização da ré à prestação de alimentos, nos termos do que preceitua o art. 1.537 do CC/16, correspondente ao artigo 948, II, do CC/02. Referido dispositivo determina ao autor do dano a "prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima".


Não desconheço que o Colendo Superior Tribunal de Justiça tem considerado a culpa concorrente da vítima para fim de diminuição do valor devido a título de pensão mensal (cf. precedentes: REsp 200501352010, Rel. Min. Nancy Andrighi, STJ - Terceira Turma, 22/05/2006; REsp 200601340688, Rel. Min. João Otávio de Noronha, STJ - Quarta Turma, 24/05/2010; REsp 200401669462, Rel. Min. Jorge Scartezzini, STJ - Quarta Turma, 21/03/2005). Contudo, no presente caso, entendo que seria inviável sua aplicação como proposta pelo voto do E. Relator.


Aplicando-se o entendimento pacificado no âmbito do C. STJ, os alimentos a serem prestados mensalmente seriam da ordem de 1,42 salário mínimo (2/3 da remuneração percebida pela vítima). Considerada essa base de cálculo, a redução da indenização em 50% resultaria em montante incapaz de assegurar a subsistência da autora, representando frustação à finalidade do ressarcimento e nítida violação ao princípio da dignidade da pessoa humana, sendo por isso inaplicável.


Por fim, sublinho que a sistemática introduzida pelo artigo 945 do Código Civil não redunda necessariamente na repartição igualitária do dano indenizável. Deve-se ter em vista o princípio da causalidade, isto é, a responsabilidade deve ser diretamente proporcional à parcela de culpa da parte e, no caso, não se poderia, por nenhuma hipótese, atribuir à vítima o mesmo grau de culpa do condutor do veículo.


Nesse sentido, vale trazer à colação a lição de Rui Stocco (in Tratado de Responsabilidade Civil: Doutrina e Jurisprudência - 7ª Edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 185)


"Dispõe o art. 945 do CC: "Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada, tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.
Rompeu-se inteiramente com o sistema anterior.
Aliás, o revogado Código Civil de 1916 sequer previa a possibilidade de concorrência de culpas, admitida em nosso ordenamento jurídico por força de criação doutrinária e jurisprudencial.
Nosso legislador já não se satisfaz com o entendimento meramente matemático, mas sem qualquer conteúdo jurídico, de repartir o dano por metade, carreando ao ofensor e à vítima o prejuízo em partes iguais.
Adota-se no art. 945 critério dúctil, lógico e juridicamente correto, ou seja, cada qual responderá na medida de sua culpa."

Na mesma esteira, o escólio de Maria Helena Diniz (in Curso de Direito Civil Brasileiro, 7º volume: responsabilidade civil - 21ª edição - São Paulo: Saraiva, 2007):


"Temos, legal e doutrinariamente, a possibilidade de empregar vários critérios, como o da compensação; o da divisão proporcional dos prejuízos, o da gravidade da culpa de cada um (CC, art. 945); o do grau de participação na causação do resultado. Se, por exemplo, lesado e lesante concorreram com uma parcela de culpa, produzindo um mesmo prejuízo, porém por atos independentes, cada um responderá pelo dano na proporção em que concorreu para o evento danoso. Pelo art. 945 do novel Código Civil, há interferência da concorrência de culpas na obrigação de reparar o dano. Se o lesado, por ato culposo, vier a concorrer para o prejuízo que sofreu, o magistrado, na fixação do quantum indenizatório, deverá levar em consideração a gravidade de sua culpa, confrontando-a com a do lesante, de sorte que abaterá a quota-parte que for imputável à culpa da vítima".
(...)
"Não desaparece, portanto, o liame de causalidade; haverá tão somente uma atenuação da responsabilidade, hipótese em que a indenização é, em regra, devida por metade (RT, 221:220, 226:181, 216:308, 222:187, 158:163, 163:669, 439:112; RF, 109:672, 102:575) ou diminuída proporcionalmente (RT, 231:513, 356:519). Haverá uma bipartição dos prejuízos, e a vítima, sob uma forma negativa, deixará de receber a indenização na parte relativa à sua responsabilidade. Logo, a culpa concorrente existe quando ambas as partes agem com qualquer das três clássicas modalidades culposas."

Igualmente, já decidiu o E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região:


ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. CHEQUES DEVOLVIDOS POR INSUFICIÊNCIA DE FUNDOS. TITULOS PROTESTADOS. CULPA CONCORRENTE DA VITIMA CONFIGURADA. APELAÇÃO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO PARA REDUZIR A INDENIZAÇÃO IMPOSTA. 1. Hipótese em que se a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos recorre de sentença que julgou procedente pedido de pagamento de indenização por danos morais e materiais sofridos por empresa em decorrência de suposto descumprimento de obrigação contratual que resultou na devolução de vários cheques por insuficiência de fundos e inscrição da apelada no CCF - Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundo. 2. Assiste razão em parte à apelante, porquanto uma breve observação dos extratos juntados aos autos para se constatar o total descontrole da empresa apelada no que tange à sua movimentação financeira, bem como que a maior parte dos pagamentos feitos pelos Correios foram tempestivos, nos termos do contrato assinado pelas partes. 3. Embora seja certo que não se pode imputar, exclusivamente, à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos todos os fatos danosos ocorridos à apelada, também não se pode afastar por completo a contribuição da empresa pública em relação a parte do constrangimento passado em virtude do atraso, confessado, no pagamento de pelo menos oito das vinte e cinco parcelas. 4. Conquanto seja difícil aferir objetivamente a gradação de culpa, pode-se dizer que a atuação do apelado representa 2/3 da postura lesiva, pois quase 70% dos pagamentos foram efetuados tempestivamente, sendo que o 1/3 restante é atribuível à já mencionada atuação da empresa pública. Inteligência do art. 945 do Código Civil. 5. Apelação parcialmente provida, para reduzir para R$ 2.000 (dois mil reais) a indenização imposta a título de danos morais e para R$ 80,00 (oitenta reais), à guisa de danos materiais.(AC 200480000041864, Desembargador Federal Leonardo Resende Martins, TRF5 - Terceira Turma, 29/10/2009)

Dessa forma, mesmo que superados todos os argumentos expendidos no presente voto, a redução pela metade do montante de indenização iria de encontro ao espírito do novel legislador. Com efeito, o estado do ciclomotor jamais poderia ser equiparado à manobra do condutor do rebocador para fins de causação do acidente, pois, quando muito, poderia ser enquadrada como culpa leve.


Pelas razões apresentadas, entendo que a vítima não concorreu para o acidente, sendo inaplicável a redução de 50% dos valores de indenização pelos danos materiais e morais.


Também, com a máxima vênia do E. Desembargador Federal Relator, entendo deva ser o valor da indenização a título de danos morais fixado em quinhentos salários mínimos, valor que hoje atingiria R$ 255.000,00 (duzentos e cinquenta e cinco mil reais), consoante precedente de minha Relatoria, julgado à unanimidade por esta Colenda Turma (APELREE 199960000070641, Desembargador Federal Mairan Maia, TRF3 - Sexta Turma, 30/03/2010), e os seguintes arestos do C. Superior Tribunal de Justiça:


CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE AÉREO. MORTE DE FILHA. VALOR DA PENSÃO. REDUÇÃO A PARTIR DA DATA EM QUE A VÍTIMA COMPLETARIA 25 ANOS. QUANTIFICAÇÃO DOS DANOS MORAIS. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. PARCELAS VENCIDAS E UM ANO DAS VINCENDAS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INTUITO PROCRASTINATÓRIO QUE NÃO SE COADUNA COM O EXPLÍCITO CARTÉR PREQUESTIONADOR DO RECURSO. MULTA AFASTADA. SÚMULA 98/STJ. APLICAÇÃO. - É inviável, em sede de recurso especial, o reexame de matéria fática. Incidência da Súmula 7/STJ. - O responsável pela morte de filha trabalhadora deve, aos familiares desta, pensão alimentícia mensal, fixada no patamar de 2/3 da remuneração da vítima até a idade em que ela completaria 25 anos e, desde então, reduz-se tal valor pela metade, pois se presume que ela constituiria família, diminuindo o auxílio a seus parentes. - Consignado que a vítima era empregada assalariada, a pensão fixada em favor de seus familiares deve contemplar os valores relativos a férias. Precedentes. - A jurisprudência do STJ indica que as hipóteses de morte, em especial de filho, vêm sendo compensadas com o valor de até 500 salários mínimos para cada familiar afetado. Precedentes. - Considerando as peculiaridades da hipótese sob análise, é razoável a fixação de quantia equivalente a aproximadamente R$ 190.000,00 (cento e noventa mil reais) como apta a compensar os danos morais causados a cada um dos três autores (pais e irmão da vítima) pelo acidente aéreo em questão. - Não há que se falar em sucumbência recíproca quando os autores decaem de parte mínima de seu pedido. - Os honorários de sucumbência, quando há necessidade de pensionamento, devem ser fixados em percentual sobre o somatório dos valores das prestações vencidas mais um ano das vincendas. Precedentes. - Merece reforma o acórdão que, ao julgar embargos de declaração, impõe multa com amparo no art. 538 do CPC, se o recurso foi interposto com expressa finalidade de prequestionar. Inteligência da Súmula 98/STJ. Recursos especiais parcialmente providos.
(RESP nº 1137708, Terceira Turma, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, DJE:06/11/2009)

PROCESSUAL CIVIL E CIVIL - INDENIZAÇÃO - DANOS MORAIS - 500 SALÁRIOS MÍNIMOS - MAJORAÇÃO - EVENTO DANOSO CONTEMPORÂNEO AO PARTO - NEGLIGÊNCIA E IMPRUDÊNCIA DO ATENDIMENTO MÉDICO - REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA - SÚMULA 7/STJ - JUROS MORATÓRIOS INCIDENTES A PARTIR DO EVENTO DANOSO - SÚMULA 54/STJ - ALÍQUOTA DOS JUROS - 0,5% AO MÊS - CÓDIGO CIVIL ANTERIOR - SELIC - ATUAL CÓDIGO CIVIL - AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO. 1. É inviável o reexame de matéria fático-probatória em sede de recurso especial. Súmula 7/STJ. 2. Inviável o conhecimento do dissídio jurisprudencial pela ausência de cotejo analítico, que não se satisfaz com a transcrição de ementas. 3. Não ocorre violação ao art. 535 do CPC quando o acórdão recorrido apresenta fundamentos suficientes para formar o seu convencimento e refutar os argumentos contrários ao seu entendimento. 4. Em se tratando de ilícito extracontratual, incide o teor da Súmula 54/STJ, sendo devidos juros moratórios a partir do evento danoso. 5. Quanto aos juros de mora, o entendimento jurisprudencial do STJ é no sentido de que "aplica-se à mora relativa ao período anterior à vigência do novo Código Civil as disposições insertas no revogado Código Civil de 1916, regendo-se o período posterior pelo diploma civil superveniente (REsp 745825/RS, DJ 20.02.2006)." (REsp 926140/DF, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 12.05.2008). Precedentes. 6. Há de ser reformado o acórdão recorrido para o fim de determinar a incidência do percentual de 0,5% ao mês a título de juros moratórios a contar da citação até a entrada em vigor do novo Código Civil, quando a partir de então, segundo determinado pelo próprio aresto a quo, deve ser aplicada a taxa Selic. 7. A morte do filho no parto, por negligência médica, embora ocasione dor indescritível aos genitores, é evidentemente menor do que o sofrimento diário dos pais que terão de cuidar sempre do filho inválido, portador de deficiência mental irreversível. 8. Reformado o acórdão recorrido para fixar o valor do dano moral em 500 (quinhentos) salários-mínimos, diante das circunstâncias fáticas da demanda. 9. Recurso especial parcialmente conhecido e parcialmente provido.
(RESP nº 1024693, Segunda Turma, Relatora Ministra ELIANA CALMON, DJE:21/08/2009)

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DANO MORAL ATROPELAMENTO. MORTE DE FILHO MENOR. QUANTUM IRRISÓRIO. MAJORAÇÃO. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Incontroverso o pressuposto de culpa exclusiva do recorrido no evento que causou a morte do menor, o quantum indenizatório, fixado na origem em R$ 20.000,00 (vinte mil reais) mostra-se em descompasso com os parâmetros que vem adotando esta Corte Superior, para casos assemelhados, que vão até 500 salários mínimos. 2. A jurisprudência deste Tribunal é firme no sentido de que o quantum definido pela Corte de origem somente pode ser alterado, em sede de recurso especial, quando manifestamente excessivo ou irrisório, o que, se verifica no caso dos autos; na espécie, o valor da indenização pela perda do filho menor dos recorrentes, deve ser elevado ao montante de R$ 190.000,00 (cento e noventa mil reais). 3. Recurso especial conhecido e provido parcialmente.
RESP nº 936792, QUARTA TURMA, Relator Minsitro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA DJ: 22/10/2007)

No tocante à correção monetária e aos juros de mora, de rigor a manutenção dos termos fixados pelo E. Relator, porquanto consentâneos com a jurisprudência dominante e as disposições da Resolução nº 561/07.


Atento ao disposto no artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil, aos princípios da causalidade e proporcionalidade, bem como à complexidade da causa, arbitro os honorários advocatícios em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).


Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação.


Mairan Maia
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007690-19.1999.4.03.6104/SP
1999.61.04.007690-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal LAZARANO NETO
APELANTE : NOEDES DANTAS DA SILVA
ADVOGADO : TELMA RODRIGUES DA SILVA
APELADO : CIA DE TRANSPORTES INTEGRADOS LLOYDBRATI
ADVOGADO : VALDIR ALVES DE ARAUJO
APELADO : Uniao Federal
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE PINHEIRO DE AMORIM

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação interposta por NOEDES DANTAS DA SILVA contra sentença que julgou improcedente a ação ordinária de indenização por danos materiais e morais, sofridos em decorrência do falecimento de seu irmão.
Sustenta que, em 23/01/86, Adelcio Dantas da Silva trafegava com um ciclomotor marca Caloi Mobilete, placas PL 719, pela Avenida dos Portuários, sentido Centro-Ponta da Praia, quando colidiu contra o terço posterior esquerdo do "bug" de placas WT 2947, tracionado pelo veículo Mercedes Benz de placas WV 7574, de propriedade da empresa ré.
Acrescenta que o caminhão transitava no mesmo sentido de direção que a vítima, mas, ao realizar uma conversão à esquerda, no intuito de ingressar na pista cujo tráfego fluía em sentido contrário, provocou o acidente que resultou na morte de seu irmão.
Fundamenta seu pedido de indenização na alegação de imprudência do motorista do rebocador, pois o mesmo deveria ter aguardado condições favoráveis para efetuar a citada conversão. Entende ter havido culpa "in eligendo" e "in vigilando" da empresa demandada.
Valor da causa: R$ 44.983,68. Foram deferidos os benefícios da assistência judiciária gratuita.
A ação foi proposta perante a Justiça do Estado de São Paulo. Entretanto, uma vez que a CIA de Navegação Lloyd Brasileiro, acionista majoritária da ré, sofreu processo de liquidação extrajudicial, sendo transferidos à União Federal seus direitos e obrigações, foram os autos remetidos à Justiça Federal. A União foi admitida como assistente simples.
Contestou a requerida, alegando, preliminarmente, ilegitimidade ativa e passiva. No mérito, pugnou pela improcedência da ação.
Diante da r. sentença de improcedência, a autora interpôs apelação, esperando a reforma do julgado.
Com contra-razões da União Federal, subiram os autos.
À revisão..
O recurso é tempestivo.
É o relatório


Lazarano Neto
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007690-19.1999.4.03.6104/SP
1999.61.04.007690-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal LAZARANO NETO
APELANTE : NOEDES DANTAS DA SILVA
ADVOGADO : TELMA RODRIGUES DA SILVA
APELADO : CIA DE TRANSPORTES INTEGRADOS LLOYDBRATI
ADVOGADO : VALDIR ALVES DE ARAUJO
APELADO : Uniao Federal
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE PINHEIRO DE AMORIM

VOTO

Quanto à matéria preliminar, de ilegitimidade ativa e passiva, foi a mesma bem afastada pela r. decisão de 1º Grau.
De fato, ficou demonstrado que a autora dependia economicamente de seu falecido irmão, haja vista a carta de concessão de benefício previdenciário, concernente à pensão por morte (fls. 31/32), o que a torna legitimada ativa para a acausa.
De outra banda, haja vista que o caminhão de placas WV 7574 (chamado de "cavalo mecânico"), pertencia à ré, Cia de Transportes Integrados Loydbratti (cf. certidão do DETRAN de fls. 33) e que seu motorista era empregado da Cia de Transportes Loydbras (cf. Boletim de Ocorrência de fls. 10), então acionista majoritária daquela primeira empresa, e hoje sucedida pela União Federal, conclui-se pela legitimidade passiva das rés.
Passa-se, portanto, ao exame do mérito, assinalando que a r. sentença recorrida merece ser reformada em parte, para que se julgue parcialmente procedente o pedido.
A caracterização da responsabilidade pela indenização dos danos materiais e morais requer o preenchimento dos seguintes requisitos:
a-) conduta do agente;
b-) dano sofrido;
c-) nexo causal.
Na hipótese dos autos há, ainda, um quarto pressuposto a ser preenchido, consistente na culpa (imprudência, imperícia ou negligência) ou no dolo, eis que não é o caso de incidência da responsabilidade objetiva do Estado.
Com efeito, não há demonstração nos autos de que o suposto causador do dano, ou seja, o motorista do caminhão placas WV 7574 ("cavalo mecânico") que rebocava a carroceria ("bug") de placas WT 2947, estivesse atuando na qualidade de agente público, tal como exigido pela CF, art. 37, § 6º. Nesse sentido, a lição de Hely Lopes Meirelles (Direito Administrativo Brasileiro, Editora Malheiros, 29ª edição, pág. 630): "A Constituição atual usou acertadamente o vocábulo agente, no sentido genérico de servidor público, abrangendo, para fins de responsabilidade civil, todas as pessoas incumbidas da realização de algum serviço público, em caráter permanente ou transitório. O essencial é que o agente da Administração haja praticado o ato ou a omissão administrativa na qualidade de agente público."
Assim, incide a regra geral vigente no ordenamento jurídico nacional, correspondente à responsabilidade subjetiva (CC/16, art. 159; CC/02, art. 186), a qual não prescinde da comprovação da culpa em sentido lato.
Tal circunstância, note-se, não retira a competência desta Justiça Federal, haja vista a sucessão da empresa empregadora (LLOIDBRATTI) pela União Federal, com sentença proferida anteriormente à EC nº 45/04.
É de se ver, contudo que assim dispõe o CC, em seu artigo 945:

"Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano."
É essa, justamente, a situação do presente processo.
Deveras, os elementos de convicção trazidos aos autos dão conta de que o condutor do caminhão (cavalo mecânico) agiu com imprudência, eis que deveria ter aguardado condições favoráveis para efetuar a conversão à esquerda, a fim de não interceptar a passagem dos demais veículos, que trafegavam pela outra pista, no mesmo sentido de direção. Essa a conclusão a que chegou o laudo percial (fls. 16), prova de natureza técnica, que não pode ser desprezada na correta solução do caso em concreto.
Entretanto, nota-se que o autor do dano não foi o único responsável pelo fatídico evento.
Realmente, o contexto fático da causa revela que o pneu traseiro do ciclomotor marca Caloi estava liso (o que evidencia a negligência com a mautenção do veículo), dificultando (ou mesmo impossibilitando), sua tempestiva frenagem.
Ademais, consta do laudo pericial que "não foram constatados vestígios de derrapagem ou frenagem, que pudessem estar relacionados com o acidente", constatação que leva a crer que o motorista da mobilete sequer acionou os freios, ou, acionando-os, o fez tarde demais, não conseguindo pará-la a tempo, bem como de que os pneus se encontravam lisos.
Conclui-se, portanto, que o lesado, por ato culposo seu, concorreu para o prejuízo. Em outras palavras, em atenção à teoria da causalidade adequada, a conduta de ambos, autor e vítima, consubstanciam antecedentes necessários e úteis à produção do resultado danoso. Tal contribuição, aliás, deu-se em igual proporção, de forma que o montante indenizatório deverá ser reduzido em cinqüenta por cento. Nesse sentido, julgado do C. STJ:

CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ARTS. 29, II, "C", DA LEI N. 9.503/1997 E 935 DO CÓDIGO CIVIL (1.525 DO CCB/1916). AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS N. 282, 356-STF E 211-STJ. INCIDÊNCIA. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. RESPONSABILIDADE RECONHECIDA PELO TRIBUNAL A QUO. MATÉRIA DE PROVA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7-STJ. CULPA CONCORRENTE. EXCLUSÃO. IMPOSSIBILIDADE. JUROS MORATÓRIOS. CÁLCULO. FATO OCORRIDO EM 1998. NOVO CÓDIGO CIVIL. INCIDÊNCIA A PARTIR DA SUA VIGÊNCIA.
I. omissis.
II. Entendido pelo Tribunal a quo que a recorrente teve responsabilidade concorrente na configuração do dano indenizável, tal circunstância fática não tem como ser reavaliada em sede de recurso especial, ao teor da Súmula n. 7 do STJ.
III. Culpa concorrente da vítima não exclui a responsabilidade da empresa pelo evento danoso, podendo, apenas, diminuir o quantum da indenização.
IV. omissis.
V. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, parcialmente provido.
(STJ, 4ª Turma, REsp 883967, Rel. Min. Aldir Passarinho Jr., DJ 04/08/09)

Anoto, ainda, que embora o art. 945 do CC/02 não tivesse corespondente no CC/16 (em vigor quando dos acontecimentos), a culpa concorrente já era aplicada em sede jurisprudencial, como revela esse antigo julgado do C. STJ:

CHEQUE FALSO - RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO. RECONHECENDO O ACORDÃO TER HAVIDO CULPA CONCORRENTE, DO ESTABELECIMENTO BANCARIO E DO CORRENTISTA, CORRETA A CONCLUSÃO AO DECLARAR SER AQUELE RESPONSAVEL PELO RESSARCIMENTO DE METADE DO PREJUIZO.
(STJ, 3ª Turma, REsp 2539/SP, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ 06/08/90)

Cabalmente demonstrados, dessarte, os quatro elementos acima referidos, necessários à caracterização da responsabilidade civil (conduta do agente, dano, nexo causal e culpa), é de se deferir a indenização pelos danos morais e materiais à autora.
Não se há negar, nessa linha, que o evento danoso causou dor, transtorno íntimo, mágoa na irmã da vítima, surgindo, desta maneira, a indeclinável obrigação de reparar o dano moral, causado pela ofensa a verdadeiros direitos subjetivos privados assegurados ao indivíduo pela CF/88. art. 5º, incisos V e X.
Vale lembrar, à esta altura, que o dano moral é definido por Yussef Said Cahali como sendo "a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos, classificando-se desse modo, em dano que afeta a parte social do patrimônio moral (honra, reputação, etc.) e dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade, etc.), dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante, etc.) e dano moral puro (dor, tristeza, etc.)" (Dano Moral, Editora Revista dos Tribunais, 2ª edição, pág. 20).
Desta forma, os seguintes aspectos deverão ser analisados na estipulação da indenização:
a-) condição social do ofensor: a Cia de Transportes Integrados Lloyd Brasileiro - Lloydbrati é pessoa jurídica de direito privado, cujo acionista majoritário era a Cia de Navegação Lloyd Brasileiro - Loydbras, a qual foi extinta, tendo a União Federal assumido todos os seus direitos e obrigações. Trata-se, pois, de entes da Administração Pública, aos quais incumbe no desempenho de suas atribuições, o respeito aos princípios insculpidos na CF, art. 37, caput, especialmente ao da legalidade, de sorte que deveria observar a regra segundo a qual não se deve causar dano a ninguém (CC/16, art. 159; CC/02, art. 927, caput)
b-) viabilidade econômica do ofensor: neste aspecto, há que se considerar que a indenização não pode ser tão elevada, a ponto de inviabilizar suas atividades, mas nem tão baixa, que não sirva de efetivo desestímulo à repetição de condutas semelhantes; e do ofendido: a soma auferida deve minimizar os sentimentos negativos advindos da ofensa sofrida, sem, contudo, gerar o sentimento de que valeu a pena a lesão, sob pena de, aí, se verificar o enriquecimento sem causa;
c-) grau de culpa: conforme salientado, cuida-se de culpa concorrente;
d-) gravidade do dano: altíssima, eis que resultou na morte do jovem Adélcio Dantas da Silva; e
e-) reincidência: não há notícia nos autos acerca de reincidência.
Assim, com base nos parâmetros supra, bem assim em precedentes do C. STJ (por exemplo, REsp 932001/AM, DJ, 11/09/07 e REsp 1101213/RJ, DJ 27/04/09, ambos relatados pelo Sr. Min. Castro Meira), arbitro o valor da indenização, em prol da irmã da vítima, em R$ 80.000,00 (oitenta mil reais); entretanto, haja vista a culpa concorrente, reduzo-o em 50%, resultando, pois, em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).
No que tange aos danos materiais, de início, tenho que a autora comprovou sua condição de dependente em relação a seu falecido irmão, tal como exigido pela Lei 3807/60, art. 13 (vigente à época dos fatos), tendo em vista os documentos de fls. 31/32, dando conta da concessão, pelo antigo INPS, do benefício previdenciário de pensão por morte.
Há de se aplicar, assim, a orientação emanada do CC, art. 948, II (correspondente ao CC/16, art. 1537, II):
"Art. No caso de homocídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:
.........................................
II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima"

Pelo exposto, e levando em conta entendimento pacificado no âmbito do C. STJ, estipulo a indenização pelos danos materiais, a qual há de ser estabelecida com base em pensionamento mensal de 2/3 da remuneração percebida pela vítima (2,13 salários mínimos, conforme declinado na peça inicial, fato este incontroverso, porquanto não objeto de impugnação específica), até quando completaria 25 anos de idade; a partir daí, reduzida para 1/3 da referida remuneração, até quando completaria 65 anos de idade. Confira-se:

ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. QUEDA DA JANELA DO 3ª ANDAR DE ESCOLA INFANTIL. MORTE DA CRIANÇA. DANO MORAL AOS PAIS E AVÓS. PENSIONAMENTO MENSAL. CORREÇÃO.
1. Não há violação do art. 535 do CPC quando o Tribunal de origem resolve a controvérsia de maneira sólida e fundamentada, apenas não adotando a tese do recorrente, no caso houve expressa manifestação acerca da legitimidade ativa dos avós.
2. O sofrimento pela morte de parente é disseminado pelo núcleo familiar, como em força centrífuga, atingindo cada um dos membros, em gradações diversas, o que deve ser levado em conta pelo magistrado para fins de arbitramento do valor da reparação do dano moral.
3. Os avós são legitimados à propositura de ação de reparação por dano moral decorrente da morte da neta. A reparação nesses casos decorre de dano individual e particularmente sofrido por cada membro da família ligado imediatamente ao fato (artigo 403 do Código Civil).
4. Considerando-se as circunstâncias do caso concreto e a finalidade da reparação, a condenação ao pagamento de danos morais no valor de R$ 114.000,00 para cada um dos pais, correspondendo à época a 300 salários mínimos e de R$ 80.000,00 para cada um dos dois avós não é exorbitante nem desproporcional à ofensa sofrida pelos recorridos, que perderam filha e neta menor, em queda da janela do terceiro andar da escola infantil onde estudava. Incidência da Súmula 7/STJ. Precedentes, entre eles: REsp 932.001/AM, Rel. Min. Castro Meira, DJ 11/09/2007.
5. No que se refere ao dano material, a orientação do STJ está consolidada no sentido de fixar a indenização por morte de filho menor, com pensão de 2/3 do salário percebido (ou o salário mínimo caso não exerça trabalho remunerado) até 25 (vinte e cinco) anos, e a partir daí, reduzida para 1/3 do salário até a idade em que a vítima completaria 65 (sessenta e cinco) anos.
6. Recurso especial conhecido em parte e provido também em parte.
(STJ, 2ª Turma, REsp 1101213/RJ, Rel. Min. Castro Meira, DJ 27/04/09)
Lembrando, contudo, da incidência do CC, art. 945 (culpa concorrente), a mesma deverá ser reduzida à metade, ou seja: 1/3 da remuneração até os 25 anos e 1/6 dela até os 65 anos.
Os valores devidos a título de indenização do dano moral sofrerão correção monetária, a partir desta decisão, com base na Resolução nº 561 /07 do Conselho da Justiça Federal (cf. STJ, 1ª Turma, REsp 743075/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 20/06/06).
Os valores devidos a título de indenização dos danos materiais, por sua vez, sofreção atualização a contar da data do efetivo prejuízo (Súmula nº 43 do C. STJ), também com base na Resolução nº 561.
Juros de mora a partir do evento danoso, a teor da Súmula nº 54 do C. STJ, aplicando-se, uma vez mais, a orientação da referida Resolução nº 561/07.
Pelo exposto, dou parcial provimento à apelação, nos termos acima explicitados.
A sucumbência há de ser tida como recíproca, à luz do CPC, art. 21, caput, afastando-se, no particular, a aplicação da Súmula nº 326 do C. STJ, devido ao reconhecimento da culpa recíproca, a implicar na parcial procedência do pedido.
É o voto.


Lazarano Neto
Desembargador Federal


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