Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 05/03/2015
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0005030-55.2013.4.03.6106/SP
2013.61.06.005030-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO(A) : RUBENS BELARMINO
ADVOGADO : SP132952 ANA PAULA SHIGAKI MACHADO SERVO e outro
No. ORIG. : 00050305520134036106 3 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

EMENTA

PROCESSO PENAL - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - CRIME AMBIENTAL - CRIME DE FALSIFICAÇÃO - JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL PRESENTE - PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO SOCIETATE APLICÁVEL - RECURSO PROVIDO
1. Consta da exordial que o denunciado cometeu os crimes capitulados no artigo 29, §1º, inciso III da Lei nº 9.605/1998 e do artigo 296, §1º, inciso III do Código Penal. O recorrido teria mantido sob sua guarda três aves silvestres, cujas anilhas apresentavam sinais de adulteração, sendo que todas se encontravam se encontravam violadas e em desconformidade com as exigências do artigo 20, II da Instrução Normativa do IBAMA nº 15, de 22 de dezembro de 2010.
2. Ambos os crimes imputados ao réu tem indícios de materialidade e autoria constantes nos autos, mais precisamente no Boletim de Ocorrência, no Termo de Destinação de animais, materiais e/ou produtos apreendidos, no Laudo de Constatação referente Mensurações de Diâmetros de Anéis de Identificação de Passeriformes, no Auto de Apreensão e no Laudo de Pericia Criminal Federal - Documentoscopia.
3. Verifica-se que a falta de justa causa no presente caso não foi evidenciada de plano, sendo que a inicial acusatória descreve fatos passíveis de serem imputados aos acusados. Imprescindível neste caso a instrução criminal para a apuração da responsabilidade ou não do réu.
4. Na fase do recebimento da denúncia, o principio jurídico in dubio pro societate deve prevalecer, devendo-se verificar a procedência da acusação e a presença de causas excludentes de antijuridicidade ou de punibilidade no decorrer da ação penal.
4. Portanto, merece ser reformada a decisão recorrida para que a ação penal tenha seu regular curso, máxime quando a denúncia preenche os requisitos formais elencados no artigo 41 do Código de Processo Penal, não restando caracterizadas, de seu turno, nenhuma das causas impeditivas previstas no artigo 395 do Código de Processo Penal. O recebimento da denúncia com o consequente prosseguimento da persecutio criminis é de rigor, inclusive sob o pálio da regra in dubio pro societate, que vigora neste momento processual.
5. Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso ministerial, para receber a denúncia ofertada em desfavor de Rubens Belarmino, determinando o prosseguimento da ação penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 23 de fevereiro de 2015.
PAULO FONTES
Desembargador Federal


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RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0005030-55.2013.4.03.6106/SP
2013.61.06.005030-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO(A) : RUBENS BELARMINO
ADVOGADO : SP132952 ANA PAULA SHIGAKI MACHADO SERVO e outro
No. ORIG. : 00050305520134036106 3 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

RELATÓRIO


Trata-se de RECURSO EM SENTIDO ESTRITO interposto pela JUSTIÇA PÚBLICA contra decisão proferida pelo MM. Juiz Federal da 3ª Vara Federal de São José do Rio Preto/SP, que rejeitou a denúncia em virtude da falta de justa causa para a ação penal (fls. 83/85).

Consta da denúncia (fls. 81/82) que:

"Rubens Belarmino, até a data de 04 de setembro de 2011, manteve em cativeiro, sem permissão dos órgãos competentes, aves da fauna silvestre. Na mesma ocasião, fez uso de selos (anilhas) utilizados pela Administração Pública.
Com efeito, na ocasião dos fatos, o acusado, em sua residência na Rua Marcílio Dias Bicalho do Espírito Santo, nº 3945, Eldorado, São José do Rio Preto/SP, mantinha em cativeiro 03 (três) aves com anilhas (selos de identificação exigidos pelo Ibama - Instituto Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis) adulteradas, tendo em vista que todas se encontravam violadas, ou seja, em desconformidade com as exigências do artigo 20, inciso II, da Instrução Normativa IBAMA nº 15, de 22 de dezembro de 2010.
As espécies encontradas em poder do denunciado consistiam em um Saltator similis (trinca-ferro) de anilha IBAMA nº 062991, uma Sporophila lineola (bigodinho) com anilha IBAMA nº 147382 e um Zonotrichia capensis (tico-tico) com anilha IBAMA nº 514021, todos considerados pássaros da fauna silvestre brasileira, consoante Instrução Normativa IBAMA nº 10, de 20 de setembro de 2011.
A materialidade do delito encontra-se no boletim de ocorrência (fls. 05/06), Auto de Infração Ambiental( fl. 07), e termo de apreensão dos pássaros e suas gaiolas (fl. 09. Por sua vez, o SISPASS (Sistema de Cadastro de Criadores Amadoristas de Passeriformes) revela, por meio do histórico das anilhas juntas aos torsos das aves, que o denunciado mantinha os pássaros em cativeiro desde os anos de 2007 e 2009 (fls. 29/31).
Apreendeu-se a anilha inscrita sob nº 062991 para análise da perícia (fl. 14). O laudo pericial, de folhas 21/24, revelou que a anilha inspecionada apresentava medidas incompatíveis com as anilhas padrões, além de se encontrar violada, sendo, portanto, adulterada.
Cumpre salientar que as anilhas são anéis de metal, codificados sequencialmente, e só podem ser fornecidas pelo órgão ambiental (IBAMA). São considerados selo público, ou seja, são sinais de autenticação de atos oficiais e, portanto, são propriedades do governo brasileiro." - grifos de acordo com o original

A rejeição da denúncia ocorreu em 13/12/2013 (fls. 83/85), tendo o Juízo "a quo" fundamentado sua decisão nos seguintes termos:

"In casu, não há elementos nos autos comprovando que os acusados tenham, efetivamente feito uso de identificadores (anilhas) de órgão da Administração Pública. Assim, não havendo condenação pelo crime de falsificação, por inexistência do dolo, não há como prosperar a imputação do delito do artigo 29, §1º, inciso III, da Lei 9.605/98.
No direito penal, a dúvida deve ser interpretada em favor do acusado, observando-se que o laudo pericial faz referência apenas aos materiais apreendidos, não fazendo qualquer referência aos pássaros, ensejando assim a aplicação do princípio "in dubio pro reo".
Por tais razões, entendo não existir justa causa para a ação penal."

Inconformado, o Ministério Público Federal interpôs Recurso em Sentido Estrito (fls. 91/93-V), requerendo a reforma da decisão para o fim de recebimento da denúncia ofertada. Sustenta, em síntese, que há indícios suficientes de autoria e materialidade dos crimes cometidos pelo denunciado. Aduz que na fase do recebimento da denúncia vige o princípio do in dubio pro societate.

As contrarrazões foram ofertadas às fls. 100/102. Requer a defesa a manutenção da sentença que rejeitou a denúncia, com base na inexistência de justa causa para a ação penal e do princípio in dubio pro reo.

Foi mantida a decisão recorrida em sede de Juízo de retratação (fl. 103).

Após, subiram os autos a esta E. Corte, onde o Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso (fls. 108/110).

Dispensada a revisão, na forma regimental.

É O RELATÓRIO.



VOTO

Dispõe o art. 41, do Código de Processo Penal, que a denúncia conterá a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol de testemunhas. A não observância dos requisitos supracitados implica a inépcia da inicial acusatória e tem por consequência a sua rejeição, nos termos da nova redação do art. 395, inciso I, do Código de Processo Penal.

Consta da exordial que o denunciado cometeu os crimes capitulados no artigo 29, §1º, inciso III da Lei nº 9.605/1998 e do artigo 296, §1º, inciso III do Código Penal.

Nos termos do artigo 29, §1º, inciso III da Lei 9.605/1998:

Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:
Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa.
§ 1º Incorre nas mesmas penas:
III - quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente.

Já o artigo 296, §1º, III do Código Penal:

Art. 296 - Falsificar, fabricando-os ou alterando-os:
I - selo público destinado a autenticar atos oficiais da União, de Estado ou de Município;
II - selo ou sinal atribuído por lei a entidade de direito público, ou a autoridade, ou sinal público de tabelião:
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.
§ 1º - Incorre nas mesmas penas:
III - quem altera, falsifica ou faz uso indevido de marcas, logotipos, siglas ou quaisquer outros símbolos utilizados ou identificadores de órgãos ou entidades da Administração Pública.

Consta da denúncia que o recorrido teria mantido sob sua guarda três aves silvestres, cujas anilhas apresentavam sinais de adulteração, sendo que todas se encontravam se encontravam violadas e em desconformidade com as exigências do artigo 20, II da Instrução Normativa do IBAMA nº 15, de 22 de dezembro de 2010.

Foi elaborado laudo biológico (fl. 62), e as espécies encontradas em poder do denunciado consistiam em um Saltator similis (trinca-ferro) de anilha IBAMA nº 062991, uma Sporophila lineola (bigodinho) com anilha IBAMA nº 147382 e um Zonotrichia capensis (tico-tico) com anilha IBAMA nº 514021, todos considerados pássaros da fauna silvestre brasileira, consoante Instrução Normativa IBAMA nº 10, de 20 de setembro de 2011.

E ainda que não tenha sido demonstrado que o denunciado teria adulterado as anilhas identificadoras nas aves silvestres, a denúncia indica que estava na guarda dos animais silvestres, que portavam anilhas violadas e adulteradas, o que se coaduna com a imputação indicada na denúncia. Nesse sentido, já decidiu este Tribunal Regional Federal da 3ª Região:

PENAL - PROCESSUAL PENAL - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - DENÚNCIA QUE PREENCHE OS REQUISITOS DO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA E MATERIALIDADE - DELITOS DESCRITOS NO ART. 29, § 1º, INC. III, DA LEI 9.605/98 E ART. 296, § 1º, INC. III, DO CÓDIGO PENAL - PROVIMENTO DO RECURSO.
1. Prática do delito descrito no art. 29, § 1º, inc. III, da Lei 9.605 /98, e no art. 296, § 1º, inc. III, do Código Penal.
2. Ainda que não se comprove que o acusado efetivamente adulterou ou falsificou os identificadores do IBAMA, os autos demonstram o uso indevido dos mesmos e, ainda, que mantinha em seu plantel aves que não possuíam anilhas, assim como estava em posse de pássaro com anilha adulterada.
3. Indícios suficientes de autoria e materialidade.
4. Denúncia encontra-se formalmente em ordem, preenchendo os requisitos do art. 41 do CPP, estando presentes as condições e pressupostos da ação.
5. Provimento do recurso ministerial.
(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, RSE 0003162-42.2013.4.03.6106, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, julgado em 28/04/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/05/2014)

Ambos os crimes imputados ao réu tem indícios de materialidade e autoria constantes nos autos, mais precisamente no Boletim de Ocorrência (fls. 05/08), no Termo de Destinação de animais, materiais e/ou produtos apreendidos (fls. 09/10), no Laudo de Constatação referente Mensurações de Diâmetros de Anéis de Identificação de Passeriformes (fls. 11/12), no Auto de Apreensão (fls. 14) e no Laudo de Pericia Criminal Federal - Documentoscopia (fls. 21/24).

Verifica-se que a falta de justa causa no presente caso não foi evidenciada de plano, sendo que a inicial acusatória descreve fatos passíveis de serem imputados ao acusado, eis que evidenciam a ocorrência de fato típico, qual seja, a guarda em cativeiro de animais silvestres de forma irregular, com anilhas violadas, adulteradas ou falsas.

Imprescindível neste caso a instrução criminal para a apuração da responsabilidade ou não do réu.

Ademais, na fase do recebimento da denúncia, o principio jurídico in dubio pro societate deve prevalecer, devendo-se verificar a procedência da acusação e a presença de causas excludentes de antijuridicidade ou de punibilidade no decorrer da ação penal.

Nesse sentido:

PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE E DE USO DE SINAL FALSIFICADO. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA AFASTADA. INDÍCIOS DE AUTORIA DELITIVA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO SOCIETATE. RECURSO PROVIDO. (...) 4. Na fase inicial da ação penal vigora o princípio in dubio pro societate, cumprindo ao juiz a verificação da prova da existência do crime e indícios de autoria, bastando para o recebimento da denúncia a mera probabilidade de procedência da ação penal. (...)
(TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, RSE 0000159-79.2013.4.03.6106, Rel. JUIZ CONVOCADO MÁRCIO MESQUITA, julgado em 12/08/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2014) (destacamos)

Portanto, merece ser reformada a decisão recorrida para que a ação penal tenha seu regular curso, máxime quando a denúncia preenche os requisitos formais elencados no artigo 41 do Código de Processo Penal, não restando caracterizadas, de seu turno, nenhuma das causas impeditivas previstas no artigo 395 do Código de Processo Penal. O recebimento da denúncia com o consequente prosseguimento da persecutio criminis é de rigor, inclusive sob o pálio da regra in dubio pro societate, que vigora neste momento processual.


Diante do exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso ministerial, para receber a denúncia ofertada em desfavor de RUBENS BELARMINO, determinando o prosseguimento da ação penal.

É COMO VOTO.


PAULO FONTES
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES:67
Nº de Série do Certificado: 3DDA401E3F58F0FE
Data e Hora: 05/12/2014 13:21:15