D.E. Publicado em 21/05/2015 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares arguidas e dar parcial provimento aos recursos dos réus, para reduzir a pena base de ambos, restando ao final, para cada réu, fixadas em 02 anos e 08 meses de reclusão e ao pagamento de 26 dias-multa, no valor de 01 salário mínimo e, por maioria, fixar o regime inicial aberto para cumprimento da pena, substituindo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, nos termos do voto da relatora, com quem votou o Des. Fed. José Lunardelli, vencido o Des. Fed. Nino Toldo que fixava o regime semiaberto para o início de cumprimento da pena, sem substituição por penas restritivas de direitos.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelações criminais interpostas por EZIO RAHAL MELILLO e FRANCISCO ALBERTO DE MOURA SILVA, contra a r.sentença de fls. 1.181/1.212 (publicada em 22/08/2007 - fls. 1.213), que condenou, cada um dos réus, ao cumprimento da pena de 04 anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 133 dias multa, à razão de 01 salário mínimo do mês de 01/1995 corrigido ao tempo do pagamento, por infração ao artigo 171, §3º, c/c artigo 14, inciso I, ambos do Código Penal. Inviabilizada a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, a teor do artigo 44, III, do Código Penal. Impossibilitado o direto dos réus apelarem em liberdade.
Concedida liberdade provisória mediante fiança aos réus, cujos alvarás de soltura foram cumpridos em 11/01/2008 para EZIO RAHAL MELILLO e em 21/11/2008 para FRANCISCO ALBERTO DE MOURA SILVA (fls. 1485/1486, 1675/1678, 1752/1757 e 6221/6222).
A denúncia está lastreada no inquérito policial de nº 70357/2000, instaurado para a apuração de fraudes na obtenção de benefícios junto ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, mediante uso de documentação falsa.
Narra a denúncia (recebida em 25/03/2002 - fls. 247) que EZIO RAHAL MELILLO e FRANCISCO ALBERTO DE MOURA SILVA teriam falsificado a Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS de nº 97089, pertencente a José Bernardino da Silva (fls. 42 e 50/89), apresentada na ação judicial de requerimento de aposentadoria por tempo de serviço de nº 95.03.081444-8, julgada procedente em primeira instância e em sede recursal na sessão de julgamento de 09/11/1998 (fls. 48/98). Referido benefício foi implantado em 02/01/1995 (DIB) e a data do início do pagamento (DIP) se deu em 01/05/2001.
FRANCISCO ALBERTO DE MOURA SILVA, em suas razões recursais, preliminarmente, requer a reunião dos processos semelhantes que tramitam em seu nome. No mérito, pugna por sua absolvição, ao argumento de que a materialidade do crime de estelionato não restou comprovada, tampouco a autoria, restando o conjunto probatório insuficiente para ensejar decreto condenatório. Subsidiariamente, requer a redução da pena base aplicada (fls. 1709/1714).
EZIO RAHAL MELILLO, em suas razões recursais, requer, preliminarmente, a) o reconhecimento da inépcia da denúncia ante a aplicação da teoria do fruto da árvore venenosa, uma vez que o mandado de busca e apreensão foi cumprido em local diverso do constante do mandado, estando ausente representante da OAB no local da apreensão, além da Polícia Federal não ter preservado o local; b) cerceamento da defesa pela não conclusão da perícia grafotécnica; e c) nulidade da instrução processual, uma vez que a defesa não foi intimada da expedição da carta precatória para oitiva das testemunhas Mario Luís Fraga Netto e Denise Vidor Cassiano. No mérito, alega que não restou comprovada a prática do crime, porque não existe elemento de prova que caracterizaria o delito, não se comprovando o dolo, a fraude, o prejuízo, ou que tenha sido o responsável pela falsificação da CTPS do segurado. Subsidiariamente, requer a redução das penas impostas e o abrandamento do regime, observando-se, subsidiariamente, as penas impostas nos autos de nº 2000.61.08.009899-0 (fls. 1794/1828 e documentos de fls. 1829/6041).
Contrarrazões apresentadas (fls. 1767/1779).
Nesta Corte, a Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento dos recursos (fls. 6045/6056).
Reconhecida a conexão dos feitos pelo C. STF e noticiada a unificação de todos os processos e inquéritos policiais em andamento, conforme sentença proferida nos autos do processo nº 2002.61.08.000957-6 (fls. 6061/6118), o MPF lançou manifestações às fls. 6120, pela impossibilidade de reunião dos processos por estarem em fases distintas, a teor do artigo 82 do Código de Processo Penal.
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
Inicialmente, anoto que o corréu FRANCISCO pede a união da presente ação penal com outros processos que foram unificados por decisão do Juízo da 2ª Vara Federal de Bauru/SP.
Contudo, entendo que o pedido não pode ser deferido.
Com efeito, a possibilidade de determinar-se a unificação de processos em virtude de conexão deve ser verificada à luz do artigo 82 do Código de Processo Penal, que estabelece que, se em um dos processos cuja unificação se pretende já houver sido proferida sentença definitiva, a unificação não deverá ser procedida.
Nessa esteira é a lição de Eugênio Pacelli de Oliveira:
Sobre a questão, o Colendo STJ erigiu a Súmula 235, que porta o seguinte enunciado:
Dentro desse contexto, releva dizer que a sentença foi publicada nestes autos em de 22/08/2007 e a sentença que determinou a unificação de diversos outros processos envolvendo os réus foi proferida em momento posterior, ou seja, em 02/12/2008 (fls. 6061/6118), não sendo o caso de se falar em unidade de julgamento.
Assim sendo, a distância existente entre as fases dos diversos processos em questão constitui motivo relevante para que não sejam reunidos, a evidenciar que a separação dos processos é a medida mais adequada ao presente caso.
Afastada a hipótese de reunião dos feitos, nenhum prejuízo advirá aos recorridos, eis que a unidade dos processos se dará posteriormente, para fins de soma ou unificação das penas (artigo 82 Código de Processo Penal).
Nesse sentido:
A defesa de EZIO RAHAL MELILLO requer, por sua vez, o reconhecimento da inépcia da denúncia ante a aplicação da teoria do fruto da árvore venenosa. Alega que as provas do processo foram colhidas de forma arbitrária e ilegal pela Polícia Federal, uma vez que o Mandado de Busca e Apreensão restringia a busca apenas em determinado endereço ou escritório do corréu FRANCISCO.
Referido Mandado foi determinado nos autos do Procedimento Criminal Diverso de nº 2000.61.08.004738-6, nos seguintes termos:
A apreensão dos documentos ocorreu no dia 07/07/2000, junto ao escritório de advocacia localizado na Rua Coronel Rodrigues Simões, 191, São Manuel/SP, local identificado como escritório do corréu FRANCISCO, sendo tal ato acompanhado por dois representantes da OAB, conforme se observa do Auto Circunstanciado de Busca e Apreensão de fls. 1863/1928.
A alegação de que a Polícia Federal não preservou adequadamente o local em que foi cumprida a diligência, permitindo que o corréu FRANCISCO alterasse a situação fática "enxertando" documentos no escritório não tem fundamento. Além de o mandado expressamente não se restringir à local específico, não há provas cabais do alegado, e, mesmo que fosse o caso, tal fato em nada alteraria a verdade dos fatos aqui apurados.
Ademais, conforme bem salientado pela douta Procuradora Regional da República, eventual irregularidade na fase investigatória não contamina de forma absoluta a ação penal.
Nesse sentido:
Como se vê, a diligência que culminou na busca da CTPS de José Bernardino da Silva, entre outras, foi realizada nos termos da autorização judicial, observada a estrita legalidade, já que o local de busca não se restringia, conforme quer fazer valer a defesa, ao endereço declinado no mandado, sendo o ato devidamente acompanhado por representantes da OAB.
A defesa de EZIO alega, ainda, que houve cerceamento de defesa pela não conclusão da perícia grafotécnica, devendo ser anulada a r.sentença, para que seja realizado um Laudo Documentoscópico Complementar, a fim de identificar a autoria dos lançamentos falsos constantes da CTPS que consubstanciou a denúncia.
No entanto, tal diligência não têm cabimento no presente caso, e somente terá serventia para a procrastinação do presente julgamento.
Cabe ressaltar que os réus não estão sendo condenados pela prática do crime de falsidade, uma vez que a falsidade, no caso, funcionou como crime meio, absorvido pelo crime fim, qual seja, o estelionato.
Assim, totalmente dispensável a averiguação do autor das falsidades lançadas na CTPS de José Bernardino da Silva, mormente porque a mesma foi devidamente periciada, nos termos do Laudo Documentoscópico de fls. 121/123, que concluiu por sua falsidade.
Vale dizer, nesse ponto, que as provas colhidas nesses autos são suficientes para esclarecer o fato criminoso apurado, notadamente, para análise das teses defensivas desse corréu e do corréu FRANCISCO, não havendo necessidade de novas diligências além das que já foram produzidas para a formação de meu convencimento.
Por fim, EZIO protesta pela nulidade da instrução processual, uma vez que a defesa não foi intimada da expedição da carta precatória para oitiva das testemunhas Mario Luís Fraga Netto e Denise Vidor Cassiano.
Novamente sem razão a douta defesa.
Às fls. 477/493 e 495/509 estão colacionadas as cartas precatórias expedidas para oitiva das testemunhas de defesa em comento.
Nelas se observa que, em 17/08/2004 (fls. 485) e em 29/06/2004 (fls. 497-v), a defesa do corréu ÉZIO foi regularmente intimada, via imprensa oficial, das expedições das cartas precatórias, bem como, em 13/10/2004, da redesignação de audiência de uma das testemunhas.
Cumpre lembrar que o artigo 222 do Código de Processo Penal exige apenas de que as partes sejam intimadas da expedição da carta precatória, o que ocorreu no caso, cabendo ao interessado acompanhar a tramitação da carta e inteirar-se da data em que se realizará a audiência no Juízo Deprecado.
É nesses termos a Súmula 273, do Superior Tribunal de Justiça, verbis:
Por fim, anoto que a audiência deprecada foi devidamente acompanhada por defensor "ad hoc", conforme se observa às fls. 491/492, 506 e 509/510.
Rejeitadas todas as preliminares e indeferidas todas as diligências requeridas, prossigo na análise dos méritos recursais.
Segundo consta, José Benardino da Silva, a fim de requerer sua aposentadoria, procurou o escritório de advocacia de FRANCISCO ALBERTO DE MOURA SILVA, entregando-lhe sua CTPS, tendo EZIO RAHAL MELILLO ingressado com a ação judicial competente.
Ocorre que um dos vínculos empregatícios nela constante foi flagrantemente falsificado, favorecendo ao segurado a obtenção da aposentadoria que na época não tinha direito.
Segundo o apurado, a anotação relativa ao vínculo empregatício prestado pelo réu junto à fazenda São João do Baracat, no lapso de 01 de agosto de 1950 a 20 de novembro de 1978, sofreu grave adulteração no campo referente à data de admissão.
José Bernardino, em suas primeiras declarações, afirmou que somente em 1963 é que foi registrado na Fazenda São João, tendo trabalhado de 1950 a 1963 sem registro. Não soube explicar a rasura constante em sua CTPS, atribuindo-a ao advogado que cuidou de sua aposentadoria (fls. 100/102).
Em juízo esclareceu (fls. 389):
Realizada diligência fiscal na referida fazenda, foi apresentado o Livro Registro de Empregados nº 01 com Termo de Abertura datado de 08/04/1970 e registro na DRT datado de 14/04/1970. Nele consta o registro de empregado de José Bernardino da Silva, no período de 01/08/1963 a 20/11/1978, não sendo apresentado quaisquer documentos referente ao período de 01/08/1950 a 01/09/1963.
O subscritor dos lançamentos constantes da CTPS, José Baroni, não foi localizado a fim de confirmar a data do vínculo anotada (fls. 110/116).
O Laudo de Exame documentoscópico, por sua vez, ao analisar a CTPS, apesar de não conseguir identificar o autor das falsificações, concluiu que a mesma apresentava rasuras com supressão e posterior acréscimo nos campos "Data de Admissão" (pag.10) e "Gozou férias relativas ao período" (pag. 37), referente ao ano 1950, bem como às páginas 53 no primeiro lançamento manuscrito "São Manuel 13/01/70". Asseverou, por fim, que no espaço rasurado constava originalmente "1963" ao invés de "1950" (fls. 121/123).
Ademais a CTPS em questão foi emitida em 13 de janeiro de 1970 (fls. 42), quando já estaria em curso o vínculo trabalhista supostamente laborado.
Dessa forma, não há dúvidas de que a data de admissão do contrato de trabalho celebrado com a Fazenda São João do Baracat fora alterada para que o tempo de serviço exigido para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço fosse suficiente.
A CTPS do segurado foi utilizada para instruir a ação de nº 95.03.081444-8 (Ação Sumária de Aposentadoria por Tempo de Serviço), junto à 1ª Vara Cível da Comarca de São Manoel/SP, em petição assinada por EZIO RAHAL MELILLO. A ação foi julgada procedente em primeira instância em 03/05/1995, e confirmada em grau de recurso por esta Corte Regional em 09/11/1998 (fls. 48/98).
Às fls. 200/206, consta que o benefício em comento teve início no dia 02/01/1995 (DIB), com primeiro pagamento em 01/05/2001 (DIP).
Consta, ainda, que foi ajuizada ação rescisória pelo INSS para desconstituir o acordão deste Tribunal ( autos de nº 2001.03.00.012241-7), sendo deferida a antecipação de tutela para suspender os efeitos da decisão rescindenda em 25/05/2001 (fls. 343/345).
Como se vê, não só a autarquia previdenciária foi mantida em erro, como também esta Justiça Federal, já que a ação judicial interposta em primeira instância foi provida, sendo mantida sua procedência nesta Corte Regional.
Comprovada, portanto, a materialidade delitiva de estelionato, estando presentes a fraude, consistente na falsificação da CTPS; a vantagem ilícita, consistente na implantação do benefício previdenciário; e o prejuízo alheio sofrido pela Autarquia Previdenciária, que foi obrigada a implantar e pagar o benefício em decorrência de ação judicial lastreada em prova fraudulenta.
As autorias, da mesma forma, são indenes de dúvidas.
Com efeito, a análise do conjunto probatório nos remonta a outros inúmeros casos já julgados por esta Corte, em que as partes, na maioria, trabalhadores rurais com pouco grau de instrução, procuravam o escritório de FRANCISCO e EZIO na ânsia de conseguir sua aposentadoria, ocasião em que, ambos os réus, conluiados, com ou sem a ciência dos segurados, providenciavam a falsificação das CTPS apresentadas, incluindo vínculos empregatícios fictícios ou alterando dadas de admissão ou demissão, a fim de conseguir benefícios previdenciários que sem as falsificações não seriam concedidos.
Este processo não é diferente.
Vejamos.
FRANCISCO, em sede policial, negou as acusações, alegando que jamais efetuou rasuras em qualquer CTPS. Esclareceu que trabalhava com EZIO há aproximadamente 10 anos, sendo esse réu quem sempre representava os clientes em juízo. Os honorários eram combinados e pagos a EZIO, no valor de 30% do valor recebido, sendo sua parte, 10%. (fls. 142/149). Em juízo, acrescentou que quando cursou a faculdade de direito, fazia estágio e trabalhava no escritório de EZIO, na cidade de São Manuel/SP. Esclareceu que atendia os clientes no escritório junto com EZIO, o qual, antes de 1997 (data em que FRANCISCO sofreu um acidente automobilístico), dava atendimento de segunda a sexta, das 8h ao meio dia; depois, passou a atender de segunda, quarta e sexta; reduzindo, posteriormente, para terça e quinta; e, por fim, apenas às terças-feiras. Com relação aos fatos, nega que tenha feito qualquer adulteração na CTPS do segurado, até porque não se recorda de tê-lo atendido na primeira vez em que esteve no escritório. Acrescentou que no dia em que foi preso esteve no fórum para verificar a ação de José Bernardino e constatou que a declaração para concessão de assistência judiciária foi preenchida pelo corréu EZIO, o que demonstra não ser apenas ele quem atendia os clientes no escritório. Ressalta que José Bernardino trabalhou mais de 38 anos, quando o tempo mínimo exigido é de 30 anos, sendo certo que só na Fazenda Baracat, conforme o segurado declarou na Polícia Federal, trabalhou de 1950 até 1978 (fls. 219/220).
EZIO, em sede policial, também negou as acusações e declarou que recebia a documentação já preparada por FRANCISCO, que se incumbia dos contatos iniciais, e, se estivesse tudo certo, preparava e protocolizava o pedido na via judicial, ficando responsável pelo acompanhamento da ação e recebimento dos valores devidos, bem como honorários, que eram fixados em 30% e divididos entre ele, sua sócia e FRANCISCO (fls. 125/130). Em juízo, acrescentou que os documentos dos clientes de FRANCISCO eram todos cópias dos originais, limitando-se a verificar se os segurados preenchiam os requisitos da ação para ajuizamento. Relativamente ao presente caso, afirmou que sua atuação limitou-se ao suporte processual, já que o segurado era cliente do corréu FRANCISCO, assim como todos os outros de São Manuel/SP. Por fim, afirmou que nunca teve escritório em São Manuel/SP (fls. 266).
As negativas dos réus não se sustentam.
No presente caso, o segurado José Bernardino claramente assegurou que trabalhou sem registro nos anos de 1950 a 1963, não constando tal período na CTPS que entregou para o escritório de advocacia, tendo sido sua CTPS flagrantemente falsificada.
Vale ressaltar que, sem a extensão fraudulenta do período laborado, o segurado não fazia jus, na época, ao benefício previdenciário.
A par disso, registro a existência de diversos testemunhos (fls. 335/338, 353/362, 396/403, 406 e 612/614), cujas declarações pertencem a outros autos e aqui são provas emprestadas, que, notadamente, auxiliam na formação da culpa ao corroborar a forma de atuação dos réus.
Da análise dessa documentação, percebe-se o modus operandi dos réus, que normalmente solicitava aos seus clientes que providenciassem CTPS novas sob a alegação de terem perdido as originais, para que pudessem proceder aos falsos lançamentos, bem como as adulterações, revelando, ainda, como orientavam tais clientes após apreensão das carteiras de trabalho.
Confirmando as condutas ilícitas dos réus, as testemunhas arroladas pela acusação nesses autos, Maria Inez Malacisi e Antonio Luiz Batista da Silva (fls. 390/392).
De outro lado, a testemunha arrolada pela defesa, Maria Helena Melo Martins, declarou que sabia que os réus trabalhavam juntos, acreditando que o escritório era de EZIO e que FRANCISCO "tocava" o escritório para ele (fls. 463).
Nilze Maria Pinheiro Aranha, sócia de EZIO no escritório de advocacia em Botucatu/SP, declarou que seu escritório tinha parceria com o escritório de FRANCISCO, e, nessa condição, recebiam os documentos que lhes eram enviados para que ajuizassem ações previdenciárias (fls. 471). Nesse sentido, as declarações de Mario Roque Simões Filho e Fabio Roberto Piozzi - funcionários do escritório de ÉZIO, na época (fls. 463/465), e Mario Luiz Fraga Neto e Denise Vidor Cassiano, advogados de outras cidades que também mantinha parceria com o corréu EZIO na cidade de São Manuel/SP (fls. 489).
As testemunhas ouvidas às fls. 472, 579, 580, 581 e 602 nada acrescentaram aos fatos.
Às fls. 731 e 905/1135, a defesa de ÉZIO juntou diversos documentos, notadamente, cópia autenticada de declaração firmada por escritura pública prestada por Valter Rodrigues Leão, afirmando que FRANCISCO MOURA havia lhe confidenciado que agia à revelia de EZIO, bem como diversos depoimentos extraídos de outros feitos, nos quais as testemunhas afirmaram desconhecer ÉZIO ou não ter contato com ele.
Acompanhando suas razões de apelação, ÉZIO também juntou inúmeros documentos que se referem, em síntese, a cópias de peças de outros processos nos quais está sendo julgado por fatos semelhantes, procurações, renúncias de mandados e honorários de ações que estavam em curso, recibos de pagamento de clientes, etc (fls. 1829/6041).
Observo que tais documentos em nada influenciam minha convicção, que restou seguramente firmada pelo conjunto probatório produzido em época própria, sob o crivo do contraditório, tampouco seu conteúdo pode ser considerado provas novas aptas a ensejar abertura de vistas às partes contrárias.
Expostas as provas, a autoria de ambos os réus está comprovada e não deixa dúvida.
Do conjunto probatório infere-se que ÉZIO, advogado militante na cidade de Botucatu-SP e região, possuía uma parceria de atendimentos, distribuição de ações e divisão de honorários com FRANCISCO, também causídico e pessoa muito conhecida na cidade de São Manuel-SP, forte militante na área trabalhista e previdenciária, bem como, política.
O atendimento preliminar era feito no escritório de FRANCISCO, que em geral era o responsável por angariar clientes, pessoas simples, trabalhadoras da zona rural e de pouca instrução, a quem confiavam a documentação necessária para obtenção de benefício previdenciário a partir da entrevista para panorâmica do caso.
Desde o atendimento inicial, em geral, os clientes deixavam suas carteiras de trabalho no referido escritório, de molde a instruir o pedido judicial e eram orientados a solicitar uma segunda via do documento. Tal orientação viabilizava o forjamento dos dados utilizados na inicial, que eram, por sua vez, inverídicos porque traçavam datas, períodos, dados e empregadores que não correspondiam à realidade trazida pelo segurado/beneficiário, de molde a justificar a concessão do benefício pleiteado, cujo pagamento, pelas declarações das testemunhas, ora era realizado com a fixação de uma porcentagem de honorários, ora se dava pela retenção dos "atrasados" pelos advogados.
A fraude foi descoberta com a apreensão de aproximadamente 800 (oitocentas) carteiras de trabalho no escritório de FRANCISCO.
Conclui-se, portanto, que FRANCISCO era o responsável por realizar os atendimentos iniciais, usualmente retinha as carteiras de trabalho dos clientes e cuidava da documentação necessária para a propositura da ação previdenciária.
ÉZIO responsabilizava-se pela instrução processual dos feitos, inclusive atendendo os clientes que buscavam informações sobre os andamentos de suas respectivas ações, na cidade de São Manuel/SP.
Traçando essas linhas gerais, percebe-se a linearidade da conduta e atuação dos envolvidos o que restou descoberto com a apreensão de das inúmeras carteiras de trabalho no escritório de FRANCISCO.
Essa medida levou o Ministério Público Federal a ingressar com centenas de ações penais visando à investigação e a eventual punição dos réus por fatos semelhantes entre si, sendo os presentes autos resultante da apreensão de um desses documentos, em nome de José Bernardino da Silva.
ÉZIO insiste na tese de que desconhecia todo embuste, que segundo alega era tramado por FRANCISCO, na medida em que apenas conduzia o andamento processual das ações, recebendo por cópias os documentos reputados como inverídicos, o que justifica sua total ignorância acerca da fraude.
Para provar o alegado juntou aos autos inúmeros documentos coletados em outros processos que versam sobre fatos semelhantes.
Sua versão não é sustentável.
Em uma análise inicial, mesmo se considerarmos que FRANCISCO era o responsável por realizar os atendimentos iniciais e usualmente retinha as carteiras de trabalho dos clientes, o argumento de que EZIO lidava somente com a cópia dos documentos não parece crível, na medida em que ele mesmo, em seu interrogatório judicial, afirma comparecer pessoalmente ao escritório de São Manuel, em determinados dias da semana, e, ao final, às terças-feiras, contribuindo, inclusive, com o rateio das despesas do local.
Nesse aspecto, seu argumento de defesa reforça a sua participação, justamente porque não é crível que um advogado, que entrevistava pessoalmente seus clientes, comparecia às audiências, acompanhava a instrução processual e que ingressou com centenas de ações, não questionasse, ou que até mesmo não fosse questionado, a respeito dos dados que em confronto com a realidade não eram verídicos.
Como acreditar, portanto, que em nenhuma dessas "centenas" de situações a verdade não transparecesse aos olhos dos advogados, um que angariava os clientes e o outro que cuidava do andamento na Justiça das causas?
Evidentemente não há resposta razoável.
Também não há explicação para a retenção de tantas carteiras pelos réus, que inevitavelmente encontra resposta no ocultamento de provas da falsificação.
Observo que o fato de José Bernardino da Silva ter entregue sua CTPS a FRANCISCO tendo pouco contato com EZIO não desvincula nenhum dos réus de suas responsabilidades, haja vista a evidente comprovação de que de fato ambos atuavam em conjunto na obtenção de documentos e ajuizamento de ações.
Ademais, se é verdade que o segurado tinha o tempo necessário para se aposentar, tal fato não ilude a fraude intentada pelos réus neste processo e é questão a ser discutida em autos administrativo ou judicial próprios, instruído com provas obviamente idôneas.
Não merece prosperar, portanto, qualquer alegação de eventuais contradições nos depoimentos das testemunhas, uma vez que tais declarações em consonância com as provas coligidas nos autos confirmam e esclarecem o modus operandi dos réus à saciedade.
Insta salientar, que é indiferente, no que concerne à consumação do delito, se os lançamentos apostos na CTPS em questão, promanaram ou não do punho dos réus.
Em outras palavras, ainda que as anotações inverídicas não sejam de autoria dos réus, estes não estão isentos da autoria da contrafação com intuito de fraude, porque conscientemente utilizaram as informações inidôneas, induzindo terceiro a erro, em detrimento da autarquia previdenciária.
É nessa linha a orientação jurisprudencial desta Corte:
Dessa forma, sob qualquer ângulo que se analise, as responsabilidades pelos lançamentos inidôneos lançados na CTPS de José Bernardino da Silva somente podem ser atribuídas a FRANCISCO e EZIO.
Aliado a isso, não há nos autos explicação plausível para as centenas de carteiras de trabalho encontradas no escritório de São Manuel-SP inquinadas, em sua maioria, de falsos vínculos empregatícios, utilizadas judicialmente para instrução de pedidos de benefícios previdenciários espúrios, em especial a ação ordinária de José Bernardino, que é o objeto dos presentes autos.
Por fim, vale dizer que não prospera a insistência de FRANCISCO em se apoiar no infeliz acidente automobilístico sofrido em 11/1997, uma vez que os fatos em questão se referem a atos anteriores a tal data, e a inicial da ação judiciária subscrita por EZIO ocorreu em 01/1995 (fls. 48/49).
A par de todas as argumentações, tenho que a acusação comprovou satisfatoriamente as condutas narradas na denúncia, que imputam a fraude praticada por FRANCISCO ALBERTO DE MOURA SILVA e EZIO RAHAL MELILLO.
Logo, o édito condenatório é de rigor e merece ser mantido.
Passo à análise da dosimetria da pena.
Na primeira fase da dosimetria, o juízo a quo elevou a pena base para 03 anos e 100 dias multa, em razão do artigo 59 do Código Penal, fundamentando o aumento em razão dos péssimos antecedentes dos réus, considerados diante das centenas de inquéritos policiais instaurados visando à apuração de fraudes perpetradas contra a autarquia federal enquanto patronos de causas previdenciárias de pessoas simples e de labor rurícola.
De fato, a pena base deve ser severamente elevada, todavia, por motivo outro que não os antecedentes desabonadores, nos termos da Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça.
Inegavelmente as condutas dos réus merecem maior repreensão por não se tratar de pessoas leigas às letras da lei.
Ao reverso, são advogados experientes, situação que denota culpabilidade acima do normal do esperado para o tipo, na medida em que a reprovabilidade daquele que conhece a lei e a maneja em desfavor do poder público e social, exclusivamente em seu interesse, apresenta conduta consideravelmente desonrosa e imoral, não condizente com o papel constitucional de auxiliar da Justiça.
Agem, portanto, com maior desvalor do injusto do que pessoa sem formação jurídica específica.
Precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça (EDcl nos EDcl no REsp 827940/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 02/04/2009, DJe 20/04/2009), do E. Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Apelação criminal 2001.51.01.529183-4, Relator: Des.Fed.Liliane Roriz - 2a.Turma Especializada, data do julgamento: 15/09/2009 e Apelação criminal , 2004.50.01.008130-7, Relator: Des. Fed Abel Gomes - 1a.Turma Especializada, data do julgamento: 05/08/2009) e desta Corte (Acr 2000.60.00.007515-1, Relator: Johonsom di Salvo/Primeira Turma, DJU 13/12/2005), corroboram este entendimento.
Apesar disso, entendo que o aumento efetuado foi exacerbado, devendo a pena base ser reduzida para 02 anos de reclusão e 20 dias multa, tendo em vista a correção da fundamentação acima exposta.
Observo que neste feito, ao contrário de outro semelhante em que a pena base foi majorada para 02 anos e 06 meses de reclusão e 25 dias multa (autos de nº 2001.61.08.00.1568-7 e 2001.61.08.001604-7), não há mínima alusão de que os réus se utilizavam de menores de idade para falsificar os documentos, motivo pelo qual, a pena destes autos resta fixada em patamar inferior.
Não há agravantes ou atenuantes.
De rigor a manutenção do §3º do artigo 171 do Código Penal, eis que a ação foi praticada em detrimento de autarquia federal, o que definitivamente eleva a pena corporal para 02 anos e 08 meses de reclusão e 26 dias multa.
O quantum do dia multa deve ser mantido em 01 salário mínimo no mês de 01/1995, frente às favoráveis condições econômicas dos réus, que eram advogados atuantes na região interiorana de São Paulo.
Em relação ao regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade, fica alterado para o aberto, ex vi do artigo 33, §2º, "c" e §3º, do CP.
Em relação à viabilidade de substituição por restritivas de direitos, na forma do artigo 44 do Código Penal, tenho que os réus fazem jus à benesse.
Portanto, substituo a pena privativa de liberdade, de cada réu, por duas restritivas de direitos consistentes em uma prestação de serviços à comunidade, o que destaco perdurar pelo tempo da pena substituída, e uma pena de multa que fixo em 07 salários mínimos, a ser cumprida em benefício de instituição pública ou de destinação social.
Nesse aspecto importante observar o montante do prejuízo causado à entidade pública, já que o segurado recebeu indevidamente o benefício em 01/05/2001 (DIP), cuja data do início se deu em 02/01/1995 (DIB).
Observa-se que a suspensão do benefício se deu em sede de tutela antecipada no dia 25/05/2001, posteriormente, portanto, ao início do recebimento.
Logo, sem perder de vista a favorável capacidade econômica dos réus, mas considerando também o prejuízo causado, tratando-se, no caso, de crime de natureza patrimonial de evidente prejuízo aos cofres públicos, entendo razoável a fixação da prestação pecuniária em 07 salários mínimos, para cada réu, que deve ser paga em benefício de instituição pública ou de destinação social a ser indicada pelo Juízo da execução.
Anote-se que a forma de pagamento, de maneira a preservar a exequibilidade do julgado, também deverá ser determinada pelo Juízo da execução.
Ante o exposto, rejeito as preliminares arguidas e dou parcial provimento aos recursos dos réus, para reduzir a pena base de ambos, restando ao final, para cada réu, fixadas em 02 anos e 08 meses de reclusão, a ser cumprida no regime inicial aberto, e ao pagamento de 26 dias multa, no valor de 01 salário mínimo, substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito..
É o voto.
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