Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 30/04/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017298-43.2005.4.03.6100/SP
2005.61.00.017298-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal NERY JUNIOR
APELANTE : RICHARD RASMUSSEN
ADVOGADO : SP017863 JOSEVAL PEIXOTO GUIMARAES e outro
APELANTE : Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovaveis IBAMA
ADVOGADO : SP179488B ISABELLA MARIANA SAMPAIO PINHEIRO DE CASTRO e outro
APELADO(A) : Ministerio Publico Federal
ADVOGADO : ANA CRISTINA BANDEIRA LINS e outro
APELADO(A) : OS MESMOS

EMENTA

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL. PODER DE POLÍCIA. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. ARTIGO 5º, XXXV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INTERESSE DE AGIR CONFIGURADO. BUSCA E APREENSÃO. RESERVA JURISDICIONAL.

1- Cuida-se de apelação interposta pelo autor IBAMA e pelo réu contra a sentença que julgou simultaneamente a Ação Civil Pública e Ação Cautelar nº 200561000143697 (em apenso), dando procedência ao pedido de indenização por dano ambiental, promovida em face de Richard Rasmussen, responsável pelo Criadouro Conservacionista, carreando-lhe a condenação ao pagamento de indenização e obrigação de fazer, sob pena de fixação de multa diária, bem como honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
2-Não ocorre a alegada falta de interesse de agir, uma vez que a lide é necessária e útil ao fim manejado pela parte autora, em razão do princípio da inafastabilidade da jurisdição, bem como porque a medida de busca e apreensão é ato sujeito ao princípio do reserva de jurisdição, amplamente reconhecidos pela jurisprudência do STJ e STF.
3-Igualmente em razão do princípio da inafastabilidade da Jurisdição, não há necessidade de exaurir as instâncias administrativas, não implicando em ausência de interesse jurídico dos autores, o fato dos processos administrativos de interesse do réu ainda estarem em curso quando do ajuizamento da ação, pois o acesso ao Judiciário é assegurado a todos, independentemente do esgotamento da esfera administrativa.
4- A independência das instâncias demonstra não haver prejuízo algum para a ação judicial, que tem como objeto a responsabilização civil por dano ambiental, pois, ainda que decorram do mesmo fato, os procedimentos e sanções são diversos.
5- O ingresso no domicílio, durante o dia, sujeita-se à cláusula de reserva jurisdicional consistente na expressa previsão constitucional de competência exclusiva dos órgãos do Poder Judiciário, com total exclusão de qualquer outro órgão administrativo.
6- A Administração atua sob a direção do princípio da legalidade, de modo que, ao anular a Informação Técnica nº 122/2004, reconhecendo o impedimento do servidor, não só retirou a validade do conteúdo do ato, como a possibilidade de sua impugnação, no que se refere ao inconformismo das informações prestadas, restaurando assim a legalidade malferida.
7- Observa-se das provas apresentadas nos autos, que no Criadouro Conservacionista "Toca da Tartaruga foram encontradas inúmeras irregularidades que, inobstante o prazo concedido para adequação, não foram sanadas, bem como outras condutas que caracterizam dano ambiental, levando o IBAMA e o Ministério Público a promover a presente ação civil pública.
8- Ante a ausência de fundamentação, visto que a parte recorrente se limitou a requerer a redução do valor, sem dizer as razões pelas quais os valores arbitrados na sentença não estão corretos, mantenho os valores das indenizações como fixados na sentença.
9- Foi consignado na sentença que os recursos seriam repassados a outras entidades, caso fosse noticiada qualquer irregularidade em relação às organizações, assim, por ocasião da execução de sentença, poderá a parte autora considerar tais condições, devendo a sentença ser mantida nesse aspecto.
10- Apelações improvidas. Sentença mantida.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 23 de abril de 2015.
NERY JÚNIOR
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 27/04/2015 14:59:01



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017298-43.2005.4.03.6100/SP
2005.61.00.017298-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal NERY JUNIOR
APELANTE : RICHARD RASMUSSEN
ADVOGADO : SP017863 JOSEVAL PEIXOTO GUIMARAES e outro
APELANTE : Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovaveis IBAMA
ADVOGADO : SP179488B ISABELLA MARIANA SAMPAIO PINHEIRO DE CASTRO e outro
APELADO(A) : Ministerio Publico Federal
ADVOGADO : ANA CRISTINA BANDEIRA LINS e outro
APELADO(A) : OS MESMOS

RELATÓRIO


Cuida-se de apelação interposta pelo autor IBAMA e pelo réu contra a sentença que julgou simultaneamente a Ação Civil Pública e Ação Cautelar nº 200561000143697 (em apenso), dando procedência ao pedido de indenização por dano ambiental, promovida em face de Richard Rasmussen, responsável pelo Criadouro Conservacionista, carreando-lhe a condenação ao pagamento de indenização e obrigação de fazer, sob pena de fixação de multa diária, bem como honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.

Expõe a parte autora na inicial que ajuizaram ação cautelar preparatória, pleiteando a expedição de autorização judicial de busca para apreensão administrativa e transferência dos animais localizados no Criadouro Conservacionista de propriedade do réu, denominado "Casa da Tartaruga", bem como para que fosse determinado ao requerido o pagamento das despesas de manutenção dos animais e dos custos para sua reintrodução na natureza.

Informam que obtiveram liminar nesse sentido e dentro do prazo legal promoveram a presente ação.

Relatam que Richard Rasmussen é responsável pelo Criadouro Conservacionista "Toca da Tartaruga", registrado sob o n. 2/35/1999/000432-3 em 23/9/1999, sendo que desde seu registro houve diversas regularidades relatadas na Informação Técnica nº 42/2005, exarada em 8 de março de 2005 pela Coordenação de Gestão do Uso de Espécies da Fauna (COEFA), como animais sem justificação de origem, sem marcação, falta de documentos de saída dos animais do plantel, condições inadequadas de manutenção.

Discorre que tais irregularidades resultaram em lavratura de autos de infração, os quais de resumem:

Em 9/9/1999, quando protocolado o projeto de Criadouro Conservacionista, o réu já possuía plantel de aves e répteis sem origem conhecida;

Em 10/8/2000, ao analisar o relatório anual 99/2000, foi constada a falta de comprovação da origem de oito flamingos e de todas as aquisições referentes às entradas dos animais e respectivas marcações;

Em 28/1/2002, foi apresentada pela própria responsável técnica do Criadouro, um documento apontando diversas irregularidades, entre elas, o ingresso de 223 sem origem conhecida, provenientes de entregas voluntárias, 96 aves evadiram do criadouro, devido a fortes chuvas, 285 foram depositados pelos órgãos de fiscalização e 485 espécies sem marcação, representando 95% do plantel.

Em 2002 o IBAMA analisou a evolução do plantel no período de 2001/2002, sendo constatada a falta de saída de 220 animais, sendo vários ameaçados de extinção cuja defesa do réu se resumiu na afirmação de que vários passeriformes foram devorados por roedores, o que impediria a realização da necropsia.

Semelhantes irregularidades foram constatadas em 28/11/2002, conforme consta no documento 3 anexado aos autos, fls. 64/66, acentuando-se na inicial a falta de cuidado com animais e recinto de tamanho inadequado.

Diante das constatações foi lavrado o Auto de Infração nº 009.600-D (doc. 5), fl. 69, por manter cativeiro ou depósito, espécimes da Fauna Silvestre Brasileira e Exótica, sem a devida permissão, licença ou autorização do IBAMA e sem comprovação de origem, sendo o réu notificado, a documentação sobre a origem dos animais não foi aceita.

Em fevereiro de 2003 foi constatado que os animais sofriam maus tratos, conforme consta do relatório de fls. 74/110, eis que várias espécies compartilhava o mesmo recinto, inadequadamente, com oferta de alimentos e água também inadequada, não havia metodologia de medicina veterinária preventiva etc.

Em 19/5/2003, durante nova vistoria, foram lavrados os seguintes autos de infração: 261.877-D fls. 113, por introduzir espécime animal no país, sem licença do IBAMA; 262.735-D de fls. 115, posteriormente substituído pelo nº 262.760-D de fls. 116, por dar destinação e/ou permuta de espécimes da fauna silvestre nativa, sem a devida permissão, auto de infração nº 262.408/D de fls. 117, por manter em cativeiro espécimes da fauna silvestre em comprovação de origem .

Ante as irregularidades foi solicitado o cancelamento do registro do Criadouro Conservacionista, contudo, o réu solicitou sua conversão em Zoológico, sendo que enquanto o procedimento era instruído, foi notificado sobre a proibição de visitação pública e o recebimento ou saída de qualquer animal.

Em nova vistoria realizada em 12/1/2004 foi constatado que faltavam diversos animais que constavam da fiscalização anterior, existindo outros que não constavam, vários micos-estrela estavam mortos na sala de atendimento veterinário e um morto no recinto, cães circulavam livremente no recinto de diversas aves e saguis, filhotes de onça eram mantidos em canil, entre outras irregularidades.

Em nova fiscalização levada a efeito em 3/3/2004 verificou-se que persistiam as irregularidades.

Expõem os autores que diante das reiteradas irregularidades concluiu-se ser necessário o cancelamento do registro do Criadouro Conservacionista, concluindo que o réu Richard Rasmissen é responsável pelos seguintes danos causados à fauna: elevado número de morte de animais devido às más condições do criadouro; maus tratos, diante das condições de insalubridade, fugas, mortes por predadores, falta de cuidados veterinários e devida alimentação; nas recorrentes fugas de animais já acostumados à vida em cativeiro, sem o acompanhamento de sua devida reinserção na natureza; nos indícios de ainda maior número de mortes, fugas ou venda a pessoa sem condições de receber animais, diante da ausência de documentos de destino dos animais desaparecidos; na recepção de animais apanhados na natureza, por não haver documento comprobatório de origem lícita; nos danos causados aos ecossistemas nacionais pela introdução de espécimes exótica.

Requereram a condenação do réu ao pagamento de indenização civil por dano ao meio ambiente, no valor de R$ 393.150,00 (trezentos e noventa e três mil cento e cinquenta reais ), devidamente a partir da distribuição, valor que deverá ser destinado a um Projeto para se aprimorar o manejo e fiscalização da fauna, no intuito de combater o tráfico de animais, a ser especificado na fase de execução da decisão condenatória.

Na ação cautelar preparatória foi requerido a confirmação da liminar, a fim de que fosse determinado ao réu que arcasse com o pagamento das despesas de manutenção dos animais e dos custos para sua reintrodução na natureza, transferidos do Criadouro Conservacionista.

Deu a causa o valor de R$ 393.150,00 e anexou os documentos de fls. 36/157.

Os autos foram apensados à medida cautelar 200561000143697, sendo determinada a citação do réu.

O réu apresentou contestação arguindo preliminarmente falta de interesse de agir. Assinala que o IBAMA, possui Poder de Polícia para fazer cumprir a lei ambiental, em especial a apreensão de animais, sendo desnecessário o provimento jurisdicional (fls. 175/197 e documentos de fls. 198/226).

Assevera que o ato administrativo "Informação nº 42/2005 - COEFA", anexado na cautelar às fls. 168/174 é nulo.

Informa que em 5/11/2004 arguiu impedimento do servidor Marcelo Américo de Almeida, médico veterinário e técnico responsável do Criadouro na época de seu registro (doc. de fls. 175 da cautelar) e requereu a nulidade de todos os atos decorrentes da Informação Técnica nº 122/2004, sendo decidido favoravelmente, no sentido de anular as informações questionadas.

Conclui o réu que todos os atos decisórios apoiados nas informações prestadas pelo sr. Marcelo Américo de Almeida estariam nulos de pleno direito, sob o prisma do princípio da causalidade, não podendo tal nulidade ser apenas parcial.

Afirma que existe uma perseguição gratuita contra sua pessoa, pois requereu a expedição de certidão junto ao IBAMA, solicitando informações sobre todos os processos existentes contra si, com informações detalhadas, direito constitucionalmente assegurado, o qual não foi atendido, somente por não constar no pedido, o número do processo e do auto de infração.

Sustenta que não praticou os atos ilícitos descritos na inicial, reafirmando que os pareceres anexados não têm validade, diante da anulação dos atos do Sr. Marcelo.

Explicitou que já possuía animais quando requereu e obteve a homologação do pedido de registro do Criadouro Conservacionista homologado, que foi deferido com base no relatório de vistoria efetuado pelo IBAMA.

Aduz que mesmo após as posteriores vistorias feitas pelo IBAMA, foi intimado para apresentar projeto para transformar o espaço do Criadouro em Zoológico, o qual foi apresentado, sendo iniciado as obras para implementação.

Discorre que em 9/3/2004, relatam os biólogos, através da Informação Técnica, que foram comprovadas as origens lícitas dos animais, com os documentos necessários para tanto, sendo apenas feitas algumas recomendações, com proibição de receber visitação pública, até que se adequasse o recinto.

Giza que em 30.4.2004 informou o IBAMA que a reforma estava concluída e pronta para ser vistoriada.

Sustenta que os autores se utilizam desta ação para prejudicar o réu, ou ao menos alguns funcionários do IBAMA, que lhe causaram danos não só patrimoniais, mas também morais, dos quais pretende responsabilizá-los na via Judicial competente.

Assentou, por fim, que não pretendia a revogação da medida liminar, mas a retiradas dos demais animais deixados no Criadouro, bem como que os pagamentos fossem colocados a ordem do Juízo, pedido reiterado na ação cautelar.

Requereu a improcedência do pedido e a condenação dos autores à responsabilização de todos os prejuízos provocados pela medida. Anexou à defesa os documentos de fls. 198/226.

A contestação da ação cautelar foi anexada às fls. 140/222.

Às fls. 234/239 o Ministério Público Federal apresentou réplica e o IBAMA às fls. 243/250, e na ação cautelar às fls. 274/278 e 229/226, respectivamente.

As partes foram intimadas para especificarem as provas a produzirem (fl. 256), tendo o MPF reiterado sua manifestação no sentido de do julgamento antecipado da lide, por entender que o réu admitiu como verdadeira a matéria alegada na inicial, consignando que, caso o Juízo entendesse necessária, protestava pela produção de prova testemunhal.

Na ação cautelar:

Após o deferimento da liminar ás fls. 128/130, o requerido apresentou contestação às fls. 146/169, anexando os documentos de fls. 165/222

O IBAMA esclareceu às fls. 292/3 da ação cautelar, que ainda não havia encontrado lugar adequado para transferência dos animais que ainda permaneciam no Criadouro.

Às fls. 306/307 foi proferida decisão mantendo a decisão liminar, com a manutenção de algumas espécimes no Criadouro Conservacionista enquanto não transferido ou impossível seu reingresso na natureza, à custa do réu.

A parte ré interpôs agravo de instrumento (fls. 311/327) nº 200503000914510, o qual foi negado provimento.
Às fls. 329/230 o IBAMA requereu que o réu cumprisse a liminar, apresentando as especificações alimentares solicitadas pelos Zoológicos onde foram transferidos os animais.

O réu informou o óbito do animal jaguatirica macho, microchip 71390 (fls. 352/3), sendo determinado pelo Juízo às fls. 358, que se intimassem com urgência os autores para que agilizassem a busca nacional de jardins zoológicos que pudessem receber os animais que ainda permaneciam no Criadouro.

Ante o esclarecimento de fl. 344, foi fixado o valor de R$ 1.000,00 mensais para o Zoológico de São Paulo, determinando-se ao réu o seu pagamento, bem como que comprovasse o envio de alimentos aos zoológicos dos municípios de Nova Odessa e Sorocaba, sob pena de multa diária fixada em R$ 2.000,00 (fl. 358)

O réu apresentou manifestação às fls. 434/435 informando que não possui condições financeiras de cumprir a liminar, sendo intimado para comprovar as despesas, apresentou os documentos às fls. 398/431.

O IBAMA informou que retirou o restante dos animais do Criadouro Conservacionista, transferindo-os para locais adequados, apresentando as despesas com a manutenção dos mesmos (fls. 435/446).

Foi proferida decisão às fls. 472, consignando que os documentos apresentados não comprovaram suas alegações, sendo determinado o cumprimento integral da liminar e decretado segredo de justiça nos autos da ação cautelar, ante a juntada dos documentos financeiros pessoais do réu. Foi interposto agravo de instrumento (fl. 479/96).

Às fls. 498 foi proferida decisão determinando o cumprimento da liminar e que as entidades Fundação Mata Ciliar e Fundação Animália deveriam comprovar os gastos efetuados com a construção dos viveiros dos animais, que deverá ser objeto de fiscalização do IBAMA.

Na ação principal foi proferida sentença às fls. 267/277, julgando simultaneamente procedente a Ação Civil Pública e Ação Cautelar, condenando o réu ao pagamento de indenização por dano ao meio ambiente, no montante de R$ 393.150,00, acrescidos de juros moratórios de 0,5% ao mês, na vigência do Código Civil de 1916 e de 1% ao mês na vigência do Código Civil de 2002, a contar da data da citação.

Condenou ainda o réu ao pagamento de:

a) R$ 31.209,50, referentes à R$ 240 mensais para o custeio da alimentação da onça parda destinada à Associação Mata Ciliar, por um período de dois anos, perfazendo um total de R$ 5.760,00 e mais R$ 12.350,00 destinado à construção do recinto para abrigar o referido animal;

b) R$ 185,00 mensais para o custeio da onça parda, destinado ao Centro de Triagem de Animais Silvestres - Fundação Animália, pelo período de dois anos, perfazendo um total de R$ 4.447,00 e mais R$ 7.652,50 para construção de um recinto definitivo para abrigar a onça;

c) R$ 1.000,00 a ser destinado ao Zoológico de São Paulo, para manutenção dos animais recebidos.

Determinou-se a aplicação da multa arbitrada em R$ 2.000,00 por dia de descumprimento, a partir da data da intimação dos termos da decisão.

Destinou-se o valor de 50% da indenização fixada para a Associação Muck de Proteção aos Primatas, no município de Itu, Registro no IBAMA nº 568189 e ou outros 50% à Associação Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos registrada no IBAMA sob o nº 02027.01423/99-01, ressaltando que noticiada qualquer irregularidade noticiada em relação às organizações, os recursos seriam repassados a outras.

Os honorários foram fixados em 10% sobre o valor da condenação.

O réu interpôs apelação às fls. 287/299 requerendo a reforma da sentença, arguindo em preliminar a ausência do interesse de agir em razão dos seguintes fundamentos: que o ato administrativo que determinou o fechamento do Criadouro Conservacionista é nulo de pleno direito (Informação nº 42/2005- COEFA), decretado por decisão administrativa; que os processos administrativos de interesse do réu ainda estão em curso e que a tutela cautelar foi pleiteada contra texto expresso de lei, tendo em vista que o IBAMA possui Poder de Polícia para efetivar a operação de fechamento do Criadouro e apreensão dos animais, sem a necessidade de autorização judicial de busca e apreensão.

Intimado para recolher as custas do preparo das apelações, o réu apresentou embargos de declaração para que houvesse manifestação sobre os benefícios da assistência judiciária gratuita, os quais não foram acolhidos, ante inexistência de pedido nesse sentido (fls. 308/9).

Dessa decisão o réu interpôs agravo de instrumento (fls. 311/321), informando o recolhimento do preparo do recurso. À fl. 353 consta cópia da decisão proferida no agravo, negando seguimento ao recurso.

O réu apresentou embargos de declaração em face da mesma sentença, que foi anexada às fls. 514/524 dos autos da ação cautelar, cujo provimento foi negado (fls. 544/45).

O IBAMA apresentou apelação apenas no que se refere a indicação das entidades as quais foram destinadas a indenização fixada na sentença, argumentando que tal escolha deveria ser feita na fase de execução de sentença, pois com o transcurso do tempo poderão surgir fatos novos que impossibilitem a efetivação da decisão.

O réu apresentou contrarrazões ao recurso do IBAMA, requerendo a improvimento do recurso, alegando tratar-se de recurso intempestivo (fls. 358/362).

O IBAMA apresentou contrarrazões às fls. 376/384 e MPF às fls. 386/395.

Remetidos os autos à Corte, o Ministério Público apresentou manifestação às 417/426, opinando pela procedência da apelação do IBAMA.

É o relatório.

Dispensada a revisão, nos termos regimentais.


VOTO

A pretensão de reforma do julgado por parte do apelante Criadouro Conservacionista está assentada na preliminar de falta de interesse de agir e na inexistência de dano ambiental.


Sobre o pedido de assistência judiciária formulado pelo apelante em grau de recurso, não há documentos nos autos que se possa aferir a atual situação financeira do réu, pois não foi apresentada declaração de bens ou declaração de pobreza na forma da lei (art. 4º da Lei nº 1.060/50), de forma que não é possível se beneficiar dos privilégios da lei 1060/50.


O apelante argui em preliminar que há falta de interesse de agir por parte dos autores, em razão da nulidade da Informação nº 42/2005 - COFESA, ato que fundamentou da ação cautelar de busca e apreensão, também pelo fato dos processos administrativos ainda estarem em curso, bem como pela desnecessidade da promoção da medida cautelar, tendo em vista que o IBAMA possui Poder de Polícia.


O apelante expõe que a decisão administrativa do IBAMA é revestida de prerrogativa executória em razão do Poder de Polícia, conforme lhe faculta o artigo 70, IV da Lei 9.605/98, de forma que para a efetivação da medida de busca e apreensão dos animais era desnecessário a promoção da ação cautelar.


Não ocorre a alegada falta de interesse de agir, uma vez que a lide é necessária e útil ao fim manejado pela parte autora, em razão do princípio da inafastabilidade da jurisdição, bem como porque a medida de busca e apreensão é ato sujeito ao princípio do reserva de jurisdição, amplamente reconhecidos pela jurisprudência do STJ e STF.


Tem-se por primeiro, que mesmo reconhecendo o Poder de Polícia administrativa do IBAMA, este não afasta a utilidade-adequação da ação cautelar ou da presente ação civil pública.


O princípio da inafastabilidade da jurisdição, fundamentado no artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal: "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito", assegura o acesso à tutela jurisdicional, ainda que seja possível ao IBAMA o exercício do poder de polícia estatal e da executoriedade dos atos administrativos.


Nesse sentido:


AMBIENTAL E ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA. DEMOLIÇÃO DE EDIFÍCIO IRREGULAR. AUTO-EXECUTORIEDADE DA MEDIDA. ART. 72, INC. VIII, DA LEI N. 9.605/98 (DEMOLIÇÃO DE OBRA). PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. INTERESSE DE AGIR CONFIGURADO.
1. A questão cinge-se ao debate sobre o eventual interesse processual do Ibama em ação civil pública cujo pedido consiste na condenação dos recorridos à reparação de danos ambientais, bem como à indenização por eventual dano coletivo causado ao meio ambiente em razão da construção de prédio na margem do "Rio Chumbo", área de preservação permanente.
2. A origem entendeu que a demolição de obras é sanção administrativa dotada de auto-executoriedade, razão pela qual despicienda a ação judicial que busque sua incidência. O Ibama recorre pontuando não ser atribuível a auto-executoriedade à referida sanção.
3. Mesmo que a Lei n. 9.605/98 autorize a demolição de obra como sanção às infrações administrativas de cunho ambiental, a verdade é que existe forte controvérsia acerca de sua auto-executoriedade (da demolição de obra).
4. Em verdade, revestida ou não a sanção do referido atributo, a qualquer das partes (Poder Público e particular) é dado recorrer à tutela jurisdicional, porque assim lhe garante a Constituição da República (art. 5º, inc. XXXV) - notoriamente quando há forte discussão, pelo menos em nível doutrinário, acerca da possibilidade de a Administração Pública executar manu militari a medida.
5. Além disso, no caso concreto, não se trata propriamente de demolição de obra, pois o objeto da medida é edifício já concluído - o que intensifica a problemática acerca da incidência do art. 72, inc. VIII, da Lei n. 9.605/98.
6. Por fim, não custa pontuar que a presente ação civil pública tem como objetivo, mais do que a demolição do edifício, também a recuperação da área degradada.
7. Não se pode falar, portanto, em falta de interesse de agir.

8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.

(REsp 1246443/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/08/2011, DJe 13/04/2012)


DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. LICENCIAMENTO AMBIENTAL. AVERBAÇÃO. RESERVA LEGAL. RETIRADA. CULTURA. CANA-DE-AÇÚCAR. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. EXTINÇÃO. PROCESSO. AUSÊNCIA. INTERESSE DE AGIR. POSSIBILIDADE. ATUAÇÃO. INSTÂNCIA ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO. ART. 3.º DO CPC. INDECLINABILIDADE. JURISDIÇÃO.
1. O Tribunal local, ao examinar a demanda, entendeu que o IBAMA não ostentava interesse de agir para propor a ação civil pública porque se destinava esta a ultimar providência a qual podia ser acolhida na esfera administrativa, razão por que não cumpria ao Poder Judiciário intervir no feito.
2. A simples possibilidade do exercício do poder de polícia estatal e da executoriedade dos atos administrativos, caso se prestasse a impedir o acesso ao Poder Judiciário, excluiria per se toda e qualquer demanda ajuizada por ente público, porque a propedêutica do direito administrativo atribui o predicado da autoexecutoriedade, em tese, a todo ato administrativo, assim como o poder de polícia constitui-se como prerrogativa inerente e estrutural da Administração Pública.
3. A conclusão, portanto é de que a utilização dessa premissa para justificar a ausência de interesse de agir é inexoravelmente equivocada, certo de que esta condição para o exercício do direito de ação implica apenas e tão-somente a exigência de que o sujeito ostente a necessidade do provimento judicial para repelir a resistência à sua pretensão e, ainda, que se utilize do meio processual adequado para tanto.
4. No caso concreto, de vez que a causa de pedir orbita a necessidade de o recorrido obter licença ambiental para seu empreendimento comercial, realizar a reserva legal e fazer cessar determinada atividade agrícola em área de preservação ambiental, isso tudo porque não o faz espontaneamente, é de concluir-se que a ação civil pública é o instrumento processual adequado para o exame da controvérsia pelo Poder Judiciário, não podendo se falar, portanto, em falta de interesse de agir.
5. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 1396306/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/10/2014, DJe 20/10/2014)


ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.PRETENSÃO DE OBRIGAR HOSPITAL A CONTRATAR E MANTER PROFISSIONAL DE ENFERMAGEM. EXERCÍCIO DAS FUNÇÕES DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. ARTIGO 5º, XXXV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INTERESSE PROCESSUAL. UTILIDADE E NECESSIDADE. CARACTERIZAÇÃO.
1. O fato de os estabelecimentos hospitalares cuja atividade básica seja a prática da medicina não estarem sujeitos a registro perante o Conselho de Enfermagem não constitui impeditivo a que sejam submetidos à fiscalização pelo referido órgão quanto à regularidade da situação dos profissionais de enfermagem que ali atuam. Porém, mesmo reconhecendo o poder de polícia administrativa ao Conselho de Enfermagem, este não afasta a utilidade-adequação da presente ação civil pública.
2. Revestido ou não de prerrogativa executória aos atos administrativos das autarquias de fiscalização, estas e qualquer das partes é dado recorrer à tutela jurisdicional, porque assim dispõe o princípio da inafastabilidade da jurisdição, que pode ser extraído do artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal: "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".
3. Na espécie, nota-se que as condições da ação estão presentes. O interesse processual, única condição em destaque, é composto pelo binômio utilidade-necessidade do provimento. A utilidade pode ser facilmente demonstrada pela necessidade de ordem judicial para a obrigar o hospital recorrido a contratar e manter durante todo o período de seu funcionamento profissionais de enfermagem. Por outro lado, a caracterização da necessidade pode ser extraída dos princípios da jurisdição, especialmente, a imparcialidade e a definitividade.
4. Na esfera administrativa dos conselhos profissionais a relação processual não possui a característica da imparcialidade bem definida, até porque o Conselho de fiscalização ocupa, também, a função de "julgador". Ademais, as decisões proferidas nesta seara não ostentam caráter definitivo, imutabilidade, presente apenas nos provimentos jurisdicionais. Dessa forma, pode a administração buscar no Poder Judiciário que o Estado-Juiz, dentro da relação processual, promova a solução definitiva da controvérsia, atento às alegações de cada parte.
5. Não se pode falar, portanto, em falta de interesse de agir por parte do Conselho Regional de Enfermagem que intentou a ação civil pública buscando que o hospital recorrido contrate e mantenha, durante todo o período de seu funcionamento, profissionais de enfermagem. Precedente: AgRg no REsp 1342461/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/02/2013, DJe 28/02/2013.
6. Recursos especiais providos.
(REsp 1398334/SE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/10/2013, DJe 24/10/2013)


Igualmente em razão do princípio da inafastabilidade da Jurisdição, não há necessidade de exaurir as instâncias administrativas, não implicando em ausência de interesse jurídico dos autores, o fato dos processos administrativos de interesse do réu ainda estarem em curso quando do ajuizamento da ação, pois o acesso ao Judiciário é assegurado a todos, independentemente do esgotamento da esfera administrativa.


Ademais, a independência das instâncias demonstra não haver prejuízo algum para a ação judicial, que tem como objeto a responsabilização civil por dano ambiental, pois, ainda que decorram do mesmo fato, os procedimentos e sanções são diversos.


E ainda, conforme asseverado na sentença, o Poder de Polícia conferido ao IBAMA possui limitações legais e constitucionais, aliás, a própria Constituição Federal baliza a atividade da fiscalização, exigindo respeito aos direitos e garantias individuais.


Na espécie, ainda que o artigo 72, IV da Lei 9.605/98, imponha como sanção administrativa a apreensão de animais, para adentrar no Criadouro e apreender todo os animais havia necessidade de ordem judicial, tanto para o ingresso como para obrigar a entrega, caso contrário, estaríamos diante de grave agressão a inviolabilidade previsto no artigo 5º, inc. XI da Constituição Federal, que garante que apenas em casos de em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro o domicílio pode ser violado.


Como já pacificado pelo Supremo Tribunal Federal, domicílio, numa extensão conceitual mais larga, abrange o local onde se exerce a profissão ou a atividade, desde que constitua um ambiente fechado ou de acesso restrito ao público, como no caso, o estabelecimento Criadouro Conservacionista Casa da Tartaruga onde o réu mantinha os animais.


Dessa forma, o ingresso no domicílio, durante o dia, sujeita-se à cláusula de reserva jurisdicional consistente na expressa previsão constitucional de competência exclusiva dos órgãos do Poder Judiciário, com total exclusão de qualquer outro órgão administrativo.

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência constitucional da cláusula de reserva jurisdicional, no julgamento do MS 23.642/DF afirmando:


As Comissões Parlamentares de Inquérito não podem determinar a busca e apreensão domiciliar, por se tratar de ato sujeito ao princípio constitucional da reserva de jurisdição, ou seja, ato cuja prática a CF atribui com exclusividade aos membros do Poder Judiciário" (STF - Pleno - MS n.° 23.642/DF - Rel. Min. Néri da Silveira, decisão: 29-11-2000 - Informativo STF n.° 212 Conferir transcrições nos Informativos STF n.° 151, 162, 163).

Portanto, sendo a busca e apreensão ato judicial, imprescindível a autorização judicial para sua realização, demonstrado está o interesse de agir dos autores em promover a ação cautelar.


Sobre a alegação de nulidade da Informação nº 42/2005 - COFESA, o IBAMA reconheceu em decisão administrativa, a nulidade da informação Técnica nº 122/2004 - COEFA, lavrada pelo servidor Marcelo Américo de Almeida, na qual opinava pelo cancelamento do registro do Criadouro, pois estava o mesmo impedido de atuar no processo administrativo, por ter sido médico veterinário responsável técnico do Criadouro quando de seu registro.


No entanto, a Informação Técnica nº 42/2005 COEFA não se fundamentou nas conclusões da Informação Técnica nº 122/2004 - COEFA, lavrada pelo servidor Marcelo Américo de Almeida, de forma que a anulação do ato administrativo, não importa na anulação de todo o processo administrativo, do qual constam vários Relatórios de Vistoria e Fiscalização e Pareceres Técnicos proferidos por outros servidores.


A possibilidade de anulação de decisões no âmbito do processo administrativo foi regulada pelo art. 53, da Lei n.º 9.784/1999, nos seguintes termos:


Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.

Esse artigo permite que a Administração proceda à anulação de seus próprios atos quando eivados de vício de legalidade.


De fato, a Administração tem o dever de anular os atos eivados de vícios que os tornam ilegais. Com efeito, a Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal - STF dispõe que:


A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.

A Administração atua sob a direção do princípio da legalidade, de modo que, ao anular a Informação Técnica nº 122/2004, reconhecendo o impedimento do servidor, não só retirou a validade do conteúdo do ato, como a possibilidade de sua impugnação, no que se refere ao inconformismo das informações prestadas, restaurando assim a legalidade malferida.


A responsabilização pela prática de dano ambiental encontra disciplina na Constituição Federal que prevê expressamente, em seu Capítulo VI, a tutela do meio ambiente, bem indisponível e direito fundamental, conforme disposto em seu art. 225, caput, bem como estabelece sanções ao agente causador do dano a teor do que reza seu § 3º, a seguir transcrito:


"Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
(...)
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados". (...)

Igualmente, a Lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981, dispondo sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, também estabeleceu as sanções cabíveis aos agentes causadores de danos ao meio ambiente, prevendo, inclusive, o pagamento de indenização, independentemente da existência de culpa (responsabilidade civil objetiva) sem prejuízo da aplicação de outras sanções cabíveis nas esferas administrativa e penal, conforme se depreende da leitura do art. 14, caput, incisos, e § 1º, do aludido diploma legal, assim transcritos:


"Art 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores:

I - à multa simples ou diária, nos valores correspondentes, no mínimo, a 10 (dez) e, no máximo, a 1.000 (mil) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTNs, agravada em casos de reincidência específica, conforme dispuser o regulamento, vedada a sua cobrança pela União se já tiver sido aplicada pelo Estado, Distrito Federal, Territórios ou pelos Municípios.

II - à perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público;
III - à perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito;
IV - à suspensão de sua atividade.
§ 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente".

Por oportuno, cumpre mencionar que o artigo 1º e 6º da Lei 5.197/67 dispõe:


Art. 1º Os animais de quaisquer espécimes, em qualquer fase do seu desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro, constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais são Propriedades do Estado, sendo proibida a sua utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha.
Art. 6º O Poder Público estimulará:
(...)
b) a construção de criadouros destinados à criação de animais silvestres para fins econômicos e industriais.


Por seu turno, o IBAMA editou a Portaria nº 139 N/93, regulamentando o dispositivo legal citado, dispondo sobre os criadouros conservacionista:


Art. 1º - Para os efeitos desta Portaria considera-se Criadouros Conservacionistas, as áreas especialmente delimitadas e preparadas, dotadas de instalações capazes de possibilitar a criação racional de espécies da fauna silvestre brasileira, com assistência adequada

Art. 4º - Os Criadouros Conservacionistas deverão cumprir as seguintes exigências:
a) ter a assistência de pelo menos um biólogo ou um médico veterinário;
b) possuir instalações adequadas a misteres da alimentação animal;
c) possuir pelo menos um tratador contratado em regime de tempo integral;
d) ter capacitação financeira devidamente comprovada;
e) manter arquivo de registro através de fichas individuais por animal;
f) manter contato / referência de laboratórios para análises clínicas, para auxiliar no diagnóstico e tratamento de doenças;
g) apresentar um sistema de marcação dos animais;
h) necropsiar todos os animais que morrerem e as informações deverão constar na ficha individual do animal; e
i) sexar todos os espécimes.


Convém ainda citar o 8º:


- O IBAMA fiscalizará os Criadouros Conservacionistas, sendo que qualquer infração à presente Portaria, principalmente ao seu art. 5º obriga ao cancelamento imediato do registro, sem prejuízo das sanções previstas na Lei nº 5.197/67, com as alterações introduzidas pela Lei 7.653, de 12 de fevereiro de 1988.


A vista dos dispositivos transcritos conclui-se que tanto a Constituição Federal quanto a legislação infraconstitucional preocuparam-se em estabelecer mecanismos de proteção à fauna, assinalando-se o artigo 14, § 1º da Lei 6.938/81, que a responsabilidade civil objetiva do infrator das normas ambientais, contexto que dispensa a investigação do elemento subjetivo da culpa ou dolo, sendo suficiente, para a atribuição do dever de indenizar, a demonstração do dano e do nexo de causalidade entre a lesão e a ação ou omissão do responsável.

No caso vertente, observa-se das provas apresentadas nos autos, que no Criadouro Conservacionista "Toca da Tartaruga" foram encontradas inúmeras irregularidades que, inobstante o prazo concedido para adequação, não foram sanadas, bem como outras condutas que caracterizam dano ambiental, levando o IBAMA e o Ministério Público a promover a presente ação civil pública.

Entre tais irregularidades, que resultaram em lavratura de autos de infração, restou constatado que mesmo quando protocolado o projeto de Criadouro Conservacionista, em 9/9/1999, o réu já possuía plantel com aves e répteis sem origem conhecida e sem respectivas marcações.

Às fls. 44/63 consta outro documento, apresentado pela própria responsável técnica do Criadouro, datado de 28/1/2002, apontando diversas irregularidades, entre elas, o ingresso de 223 animais sem origem conhecida, provenientes de entregas voluntárias, 96 aves evadiram do criadouro, devido a fortes chuvas, 285 foram depositados pelos órgãos de fiscalização e 485 espécies sem marcação, representando 95% do plantel.

Consta às fls. 64/65 um relatório de fiscalização datado de 28 de novembro de 2002, sendo aferido na vistoria que havia espécimes sem marcação, outras marcadas, porem com divergência das espécies relacionadas no relatório entregue ao IBAMA, acentuando-se na inicial a falta de cuidado com animais e recinto de tamanho inadequado.

Em 2002 o IBAMA analisou a evolução do plantel no período de 2001/2002, concluindo-se pela a falta de 220 animais, sendo vários ameaçados de extinção, cuja defesa do réu se resumiu na afirmação de que vários passeriformes foram devorados por roedores, situação que impediria a realização da necropsia.

Já nessa oportunidade, a conclusão do relatório foi pelo enquadramento de Richard Rasmussen na Lei nº 9.605/98, art. 29 §1º 31, Decreto 3179/99, artigo 2º, II e IV e art. 11 e § 1º, III, com sugestão de paralisar o pedido de transformação do criadouro conservacionista em zoológico, sugerindo uma auditoria completa.

Restou lavrado o Auto de Infração nº 009.600-D, (doc. 5 de fl. 69), em razão do réu manter em cativeiro ou depósito, espécimes da Fauna Silvestre Brasileira e Exótica, sem a devida permissão, licença ou autorização do IBAMA e sem comprovação de origem.

O documento apresentado às fls. 74/110, consistente no relatório de vistoria técnica realizado no Criadouro em fevereiro de 2003 comprova fartamente o dano ambiental, dispondo fotos que descrevem a situação irregular em que viviam diversos animais.

Constatou-se que havia várias espécies compartilhando o mesmo recinto, impropriamente, com oferta de alimentos e água inadequada, colocadas sem proteção de intempéries, e mesmo animais que não dispunham de área coberta para fazer ninho ou pernoitar.

É o que se verifica das fotos e imagens com transcritos abaixo:

a) às fls. 76 e 78 constam na cozinha alimentos indevidamente acondicionados, iguanas com vasilha de água com aspecto sujo e de cor esverdeada, com alimentação em pratos sobre o substrato de área, o que pode levar a ingestão do composto, com sérios danos ao animal;

b) foto de fl. 80 se refere ao lago destinada aos répteis aquático, na qual inexiste sistema de filtragem e escoamento da agua residual;

c) fotos de fls. 95 apresentam um animal aparentando necessidade de cuidados veterinários e outro dentro de caixa plástica de tamanho reduzido, em substrato de jornal e vasilha de agua diminuta para o espécie;

d) a figura de fl. 99 apresenta animal mantido para alimentação de carnívoro, juntamente com outro morto, o mesmo nas figuras de fls. 98;

Sobre tais provas, nada apresentou o réu em sua defesa, se atendo a afirmar que em uma das vistorias efetuadas pelo IBAMA a contagem dos animais estava correta, referindo a esse mesmo documento, sem impugnar de forma especifica qualquer uma das informações.

A prova apresentada comprova a situação de despreparo e inabilidade na manutenção de animais, muitos sem as condições mínimas de higiene, levados a mortes por predadores, falta de cuidados veterinários e alimentação correta, bem como a diante da ausência de documentos de destino dos animais desaparecidos ou de sua recepção e origem lícita e introdução de espécimes exótica, restando inegável a responsabilidade do réu pelo ocorrência de dano causado à fauna, devendo ser confirmada a sentença.

Requereu ainda o apelante, a redução valor da condenação (fls. 291), tendo em vista os parâmetros ofertados por precedentes jurisprudenciais na defesa (fls. 291).

A contestação do réu foi anexada às fls. 175/197, com documentos de fls. 198/226, e na cautelar às fls. 146/164, acompanhada dos documentos de fls. 165/222, peças em nas quais não foram citadas qualquer precedentes jurisprudencial.

Ante a ausência de fundamentação, visto que a parte recorrente se limitou a requerer a redução do valor, sem dizer as razões pelas quais os valores arbitrados na sentença não estão corretos, mantenho os valores das indenizações como fixados na sentença.

Quanto a impugnação à tempestividade da apelação do IBAMA, verifica-se que a autarquia foi intimada em 26 de junho de 2008 (fl. 337) e apresentou a apelação em 11 de julho de 2008 ( fls. 342), portanto, tempestivo seu recurso, ante os termos dos artigos 10 e 17 da Lei 9.469/97, que é expressa ao dispor sobre a intimação pessoa dos procuradores autárquicos e do benefício do prazo em dobro de que goza a autarquia.

A apelação do IBAMA se ateve à indicação das entidades as quais foram destinadas a indenização fixada na sentença, asseverando que a indicação deveria ser feita na fase de execução de sentença, pois com o transcurso do tempo poderão surgir fatos novos que impossibilitem a efetivação da decisão.

Quanto a tal questão foi consignado na sentença que os recursos seriam repassados a outras entidades, caso fosse noticiada qualquer irregularidade em relação às organizações, assim, por ocasião da execução de sentença, poderá a parte autora considerar tais condições, devendo a sentença ser mantida nesse aspecto.

Diante do exposto, nego provimento às apelações do IBAMA e do autor, mantendo a sentença na íntegra.


NERY JÚNIOR
Desembargador Federal Relator


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