Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 09/09/2015
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0010156-08.2007.4.03.6103/SP
2007.61.03.010156-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : MUNICIPIO DE SAO JOSE DOS CAMPOS SP
ADVOGADO : SP218195 LUÍS FERNANDO DA COSTA e outro
APELADO(A) : MARLIAN MACHADO GUIMARAES
: ALVARO DE SOUZA ALVES
ADVOGADO : SP112459 LUIZ CARLOS DE CASTRO VASCONCELLOS e outro
EXTINTA A PUNIBILIDADE : JOSE FLORIANO DELGADO falecido
No. ORIG. : 00101560820074036103 3 Vr SAO JOSE DOS CAMPOS/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. AMBIENTAL. LEI N. 9.605/98, ART. 40. SENTENÇA QUE EXTINGUIU O PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO POR INÉPCIA DA DENÚNCIA APÓS ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL.
1. A sentença proferida foi de extinção do processo sem resolução de mérito, depois do encerramento da instrução criminal, em razão da inépcia da denúncia, pois esta não teria descrito a atuação dos acusados somente na "área 1", sendo neste aspecto genérica.
2. É dificultoso afirmar, nesse quadro, que a área objeto de atuação por parte dos acusados não integre a denúncia. É intuitivo que, com a instrução criminal, advenham novos elementos, outras informações, mas daí firmar-se a inépcia da denúncia há uma certa distância. Pois os réus se defendem dos fatos nela descritos, podendo, sem dificuldade, objetar não serem responsáveis por condutas concernentes a toda a área indicada na denúncia.
3. Seja como for, o fato é que, concluída a instrução criminal é possível abalizar um juízo de mérito a respeito da procedência do pedido condenatório: se da análise do conteúdo dos autos resultar insegurança, tal é o caso de absolvição; mas não é impossível que, considerada a prova, compreenda-se que os fatos estão razoavelmente comprovados e ensejam, conforme o caso, a condenação.
4. Recurso ministerial provido para reformar a sentença, afastando a extinção do processo sem resolução do mérito e determinar o retorno dos autos para regular prosseguimento do feito.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento ao apelo ministerial para reformar a sentença e, afastando a extinção do processo sem resolução do mérito, determinar o retorno dos autos para regular prosseguimento do feito.

São Paulo, 24 de agosto de 2015.
Andre Nekatschalow
Relator para Acórdão


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0010156-08.2007.4.03.6103/SP
2007.61.03.010156-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : MUNICIPIO DE SAO JOSE DOS CAMPOS SP
ADVOGADO : SP218195 LUÍS FERNANDO DA COSTA e outro(a)
APELADO(A) : MARLIAN MACHADO GUIMARAES
: ALVARO DE SOUZA ALVES
ADVOGADO : SP112459 LUIZ CARLOS DE CASTRO VASCONCELLOS e outro(a)
EXTINTA A PUNIBILIDADE : JOSE FLORIANO DELGADO falecido(a)
No. ORIG. : 00101560820074036103 3 Vr SAO JOSE DOS CAMPOS/SP

VOTO CONDUTOR

Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal contra a decisão do MM. Juiz Federal da 3ª Vara Federal de São José dos Campos (SP), que nestes autos em que se apurava a prática do delito previsto no art. 40, caput, da Lei 9.605/98 contra os réus, ora apelados, extinguiu o processo sem resolução de mérito, depois do encerramento da instrução criminal, em razão da inépcia da denúncia, pois esta não teria descrito a atuação dos acusados somente na "área 1", sendo neste aspecto genérica.

Recorre o Parquet Federal para que seja reformada tal decisão, sustentando:

a) a denúncia atendeu às exigências do art. 41 do Código de Processo Penal, permitindo aos acusados responderem precisamente sobre os fatos alegados, tanto que a instrução chegou ao seu término;
b) a denúncia de forma adequada descreveu os danos, as áreas degradadas e as condutas dos agentes envolvidos, não podendo ser considerada genérica;
c) a não aceitação da proposta de suspensão condicional do processo se deu por opção dos próprios corréus, ora apelados, uma vez que o Ministério Público Federal propôs que eles assumissem tão somente a responsabilidade de reparar os danos da área incontroversa, a "área 1", satisfeitas as demais condições do art. 89 da Lei n. 9.0099/95 (fls. 1.282/1.286).

O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. Osvaldo Capelari Junior, manifestou-se pelo provimento do recurso para que seja anulada a r. decisão monocrática que declarou a inépcia de denúncia, e que seja determinado o retorno dos presentes autos ao Juiz a quo para novo pronunciamento quanto ao mérito da ação (fls. 1.326/1.332).

O Eminente Desembargador Federal Maurício Kato deu provimento ao recurso para anular a sentença por ocorrência da preclusão pro judicato, por entender que uma vez recebida a denúncia e após esgotada a instrução criminal, não pode o Magistrado, quando da prolação da sentença, rever sua decisão de recebimento da peça acusatória, mas concedeu habeas corpus para trancar a ação penal, em razão da inépcia da denúncia, por não descrever a atuação dos acusados somente na "área 1" (fls.1.352/1.355).

Com a devida vênia, divirjo do voto do Eminente Desembargador Federal Relator, pois conforme consta da sentença, o Ministério Público Federal preferiu "abarcar sob uma mesma denúncia todas as áreas embargadas pelo IBAMA, atribuindo a todos os réus as condutas genéricas de terem participado do dano perpretado em todas elas" (fl. 1.270). Sendo assim, a denúncia abrange tanto a "área 1" (AI n. 2624453, lavrado contra a Prefeitura Municipal) quanto a "área 2" (AI n. 262454, lavrado contra Maria das Dores Delgado Gomes) (cfr. fls. 1.265/1.266).

É dificultoso afirmar, nesse quadro, que a área objeto de atuação por parte dos acusados não integre a denúncia. É intuitivo que, com a instrução criminal, advenham novos elementos, outras informações, mas daí firmar-se a inépcia da denúncia há uma certa distância. Pois os réus se defendem dos fatos nela descritos, podendo, sem dificuldade, objetar não serem responsáveis por condutas concernentes a toda a área indicada na denúncia.

Seja como for, o fato é que, concluída a instrução criminal é possível abalizar um juízo de mérito a respeito da procedência do pedido condenatório: se da análise do conteúdo dos autos resultar insegurança, tal é o caso de absolvição; mas não é impossível que, considerada a prova, compreenda-se que os fatos estão razoavelmente comprovados e ensejam, conforme o caso, a condenação.

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal para reformar a sentença e, afastando a extinção do processo sem resolução do mérito, determinar o retorno dos autos para regular prosseguimento do feito.

É o voto.




Andre Nekatschalow
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0010156-08.2007.4.03.6103/SP
2007.61.03.010156-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : MUNICIPIO DE SAO JOSE DOS CAMPOS SP
ADVOGADO : SP218195 LUÍS FERNANDO DA COSTA e outro
APELADO(A) : MARLIAN MACHADO GUIMARAES
: ALVARO DE SOUZA ALVES
ADVOGADO : SP112459 LUIZ CARLOS DE CASTRO VASCONCELLOS e outro
EXTINTA A PUNIBILIDADE : JOSE FLORIANO DELGADO falecido
No. ORIG. : 00101560820074036103 3 Vr SAO JOSE DOS CAMPOS/SP

RELATÓRIO

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA JUÍZA FEDERAL CONVOCADA MARCELLE CARVALHO: Trata-se de Apelação Criminal interposta pelo Ministério Público Federal contra a r. sentença (fls. 1260/1272), proferida pelo MM. Juiz Federal Substituto da 3ª Vara Federal de São José dos Campos, Dr. Carlos Alberto Antonio Junior, que com fundamento no artigo 41, c.c. artigo 564, III, "a", c.c. artigo 563, todos do Código de Processo Penal, declarou inepta a denúncia e, em analogia com o artigo 267, IV, do Código de Processo Civil, por força do artigo 3º do Código de Processo Penal, julgou extinto o feito sem resolução do mérito.


Nas razões de apelação (fls. 1282/1286), o parquet federal alega, em síntese, que:


a) a denúncia atendeu às exigências do artigo 41 do Código de Processo Penal, sendo que seu teor propiciou seu recebimento e posterior ratificação, bem como permitiu aos acusados responderem precisamente sobre os fatos alegados, tanto que a instrução chegou ao seu final;


b) a denúncia de forma adequada descreveu os danos, as áreas degradadas e as condutas dos agentes envolvidos, não podendo ser considerada genérica;


c) o não usufruto da suspensão condicional do processo por parte dos corréus se deu por opção deles próprios, uma vez que o ora apelante propôs que os réus assumissem tão somente a responsabilidade de reparar os danos da área incontroversa, a "área 1", satisfeitas as demais condições do art. 89 da Lei nº 9.099/95 (fls. 1064 verso).


Contrarrazões acostadas às fls. 1291/1308 e 1311/1324.


A Procuradoria Regional da República, por seu ilustre representante, Dr. Osvaldo Capelari Junior, opinou pelo provimento do recurso, a fim de que seja anulada a r. decisão monocrática que declarou a inépcia da denúncia, e que seja determinado o retorno dos presentes autos ao Juízo a quo para novo pronunciamento quanto ao mérito da ação (fls. 1326/1332).


É o relatório.


À revisão.


MARCELLE CARVALHO
Juíza Federal Convocada


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0010156-08.2007.4.03.6103/SP
2007.61.03.010156-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
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APELADO(A) : MARLIAN MACHADO GUIMARAES
: ALVARO DE SOUZA ALVES
ADVOGADO : SP112459 LUIZ CARLOS DE CASTRO VASCONCELLOS e outro
EXTINTA A PUNIBILIDADE : JOSE FLORIANO DELGADO falecido
No. ORIG. : 00101560820074036103 3 Vr SAO JOSE DOS CAMPOS/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL MAURICIO KATO: Município de São José dos Campos, Marlian Machado Guimarães, Alvaro de Souza Alves e José Floriano Delgado foram denunciados como incursos na sanção do artigo 40, caput, da Lei nº 9.605/98 combinado com os artigos 29 e 71 do Código Penal.


Consta da inicial acusatória que:


"(...) os denunciados JOSÉ FLORIANO DELGADO e o MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS/SP, este último representado pelo ex-Secretário de Serviços Municipais ALVARO DE SOUZA ALVES; e pelo atual, MARLIAN MACHADO GUIMARÃES, conhecendo os elementos do tipo penal e com livre vontade de realizar a conduta proibida, causaram dano direto à Unidade de Conservação, na categoria Área de Proteção Ambiental (APA), pertencente à Bacia do Rio Paraíba do Sul e protegida pelo Decreto nº 87.561, de 13 de setembro de 1982.
Consta nos autos que na data de 13 de julho de 2000, JOSÉ FLORIANO DELGADO concedeu, por meio do documento de fl. 84, autorização para que a Prefeitura Municipal de São José dos Campos depositasse entulho em sua propriedade situada na rua Fonte Canindú, s/n, Alto de Santana neste município.
Referidos depósitos de entulho se deram durante vários anos e só cessaram na data de 05 de setembro de 2008, ocasião em que, por meio do documento de fl. 83, a Municipalidade "devolveu" a área degradada ao proprietário JOSÉ FLORIANO DELGADO, sob a afirmação de que a capacidade para deposição de entulho no terreno já estava exaurida.
No laudo pericial de fl. 152 consta que houve, inclusive dano direto à APP - Área de Proteção Permanente do Rio Buquira, uma vez que o dano ocorreu a uma distância de trinta metros do rio (art. 2º, alínea "a" número "1" da Lei 4.771/65, com redação determinada pela Lei 7.803/89).
A materialidade do crime está comprovada pelo auto de infração de fl. 06, Termo de Embargo de fl. 07, os documentos de fls. 14/20 e também pelo laudo de fls. 147/160.
Outrossim, a autoria também é induvidosa, do depoimento dos co-proprietários da área degradada (fls. 50/57), extrai-se que a deposição de entulho se deu mediante acordo firmado entre JOSÉ FLORIANO DELGADO e MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS/SP, esta pessoa jurídica, representada, em um primeiro momento, pelo Secretário de Serviços Municipais ALVARO DE SOUZA ALVES e posteriormente, pelo atual Secretário MARLIAN MACHADO GUIMARÃES.
Ainda quanto à autoria, reiteramos que está comprovada, seja pelos depoimentos dos próprios denunciados (fls. 78/79, 80 e 123) que confirmam o acordo por eles firmado ou seja pelo Termo de entrega de fl. 83 e pela Autorização de fl. 84.
Veja-se que a Municipalidade, com a expressa anuência de JOSÉ FLORIANO DELGADO, pelo prazo de no mínimo 08 anos, depositou entulho de forma irregular na área que foi degradada, sendo cessados os depósitos somente na data de 05 de setembro de 2008.
Diante das informações carreadas aos autos, restam, portanto, nitidamente demonstradas a materialidade do delito sub examine, bem como a autoria dos denunciados.
Restou cabalmente comprovado pelo laudo pericial (fls. 147/160) que houve verdadeiro dano à flora sucessória (espécie pioneiras e/ou de transição) o que ocasiona danos aos demais elementos do ecossistema, inclusive a fauna. E como já dito, a área degradada situa-se na Bacia do Rio Paraíba do Sul, a qual foi declarada pelo Decreto nº 87.561, de 13 de setembro de 1982 como sendo Área de Preservação Ambiental (APA), que por sua vez insere-se na categoria genérica de Unidades de Conservação, fato que amolda-se perfeitamente à norma incriminadora (...)."

Julgada extinta a punibilidade em relação aos fatos imputados a José Floriano Delgado, com fundamento no artigo 107, inciso I, do Código Penal (fls. 1067).


A denúncia foi recebida, nos seguintes termos (fls. 178/179):


"(...) considerando que se encontra descrito fato penalmente relevante, atribuindo-se aos denunciados as autorias delitivas, com base em elementos colhidos em inquérito policial e que, em exame preliminar, estão ausentes as hipóteses de rejeição previstas no artigo 395 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008."

Oferecidas as respostas à acusação, sobreveio a decisão de fls. 1107/1109:


"A denúncia aponta especificamente quais teriam sido as áreas degradadas, aduzindo que a responsabilidade pela degradação seria dos réus ÁLVARO e MARLIAN, enquanto exerceram o cargo de Secretário de Serviços Municipais de São José dos Campos, e do próprio MUNICÍPIO, pessoa jurídica a eles vinculada.
Resolver qual dessas áreas foi efetivamente degradada e qual parte seria de responsabilidade de cada um dos réus é matéria relacionada com o mérito da ação penal, daí porque insuficiente para justificar a absolvição sumária.
A alegada recuperação da área e os possíveis efeitos penais dela decorrentes são também questões que devem ser resolvidas ao final da instrução processual penal.
(...)
No mais, não estão presentes os requisitos para aplicação do artigo 397 do CPP, razão pela qual determino o prosseguimento do feito."

Concluída a instrução criminal, o magistrado de primeiro grau declarou inepta a denúncia e, em analogia com o artigo 267, IV, do Código de Processo Civil, por força do artigo 3º do Código de Processo Penal, julgou extinto o feito sem resolução do mérito, sob o fundamento de que a denúncia foi feita de forma genérica, sem discriminar a atuação dos corréus somente na "área 1", o que, desde a autuação do IBAMA, já podia ser identificado. Consignou que por ser genérica na atribuição das áreas e condutas, a denúncia tornou-se inepta, na medida em que afetou a possibilidade de suspensão condicional do processo, prevista no artigo 89 da Lei nº 9.099/95.


Do exame dos autos, verifico que o decisum ora atacado merece ser anulado.


A Lei nº 11.719/2008 deu aos artigos 395, 396, 396-A e 397 do Código de Processo Penal as seguintes redações, verbis:


"Art. 395.  A denúncia ou queixa será rejeitada quando: 
I - for manifestamente inepta; 
II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou
III - faltar justa causa para o exercício da ação penal. 
       
Art. 396.  Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias. 
(...)
Art. 396-A.  Na resposta, o acusado poderá argüir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário. 
(...)
Art. 397.  Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: 
I - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; 
II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; 
III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou 
IV - extinta a punibilidade do agente."

Note-se que, superada a fase do art. 395 do CPP com o recebimento da denúncia, após a apresentação da defesa prévia, o juiz não fica vinculado às hipóteses elencadas no art. 397 do mesmo diploma legal, autorizadoras da absolvição sumária, podendo rever sua decisão de recebimento da exordial, o que não ocorreu na hipótese vertente, pois o juízo a quo entendeu pelo prosseguimento do feito.


Assim, recebida a denúncia, o juiz designou data para a audiência de instrução e julgamento, nos termos do artigo 399 do Código de Processo Penal. Seguiu-se a instrução processual e, ao final, as partes apresentaram alegações finais. Daí o magistrado de primeiro grau proferiu sentença julgando inepta a denúncia.


De fato, uma vez recebida a denúncia e após esgotada a instrução criminal, não pode o magistrado, quando da prolação da sentença, rever sua decisão de recebimento da peça acusatória, fazendo novo juízo de admissibilidade para rejeitá-la, em decorrência de preclusão pro judicato, sob pena de causar tumulto ao bom andamento da marcha processual, razão pela qual decreto a nulidade da sentença.


A propósito, o aresto que destaco:


"RECURSO ESPECIAL. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA EM RELAÇÃO AO CRIME PREVISTO NO ART. 60 DA LEI N. 9.605/98. SUPERVENIÊNCIA DE ELEMENTOS ENSEJADORES DA AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A PERSECUÇÃO PENAL. JUÍZO DE MÉRITO. RECONSIDERAÇÃO DO DESPACHO QUE RECEBEU DE DENÚNCIA. INADMISSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL E NECESSIDADE DE RESGUARDO DA SEGURANÇA JURÍDICA. APLICAÇÃO DA TEORIA DA ASSERÇÃO AO DIREITO PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
1. O processo penal encerra uma série de atos coordenados, constituindo verdadeira "marcha para frente", tendo em vista a finalidade a que ele se destina.
2. Não pode, portanto, o juiz, após ter recebido a denúncia e manifestado-se sobre a admissibilidade da acusação, simplesmente voltar atrás e reformar o seu despacho, em prejuízo à segurança jurídica, pois operada contra ele a preclusão pro judicato.
3. Caso surja, durante a instrução criminal, circunstâncias de fato ou de direito que levem à improcedência, total ou parcial, da pretensão punitiva estatal, deverá o juiz, ao sentenciar, levar em consideração tais circunstâncias, utilizando-se, entretanto, de fundamentação diversa daquela relativa à inadmissibilidade da exordial acusatória.
4. Isso porque, ao proferir decisão positiva de admissibilidade da denúncia e atestar a existência das condições da ação e dos pressupostos processuais positivos, o magistrado ultrapassa uma fase processual, surgindo, a partir daí, não mais um juízo sobre a viabilidade da denúncia, mas sim um juízo de mérito, ensejando a prolação de sentença condenatória ou absolutória, conforme o caso, sendo aplicável a teoria da asserção.
5. Recurso especial improvido."
(STJ - REsp 1354838/MT - relator: CAMPOS MARQUES (Desembargador Convocado do TJ/PR) - DJe: 05/04/2013)

Por outro lado, na espécie, entendo evidenciada inépcia da denúncia, impondo-se a concessão de "habeas corpus" de ofício, com fundamento no artigo 654, §2º, do Código de Processo Penal.


Como bem asseverado na sentença:


"Desde o início deste feito chama a atenção o fato de que há duas áreas autuados pelo IBAMA, que as partes convencionaram chamar de "área 1" e "área 2". Trata-se do AI 2624453 (área 1), contra a Prefeitura Municipal; e AI 262454 (área 2), contra Maria das Dores Delgado Gomes, lavrados pelo IBAMA.
Os corréus Prefeitura Municipal, Álvaro e Marlian, desde o início, sustentam a inépcia da inicial por não terem tido qualquer atuação de degradação na "área 2". A alegação foi afastada durante o curso da lide, pois a jurisprudência admite, em certo grau, em especial em crimes societários, que haja descrição genérica das condutas. Este feito se assemelhava a esta hipótese.
Ocorre que a instrução criminal comprovou que, de fato, há duas áreas distintas embargadas pelo IBAMA, chamadas pelas partes de "área 1" e "área 2". A Prefeitura e os demais corréus somente atuaram na "área 1", seja depositando entulho no terreno, seja, após, executando a recuperação da área. O fato é que a Prefeitura e os corréus somente tinham autorização para trabalhar na "área 1", e assim o fizeram, os depoimentos são claros neste sentido. Não houve atuação deles na "área 2".
(...)
Pois bem. Os depoimentos e interrogatórios demonstram, fartamente, que sempre houve duas áreas, e, inclusive, conforme testemunhou o analista do IBAMA, Sr. Evandro, foram feitas três autuações, em razão da identificação de divisão das áreas.
Visto assim, resta claro que a denúncia foi feita de forma genérica, sem descriminar a atuação dos corréus Prefeitura, Marlian e Álvaro somente na "área 1", o que, desde a autuação do IBAMA, já podia ser identificado.
Preferiu o Ministério Público Federal abarcar sob uma mesma denúncia todas as áreas embargadas pelo IBAMA, atribuindo a todos os réus as condutas genéricas de terem participado do dano perpetrado em todas elas. Com isso, na prática, inibiram que os corréus pudessem fazer uso dos instrumentos descriminalizadores da legislação, em afronta ao seus direitos subjetivos de ampla-defesa e responsabilidade subjetiva (e não objetiva) e devido processo legal, em especial a suspensão condicional do processo, prevista no artigo 89 da Lei n. 9099/95."

Com efeito, é inepta a denúncia que não especifica, ao menos sucintamente, fatos concretos, de modo a possibilitar ao acusado a sua defesa, não podendo se limitar a afirmações de cunho vago (STJ, HC nº 243450, relator: Ministro Sebastião Reis Júnior, DJE 04/09/2013).


E, no caso dos autos, a peça acusatória não descreveu a atuação dos acusados somente na "área 1", a demonstrar uma mínima relação de causalidade entre as condutas praticadas e o fato delituoso imputado, sendo nesse aspecto totalmente genérica, causando prejuízo à ampla defesa.


Por estes fundamentos, dou provimento à apelação ministerial para anular a sentença, nos termos do artigo 564, III, "m", do Código de Processo Penal, e concedo habeas corpus de ofício, para, reconhecendo a inépcia da denúncia, determinar o trancamento da ação penal.


É o voto.


MAURICIO KATO
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