Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 10/09/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013605-16.2008.4.03.6110/SP
2008.61.10.013605-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRE NABARRETE
APELANTE : DONIZETTI BORGES BARBOSA e outros
ADVOGADO : SP231319 MILENA GUEDES CORRÊA PRANDO DOS SANTOS e outro
: SP272877 FERNANDO JAMMAL MAKHOUL
APELANTE : MARIA ELISA MANCA
: RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA
: LUIZ DO CARMO BATISTA ROSA
: ADILSON RODRIGUES DE ALMEIDA
: VANDERLEI BORGES DE LIMA
ADVOGADO : SP231319 MILENA GUEDES CORRÊA PRANDO DOS SANTOS e outro
APELADO(A) : Ministerio Publico Federal
PROCURADOR : OSVALDO DOS SANTOS HEITOR JUNIOR e outro
APELADO(A) : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 TÉRCIO ISSAMI TOKANO
PARTE AUTORA : PREFEITURA MUNICIPAL DE APIAI SP
ADVOGADO : SP119454 FABIO JOSE DE OLIVEIRA e outro
No. ORIG. : 00136051620084036110 1 Vr SOROCABA/SP

EMENTA

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE. REEXAME NECESSÁRIO. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. NÃO OCORRÊNCIA. APROVAÇÃO DE CONTAS POR ÓRGÃOS COMPETENTES. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO EM SEDE JUDICIAL. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. FIXAÇÃO DAS SANÇÕES MANTIDA. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL DESPROVIDAS.
- A imputação de improbidade administrativa decorre, em síntese, de supostas irregularidades perpetradas na formalização e condução de processos licitatórios com o intuito de burlar o caráter competitivo dos certames (Convites nºs 08/2005, 09/2005 e 10/2005, Convênios nºs 1594/2003 e 1832/2003) e favorecer empresas licitantes e pessoas atuantes na denominada "Máfia das Sanguessugas", em prejuízo do Município de Apiaí e da União, bem como da inobservância às normas e aos princípios que disciplinam e regem as licitações públicas. A inicial assinalou a incidência do artigo 10, caput e incisos VIII, IX, XI e XII, bem como do artigo 11, caput e inciso I, ambos da Lei nº 8.429/92.
- Trata-se de caso de remessa obrigatória, embora a Lei nº 7.347/85 silencie a respeito, porquanto, por interpretação sistemática das ações de defesa dos interesses difusos e coletivos, conclui-se aplicável analogicamente o artigo 19 da ação popular (Lei nº 4.717/65).
- No caso dos autos, não existe lei que determine a obrigatoriedade e, à vista da natureza da relação jurídica (ação civil pública de improbidade administrativa), tem o apelado, na qualidade de demandante, a faculdade de definir o polo passivo da ação a partir dos elementos de convicção que tiver contra cada um dos acusados, agentes públicos ou não. Destarte, deve ser afastada a alegação de necessidade da inclusão dos terceiros nominados e beneficiários indiretos do suposto ato ímprobo no polo passivo (artigos 3º da Lei de Improbidade Administrativa, 2º, 3º, 128, 214, 267, inciso IV, 284, 285, 293 e 301, inciso III, do CPC e 5º, incisos LIV e LV, da CF/88).
- Não prospera a tese de inexistência de eventual fraude nos certames mencionados nos autos, à vista da aprovação pelos órgãos competentes (Controladoria da União e Tribunal de Contas do Estado de São Paulo) da prestação de contas do convênio federal e dos respectivos processos licitatórios. A teor do artigo 21, inciso II, da Lei nº 8.429/92, o exame jurisdicional do ato impugnado em sede de ação de improbidade administrativa não se vincula à aprovação ou rejeição levadas a efeito pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas. Nesse sentido iterativa jurisprudência do S.T.J..
- As diversas irregularidades formais apontadas pelos auditores, tanto na fase inicial quanto nas demais etapas do feito licitatório, no tocante à ausência da autorização para a abertura do certame, da identificação de quem retirou o edital e do agente recebedor do bem, inexistência de comprovação de ampla divulgação da licitação, existência de folhas não numeradas, falta de pesquisa prévia de preço de mercado, de indicação da disponibilidade dos recursos e da minuta do edital com aprovação da assessoria jurídica da entidade, mais do que representar em meras irregularidades administrativas, têm por consequência imediata maior dificuldade para o exercício dos controles interno ou externo por órgãos competentes, já que ausentes elementos relevantes nos três feitos administrativos.
- A Delta Veículos Especiais Ltda foi destinatária das três cartas-convites (08/2005, 09/2005 e 10/2005) e venceu os dois certames relativos às aquisições do veículo van e do ônibus (cartas-convites nº 08/2005 e 09/2005). Conforme declarou Luiz Antônio Trevisan Vedoin, no interrogatório colhido na Segunda Vara da Seção Judiciária do Estado de Mato Grosso, trata-se de empresa pertencente a Sinomar Martins Camargo, a qual foi constituída, em razão da necessidade de uma empresa do Estado do Paraná participar de licitações naquela unidade federativa, além de esclarecer que a Delta passou a dar cobertura às suas empresas no ano de 2005.
- Conforme ressaltado no relatório de auditoria (convênio nº 1832/2003), houve fracionamento do objeto da licitação para evitar a tomada de preços, modalidade correta para a espécie. Como descrito pelo interrogado Luiz Antônio, eram realizados dois procedimentos licitatórios, de modo que ocorria um certame destinado à aquisição da unidade móvel de saúde e outro, exclusivamente, para a aquisição dos equipamentos médico-hospitalares. A providência garantia a utilização da carta-convite, o que propiciava o controle do resultado.
- O direcionamento de licitações para favorecer específica fornecedora está manifestamente delineado nos autos.
- As declarações das testemunhas ouvidas em juízo não têm o condão de infirmar a convicção acerca da perpetração das ações descritas pelo autor, relativamente ao direcionamento das licitações, pois não participaram diretamente dos procedimentos licitatórios, não se recordaram de fato específico acerca da reunião da comissão e obtiveram informações por terceiros.
- Não se trata, portanto, de imputação de responsabilidade ao município baseada unicamente no depoimento de Luiz Antônio, mas na análise do conjunto probatório produzido à luz do devido processo legal.
- Os acervos oral e documental consubstanciam um conjunto harmônico a demonstrar a materialidade e a autoria em relação a Donizetti Borges Barbosa, bem como autoriza concluir que tenham os réus Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima concorrido, voluntária e conscientemente, para o direcionamento da licitação.
- Quanto aos réus Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima, membros da Comissão Permanente para o julgamento de licitações, o cotejo de suas declarações com as dos outros réus, assim como documentos e depoimentos existentes, não demonstra que tenham concorrido voluntária e conscientemente para a fraude verificada, na medida em que não há qualquer prova nos autos de que tivessem conhecimento do direcionamento pretendido pelos demais apelantes, o que não afasta a possibilidade de responderem por atuação negligente na Comissão de Licitação.
- Para a perpetração da fraude seria imprescindível o atendimento dos aspectos formais exigíveis para a realização do certame, inclusive das atividades atinentes à Comissão de Licitação.
- Exsurge que a lei imputa função de maior complexidade do que a que estes réus, na verdade, desempenhavam. Infere-se de suas declarações que se reuniam somente no dia da abertura dos envelopes para análise dos documentos e propostas, não tinham atribuição específica e não acompanhavam o que acontecia antes ou depois dessa sessão.
- Ainda que não tivessem conhecimento dos desígnios dos demais corréus, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima assumiram o encargo de membros da Comissão Permanente, mas não se desincumbiram das responsabilidades inerentes, de modo que propiciaram o êxito da realização da conduta. Por outro lado, não demonstraram terem sido coagidos a tal proceder.
- Em relação aos corréus Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima, não há que se perquirir sobre a ausência de má-fé, à vista de suas condutas culposas, o que não se aplica a Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima, os quais atuaram com o dolo de propiciar a contratação da empresa Delta Veículos Especiais Ltda mediante licitação inidônea.
- A afirmação da defesa de que foram realizadas as prévias pesquisas de preço não restou comprovada nos autos.
- Também não merece guarida a alegação de que o relatório CGU/DENASUS é impreciso quanto à diferença de valor pago às licitantes em relação ao preço de mercado, bem como omisso quanto à demonstração dos parâmetros de comparação.
- O método consiste, em síntese, no estabelecimento de preços de mercado relativos às unidades móveis de saúde e às transformações, por meio de ampla pesquisa, inclusive considerados os praticados pelo grupo Planam, além de valores obtidos na Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas-FIPE e na Secretaria de Fazenda do Estado de Rondônia-Sefaz/RO (tabela do IPVA), que utiliza a FIPE como referência. Assim, ao contrário do argumento da defesa, há nos autos provas que demonstraram o prejuízo ao erário com a aquisição do ônibus e com a respectiva adaptação.
- Com o intuito de demonstrar a regularidade procedimental afirma-se que a inexistência de autorização para a abertura do certame não obsta sua homologação e que a lei não impõe a identificação da pessoa que retira o edital. Não prospera a alegação. Ao tratar do procedimento e julgamento da licitação, o artigo 38 da Lei nº 8.666/93 prevê seu início, mediante a abertura de processo administrativo, o qual deverá ser instruído com a respectiva autorização, bem como o comprovante da entrega do convite.
- Com a razão a sentença ao suscitar a incompatibilidade lógica de o corréu Rubens Barra R. de Lima, à vista de sua formação jurídica, ter permitido a assinatura em nome de sociedade empresária sem que o signatário comprovasse a qualidade de preposto.
- Eventual inconsistência do relatório DENASUS acerca do fim do prazo de vigência do convênio 1832/2003 deve-se às sucessivas renovações de prazo para a prestação de contas, o que não compromete a lisura da auditoria realizada.
- É certo que a modalidade convite é a mais singela e demanda menos formalismo, razão pela qual não se exige a publicação na imprensa oficial. Todavia, a Lei nº 8.666/93 admite a participação de interessados não convidados. Seu artigo 22, § 3º, dispõe acerca da afixação, em local apropriado, de cópia do instrumento convocatório para propiciar aos demais cadastrados na correspondente especialidade manifestarem seu interesse.
- O fato de as ações ilícitas relatadas por Luiz Antônio Vedoin antecederem o julgamento da licitação não exclui a responsabilização dos membros da comissão, porquanto, como se viu, respondem culposamente pela perpetração de suas condutas.
- A inexistência de enriquecimento ilícito não obsta a caracterização de improbidade, dado que, nestes autos, não se cuida de condutas previstas no artigo 9º da Lei nº 8.429/92, mas, sim, as discriminadas no artigo 10, que correspondem, respectivamente, a causar prejuízo ao erário.
- Evidente a ocorrência no caso sob análise, ao menos em relação ao convênio nº 1832/2003, elemento indispensável para a caracterização dos atos de improbidade descritos no artigo 10 da Lei de improbidade, uma vez que a conduta do agente público, em princípio, acarretou não apenas dano estimado em R$ 83.923,58, como também a realização da transformação em desacordo com o Plano de Trabalho aprovado e consequente inexistência de consultório pediátrico/médico e ginecológico, o que privou a população do atendimento almejado com o convênio. Despiciendo, portanto, o argumento acerca da inexistência de indício de que seria possível a contratação do mesmo serviço de maneira diversa da que foi realizada pela Prefeitura de Apiai/SP, já que os parâmetros foram obtidos por meio de pesquisas, o que indica a existência de outros fornecedores.
- Relativamente ao convênio nº 1594/2003, conforme consta à fl. 111 do apenso II, volume I, não se identificou prejuízo ao erário, o que afasta a incidência do artigo 10 da LIA, porque a figura apresenta uma descrição de conduta lesiva. Assim, como observou o juiz a quo, não há se falar em duas práticas de improbidade.
- A defesa escuda-se da prática de improbidade sob o fundamento de que houve a efetiva utilização do objeto licitado, bem como o emprego dos recursos para as respectivas aquisições. O exame do caso dos autos não abrange tais aspectos, os quais restaram incontroversos, mas o caráter fraudulento dos certames e o prejuízo resultante do superfaturamento. O que a lei pretende tutelar no inciso VIII do artigo 10 da Lei nº 8.429/92 é a licitude do procedimento licitatório e sua índole competitiva.
- Quanto à alegada impossibilidade de os apelantes apurarem a participação inidônea de empresas, à vista da regularidade documental, não se apresenta plausível. Considerado o interesse daquela constituída para o fim de participar em licitações, por certo seria apresentada toda a documentação necessária para o desiderato, tanto que não se apontou nenhuma inconsistência em relação os documentos exibidos pela Delta Veículos Especiais Ltda, o que não afasta a responsabilidade dos réus, já que a fraude não é relativa à indevida habilitação dos candidatos e, sim, ao modo indevidamente dirigido para se chegar ao resultado.
- Assim, demonstradas a materialidade e a autoria do ato ímprobo, a manutenção da condenação é medida que se impõe.
- In casu, foi constatada a incidência do artigo 10, caput e inciso VIII, da LIA.
- Restou comprovado o direcionamento da licitação com o intuito de favorecer a empresa Delta Veículos Especiais Ltda, o que culminou no superfaturamento do objeto e prejuízo ao erário, perpetrado por Donizetti Borges Barbosa com a participação voluntária e consciente dos corréus Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima.
- Outrossim, ainda que não tivessem conhecimento dos desígnios dos demais corréus, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima assumiram o encargo de membros da comissão permanente, mas não se desincumbiram das responsabilidades inerentes, de modo que propiciaram o êxito da realização das condutas.
- Assim, todos os réus infringiram o artigo 10, caput e inciso VIII, da LIA. Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima respondem por dolo, ao passo que Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima por culpa.
- É inegável, portanto, que incorreram na prática de graves atos de improbidade, porquanto fizeram tábua rasa das disposições constitucionais e das leis de regência em matéria de licitação, que preveem a observância do princípio da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração, bem como o processamento e julgamento em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, em relação às quais estavam obrigados a obedecê-las.
- Em conclusão, o argumento de que as penas dos incisos I a III do artigo 12 devem ser necessariamente aplicadas de forma cumulativa está superado pela expressa disposição do caput de que "podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente", incluída pela Lei nº 12.120/09 em resposta ao debate que se estabelecera e em consonância com o entendimento do STJ. In casu, porém, à vista da gravidade dos atos praticados pelos réus, conforme demonstrada anteriormente, com supedâneo no parágrafo único do artigo 12 da Lei nº 8.429/92, no que se refere à fixação das penas entendo que o juízo a quo houve-se bem. Cabe ressaltar que, ao estabelecê-las em patamar próximo ao mínimo legal, bem como ao optar pela cumulatividade, apontou as circunstâncias em que baseava sua decisão.
- Constata-se que a sentença está bem fundamentada nos elementos de prova dos autos e, no que concerne à fixação das sanções, nada há que se reparar. Houve descrição das condutas de cada um dos réus, apontaram-se os motivos da cumulação das reprimendas, relativamente a Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima, bem como a valoração do pagamento de multa civil teve por base o grau de participação dos apelantes em relação à perpetração da improbidade. Considerou-se a conduta culposa dos apelantes que responderam nessa modalidade, o que resultou em dosimetria mais branda em relação aos demais.
- A Lei n.º 8.429/92 prevê especificamente a indisponibilidade de bens no âmbito das ações civis públicas de improbidade administrativa, onde o periculum in mora está implícito no próprio comando legal, uma vez que visa a "assegurar o integral ressarcimento do dano", exigida do requerente tão somente a demonstração, em tese, da prática de conduta ímproba pelo requerido, com dano ao erário e/ou do enriquecimento ilícito do agente.
- Quanto à suposta insolvência suscitada, em decorrência da decretação de indisponibilidade de bens, bem como da condenação a ressarcimento ao erário e multa civil, por não disporem do atinente montante, sequer foi comprovada e, portanto, não pode justificar a não imposição da medida cautelar ou o abrandamento das reprimendas.
- Por fim, incabível a afirmação de que a restituição de valores resultaria em enriquecimento ilícito da administração, decorrente do ressarcimento integral do dano, ante a prestação do serviço. Não incide na espécie o artigo 59 da Lei nº 8.666/93, o qual trata da nulidade do contrato administrativo, matéria manifestamente estranha ao caso.
- Repise-se que restou inconteste o prejuízo, em razão do superfaturamento dos objetos licitados, o que impõe a devolução dos valores relativos à perda patrimonial. A prestação de serviços propiciada pelos veículos adquiridos não elide a fraude perpetrada, já que tal ocorreria independentemente do preço da aquisição.
- Rejeitada a preliminar e negado provimento à apelação dos réus e à remessa oficial tida por interposta.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e negar provimento à apelação e à remessa oficial, tida por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 19 de agosto de 2015.
André Nabarrete
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 27/08/2015 17:01:03



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013605-16.2008.4.03.6110/SP
2008.61.10.013605-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRE NABARRETE
APELANTE : DONIZETTI BORGES BARBOSA e outros
ADVOGADO : SP231319 MILENA GUEDES CORRÊA PRANDO DOS SANTOS e outro
: SP272877 FERNANDO JAMMAL MAKHOUL
APELANTE : MARIA ELISA MANCA
: RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA
: LUIZ DO CARMO BATISTA ROSA
: ADILSON RODRIGUES DE ALMEIDA
: VANDERLEI BORGES DE LIMA
ADVOGADO : SP231319 MILENA GUEDES CORRÊA PRANDO DOS SANTOS e outro
APELADO(A) : Ministerio Publico Federal
PROCURADOR : OSVALDO DOS SANTOS HEITOR JUNIOR e outro
APELADO(A) : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 TÉRCIO ISSAMI TOKANO
PARTE AUTORA : PREFEITURA MUNICIPAL DE APIAI SP
ADVOGADO : SP119454 FABIO JOSE DE OLIVEIRA e outro
No. ORIG. : 00136051620084036110 1 Vr SOROCABA/SP

RELATÓRIO

Apelação (fls. 989/1080) interposta por Donizetti Borges Barbosa e outros contra sentença (fls. 925/971) proferida nos autos da ação civil pública por atos de improbidade administrativa, que julgou o pedido parcialmente procedente para condenar os apelantes como incursos no artigo 10, inciso VIII, da Lei nº 8.429/92 e, em consequência, com fulcro no artigo 12, inciso II, dessa mesma lei, condenou 1) DONIZETTI BORGES BARBOSA às seguintes penalidades: a) ressarcimento do dano suportado pelo erário, de forma solidária, cujo valor é de R$ 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos), acrescido de correção monetária, desde 12/06/2007, a ser aplicada na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, nos termos da Resolução nº 134/2010 do CJF, e juros moratórios, com incidência desde a data do evento danoso, no percentual de 1% (um por cento) ao mês; b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; c) pagamento de multa civil no valor de R$ 41.961,79 (quarenta e um mil, novecentos e sessenta e um reais e setenta e nove centavos), devidamente acrescido de correção monetária, desde 19/05/2005; d) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja o réu sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos; e) sanção de perda de função, cargo ou emprego que atinge qualquer cargo, emprego ou função em exercício no momento do trânsito em julgado da sentença, ainda que distinto daquele do qual se praticou o ato de improbidade; 2) MARIA ELISA MANCA: a) ressarcimento do dano suportado pelo erário, de forma solidária, cujo valor é de RS 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos), acrescido de correção monetária, desde 12/06/2007, a ser aplicada na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, nos termos da Resolução nº 134/2010 do CJF, e juros moratórios, com incidência desde a data do evento danoso, no percentual de 1% (um por cento) ao mês; b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; c) pagamento de multa civil no valor de RS 20.980,89 (vinte mil, novecentos e oitenta reais e oitenta e nove centavos), devidamente acrescido de correção monetária, desde 19/05/2005; d) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja a ré sócia majoritária, pelo prazo de 5 (cinco) anos; e) sanção de perda de função, cargo ou emprego que atinge qualquer cargo, emprego ou função em exercício no momento do trânsito em julgado da sentença, ainda que distinto daquele do qual se praticou o ato de improbidade; 3) RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA: a) ressarcimento do dano suportado pelo erário, de forma solidária, cujo valor é de R$ 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos), acrescido de correção monetária, desde 12/06/2007, a ser aplicada na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, nos termos da Resolução nº 134/2010 do CJF, e juros moratórios, com incidência desde a data do evento danoso, no percentual de 1% (um por cento) ao mês; b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; c) pagamento de multa civil no valor de R$ 20.980,89 (vinte mil, novecentos e oitenta reais e oitenta e nove centavos), devidamente acrescido de correção monetária, desde 19/05/2005; d) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja o réu sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos; e) sanção de perda de função, cargo ou emprego que atinge qualquer cargo, emprego ou função em exercício no momento do trânsito em julgado da sentença, ainda que distinto daquele do qual se praticou o ato de improbidade; 4) VANDERLEI BORGES DE LIMA: a) ressarcimento do dano suportado pelo erário, de forma solidária, cujo valor é de RS 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos), acrescido de correção monetária, desde 12/06/2007, a ser aplicada na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, nos termos da Resolução nº 134/2010 do CJF, e juros moratórios, com incidência desde a data do evento danoso, no percentual de 1% (um por cento) ao mês; b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; c) pagamento de multa civil no valor de R$ 5.245,22 (cinco mil, duzentos e quarenta e cinco reais e vinte e dois centavos), devidamente acrescido de correção monetária, desde 19/05/2005; d) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja o réu sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos; 5) LUIZ DO CARMO BATISTA ROSA: a) ressarcimento do dano suportado pelo erário, de forma solidária, cujo valor é de RS 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos), acrescido de correção monetária, desde 12/06/2007, a ser aplicada na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, nos termos da Resolução nº 134/2010 do CJF, e juros moratórios, com incidência desde a data do evento danoso, no percentual de 1% (um por cento) ao mês; b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; c) pagamento de multa civil no valor de R$ 5.245,22 (cinco mil, duzentos e quarenta e cinco reais e vinte e dois centavos), devidamente acrescido de correção monetária, desde 19/05/2005; d) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja o réu sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos; 6) ADILSON RODRIGUES DE ALMEIDA: a) ressarcimento do dano suportado pelo erário, de forma solidária, cujo valor é de R$ 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos), acrescido de correção monetária, desde 12/06/2007, a ser aplicada na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, nos termos da Resolução nº 134/2010 do CJF, e juros moratórios, com incidência desde a data do evento danoso, no percentual de 1% (um por cento) ao mês; b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; c) pagamento de multa civil no valor de R$ 5.245,22 (cinco mil, duzentos e quarenta e cinco reais e vinte e dois centavos), devidamente acrescido de correção monetária, desde 19/05/2005; d) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja o réu sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos. Assinalou a observância do disposto no artigo 20 da Lei n° 8.429/92, no sentido de que as penas de perda da função pública e suspensão dos direitos políticos só poderão ser eventualmente aplicadas após o trânsito em julgado da sentença. Em relação à indisponibilidade de bens dos réus DONIZETTI BORGES BARBOSA, MARIA ELISA MANCA e RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA, determinou o bloqueio imediato de ativos financeiros pelo sistema "BACEN JUD", até o limite de RS 83.923,58, e averbação no Cartório de Registro de Imóveis de Apiaí da indisponibilidade de bens imóveis em nome dos réus DONIZETTI BORGES BARBOSA, MARIA ELISA MANCA e RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA, bem como anotação, por meio do sistema "RENAJUD", dos veículos em nome desses réus. Não houve condenação a custas e honorários advocatícios.


Na inicial, o MPF narra que a atuação fiscalizadora da Controladoria-Geral da União - CGU em municípios de diferentes regiões do país revelou, no ano de 2004, a existência de uma organização criminosa que, desde o ano de 2000, desviava verbas federais, oriundas do Fundo Nacional de Saúde - FNS, destinadas à compra de ambulâncias, repassadas a prefeituras e outras entidades por meio de convênios firmados com o Ministério da Saúde.

Aduz o órgão ministerial que:

a) com pequenas variações, o esquema montado para desvio de dinheiro público consistia no comércio de emendas individuais ou genéricas ao orçamento geral da União, fraude em licitação e superfaturamento na compra de ambulâncias e/ou equipamentos hospitalares;

b) em 4 de maio de 2006, a Polícia Federal deflagrou a chamada "Operação Sanguessuga" para desarticular a quadrilha que atuava na área da saúde. Dezenas de parlamentares, prefeitos e empresários foram flagrados nesse esquema, grupo que passou a ser chamado de "MÁFIA DAS SANGUESSUGAS";

c) o sistema era operado, principalmente, por Darci José Vedoin e seu filho Luiz Antônio Trevisan Vedoin, proprietários da maioria das empresas utilizadas nas fraudes às licitações, algumas de "fachada", abertas em nomes de parentes e "laranjas", controladas, via de regra, pela PLANAM - Comércio e Representações;

d) o estratagema se desenvolvia em fases distintas, porém articuladas. Primeiro, os membros entravam em contato com prefeitos interessados em adquirir unidade móvel de saúde (ambulâncias) do governo federal sem a necessidade de se submeterem aos trâmites normais. Para seguir esse "atalho", eram oferecidos aos interessados todos os "serviços" necessários para forjar e direcionar licitações fraudulentas em que venceria uma das empresas do grupo criminoso. Em alguns casos, os contatos com os prefeitos eram feitos pelo próprio parlamentar;

e) obtida a anuência/conivência do prefeito, dava-se início à segunda fase, voltada à obtenção dos recursos. Nessa etapa, senadores e respectivos assessores preparavam emendas parlamentares individuais ou genéricas ao orçamento da União, com vista à destinação de verbas para aquisição pelos municípios "contemplados" de unidades móveis de saúde e equipamentos correlatos. Num terceiro momento, correspondente à execução orçamentária, eram confeccionados e apresentados ao Ministério da Saúde pré-projetos e projetos, os quais resultavam na formalização dos convênios e, consequentemente, no repasse dos recursos às prefeituras;

f) já celebrado o convênio, a ação do grupo se desenvolvia no âmbito municipal, momento em que, com a participação dos servidores locais, mais especificamente dos membros das comissões de licitação, além do prefeito e secretários, eram forjados os processos licitatórios para garantir a vitória de uma das empresas do grupo;

g) as vantagens econômicas obtidas com essa prática eram rateadas entre todos que contribuíam para seu êxito: empresários, parlamentares, agentes e funcionários públicos;

h) durante mais de 5 (cinco) anos, o grupo executou praticamente todos os atos necessários à concretização do fim ilícito colimado. A organização elaborava, previamente, muitos dos documentos necessários para o processamento das diferentes etapas da atividade delitiva;

i) uma espécie de Kit de licitação fraudulenta era disponibilizado aos "interessados", mormente quando a modalidade escolhida era a carta-convite. Assim, nenhuma das etapas política ou administrativa necessárias para o desvio dos recursos públicos fugia ao controle da quadrilha;

j) o presente feito tem por objeto a persecução dos responsáveis pela execução da fraude no processo licitatório para aquisição de unidade móvel de saúde no Município de Apiaí/SP, Convênio n° 1594/2003, SIAF nº 496077, processo n° 25.000.087131/2003-17, relativo à aquisição de 1 (um) veículo tipo van, com capacidade para 16 (dezesseis) pessoas, destinado ao transporte de pacientes, no valor total de R$ 68.000,00 (sessenta e oito mil reais), dos quais R$ 39.990,00 (trinta e nove mil, novecentos e noventa reais) foram repassados pelo Ministério da Saúde e R$ 24.301,27 (vinte e quatro mil, trezentos e um reais e vinte e um centavos) são provenientes de contrapartida, e o Convênio nº 1832/2003, SIAF n° 496078, Processo nº 25.000.093646/2003-12, para a aquisição de 1 (um) ônibus equipado para atendimento médico e odontológico, no valor total de R$ 145.180,00 (cento e quarenta e cinco mil, cento e oitenta reais), dos quais R$ 95.980,00, mais os rendimentos de R$ 10.800,00, foram repassados pelo Ministério da Saúde e R$ 38.400,00 (trinta e oito mil e quatrocentos reais) correspondem à contrapartida da prefeitura. Os termos dos convênios foram assinados pelo Prefeito de Apiaí, à época, Emílson Couras da Silva, e pelo Ministro de Estado da Saúde, Humberto Sérgio Costa;

k) os recursos necessários para a aprovação e execução do Convênio n° 1594/2003 tiveram origem na Emenda Parlamentar ao Orçamento da União n° 36050013, de autoria do Deputado Federal Gilberto Kassab, e os do Convênio n° 1832/2003 na Emenda Parlamentar ao Orçamento da União n° 36000001, de autoria do Deputado Federal Bispo Wanderval Santos;

l) coube ao Prefeito DONIZETTI BORGES BARBOSA dar continuidade aos "trabalhos" no âmbito municipal, iniciado por solicitação do Secretário Municipal de Saúde, Carlos Alberto Bastos de Moraes, dos seguintes processos licitatórios:

l.1)- Processo n° 09/2005 - Carta-Convite n° 08/2005 (Convênio n° 1832/2003), para aquisição de 1 (um) ônibus modelo não inferior a 1997, versão vazio, para adaptação de equipamentos médicos e odontológicos;

l.2)- Processo n° 11/2005 - Carta-Convite n° 10/2005 (Convênio n° 1832/2003), para a transformação do veículo (ônibus) em unidade móvel de saúde;

l.3)- Processo n° 10/2005 - Carta-Convite n° 09/2005 (Convênio n° 1594/2003), para aquisição de 1 (um) veículo tipo van, adaptada para atendimento médico - denominada Unidade Móvel de Saúde;

m) os editais foram publicados no mesmo dia, 05/04/2005;

n) a Comissão de Licitacão, instituída pela Portaria Municipal n° 16, de 3 de janeiro de 2005, foi composta, nos três processos, por RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA - Presidente, e pelos membros LUIZ DO CARMO BATISTA ROSA, ADILSON RODRIGUES DE ALMEIDA e VANDERLEI BORGES DE LIMA;

o) com relação à Carta-Convite n° 08/2005 - Processo nº 09/2005, cujo objeto foi a aquisição de 1 (um) ônibus para ser adaptado, foram "convidadas" as seguintes empresas:

- Delta Veículos Especiais Ltda - Curitiba/PR;

- De Nigris Distrib. de Veículos Ltda - São Paulo/SP;

- Manupa Com. Veículos, Al. Pap. Elét. E Rep. Ltda - Sto. Antônio Jardim/SP;

p) as propostas apresentadas (fls. 429, 432 e 434) foram:

- Delta: R$ 78.000,00 (setenta e oito mil reais);

- De Nigris: R$ 79.900,00 (setenta e nove mil e novecentos reais)

- Manupa: R$ 79.950,00 (setenta e nove mil, novecentos e cinquenta reais);

q) conforme a ata de julgamento, de 13/04/2005, todas as empresas foram consideradas habilitadas. Venceu a empresa Delta Veículos Especiais Ltda;

r) o representante da Manupa não apresentou a procuração, bem como a De Nigris não teve nenhum representante, de modo que, sob o aspecto formal, somente a Delta estava representada por Sinomar Martins Camargo;

s) no tocante à Carta-Convite n° 10/2005 - Processo nº 11/2005, com vista à transformação do ônibus em unidade móvel de saúde, foram convidadas as seguintes empresas:

- Delta Veículos Especiais Ltda - Curitiba/PR;

- Tapeçaria Jaedi de Medianeira Ltda - Medianeira/PR;

- Transform Indústria e Comércio de Veículos Especiais Ltda - Franca/SP;

t) as propostas apresentadas foram:

- Delta: R$ 58.200,00 (cinquenta e oito mil e duzentos reais);

- Transform: R$ 56.000,00 (cinquenta e seis mil reais);

- Tapeçaria Jaedi: R$ 64.800,00 (sessenta e quatro mil e oitocentos reais);

u) as empresas foram consideradas habilitadas, a teor da ata de julgamento, de 13/04/2005. Venceu a empresa Transform Indústria e Comércio de Veículos Especiais Ltda;

v) o representante da Transform, Jordan Azevedo, não apresentou o instrumento de mandato, bem como a Tapeçaria Jaedi não enviou preposto, portanto, apenas a empresa Delta estava regularmente representada;

x) as homologações e adjudicações dos dois certames ocorreram na mesma data: 02/05/2005;

y) os dois procedimentos licitatórios tiveram origem nos recursos oriundos do Convênio n° 1832/2003, SIAF 496078, Processo n° 25000.093646/2003-12, referente à Emenda Parlamentar n° 36000001 da autoria do Deputado Federal Bispo Wanderval e, segundo o Plano de Trabalho apresentado ao Ministério da Saúde pela Prefeitura de Apiaí/SP, destinava-se à aquisição de um veículo (ônibus) dotado de equipamentos para atendimento médico e odontológico;

z) com relação à Carta-Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, alusiva à aquisição de um veículo tipo van - Unidade Móvel de Saúde, foram convidadas as seguintes empresas:

- Delta Veículos Especiais Ltda - Curitiba/PR;

- Manupa Com. Veículos, Al. Pap. Elét. E Rep. Ltda - Sto. Antônio Jardim/SP;

- Transform Indústria e Comércio de Veículos Especiais Ltda - Franca/SP;

a.1) As propostas apresentadas foram:


- DeIta: R$ 68.380,00 (sessenta e oito mil, trezentos e oitenta reais);

- Manupa: R$ 74.500,00 (setenta e quatro mil e quinhentos reais);

- Transform: R$ 71.450,00 (setenta e um mil, quatrocentos e cinquenta reais);

b.1) conforme registrado na ata de julgamento, de 13/04/2005, todas as empresas foram consideradas habilitadas. Venceu a empresa Delta Veículos Especiais Ltda;

c.1) somente a Delta estava representada formalmente por Sinomar Martins Camargo. A Transform estaria representada por Jordan Azevedo que, no entanto, não apresentou a respectiva procuração. Outrossim, em relação à Manupa, o suposto representante, Diego Rezende, também não apresentou o instrumento de mandato;

d.1) a homologação e adjudicação ocorreram em 02/05/2005;

e.1) na auditoria realizada pelo DENASUS constataram-se inúmeras irregularidades que comprovam a preparação fraudulenta do certame. Quanto à Carta-Convite nº 09/2005 registrou-se:

e.1.1.) não consta documento autorizador para a abertura do processo licitatório;

e.1.2) não se demonstrou a realização prévia de pesquisa de preço de mercado;

e.1.3) o objeto licitado não é compatível com o do Plano de Trabalho apresentado ao Ministério da Saúde, o qual previa a compra de veículo com capacidade para 16 passageiros, e o edital descreve veículo adaptado para atendimento médico;

e.1.4) não há documentos comprobatórios da ampla divulgação do certame;

e.1.5) não há identificação correta de quem retirou o edital em nenhum dos recibos;

e.1.6) as assinaturas de Antônio da Silva Filho no comprovante de entrega do edital, na declaração do empregador e na proposta não conferem com a assinatura no contrato social da empresa Transform;

e.1.7) não há no processo licitatório indicação da disponibilidade dos recursos financeiros e minuta do edital com aprovação da assessoria jurídica, conforme exigem, respectivamente, os artigos 14 e 38, parágrafo único, da Lei n° 8.666/93;

e.1.8) a aquisição de um veículo diverso daquele apresentado no Plano de Trabalho gerou um prejuízo social à população, que poderia ser melhor atendida por um veículo com capacidade para 16 pessoas, principalmente nos casos de deslocamento para consultas e tratamentos em outros municípios;

f.1) quanto à Carta-Convite n° 08/2005, Processo n° 09/2005, para aquisição de 1 ônibus e à Carta-Convite n° 10/2005, Processo n°11/2005, para a transformação do veículo, a análise do DENASUS foi simultânea em razão de ambos decorrerem do Convênio n° 1832/2003. Constatou-se o seguinte:

f.1.1) apesar de os recursos terem sido liberados em 22/04/2004, o prazo para prestação de contas passou a ser 23/02/2006, devido às sucessivas ocorrências nos termos de prorrogações;

f.1.2) em 14/12/2005, a Prefeitura Municipal de Apiaí solicitou a reformulação do Plano de Trabalho do Convênio n° 1832/2003;

f.1.3) os processos de licitação nºs 09/2003 e 11/2003 não estão devidamente numerados;

f.1.4) houve fracionamento do objeto da licitação para fugir à modalidade correta, que seria tomada de preços;

g.1) quanto ao Convite n° 08/2005 - Processo n° 09/2005:

g.1.1) não consta a realização de pesquisa de mercado/preço em nenhum dos processos;

g.1.2) não há informações sobre eventual publicação dos editais;

g.1.3) não há a identificação das pessoas que retiraram os editais;

g.1.4) consta da ata que Diego Rezende, que representaria a Manupa, não apresentou a devida procuração;

g.1.5) as assinaturas de Antônio da Silva Filho no comprovante de entrega do edital (Conv. 10/2005 - Processo n° 11/2005), na declaração do empregador e na proposta não conferem com a assinatura no contrato social da Transform;

g.1.6) a De Nigris não teve nenhum representante na sessão de abertura dos envelopes, porém teria protocolado os envelopes na mesma data, 13/04/05, às l0h28;

g.1.7) consta da ata (processo n° 11/2005) que Jordan Azevedo, que representaria a Transform, não apresentou a devida procuração;

g.1.8) a Tapeçaria Jaedi não teve nenhum representante na sessão de abertura dos envelopes (processo n° 11/2005), porém teria protocolado os envelopes na mesma data, 13/04/05, às l0h28;

g.1.9) na verificação in loco realizada pelo FNS, Relatórios nºs 308-1/2004 e 308-2/2005, não foi encontrada a documentação referente ao pedido de reformulação do Plano de Trabalho "aprovado";

g.1.10) não há, no processo licitatório, aprovação do ordenador de despesas à requisição no tocante à abertura do processo licitatório, indicação da disponibilidade dos recursos financeiros e minuta do edital com aprovação da assessoria jurídica, conforme exigem, respectivamente, os artigos 14 e 38, parágrafo único, da Lei n° 8.666/93;

h.1) na verificação física foi constatado:

h.1.1) licenciamento do veículo vencido;

h.1.2) inexistência do consultório pediátrico/médico e ginecológico, conforme constavam no Plano de Trabalho aprovado, no edital de licitação e na nota fiscal. Foi verificado que no veículo existiam dois consultórios odontológicos: um equipado em funcionamento e outro, também montado, porém inadequado para utilização;

h.1.3) o veículo não estava dotado de portas sanfonadas nem cortinas e, embora indicada na nota fiscal n° 448, da Transform, não foi encontrada torneira elétrica;

i.1) a auditoria do DENASUS, segundo os cálculos apresentados às fls. 138/139, apurou um prejuízo total de R$ 72.743,58 (setenta e dois mil, setecentos e quarenta e três reais e cinquenta e oito centavos). Acrescentado a esse valor o saldo não executado do convênio de R$ 11.180,00 (onze mil, cento e oitenta reais), chega-se ao montante de R$ 83.923,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e três reais e cinquenta e oito centavos);

j.1) a análise dos três processos licitatórios em questão não deixa dúvidas de que se trata de fraudes consumadas pela "Máfia das Sanguessugas";

k.1) a significativa quantidade de irregularidades verificadas na formalização e condução dos processos licitatórios revela que houve coordenação de ações para burlar o caráter competitivo que deveria nortear os certames;

l.1) nesses procedimentos licitatórios já estavam definidas quais seriam as empresas vencedoras;

m.1) a Delta Veículos Especiais Ltda venceu nos dois processos para aquisição dos veículos e o convênio teve origem em emenda parlamentar de autoria do Deputado Federal Bispo Wanderval e ambos convergiram para os mesmos processos licitatórios;

n.1) o desmembramento (fracionamento) do processo de aquisição da unidade móvel de saúde em duas licitações, conforme se demonstrou, reforça as conclusões extraídas das investigações conduzidas pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal, no sentido de que o esquema de fraude nas licitações dava-se, prioritariamente, pela utilização da modalidade carta-convite, o que possibilitava a escolha prévia das empresas "licitantes";

o.1) para viabilizar o emprego de tal modalidade licitatória, comumente desmembrava-se o objeto do convênio e eram realizadas duas licitações de valor não superior a R$ 80.000,00, uma para aquisição do veículo e outra para a aquisição dos equipamentos médicos, porém invariavelmente as unidades móveis de saúde eram entregues, já montadas, pela mesma empresa;

p.1) Luiz Antônio Trevisan Vedoin, por ocasião de seu interrogatório realizado, em 03.07.2006, na 2ª Vara Federal de Cuiabá/MT - Processo n° 2006.36.00.007594-5, mencionou que, para evitar a tomada de preço, havia o fracionamento do objeto licitatório, bem como se manifestou acerca da constituição e participação de específicas empresas;

q.1) nos três processos identificam-se manipulações que apontam para o fracionamento do objeto a ser licitado para possibilitar a opção pela modalidade carta-convite e que a Delta participou sozinha dos certames. As demais empresas, cientes ou não, serviram apenas para fazer número, inclusive a Transform, a qual supostamente teria vencido a licitação para transformar o ônibus em unidade móvel de saúde;

r.1) chama a atenção, também, o fato de as empresas Delta, De Nigris e Jaedi terem os seus envelopes protocolados no mesmo dia, 13/04/05, e na mesma hora, l0h28. Os envelopes da Manupa foram protocolados no dia 13/04/05, às l0h5l, e os da Transform, na mesma data, às l0h39, não obstante as supostas licitantes tivessem sede em Municípios e Estados diferentes;

s.1) DONIZETTI BORGES BARBOSA ocupava, na data dos fatos, o cargo de Prefeito Municipal e nessa condição foi o responsável pela execução dos Convênios nos 1594/2003 (Convite no 09/05 - Proc. no 10/05) e 1832/2003 (Convite n° 08/05 - Proc. n° 09/05 e Convite n° 10/05 - Proc. Nº 11/05);

t.1) MARIA ELISA MANCA, funcionária do Departamento de Compras, foi quem deu os primeiros passos para deflagrar a formalização das licitações fictícias, ao solicitar informações sobre dotações orçamentárias e assinar os convites supostamente enviados às empresas "licitantes", o que demonstra pleno conhecimento dos fins fraudulentos daquele procedimento;

u.1) RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA atuou como Presidente da Comissão de Licitação, responsável pela formalização e julgamento do Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, referente ao Convênio n° 1594/2003 - SIAF n° 496077, do Convite n° 08/2005 - Processo n° 09/2005, e do Convite n° 10 - Processo n° 11/2005, ambos referentes ao Convênio n° 1832/2003;

v.1) LUIZ DO CARMO BATISTA ROSA, membro da Comissão de Licitação, responsável pela formalização e julgamento do Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, referente ao Convênio nº 1594/2003 - SIAF n° 496077, do Convite nº 08/2005 - Processo nº 09/2005, e do Convite nº 10 - Processo n° 11/2005, ambos referentes ao Convênio nº 1832/2003;

y.1) ADILSON RODRIGUES DE ALMEIDA, membro da Comissão de Licitação, responsável pela formalização e julgamento do Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, referente ao Convênio n° 1594/2003 - SIAF n° 496077, do Convite n° 08/2005 - Processo n° 09/2005, e do Convite n° 10 - processo n° 11/2005, ambos referentes ao Convênio nº 1832/2003;

z.1) VANDERLEI BORGES DE LIMA, membro da Comissão de Licitação, responsável pela formalização e julgamento do Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, referente ao Convênio nº 1594/2003 - SIAF n° 496077, do Convite n° 0812005 - Processo n° 09/2005, e do Convite n° 10 - processo n° 11/2005, ambos referentes ao Convênio n° 1832/2003;

a.2) os requeridos que fizeram parte da Comissão de Licitação e descuraram das obrigações inerentes a essa função respondem solidariamente por todos os atos irregulares e ilícitos praticados e descritos na presente ação.


A Prefeitura do Município de Apiaí/SP, bem como a União manifestaram interesse em integrar a lide como litisconsortes ativos (fls. 53 e 71).


Defesa preliminar dos requeridos, às fls. 74/101.


Contestação, às fls. 518/561. Resposta do MPF, às fls. 566/574, e da União, à fl. 579.


Depoimentos dos réus, às fls. 623/631, e das testemunhas, às fls. 631/633 vº, 846/854 e 864/866.


Alegações finais do Parquet, às fls. 894/897, da União, à fl. 901, e dos réus, às fls. 914/921.


Prolatada sentença, às fls. 925/971.


Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca, Rubens Barra Rodrigues de Lima, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima interpuseram recurso de apelação (fls. 989/1048), no qual aduziram, em síntese, que:


a) não há prova da aludida ocorrência de fraudes, no que tange às regras de licitação e do suposto direcionamento descrito na inicial ou de outros elementos que revelariam burla ao caráter competitivo do certame;

b) a prestação de contas do convênio federal e os processos licitatórios foram devidamente aprovados pelos órgãos competentes (Controladoria da União e Tribunal de Contas do Estado de São Paulo);

c) as irregularidades não podem ser imputadas aos municípios apenas por terem sido mencionados no depoimento pessoal de Luiz Antônio Trevisan Vedoin;

d) o veículo tipo van e o ônibus adaptado, ambos direcionados para a área da saúde, são utilizados pela população que se beneficia com a oportuna aquisição;

e) os preços pagos em todas as licitações são de mercado, devidamente pautados em pesquisa de preços e orçamento predefinido;

f) não houve pagamento de qualquer comissão para prefeitos ou servidores e os contatos foram realizados diretamente pelos parlamentares responsáveis pelas emendas;

g) ausente má-fé ou o dano ao erário, requisitos para a prática de ato de improbidade;

h) trata-se de licitações idôneas, na medida em que houve convênio federal e respeitaram-se os trâmites legais e administrativos para se chegar ao repasse do recurso público, o qual foi devidamente utilizado;

i) impossibilidade de ter sido obtida a anuência de DONIZETTI BORGES BARBOSA, pois não era prefeito à época em que o recurso federal foi concedido;

j) o que ocorreu foi o fato de o Prefeito DONIZETTI BORGES BARBOSA se apressar em utilizar o recurso deixado pela gestão passada;

k) foi o anterior prefeito quem assinou o convênio;

l) o Município de Apiaí realizou os 02 (dois) procedimentos licitatórios em 13/04/2005 para a aquisição dos veículos, à vista do prazo de vigência do convênio n° 1832/2003, o qual se encerraria em 16/06/2005;

m) a aquisição do ônibus e sua transformação totalizaram R$ 134.000,00 (cento e trinta e quatro mil reais), valor inferior ao do Plano de Trabalho aprovado pelo Ministério da Saúde (R$ 144.000,00-cento e quarenta e quatro mil reais);

n) o relatório apresentado pelo DENASUS, alusivo à diferença de valor em relação ao preço de mercado, é impreciso, utiliza o sistema SGI da CGU, desconhecido publicamente, e não demonstra os parâmetros de comparação de preços com outros fornecedores;

o) a Prefeitura de Apiaí investiu recursos próprios de contrapartida no valor de R$ 10.705,33 (dez mil, setecentos e cinco reais e trinta e três centavos), após a aprovação de novo Plano de Trabalho pelo Ministério da Saúde, dentro da vigência do Convênio que se encerrou em 24/06/2007;

p) no que se refere ao Convite n° 08/2005, a ausência de representante legal no momento da sessão de abertura não anula a licitação e não impede a participação no certame, nem tampouco a presença de representante sem a devida procuração;

q) a apresentação da habilitação e da proposta já permitem a participação no certame;

r) a melhor apresentada foi a da Delta Veículos Especias Ltda, no valor de R$ 78.000,00;

s) quanto ao Convite n° 10/2005, caso se tratasse de procedimento fraudulento, a Delta novamente sairia vencedora, todavia não foi o que ocorreu;

t) a empresa Transform Indústria e Comércio de Veículos Especiais Ltda, apesar de representada por Jordan Azevedo, sem procuração, venceu por apresentar o menor valor - R$ 56.000,00, assim como no tocante ao Convite n° 09/2005, no qual a empresa Delta Veículos Especiais teve êxito por exibir a menor quantia, R$ 68.380,00;

u) relativamente à auditoria realizada pelo DENASUS, o relatório apresentado é bastante impreciso ao mencionar prejuízo ao erário no valor de 83.923,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e três reais e cinquenta e oito centavos), bem como ao apontar uma diferença no valor de R$ 61.256,42 em relação ao valor de mercado, aferida por meio do sistema SGI da CGU;

v) os membros da Comissão de Licitação não têm relação com a execução dos processos licitatórios no tocante à aquisição dos bens e seus pagamentos;

x) quanto à utilização de saldos remanescentes, a Prefeitura Municipal pediu reformulações e obteve autorizações do Ministério da Saúde, na vigência do convênio, com prazo final até o dia 24 de junho de 2007, embora equivocadamente o relatório do órgão mencionasse a data de término em 22/02/2007;

y) em 16 de maio de 2007 mais uma vez houve pedido de prorrogação, porém o Ministério da Saúde quedou-se inerte;

z) os equívocos constantes do relatório do DENASUS, quanto ao termo final, revelam que se cuida de documento que não denota total confiança, mais um motivo plausível para a absolvição dos apelantes;

a.1) os apontamentos não levam a crer que houve fraude em processos licitatórios ou que os apelantes poderiam beneficiar alguém ou alguma empresa participante;

b.1) foram adquiridos o ônibus, bem como o veículo tipo van com capacidade para 16 passageiros, ou seja, houve Planos de Trabalho distintos;

c.1) quanto à realização de pesquisa prévia de mercado, realmente haveria a necessidade de seu encarte no processo. Ocorre que a pesquisa era feita de maneira informal, porém o fator mais importante é que o valor efetivamente pago condiz com o preço de mercado à época;

d.1) além de não ter havido pagamento para nenhum servidor de Apiaí, também não houve superfaturamento do bem licitado, nem houve prejuízo para o município, tampouco atitude dolosa de Maria Elisa Manca;

e.1) não houve dano ao erário, razão pela qual totalmente descabida a condenação a ressarcimento;

f.1) favoreceram-se o município e sua população, a qual se beneficia com a utilização do ônibus e da ambulância, situação distinta de outras cidades, nas quais verdadeiramente constatou-se ilicitude nas aquisições, inclusive em relação ao preço médio pago por cada unidade;

g.1) há possibilidade de empresas interessadas tomarem conhecimento antecipado acerca da abertura de possíveis processos licitatórios mediante o acesso à internet, motivo pelo qual não haveria como impedir a participação daquelas ligadas a Luiz Antonio Trevisan Vedoin, dado o atendimento aos requisitos e cláusulas de edital;

h.1) a operação "Máfia das Sanguessugas" foi deflagrada em 2006, depois das homologações dos certames em tela;

i.1) a ausência de documento de autorização para a abertura do processo licitatório configura um vício formal, sanável com a homologação do certame;

j.1) a pretensa inexistência de prova acerca da ampla divulgação do certame justifica-se, à vista da modalidade licitatória, a qual não a exige;

l.1) da mesma forma, a lei não obriga a identificação de quem retira o edital, nem tampouco obriga que se retire;

m.1) o ato de improbidade administrativa importa no dolo do agente, enriquecimento ilícito e aferição de vantagem patrimonial, o que não se verifica nos autos;

n.1) os apelantes, integrantes da Comissão Permanente de Licitação, são servidores públicos da Prefeitura Municipal de Apiaí e seguiram ordens emanadas de superiores imediatos, no tocante à formalização dos processos licitatórios;

o.1) cumpriram com suas obrigações na qualidade de integrantes da Comissão de Licitações do município e agiram em todas as licitações de maneira idônea;

p.1) se existiu algum ilícito atinente à operação intitulada como "Máfia das Sanguessugas", os apelantes não tiveram participação alguma, não obtiveram nenhum tipo de favorecimento e nem beneficiaram outrem;

q.1) Donizetti Borges Barbosa, apesar de Chefe do Executivo, não participava diretamente dos processos licitatórios, bem como não recebeu favorecimento algum com os três procedimentos em tela;

r.1) inexistente conduta dolosa do prefeito, pois não o era à época em que o recurso foi concedido;

s.1) relativamente a Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima, suas atuações consistiam em examinar a documentação apresentada pelos participantes do pleito e adjudicar a compra a quem oferecesse o "menor preço";

t.1) os licitantes trouxeram para o certame documentos merecedores de fé pública, os quais "efetivamente e aparentemente" provavam que as empresas estavam aptas a participar do certame. Portanto, quase impossível que simples servidores, sem técnica adequada, reconhecessem a existência de fraude ou outros ilícitos;

u.1) não cabia a Maria Elisa Manca, Rubens Barra Rodrigues de Lima, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima e até mesmo ao Prefeito Donizetti Borges Barbosa perquirirem quanto à veracidade dos papéis, aparentemente com chancela dos órgãos públicos fornecedores;

v.1) Maria Elisa Manca jamais realizou processo licitatório sem a prévia pesquisa detalhada de preços praticados no mercado. Em algumas oportunidades deixou de realizar alguns procedimentos formais como a juntada nos respectivos procedimentos ou a transcrição em um documento hábil, o que não pode ser interpretado como conduta dolosa;

x.1) os apelantes Vanderlei Borges de Lima, Adilson Rodrigues de Almeida, Luiz do Carmo Batista Rosa não tinham experiência e conhecimento técnico em licitações e não participaram anteriormente em certames dessa natureza;

y.1) os réus não recebiam remuneração extra pelo desempenho de suas funções na Comissão de Licitações, estavam subordinados ao prefeito e foram convocados em virtude de ser funcionários efetivos de carreira;

z.1) a própria decisão recorrida noticia que os apelantes Adilson, Vanderlei e Luiz Do Carmo tiveram condutas meramente formais e auxiliares no âmbito dos dois processos licitatório (aquisição do ônibus e sua transformação);

a.2) a condenação imposta a Adilson, Vanderlei e Luiz do Carmo é altamente excessiva, porquanto percebem remuneração suficiente apenas para a manutenção básica;

b.2) não se pode imputar aos membros da comissão licitante atos e fatos anteriores ao julgamento do certame, que desconheciam e não tinham meios de conhecer;

c.2) não se demonstraram o elemento subjetivo ou a má fé dos apelantes, nem o prejuízo causado ao erário, de modo que descaracterizada a tipicidade de conduta;

d2) pelas drásticas sanções previstas na Lei 8.429/92, deve-se atentar para os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade;

e2) indevida a postulação de ressarcimento de valores que efetivamente foram empregados pelo ente público por constituir-se verdadeiro enriquecimento ilícito;

f.2) a presunção de conluio com empresas participantes do certame impõe que elas e os respectivos sócios integrem a lide, o que não se verificou nos autos;

g.2) a pena de suspensão de direitos políticos, além de não estar fundamentada e, consequentemente, sem graduação, é desproporcional ao ato praticado;

h.2) exige-se que sejam conhecidos os motivos que determinaram ao julgador optar por punição tão grave;

i.2) a mera irregularidade de gestão, sem maiores prejuízos significativos para o erário, não caracteriza ato de improbidade, sob pena de se impossibilitar a gerência da coisa pública e violação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade;

j.2) todos os valores foram devidamente empregados para a finalidade para a qual se destinaram;

k.2) não há descrição de como teriam concorrido os apelantes para a prática do delito imputado e sequer indício de que tenham obtido qualquer vantagem pecuniária com a aquisição de ambulância;

l.2) o próprio Tribunal de Contas não identificou qualquer prejuízo ao erário em relação à aquisição da unidade móvel de saúde;

m.2) a prática do ato de improbidade não tem o condão de determinar a aplicação obrigatória de todas as sanções;

n.2) a pena de proibição de contratar com o poder público foi prevista, à toda evidência, para ser imposta ao terceiro que se beneficia do ato de improbidade;

o.2) a conclusão a que se chega é a de que deverão ser aplicadas as penas possíveis, à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, para fins de dosimetria, conforme o disposto no parágrafo único do artigo 12 da Lei nº 8.429/92;

p.2) não se observaram critérios tais como a lesividade e reprovabilidade das condutas e o respectivo interesse público para efetivar a dosimetria da sanção;

q.2) a conduta dos apelantes não se revestiu de maiores anormalidades, se comparada com casos análogos;

r.2) quanto ao ressarcimento integral do dano, realizada a prestação do serviço, ainda que decorrente de suposta contratação ilegal, a condenação na espécie é considerada indevida, sob pena de enriquecimento ilícito da administração pública;

s.2) por se tratar de ação fundada no artigo 10 (prejuízo ao erário), deve-se demonstrar a efetiva lesividade do ato, ou seja, o desfalque patrimonial sofrido;

t.2) o ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios seriam incompatíveis com o desvalor da conduta praticada pelos apelantes;

u.2) entre as infrações descritas nos incisos do artigo 10 da Lei nº 8429/92 existem notórias diferenças de gravidade;

v.2) algumas das sanções previstas no inciso II do artigo 12 admitem variações entre limites mais ou menos amplos;

x.2) a amplitude das infrações, as diferenças de gravidade entre elas e as infinitas variações possíveis nas condutas conduzem à conclusão de que é possível a aplicação a certos casos de apenas um ou algumas dentre as sanções previstas;

y.2) é indispensável a individuação da pena, com a indicação dos fundamentos e das razões para a aplicação de cada uma delas;

z.2) a pena aplicada deve guardar coerência com a prova dos autos e proporção com a natureza do ilícito praticado, bem como suas circunstâncias, além de se considerar a individualização da penalidade;

a.3) imprescindível seja informado e devidamente caracterizado o elemento volitivo do agente;

b.3) não há indícios de que a vontade dos apelantes não estivesse voltada à consecução do interesse público, bem como de conduta desidiosa dos requeridos, de modo a ensejar sua tipificação no artigo 10 da Lei 8.429/92;

c.3) o mencionado enquadramento, apesar de admitir conduta culposa, exige como elemento nuclear do tipo a lesão ao erário;

d.3) o simples desvio de finalidade, ainda que em proveito do agente, resulta no ato inválido e pode ensejar a imposição de sanções, mas não as graves consequências previstas para a conduta ímproba;

e.3) restou injustificada a decretação de indisponibilidade de bens e valores dos recorrentes ante a inexistência de elemento comprobatório de dilapidação ou acréscimo patrimoniais indevidos;

f.3) não se demonstrou que Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima tinham conhecimento do ocorrido;

g.3) a condenação ao ressarcimento no montante de R$ 83.923,58 e multa correspondente ao valor do dano implica os condenados desembolsarem quantia superior a todos seus bens e valores e em impedimento de eles praticarem atos da vida civil.

Pleitearam, por fim, a reforma do decisum e o provimento do recurso, para julgar improcedente a ação civil pública de improbidade administrativa.


Recebida a apelação nos efeitos suspensivo e devolutivo (fl. 1109), mantidos os da indisponibilidade, foram apresentadas contrarrazões pelo Ministério Público Federal (fls. 1112/1117 vº), nas quais se requereu seja negado provimento ao apelo. Destacam-se no contra-arrazoado:


a) a farta documentação que instrui os autos, objeto de extensa e detalhada análise por parte do Ministério Público Federal e da União, revelaram que os réus/apelantes praticaram atos fraudulentos em procedimentos licitatórios;

b) os certames em questão foram realizados em consonância com as regras desenvolvidas e os objetivos ilícitos almejados pela denominada "Máfia das Ambulâncias";

c) irrelevante que os convênios e os recursos tenham sido assinados e recebidos pela administração anterior e que os veículos adquiridos foram efetivamente utilizados na prestação de serviços à população de Apiaí, uma vez que o processamento dos certames fictícios ocorreu, na sua totalidade, por ação dos corréus e a causa de pedir da presente ação são as fraudes praticadas nos processos licitatórios;

d) as provas concretas existentes e apontadas nos autos demonstram a materialidade das práticas fraudulentas e sua simetria com a dinâmica do esquema criminoso;

e) também foi robustamente comprovada a participação direta e consciente dos corréus na perpetração das fraudes, os quais executaram os atos necessários e imprescindíveis para forjar as supostas licitações;

f) não há reparos a serem feitos na dosimetria das sanções aplicadas, assentada nitidamente nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, considerado o grau de participação e de responsabilidade individual dos réus na linha de desdobramento dos atos fraudulentos;

g) a condenação de natureza pecuniária impõe a decretação de indisponibilidade e/ou bloqueio de bens que se encontre em nome dos apelantes, medida cautelar respaldada em preceitos legais e constitucionais;

h) todos os aspectos fáticos e jurídicos relatados nos autos, seja em relação à materialidade, à autoria e aos prejuízos resultantes das fraudes nos processos licitatórios, restaram cabalmente confirmados ao final da instrução processual.


A União ratificou as contrarrazões apresentadas pelo Parquet. (fl. 1123)


Dada vista ao órgão ministerial, que opinou fosse desprovido o recurso (fls. 1136/1143).


É o relatório.


À revisão.



André Nabarrete
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): ANDRE NABARRETE NETO:10023
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Data e Hora: 23/06/2015 15:35:26



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013605-16.2008.4.03.6110/SP
2008.61.10.013605-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRE NABARRETE
APELANTE : DONIZETTI BORGES BARBOSA e outros
ADVOGADO : SP231319 MILENA GUEDES CORRÊA PRANDO DOS SANTOS e outro
: SP272877 FERNANDO JAMMAL MAKHOUL
APELANTE : MARIA ELISA MANCA
: RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA
: LUIZ DO CARMO BATISTA ROSA
: ADILSON RODRIGUES DE ALMEIDA
: VANDERLEI BORGES DE LIMA
ADVOGADO : SP231319 MILENA GUEDES CORRÊA PRANDO DOS SANTOS e outro
APELADO(A) : Ministerio Publico Federal
PROCURADOR : OSVALDO DOS SANTOS HEITOR JUNIOR e outro
APELADO(A) : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 TÉRCIO ISSAMI TOKANO
PARTE AUTORA : PREFEITURA MUNICIPAL DE APIAI SP
ADVOGADO : SP119454 FABIO JOSE DE OLIVEIRA e outro
No. ORIG. : 00136051620084036110 1 Vr SOROCABA/SP

VOTO

O Ministério Público Federal propôs ação de improbidade administrativa contra Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca, Rubens Barra Rodrigues de Lima, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima (fls. 02/29), com o objetivo de responsabilizá-los, nos termos da Lei nº 8.429/92, por prática de fraude no processo licitatório para aquisição de unidade móvel de saúde no âmbito do Município de Apiaí-SP, em relação aos convênios nº 1594/2003 e 1832/2003, firmados com o Ministério da Saúde.


Foi submetida ao crivo deste tribunal pela apelação interposta e pelo reexame necessário que se impõe quanto à parte em que o autor, Ministério Público Federal, e os litisconsortes ativos, União e Município de Apiaí/SP, tiveram a ação julgada parcialmente procedente.


DO REEXAME NECESSÁRIO


Inicialmente, ressalte-se que se trata de caso de remessa obrigatória, embora a Lei nº 7.347/85 silencie a respeito, porquanto, por interpretação sistemática das ações de defesa dos interesses difusos e coletivos, conclui-se aplicável analogicamente o artigo 19 da ação popular (Lei nº 4.717/65), verbis:


"Art. 19. A sentença que concluir pela carência ou improcedência da ação está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal; da que julgar a ação procedente, caberá apelação, com efeito suspensivo." (Redação dada pela Lei nº 6.014/73)

Nesse sentido, a jurisprudência do S.T.J.:


"PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. REEXAME NECESSÁRIO. CABIMENTO. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DO ART. 19 DA LEI 4.717/1965.
1. "Por aplicação analógica da primeira parte do art. 19 da Lei nº 4.717/65, as sentenças de improcedência de ação civil pública sujeitam-se indistintamente ao reexame necessário." REsp 1.108.542/SC, Rel. Ministro Castro Meira, j. 19.05.2009, DJe 29.05.2009).
2. Agravo regimental não provido."
(STJ - 2ª Turma - AgRg no REsp 1.219.033/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, v.u., DJe 25.04.2011)


DA PRELIMINAR


Do litisconsórcio passivo necessário


Sustentam os apelantes que o suposto conluio com empresas participantes do certame impõe sejam os respectivos sócios incluídos na lide. Sem razão sob esse aspecto. Estabelece o artigo 47 do CPC, verbis:


"Art. 47. Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo."

No caso dos autos, não existe lei que determine a obrigatoriedade e, à vista da natureza da relação jurídica (ação civil pública de improbidade administrativa), tem o apelado, na qualidade de demandante, a faculdade de definir o polo passivo da ação a partir dos elementos de convicção que tiver contra cada um dos acusados, agentes públicos ou não. Destarte, deve ser afastada a alegação de necessidade da inclusão dos terceiros nominados e beneficiários indiretos do suposto ato ímprobo no polo passivo (artigos 3º da Lei de Improbidade Administrativa, 2º, 3º, 128, 214, 267, inciso IV, 284, 285, 293 e 301, inciso III, do CPC e 5º, incisos LIV e LV, da CF/88).


Por outro lado, como asseverou o Parquet, parlamentares e respectivos assessores, membros de determinadas famílias e outros devem figurar como réus em ações específicas, propostas em outras varas, principalmente em Cuiabá/MT (fl. 06).


Rejeito a preliminar arguida.


DAS CONDUTAS IMPUTADAS AOS RÉUS


A imputação de improbidade administrativa decorre, em síntese, de supostas irregularidades perpetradas na formalização e condução de processos licitatórios com o intuito de burlar o caráter competitivo dos certames (Convites nºs 08/2005, 09/2005 e 10/2005, Convênios nºs 1594/2003 e 1832/2003) e favorecer empresas licitantes e pessoas atuantes na denominada "Máfia das Sanguessugas", em prejuízo do Município de Apiaí e da União, bem como da inobservância às normas e aos princípios que disciplinam e regem as licitações públicas. A inicial assinalou a incidência do artigo 10, caput e incisos VIII, IX, XI e XII, bem como do artigo 11, caput e inciso I, ambos da Lei nº 8.429/92.


Dispõem os mencionados dispositivos legais:


Lei nº 8.429/92:
Dos Atos de Improbidade Administrativa que Causam Prejuízo ao Erário
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
(...)
VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente; (Vide Lei nº 13.019, de 2014) (Vigência)
(...)
IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento;
(...)
XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular;
XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente;
Dos Atos de Improbidade Administrativa que Atentam Contra os Princípios da Administração Pública
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;

De acordo com autor, Donizetti Borges Barbosa ocupava, na data dos fatos, o cargo de Prefeito Municipal e nessa condição foi o responsável pela execução dos Convênios nº 1594/2003 (Convite no 09/05) e nº 1832/2003 (Convite n° 08/05 e Convite n° 10/05), de modo que teve participação direta, porquanto se constituía em conditio sine qua non para a concretização das fraudes relatadas.


Ainda segundo o MPF, Maria Elisa Manca, funcionária do Departamento de Compras, foi quem deu os primeiros passos para deflagrar a formalização das licitações fictícias, ao solicitar informações sobre dotações orçamentárias e assinar os convites supostamente enviados às empresas licitantes, o que demonstra pleno conhecimento dos fins fraudulentos daquele procedimento.


Quanto a Rubens Barra Rodrigues de Lima, sustenta o Parquet sua atuação como Presidente da Comissão de Licitação, responsável pela formalização e julgamento do Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, referente ao Convênio n° 1594/2003 - SIAF n° 496077, do Convite n° 08/2005 - Processo n° 09/2005 e do Convite n° 10 - Processo n° 11/2005, ambos referentes ao Convênio n° 1832/2003.


Relativamente a Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima, o órgão ministerial aponta-os como membros da Comissão de Licitação, responsáveis pela formalização e julgamento do Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, referente ao Convênio nº 1594/2003 - SIAF n° 496077, do Convite nº 08/2005 - Processo nº 09/2005 e do Convite nº 10 - Processo n° 11/2005, ambos referentes ao Convênio nº 1832/2003. Acrescenta que os integrantes da Comissão de Licitação, os quais descuraram das obrigações inerentes a essa função, respondem solidariamente por todos os atos irregulares e ilícitos praticados e descritos na presente ação, nos termos do artigo 51, § 3º, da Lei nº 8.666/93.


DA PROVA DOS FATOS


Não prospera a tese de inexistência de eventual fraude nos certames mencionados nos autos, à vista da aprovação pelos órgãos competentes (Controladoria da União e Tribunal de Contas do Estado de São Paulo) da prestação de contas do convênio federal e dos respectivos processos licitatórios. A teor do artigo 21, inciso II, da Lei nº 8.429/92, o exame jurisdicional do ato impugnado em sede de ação de improbidade administrativa não se vincula à aprovação ou rejeição levadas a efeito pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas. Nesse sentido iterativa jurisprudência do S.T.J.:


..EMEN: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE. RECEBIMENTO DA INICIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. APROVAÇÃO DAS CONTAS PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. ART. 21, INC. II, DA LEI Nº 8.429/92. NÃO VINCULAÇÃO FRENTE AO PODER JUDICIÁRIO. POSSIBILIDADE DE IMPUGNAÇÃO VIA AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO (ARTS. 267, INCS. I e VI e 295, INC. I E PAR. ÚNICO, INCS. I e III, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL). INOVAÇÃO EM SEDE DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. 1. O Controle exercido pelo Tribunal de Contas, não é jurisdicional, por isso que não há qualquer vinculação da decisão proferida pelo órgão de controle e a possibilidade de ser o ato impugnado em sede de ação de improbidade administrativa, sujeita ao controle do Poder Judiciário, consoante expressa previsão do art. 21, inc. II, da Lei nº 8.429/92. Precedentes: REsp 285305/DF, Primeira Turma, julgado em 20/11/2007, DJ 13/12/2007 p. 323; REsp 880662/MG, Segunda Turma, julgado em 15/02/2007, DJ 01/03/2007 p. 255; REsp 1038762/RJ, Segunda Turma, julgado em 18/08/2009, DJe 31/08/2009. 2. (...) 3. (...) 4. (...) 5. (...) 6. (...) 7. (...) 8. (...) 9.(...) 10. (...) 11. (...) 12. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido. ..EMEN:
(RESP 200800359416, LUIZ FUX, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:03/12/2009 ..DTPB:.-grifei)
..EMEN: ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DESPESAS DE VIAGEM. PRESTAÇÃO DE CONTAS. IRREGULARIDADE. LESÃO A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. ELEMENTO SUBJETIVO. DANO AO ERÁRIO. COMPROVAÇÃO. DESNECESSIDADE. SANÇÃO DE RESSARCIMENTO EXCLUÍDA. MULTA CIVIL REDUZIDA. 1. A lesão a princípios administrativos contida no art. 11 da Lei nº 8.429/92 não exige dolo ou culpa na conduta do agente nem prova da lesão ao erário público. Basta a simples ilicitude ou imoralidade administrativa para restar configurado o ato de improbidade. Precedente da Turma. 2. A aplicação das sanções previstas na Lei de Improbidade independe da aprovação ou rejeição das contas pelo órgão de controle interno ou pelo tribunal ou conselho de contas (art. 21, II, da Lei 8.429/92). 3. (...) 4. (...) 5. (...) 6. (...) 7. Sentença mantida, excluída apenas a sanção de ressarcimento ao erário e reduzida a multa civil para cinco vezes o valor da remuneração recebida no último ano de mandato. 8. Recurso especial provido. ..EMEN:
(RESP 200601704889, CASTRO MEIRA, STJ - SEGUNDA TURMA, DJ DATA:01/03/2007 PG:00255 ..DTPB:.-grifei)

Os elementos colhidos não deixam dúvidas quanto à materialidade do ato de improbidade descrito no artigo 10, caput e inciso VIII, da Lei nº 8.429/92.


Os autos estão instruídos com vasta documentação reunida no Procedimento Administrativo nº 1.34.016.000335/2006-19, iniciado pela Procuradoria da República no Município de Sorocaba/SP para apuração de eventual irregularidade no tocante à aquisição de equipamentos e unidades móveis de saúde com recursos liberados pelo Ministério da Saúde à Prefeitura de Apiaí e outros. O acervo contém excerto dos trabalhos da CPMI "das ambulâncias", bem como relatórios de fiscalizações e auditorias realizadas no âmbito da Controladoria-Geral da União e do Departamento Nacional de Auditoria do SUS-DENASUS. Também constam interrogatórios de Ronildo Pereira Medeiros e de Luiz Antônio Trevisan Vedoin, realizados no processo em trâmite na Segunda Vara Federal em Cuiabá/MT, Seção Judiciária do Estado de Mato Grosso, nos quais os depoentes, sobretudo Luiz Antônio, explicitam ações realizadas em vários Estados federativos com o intuito de direcionar o resultado de licitações para aquisições de unidades móveis de saúde, de modo a favorecer empresas ligadas ao grupo do qual participava o interrogado.


Do depoimento de mais de 150 páginas juntadas no anexo I, apenso II, destacam-se os seguintes pontos bem sintetizados pelo magistrado a quo, que ora transcrevo:


"Em seu depoimento, Luiz Antônio Trevisan Vedoin esclarece que o direcionamento das licitações era dividido basicamente em três fases (fls. 984/987 do apenso II, anexo I): a primeira que estava relacionada com a obtenção de emendas parlamentares destinas à aquisição de unidades móveis de saúde e de equipamentos médico-hospitalares; a segunda em que eram elaborados projetos junto ao Ministério da Saúde para a celebração de convênios; e a terceira fase que estava relacionada com o procedimento de fraude na licitação.
(...)
Referido deputado federal Bispo Wanderval Santos é citado por Luiz Antônio Trevisan Vedoin em seu depoimento de fls. 1.085/1.086 (apenso II, anexo I), sendo que Luiz aduz que realizou acordo com o deputado através do qual este receberia 10% sobre o valor das emendas destinadas para a área da saúde para aquisição de unidades móveis de saúde em diversos municípios, incluindo Apiaí.
No que se refere à segunda fase, Luiz Antônio Trevisan Vedoin (fls. 985 do apenso II, anexo I) esclarece que existia a necessidade de elaboração de projetos e pré-projetos, sendo que até o ano de 2004 o procedimento não estava informatizado, sendo que "o projeto era elaborado em meio físico, sendo que a assinatura dos prefeitos normalmente era colhida nos gabinetes dos parlamentares ou nos escritórios de parlamentares nos estados; que os projetos e os convênios eram assinados na presença dos parlamentares; que nessa oportunidade, o parlamentar e o prefeito aproveitavam para acertar os detalhes do processo de licitação".
Note-se que em fls. 985 Luiz Antônio Trevisan Vedoin afirma textualmente que "o objetivo na elaboração dos pré-projetos e projetos era trabalhar com os valores máximos do Ministério, para poder absorver todos os custos da operação".
Outrossim, em relação à terceira fase, que efetivamente é a fase objeto desta ação de improbidade administrativa, Luiz Antônio Trevisan Vedoin aduziu em fls. 986 do apenso II, anexo I "que a terceira fase do procedimento se referia propriamente ao processo de licitação; que nas hipóteses em que a licitação se dava na modalidade de carta convite, o grupo repassava às entidades beneficiadas, sejam elas municípios ou instituições não governamentais, o nome das empresas que deveriam receber as cartas convites".
Especificamente, em relação ao município de Apiai, Luiz Antônio Trevisan Vedoin aduziu em fls. 1.085 do apenso II, anexo I: "que para o exercício de 2003, o parlamentar apresentou emendas em favor dos municípios de Apiaí (...) que dessas entidades, o interrogando executou apenas em Vinhedo, no valor de R$ 395.000,00, em Apiaí no valor de R$ 120.000,00 (...) que em Apiaí e Vargem, bastou o parlamentar fazer o contato por telefone com os prefeitos, para acertar os detalhes do direcionamento das licitações".
(...)
Destarte, há que se destacar trechos de depoimento de Luiz Antônio Trevisan Vedoin prestado na 2ª Vara Federal da Seção Judiciária de Mato Grosso, quando peremptoriamente afirma "que pelo fato da homologação da licitação, empenho e pagamento estar a cargo dos prefeitos, sem exceção, os prefeitos sabiam das circunstâncias em que a licitação iria ocorrer" (fls. 987 do apenso II, anexo I). Na sequência, em fls. 987 afirmou peremptoriarnente "que as cartas convites sempre eram expedidas para as empresas ligadas ao grupo".
No mesmo depoimento, mais adiante, aduz "que se os municípios não aceitassem as condições impostas pelos parlamentares perderiam o dinheiro da emenda" (fls. 988 do apenso).
(...) Luiz Antônio Trevisan Vedoin informou em seu depoimento prestado na 2ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Cuiabá (apenso II, anexo I, fls. 974) que a empresa Delta pertence a Sinomar Martins Camargo, que atuava nos estados de São Paulo e Rio Grande do Sul, esclarecendo que Sinomar era anterior representante da Planam. Aduziu, inclusive, que a empresa Delta no ano de 2005 passou a dar cobertura às empresas do interrogando (...).
Note-se que Luiz Antônio Trevisan Vedoin afirmou em seu depoimento em fis. 971/972 do apenso II, anexo I, "que eram realizados dois processos de licitação, com o objetivo de adquirir-se uma unidade móvel de saúde; que para evitar a tomada de preço, havia o fracionamento do objeto licitatório, sendo uma licitação destinada exclusivamente à aquisição da unidade móvel de saúde preparada para a instalação dos equipamentos médico-hospitalares e uma outra licitação, exclusivamente
para a aquisição desses equipamentos; que com o fracionamento da licitação, garantia-se a modalidade de carta convite à licitação e, com isto, o controle de seu resultado". (fls. 939/944)

Conforme se delimitou na petição inicial, estes autos versam sobre os convênios nº 1594/2003 e 1832/2003, os quais resultaram em três licitações realizadas no Município de Apiaí/SP no ano de 2005, nos moldes narrados por Luiz Antônio Trevisan Vedoin.


Os apelantes Rubens Barra Rodrigues de Lima, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima foram nomeados membros da Comissão Permanente para o Julgamento de Licitações para o exercício de 2005 por meio da Portaria Municipal de Apiaí/SP nº 16, de 03/01/2005 (fl. 372 do apenso II, volume II).


Os instrumentos convocatórios sob análise tramitaram de modo concomitante. É possível observar que os pedidos de autorizações para início dos certames, assinaturas dos editais, consultas sobre eventuais existências de dotação orçamentária, manifestações do Secretário de Finanças, bem como os envios de solicitações de propostas às licitantes foram realizados conjuntamente em cada fase do andamento procedimental. Outrossim, os envelopes apresentados pelas empresas Delta Veículos Especiais Ltda, De Nigris Distribuidora de Veículos Ltda e Tapeçaria Jaedi de Medianeira Ltda (fl. 379, 400 e 577 vº do apenso II, volumes II e III) foram protocolizados na Prefeitura Municipal de Apiaí/SP, com singular simultaneidade, em 13/04/2005, às 10h28, o que constitui indício de procedimento planejado. Assinale-se que Luiz Antônio Vedoin esclareceu no interrogatório que, nos casos de licitação por convite, o grupo repassava aos municípios ou instituições não governamentais o nome das empresas que deveriam ser destinatárias. Também ficava à disposição para elaborar o edital ou fazê-lo conjuntamente (fl. 986 do apenso II, anexo I), o que demonstra que se conduzia uma ação orquestrada com os mencionados entes, com vista a assegurar o sucesso das concorrentes indicadas, situação semelhante à observada no Município de Apiaí/SP, mormente à vista do sincronismo verificado na marcha procedimental e o fato de a sociedade empresária constituída no âmbito da organização delatada por Luiz Antônio Vedoin ter participado das três licitações sob exame.


Relativamente ao certame nº 08/2005, verifica-se que, em 01/04/2005, o Secretário Municipal de Saúde, Carlos Alberto Bastos de Moraes, solicitou autorização para a abertura de licitação pelo Departamento de Compras, Material e Patrimônio, com vista à aquisição de um veículo ônibus ano/modelo não inferior a 1997 para uso do Setor de Saúde (fl. 363 do apenso II, volume II).


Assinado o edital de licitação na modalidade convite para a compra do mencionado ônibus, em 05/04/2005, pelo Prefeito Municipal de Apiaí/SP, Donizetti Borges Barbosa (fls. 364/368 do apenso II, volume II).


A corré Maria Elisa Manca figura como signatária do ofício encaminhado pelo Departamento de Compras, em 05/04/2005, ao Secretário Municipal de Finanças, Vanderlei Borges de Lima, a fim de obter informação sobre a eventual existência de dotação orçamentária para a compra, a qual teria o valor aproximado de R$ 80.000,00 (fl. 370 do apenso II, volume II), o qual respondeu positivamente à consulta na mesma data (fl. 371 do apenso II, volume II).


Foram enviadas, em 05/04/2005, solicitações de propostas às empresas Delta Veículos Especiais Ltda, De Nigris Distribuidora de Veículos Ltda, Manupa Com. de Veículos, A. Pap. Elet. e Rep. Ltda (fls. 373/375 do apenso II, volume II), cujos recibos de cópias do edital constam às fls. 376/378.


No tocante à carta-convite nº 09/05, consta que, em 01/04/2005, o Secretário Municipal de Saúde, Carlos Alberto Bastos de Moraes, solicitou autorização para a abertura de licitação pelo Departamento de Compras, Material e Patrimônio, com vista à aquisição de um veículo van 0 km (fls. 445 do apenso II, volume II).


Foi firmado o edital de licitação na modalidade convite para a compra do mencionado veículo, em 05/04/2005, pelo Prefeito Municipal de Apiaí/SP, Donizetti Borges Barbosa (fls. 446/451 do apenso II, volume II).


A corré Maria Elisa Manca figura como signatária do ofício encaminhado pelo Departamento de Compras, em 05/04/2005, ao Secretário Municipal de Finanças, Vanderlei Borges de Lima, a fim de obter informação sobre a eventual existência de dotação orçamentária para a compra, a qual teria o valor aproximado de R$ 70.000,00 (fl. 454 do apenso II, volume II), o qual respondeu positivamente à consulta na mesma data (fl. 455 do apenso II, volume II).


Foram enviadas, em 05/04/2005, solicitações de propostas às empresas Delta Veículos Especiais Ltda, Manupa, Comércio de Veículos, Alimentação, Papelaria, Eletroeletrônico e Representações Ltda e Transform Ind. e Com. de Veic. Especiais Ltda (fls. 457/459 do apenso II, volume II), cujos recibos de cópias do edital constam às fls. 460/462.


No que concerne ao convite nº 10/05, observa-se que, em 01/04/2005, o Secretário Municipal de Saúde, Carlos Alberto Bastos de Moraes, solicitou abertura de licitação pelo Departamento de Compras, Material e Patrimônio para transformação de um ônibus em unidade médico odontológica (fls. 540 do apenso II, volume III).


Foi firmado o edital de licitação na modalidade convite para a transformação, em 05/04/2005, pelo Prefeito Municipal de Apiaí/SP, Donizetti Borges Barbosa (fls. 541/546 do apenso II, volume III).


A corré Maria Elisa Manca figura como signatária do ofício encaminhado pelo Departamento de Compras, em 05/04/2005, ao Secretário Municipal de Finanças, Vanderlei Borges de Lima, a fim de obter informação sobre a eventual existência de dotação orçamentária para a realização do serviço, a qual teria o valor aproximado de R$ 58.000,00 (fl. 548 do apenso II, volume III), o qual respondeu positivamente à consulta na mesma data (fl. 549 do apenso II, volume III).


Foram enviadas, em 05/04/2005, solicitações de propostas às empresas Transform Ind. e Com. de Veic. Especiais Ltda, Delta Veículos Especiais Ltda e Tapeçaria Jaedi de Medianeira Ltda (fls. 551/553 do apenso II, volume III), cujos recibos de cópias do edital constam às fls. 554/556.


A empresa Delta Veículos Especiais Ltda venceu o certame relativo à carta convite nº 08/2005, convênio nº 1832/2003 (fl. 125 do apenso II, volume I), para fornecimento do ônibus, ofertado por R$ 78.000,00. Participaram também as empresas De Nigris Distribuidora de Veículos Ltda e Manupa, Comércio de Veículos, Alimentação, Papelaria, Eletroeletrônico e Representações Ltda (fls. 435/443 do apenso II, volume III).


Outrossim, Delta Veículos Especiais Ltda obteve vitória na licitação por convite nº 09/2005 para a compra de um veículo tipo van, na qual concorreram Manupa, Comércio de Veículos, Alimentação, Papelaria, Eletroeletrônico e Representações Ltda e Transform Ind. e Com. de Veic. Especiais Ltda (fls. 444/536 do apenso II, volume III).


Quanto à transformação do ônibus, objeto da carta-convite nº 10/2005, convênio nº 1832/2003 (fl. 125 do apenso II, volume I), a empresa Transform Ind. e Com. de Veic. Especiais Ltda obteve resultado favorável em detrimento das concorrentes Delta Veículos Especiais Ltda e Tapeçaria Jaedi de Medianeira Ltda (fls. 540/642 do apenso II, volume III).


Consta dos elementos coligidos a auditoria realizada, no período de 21 a 22 de setembro de 2006, na Prefeitura Municipal de Apiaí/SP por determinação do Ministro de Estado e Saúde, com a finalidade de verificar a execução do convênio nº 1832/2003. O crédito orçamentário decorreu da emenda parlamentar nº 36000001 de autoria do Deputado Federal Bispo Wanderval (fl. 119 do apenso II, volume I). O respectivo relatório, elaborado pelo DENASUS/COSIN/Controladoria Geral da União, descreve detalhadamente o objeto do plano de trabalho. Confira-se:


"1. VEÍCULO
Ônibus ano/modelo não inferior a 1997, revisado motor, caixa e diferencial com as seguintes características: Combustível a diesel, direção hidráulica, motor dianteiro, potência mínima 170 CV; Distância entre os eixos mínimo de 4800 mm; Comprimento mínimo de 10000 mm; Largura mínima de 2400 mm; carroceria na cor branca e interior pintado na cor branca; com janelas laterais e duas portas de acesso, versão vazio para adaptação de equipamentos médicos e odontológicos no seu interior.
2. EQUIPAMENT0S PARA UNIDADE MÓVEL DE SAÚDE
2.1 Consultório Odontológico:
Cadeira odontológica semi-automática; equipamento com seringa tríplice, com saída para micro motor baixa rotação e contra ângulo; Unidade auxiliar com sugador; Refletor odontológico; Compressor de ar odontológico; Estufa para esterilização; Mocho mecânico; Armário para guarda de materiais; Lavatório com cuba inox; Ar condicionado.
2.2 Consultório Pediátrico/Médico e Ginecológico com:
Mesa para exame clínico estofada; escada de dois degraus com piso antiderrapante; mocho mecânico; Armário para guarda de materiais; Lavatório com cuba inox; Estufa para esterilização; Aparelho de pressão; Estetoscópio; Termômetro; ar condicionado.
2.3 Sala de Enfermaria:
Banco estofado; Mesa em MDF; Mocho; Cama clínica estofada; frigobar.
2.4 Sala de Espera:
Banco estofado
2.5 Faz parte da Unidade:
Cabo de extensão de 25 metros, Piso anti-derrapante; paredes em MDF (material lavável); cortinas nas janelas; caixa d'água para 150 litros; portas sanfonadas; caixas em fibra; compartimento para o compressor
Valor Total 144.000,00
Deverão ser seguidas as recomendações do fabricante, quanto a utilização, manutenção preventiva e manutenção corretiva do equipamento e acessórios, tendo em vista a validade da garantia e vida útil dos mesmos." (fls. 120/121 do apenso II, volume I)

O convênio nº 1832/2003 foi executado mediante as cartas-convites nº 08/2005, processo 09/2005 (aquisição do ônibus), e nº 10/2005, processo nº 11/2005 (transformação de um ônibus em unidade móvel de saúde).


Conforme ressaltado no mencionado relatório, houve fracionamento do objeto da licitação para evitar a tomada de preços, modalidade correta para a espécie.


Também se destacam apontamentos dos auditores, no sentido de que os respectivos procedimentos administrativos não estão devidamente numerados; não consta a realização de pesquisa de preço de mercado; há divergência entre as descrições do Plano de Trabalho e as do edital; falta identificação dos signatários das retiradas dos editais, além de as assinaturas de Antônio da Silva Filho, apostas no comprovante de entrega de edital e no contrato social da Empresa Transform-Ind. e Com. De Veíc. Especiais Ltda serem diferentes.


Quanto aos valores utilizados, foi apontado prejuízo estimado de R$ 72.743,58, in verbis:


"PREJUÍZO ESTIMADO NA AQUISIÇÃO DA UMS.
De acordo com o RELATÓRIO DE CÁLCULO DE PREJUÍZO ESTIMADO DE U.M.S./Ordem de Serviço/CGU nº 185727, elaborado em 12/06/2007, verificou-se que ocorreu um prejuízo estimado de R$ 72.743,58 (setenta e dois mil, setecentos e quarenta e três reais e cinquenta e oito centavos).
Utilizou-se para a realização do cálculo do prejuízo estimado para a U.M.S. a seguinte metodologia:
- Apuração do valor estimado de mercado do veículo (R$) - 36.332,00
- Apuração do valor estimado da transformação (R$) - 24.924,42
- Apuração do valor estimado dos equipamentos (R$) - 0,00
- Valor total estimado (R$) - 61.256,42
- Valor pago pela UMS (R$) - 134.000,00
- Apuração do prejuízo estimado para a UMS (R$) - 72.743,58" (fls. 138/139 do apenso II, volume I)

Acerca da verificação física assentou-se:


"DISPARIDADES ENCONTRADAS NA VERIFICAÇÃO FÍSICA
- Não existe o Consultório Pediátrico/Médico e Ginecológico conforme aprovado no Plano de Trabalho, em desacordo com Edital de licitação e Nota Fiscal.
- Além do consultório odontológico equipado e em funcionamento, encontramos no local reservado ao "Consultório Pediátrico/Médico e Ginecológico" outro consultório odontológico montado, não adequado para utilização: com cadeira odontológica semi-automática em um espaço insuficiente para a inclinação da cadeira; equipamento com seringa tríplice incompleto; unidade auxiliar com sugador; refletor; uma autoclave não afixada na bancada (o que ocasionaria uma queda com ônibus em movimento); armário; lavatório com cuba de inox que provavelmente não é utilizada, uma vez que a torneira foi testada e deu-se a saída de água "cor de ferrugem".
- Não havia portas sanfonadas e cortinas nas janelas, conforme descrito nas propostas.
- Não havia torneira elétrica, conforme nota fiscal n° 000448 da empresa Transform Ind. Com. Veículos Especiais Ltda." (fls. 140/141 do apenso II, volume I)

Por fim, conclui o relato:


"Desta forma, com base nas evidências levantadas constante no presente relatório de auditoria, concluímos que:
- Houve aquisição da Unidade Móvel e equipamentos com recursos específicos do Convênio 1832/2003, mas em desacordo com o Plano de Trabalho aprovado, conforme citado no item 3.7.2. e da licitação.
- A unidade móvel está atendendo parte dos objetivos do convênio, uma vez que está em desacordo com o Plano de Trabalho.
- Existe um saldo de contrapartida, o qual a Prefeitura Municipal necessita apresentar uma Reformulação do Plano de Trabalho com os devidos itens, conforme citado no parecer de agosto/2006. (PRAZO DE VIGÊNCIA EXPIRADO EM 22/2/2007, PORTANTO NÃO CABE MAIS REFORMULAÇÃO DO PLANO DE TRABALHO).
- De acordo com o RELATÓRIO DE CÁLCULO DE PREJUÍZO ESTIMADO DE U.M.S./Ordem de Serviço/CGU no. 185727, elaborado em 12/06/2007, verificou-se que ocorreu um prejuízo estimado de R$ 72.743,58 (setenta e dois mil, setecentos e quarenta e três reais e cinqüenta e oito centavos).
- Assim sendo, conforme consta no Demonstrativo de Cálculo de Proporcionalidade - Quadro XIV-B o valor de R$ 61.725,86 (sessenta e um mil, setecentos e vinte e cinco reais e oitenta e seis centavos) deverá ser restituído ao Fundo Nacional de Saúde, com os devidos acréscimos legais, nos termos da lN/STN 01/97, artigo 116 da Lei 8.666/93 e Incisos II, III e V do artigo 1° c/c artigo 3° do Decreto 201/67, cabendo, portanto, a emissão das respectivas Planilhas de Glosa e de Responsáveis. Quanto ao valor de R$ 22.197,72, deverá ser ressarcido aos cofres do município por se tratar de recursos de fonte própria.
- Ocorreram falhas administrativas durante a execução do convênio, tais como o prazo de vigência não considerado para prorrogação, como citado no item 3.1.
- Ocorreram atos impróprios no processo de licitação que estão em desacordo com a Lei 8666/93
- Acusamos o licenciamento do veículo datado em 2005." (fls 142/143 do apenso II, volume I)

Como visto, os auditores constataram a inexistência de consultório pediátrico/médico e ginecológico, em desacordo com o Plano de Trabalho. Também verificaram que, no respectivo local reservado, havia outro consultório odontológico montado, porém não adequado para utilização.


Relativamente ao convite nº 08/2005, aduziu-se que o representante da empresa Manupa não apresentou a procuração; a empresa De Nigris não teve nenhum representante, todavia os envelopes foram protocolados no dia 13/04/2005, às 10h28.


Quanto ao convite nº 10/2005, aludiu-se à não representação da empresa Tapeçaria Jaedi de Medianeira Ltda e falta de instrumento de mandato de Jordan Azevedo, representante da empresa Transform Ind. e Com. De Veic. Especiais Ltda, embora os envelopes tenham sido protocolados no dia 13/04/2005, às 10h28.


O relatório também consignou que a homologação e adjudicação das empresas vencedoras para aquisição do ônibus (Delta Veículos Especiais Ltda) e para transformação em unidade móvel de saúde (Transform Ind. e Com. de Veic. Especiais Ltda) ocorreram no mesmo dia, 02/05/2005, bem como foram assinadas pelo prefeito municipal (fls. 130/144 do apenso II, volume I).


O relato da auditoria em relação ao convênio nº 1594/2003, convite 09/2005 (fl. 101 do apenso II, volume I), descreve o objeto como um veículo van 0 Km, capacidade 16 pessoas. A respeito das impropriedades constatadas no certame, apontam-se: ausência de autorização para a abertura do procedimento licitatório; existência de folhas não numeradas; falta de pesquisa prévia de preço de mercado; incompatibilidade do bem licitado com o Plano de Trabalho; não demonstração da ampla divulgação; inexistência de identificação de quem retirou o edital e do agente recebedor do bem; deixou de constar no feito indicação da disponibilidade dos recursos e minuta do edital com aprovação da assessoria jurídica da entidade.


As considerações dos auditores atestam o não atendimento ao que restou proposto no Plano de Trabalho, porquanto diversamente do objeto avençado, foi adquirido um veículo com menor capacidade de transportar os pacientes, usuários SUS, do que o previsto, in verbis:


Diante do exposto concluímos que, embora o objetivo geral do convênio, ou seja, "melhorar a qualidade da assistência ao usurário SUS", tenha sido alcançado, o objeto do convênio, proposto no Plano de Trabalho, não foi atendido uma vez que, o veículo descrito inicialmente (Van com 16 lugares), a ser utilizado para transporte de pacientes que necessitam realizar procedimentos em outros municípios, não foi adquirido.
A aquisição feita pelo município, através do presente convênio, caracteriza-se como UMS Tipo 2, com configuração da cabine para o paciente com apenas três assentos, e mais um na cabeceira da maca, além do compartimento do motorista, onde podem ser acomodados mais dois passageiros. Conforme pudemos verificar, este veículo, na maioria das vezes, é efetivamente utilizado para transportar pacientes que necessitam realizar exames/tratamentos em outros municípios (transporte agendado), o que certamente seria mais confortável, se feito através de uma Van de 16 lugares, conforme Plano de Trabalho aprovado.
As despesas relacionadas aos recursos envolvidos no Convênio, tanto aqueles repassados pelo FNS, como os resultantes da contrapartida municipal, foram devidamente demonstradas. A aquisição da Unidade Móvel de Saúde ocorreu com recursos específicos do convênio, acrescido de uma contrapartida extra de R$ 16.303,27." (fl. 114 do apenso II, volume I)

As diversas irregularidades formais apontadas pelos auditores, tanto na fase inicial quanto nas demais etapas do feito licitatório, no tocante à ausência da autorização para a abertura do certame, da identificação de quem retirou o edital e do agente recebedor do bem, inexistência de comprovação de ampla divulgação da licitação, existência de folhas não numeradas, falta de pesquisa prévia de preço de mercado, de indicação da disponibilidade dos recursos e da minuta do edital com aprovação da assessoria jurídica da entidade, mais do que representarem em meras irregularidades administrativas, têm por consequência imediata maior dificuldade para o exercício dos controles interno ou externo por órgãos competentes, já que ausentes elementos relevantes nos três feitos administrativos.


Note-se que a Delta Veículos Especiais Ltda foi destinatária das três cartas-convites (08/2005, 09/2005 e 10/2005) e venceu os dois certames relativos às aquisições do veículo van e do ônibus (cartas-convites nº 08/2005 e 09/2005). Conforme declarou Luiz Antônio Trevisan Vedoin, no interrogatório colhido na Segunda Vara da Seção Judiciária do Estado de Mato Grosso, trata-se de empresa pertencente a Sinomar Martins Camargo, a qual foi constituída, em razão da necessidade de uma empresa do Estado do Paraná participar de licitações naquela unidade federativa, além de esclarecer que a Delta passou a dar cobertura às suas empresas no ano de 2005 (fl. 974 do apenso II, anexo I).


Por outro lado, conforme ressaltado no relatório de auditoria (convênio nº 1832/2003), houve fracionamento do objeto da licitação para evitar a tomada de preços, modalidade correta para a espécie. Como descrito pelo interrogado Luiz Antônio, eram realizados dois procedimentos licitatórios, de modo que ocorria um certame destinado à aquisição da unidade móvel de saúde e outro, exclusivamente, para a aquisição dos equipamentos médico-hospitalares. A providência garantia a utilização da carta-convite, o que propiciava o controle do resultado.


A circunstância de a empresa Transform Ind. e Com. de Veic. Especiais Ltda ter obtido resultado favorável em detrimento das concorrentes Delta Veículos Especiais Ltda e Tapeçaria Jaedi de Medianeira Ltda para transformação do ônibus em unidade médico odontológica não afasta o imputado certame dirigido que ora se examina, considerado que tal prática também integrava o modus operandi do grupo, no qual uns se dedicavam à venda de unidades móveis, ao passo que outros à comercialização de equipamentos médico-hospitalares (fl. 971 do apenso II, anexo I).


Outrossim, quanto ao convênio nº 1593/2003, constata-se que foi adquirido um veículo diverso do que o previsto no Plano de Trabalho. Consoante o objeto avençado, cuida-se de um veículo van com capacidade para 16 pessoas, entretanto licitou-se uma ambulância (fl. 105 do apenso II, volume I), justamente o que a Delta Veículos Especiais Ltda comercializava, conforme se denota dos documentos de fls. 463/464 do apenso II, volume III.


Consoante se observa, o direcionamento de licitações para favorecer específica fornecedora está manifestamente delineado nos autos.


Os depoimentos dos réus e das testemunhas de defesa, colhidos em juízo, não são aptos a refutar a conclusão anterior.


O réu Donizetti Borges Barbosa negou os fatos imputados, às fls. 623/624. Esclareceu que quem cuidava das licitações era a comissão e que a parte formal dos procedimentos ficava a cargo da corré Maria Elisa. Asseverou que pediu prorrogação de prazo em relação a dois convênios e modificação de objeto. Reconheceu que Sinomar Martins Camargo foi uma vez à prefeitura para indagar ao depoente acerca de licitação que teria interesse em participar, mas o depoente orientou-o a procurar a comissão. Que Sinomar ligou algumas vezes para o declarante, a fim de procurar saber se já havia sido autorizada a abertura da licitação, in verbis:


"Que foi Prefeito de Apiaí de 01/01/2005 até 31/12/2008. Que o Prefeito anterior era Emílson Couras da Silva. Que não conhece e não teve contato com Darci José Verdoin e Luis Antônio Trevisan Vedoin. Que não teve contato com a empresa Planan Comércio e Representações. Que quando assumiu a Prefeitura de Apiaí, existiam três recursos aprovados para realização de convênios, que um dos convênios já teria sido executado. Que não sabe porque o Sr. Luiz Antônio Trevisan fez as declarações constantes nos autos; esclarece que em relação aos dois convênios teve que pedir prorrogação porque o prazo já estava expirando. Esclarece que requereu ao Ministério da Saúde modificação do objeto de um ou dos dois convênios, não se recordando, que não foi autorizado e houve a execução posterior dos convênios. Que não teve nenhum contato telefônico com ninguém com relação aos convênios. Que quem cuidava da licitação era a comissão. Que não acompanhou a expedição de cartas convite. Que Sinomar Martins Camargo apareceu uma vez na Prefeitura, indagando o depoente sobre licitação que teria interesse em participar e o depoente disse para ele procurar a comissão. Que Sinomar ligou algumas vezes para o depoente, para saber se já havia sido autorizada a abertura da licitação. Que tem contato com o ex prefeito, apesar de serem de partidos diversos. Que nunca indagou o ex prefeito sobre os convênios. Que Maria Elisa era quem cuidava da parte formal dos processos, mas não se lembra de nada de especial com relação à atuação de Maria Elisa."
Às reperguntas do representante do Ministério Público Federal, respondeu: "Que não conhece o Deputado Wanderval Santos. Que não tem conhecimento de como as empresas foram selecionadas, acreditando que as empresas procuraram o Município para participar da licitação. Que não tem conhecimento de quem entregou as propostas das empresas na Prefeitura. Que, não sabe detalhar o tempo que demora uma licitação, acreditando que segue as normas do edital. Que não se lembra da Comissão de Licitação ter se reportado ao réu para dirimir alguma dúvida. Que não sabe quem fez as pesquisas de mercado em relação os bens objetos dos convênios. Que só conhece a empresa Denigris, já que o depoente sabe dizer que está situada na Marginal Tietê, em São Paulo; que não conhece as demais empresas relacionadas nesta ação. Que a Denigris não participou de outras licitações, já que a Prefeitura não mais adquiriu os bens objeto da fabricação da referida empresa. Que a Controladoria não entrou em contato com o depoente; que houve a presença de uma comissão do Ministério da Saúde, que fez uma espécie de auditoria e que emitiu parecer favorável ao cumprimento do convênio. Que está comissão veio após a execução dos convênios. Que não se lembra se a Prefeitura foi intimada para devolver algum valor. Que os veículos foram entregues de acordo com os editais dos dois convênios; que do outro convênio não tem conhecimento, esclarecendo que houve a entrega de um veículo e posterior substituição." (grifei)

Maria Elisa Manca declarou, às fls. 625/625 vº, que trabalhava no setor de compras e licitações e sua função era formalizar os processos juntamente com o setor jurídico, bem como entregar ou enviar os convites às empresas. Que preparou os convites mencionados na inicial. Esclareceu que realizou as pesquisas de mercado, mas não as juntou ao processo, in verbis:


"Que trabalhou em uma função comissionada que dizia respeito ao setor de compras e licitações. Que entrou nesta função em Janeiro de 2005 e ficou até Outubro de 2006. Que trabalha na Prefeitura sempre em cargo em comissão desde 1983. Que não trabalhou na gestão do anterior prefeito Emílson. Que em outubro de 2006 foi para a área social, ou seja, trabalhar com capacitação de pessoas para costura industrial. Que trabalhou em outro município, por quatro anos, em setor igual, ou seja, de compras e licitações. O município é Barra do Chapéu. Que a função da depoente era formalizar os processos junto com o setor jurídico, sendo que o edital era elaborado pelo setor jurídico. Que a depoente pediu para o setor de finanças a verificação da existência de dotação, sendo que foi respondido de forma positiva. Que entregava os convites para as empresas, alguns em mãos outros através dos correios. Que as empresas ligavam a Prefeitura para saber a data da abertura da licitação. Que todos os convites constantes na petição inicial foram montados pela depoente. Esclarece que um dos convênios veio da administração anterior. Que os convênios já existiam e houve uma prorrogação, até porque a população já sabia da existência dos convênios. Esclarece que após a assinatura das cartas convite, chegou a acompanhar a abertura dos envelopes, mas já não tinha mais atribuições funcionais. Que a abertura dos envelopes das propostas do três convênios ocorreu no mesmo dia. Que se lembra que havia representantes das empresas, mas não sabe precisar quais representantes estavam ligados a determinada empresa. Que recebia o pedido de abertura de licitação vinha do Secretário de Saúde, despachado pelo Prefeito. Que o Prefeito nada disse sobre os convênios. Que chegou a fazer pesquisa de mercado. Que se lembra de ter feito uma pesquisa em uma empresa de Bauru, cujo nome não se recorda. Que também fez pesquisa de mercado com as próprias empresas citadas na petição inicial. Esclarece que tinha as pesquisas enviadas por fax, mas não juntou ao processo. Que os fax se perderam. Que além das empresas que contam no processo, não enviou convites para outras empresas, esclarecendo que a proposta da empresa de Bauru estava mais cara."
Às reperguntas da advogada dos réus, respondeu: "Que somente a depoente era responsável pela formalização dos processos. Que tinha dificuldade em encontrar fornecedores para os procedimentos licitatórios, em razão da localização geográfica do município. Que quem assinou os termos de convênios foi o prefeito anterior. Que os bens adquiridos são utilizados atualmente no município de Apiaí. Que o procedimento adotado pela depoente era o adotado nos anteriores procedimentos licitatórios."
Às reperguntas do representante do Ministério Público Federal, respondeu: "Que não conhece Deputado Wanderval Santos. Que antes da abertura das licitações nenhum representante da empresas constantes na petição inicial procurou a depoente. Que esclarecia dúvidas com o departamento jurídico. Que o Prefeito não tinha conhecimento das empresa que participavam das licitações. Que era comum que empresas de localidades distantes participavam das licitações, quando se tratava de licitações de convênios federais de maior porte. Que o Paraná fica mais próximo de Apiaí que São Paulo. Que não se recorda se todas as propostas foram entregues pessoalmente. Que não sabe dizer se houve ou não fracionamento, uma vez que os pedidos chegaram para a depoente na forma de três cartas convite.
Que neste momento a advogada dos réus interrompeu o Juízo, após responder a pergunta antes da testemunha, fazendo objeção à pergunta formulada pelo Ministério Público Federal, nos seguintes termos: "Que na verdade não se tratou de fracionamento de licitação, mais sim de três objetos distintos, vez que não havia empresa que executasse os três objetos."
Que não chegou a questionar o Jurídico sobre a modalidade de licitação que havia sido delimitada (convite). Que não se recorda sobre o fracionamento, até porque não havia convênios de grande porte na Prefeitura. Que o procedimento de retirada dos editais era o seguinte: levavam um documento da empresa e assinavam o comprovante de entrega edital. Que não atendeu Antônio da Silva Filho. Que os bens foram entregues de acordo com a licitação, pois houve uma vistoria da Prefeitura e também da comissão do Ministério da Saúde, que aprovaram a entrega dos bens. Que não foi intimada e não prestou esclarecimentos à Controladoria Geral da União. Que o veículo que foi entregue e posteriormente foi substituído e houve uma comoção da população se referiu à administração anterior. Que em relação aos convênios que a depoente participou, não houve qualquer substituição de bens.
Às reperguntas do Procurador da União, respondeu: "que não tem conhecimento sobre o relatório do Departamento Nacional de Auditoria do SUS, reprovando a execução do convenio." (grifei)

Rubens Barra Rodrigues de Lima respondeu, às fls. 627/627 vº, que foi presidente nas três licitações. Asseverou que deu pareceres jurídicos relacionados a licitações em outras prefeituras em que trabalhou. Esclareceu que a adjudicação era "montada" pelo setor de compras e, após a assinatura do prefeito, o feito seguia para a homologação do certame pela comissão. Disse que os envelopes eram entregues fechados no setor de protocolo e recebiam um número, in verbis:


"Que foi Presidente das três licitações. Que antes destes fatos, o depoente não trabalhava na Prefeitura. Que entrou em janeiro de 2005 em cargo de comissão (Procurador Jurídico). Que nunca atuou em outras comissões de licitação relacionadas a outros municípios. Que já deu pareceres jurídicos em outras prefeituras que trabalhou, relacionados à licitações. Esclarece que o Edital de Licitação era feito pela comissão de assuntos jurídicos que passava para o setor de compras e depois era repassado para a comissão de licitação. Que não tem nenhum conhecimento sobre o fracionamento das licitações. Que as propostas foram abertas na mesma data, em seqüência de horários diversos. Que se lembra de Sinomar que estava no dia, representando alguma das empresas, cujo nome não se recorda. Que havia outro representante de outra empresa presente na abertura das propostas, entretanto, não tinha nenhum documento que era representante da empresa, sendo que, salvo engano, seu nome constou da ata. Que antes da abertura dos envelopes não teve contato com nenhum representante de nenhuma empresa. Que o trabalho da licitação é basicamente o seguinte: verificação da parte dos documentos das empresas e, posteriormente, abertura dos envelopes. Que depois da assinatura da ata, o depoente não teve mais atuação no procedimento licitatório. Esclarece que a adjudicação era montada pelo setor de compras, sendo que após a assinatura do Prefeito, o processo vinha para comissão homologar o certame. Que antes de chegar ao depoente as cartas convites, o depoente não manteve nenhum contato com o Prefeito. Que a entrega de edital de licitação não era atribuição da Comissão de Licitação."
Às reperguntas da advogada dos réus, respondeu: "Que não vê nenhum óbice que exista alguém representando determinada empresa quando da abertura dos envelopes, sem portar procuração ou documentos, sendo que tal pessoa somente não poderia impugnar os atos da comissão. Que presidiu outros atos em que o licitante não estava presente, somente os documentos, esclarecendo que participou de licitações de obras e de serviços; que não se lembra de alguma obra específica, esclarecendo, em relação aos serviços, eram serviços corriqueiros de valor baixo. Que os envelopes eram entregues no setor de protocolo de forma fechada e recebiam um número de protocolo. Que não sabe dizer se o edital era encaminhado junto com o convite, já que era atribuição do setor de compras. Que, pelo que sabe, os integrantes da comissão de licitação não tiveram contato prévio com os representantes das empresas. Que jamais recebeu qualquer tipo de comissão em processos licitatórios."
Às reperguntas do representante do Ministério Público Federal, respondeu: "Que os membros da comissão de licitação eram quem resolviam todos os problemas relacionados à licitação. Que a modalidade de licitação era decidida pelo Departamento Jurídico, antes de chegar na comissão. Que o responsável pelo departamento jurídico na época era o Sr. Luiz Antônio Beluzzi. Que como o processo já veio formalizado do departamento jurídico, nã elaborou qualquer questão relacionada a fracionamento. Que não estranhou a existência de fracionamento. Que, pelo que sabe, o Prefeito não teve nenhum contato com os representantes da empresas."

Em seu depoimento, às fls. 628/628 vº, Luiz do Carmo Batista Rosa afirmou que nunca exerceu cargo em comissão de licitação antes da gestão do Prefeito Donizetti. Explicou que fazia parte da comissão descrita na inicial e que todos os integrantes se reuniam e analisavam a documentação e a proposta, in verbis:


"Que é funcionário concursado da Prefeitura de Apiaí desde 15 de agosto de 1989. Que nunca exerceu cargo em comissão de licitação antes da gestão do Prefeito Donizetti. Que nunca trabalhou em outros setores de licitação antes dos fatos. Que fazia parte da comissão descrita na inicial. Que o depoente não tinha uma função específica na Comissão de licitação, sendo que todos os integrantes se reuniam e analisavam a documentação e a proposta. Que na gestão do anterior prefeito o depoente era almoxarife. Que não se recorda se as aberturas dos envelopes foram no mesmo dia. Que não se recorda se no dia da abertura das cartas estavam presentes um ou dois representantes de empresas. Que o depoente não participava de entrega de editas, pois não era sua função. Que não sabe o nome da pessoa ou a área que nomeou o depoente para a comissão de licitação. Que participou de comissões de licitação durante toda a gestão do Prefeito Donizete, sendo que, com a nomeação do novo prefeito, foram nomeadas outras pessoas."
Às reperguntas da advogada dos réus, respondeu: "Que a entrega dos envelopes de habilitação de propostas é feita no setor de protocolo. Que ocorreram outras seções de licitações que não estavam presentes os representantes das empresas ou não possuíam procuração. Que não sabe precisar alguma licitação específica que isso tenha ocorrido. Esclarece que como os envelopes são protocolados no setor de protocolo, o depoente não sabe quais as firmas que irão participar das licitações, ou seja, se são firmas de fora ou da região. Que em relação aos processos descritos na petição inicial, o depoente não teve contato com representantes das empresas. Que o depoente ainda trabalha na Prefeitura e sabe dizer que as unidades de ambulância ainda são utilizadas até hoje. Que não conhece empresa que ao mesmo tempo venda e transforme veiculo em unidade de saúde."
Às reperguntas do representante do Ministério Público Federal, respondeu: "Que é técnico em administração e possui o segundo grau completo. Que quando saiu do setor de almoxarifado, fez vários cursos, não se recordando o local onde fez o curso em Sorocaba. Que não se recorda o nome da empresa que prestou um curso em Apiaí, sobre licitações.
Que, com relação a estes convênios, o depoente não teve uma função especifica, já que as funções eram conjuntas de toda a comissão. Que o depoente atuava a partir da abertura dos envelopes, sendo que antes não tinha nenhuma atribuição."

O corréu Adilson Rodrigues de Almeida aduziu, às fls. 629/629 vº, que, no dia do julgamento, a decisão era tomada de forma conjunta. Afirmou que só participava desse ato, pois não tinha atribuições anteriores relacionadas às licitações. Aludiu à presença de pelo menos um representante de empresa, mas não se recordava de seu nome, in verbis:


"Que é funcionário concursado da Prefeitura de Apiaí, desde 2002, par ao cargo de escriturário. Que trabalhou na comissão de licitação somente a partir de 2005, sendo que antes trabalhava no setor de contabilidade. Que não se recorda o nome da pessoa que nomeou o depoente para exercer função na comissão de licitação. Que ficou na função até 2007. Que depois de 2007, voltou para o setor de contabilidade. Que não tinha uma função específica na comissão de licitação. Que possui segundo grau completo. Que não fez nenhum curso antes de assumir as funções na comissão de licitação; que após os convênios noticiados nos autos, não fez nenhum curso de licitação. Que no dia do julgamento a decisão era tomada de forma conjunta. Que o depoente só participava no dia do julgamento, não tendo atribuições anteriores relacionadas às licitações. Que as licitações foram abertas no mesmo dia. Que se lembra que havia representantes de empresas no dia, se recordando que havia pelo menos um representante, não se recordando o seu nome. Que não teve contato com representantes das empresas antes do dia do julgamento das propostas. Que o depoente pediu afastamento do cargo em 2007 e só voltou a trabalhar na prefeitura em 2009."
Às reperguntas da advogada dos réus, respondeu: "Que não sabe precisamente se as prestações de contas dos convênios foram aprovadas. Que não sabe dizer quem assinou os termos dos convênios. Que sabe dizer que a ambulância e a unidade móvel estão servindo a comunidade."

Vanderlei Borges de Lima disse, às fls. 630/630 vº, que ele e Adilson tinham conhecimentos contábeis, razão pela qual faziam a conferência relativa à fase de habilitação. Respondeu que as cartas-convites foram abertas no mesmo dia em horários diferentes. Esclareceu que havia vários representantes das empresas no dia da abertura dos envelopes, mas não se recordava do número ou identidade deles, in verbis:


"Que é funcionário concursado da Prefeitura de Apiaí desde 1987, no cargo de ofice boy; que prestou concurso quando completou 18 anos e assumiu o cargo de escriturário. Que se formou no ano de 2000 em administração de empresas. Que trabalhou no setor de contabilidade desde seu ingresso na Prefeitura. Que no início de 2005 (gestão do prefeito Donizetti) foi feita uma portaria que nomeou os membros da comissão de licitação. Que antes não havia participado de comissões de licitação. Que fez cursos na área de orçamento pelo IBRAP, mas curso de licitação específico não chegou a fazer. Que o depoente e Adilson, como tinham conhecimentos contábeis, faziam a conferência da parte de habilitação, incluindo certidões de Fundo de Garantia, INSS. Que a Portaria que nomeou a comissão ia de 2005 até o final da gestão em 2008. Que o depoente saiu e foi para o Ciretran. Que as cartas convite foram abertas no mesmo dia, em horários diferentes. Que se recorda que havia vários representantes das empresas no dia da abertura dos envelopes, não se recordado quantos. Que no dia da abertura, não se lembra exatamente quem seriam os representantes da empresa. Que antes do dia da abertura, o depoente não tinha nenhuma atribuição relacionada as cartas convite."
Às reperguntas da advogada dos réus, respondeu: "Que não sabe dizer quem assinou os Termos de Convênio. Que se lembra que os convênios vieram desde 2003, na gestão anterior. Que não se lembra se em outros processos de licitação posteriores aos descritos nos autos, compareceram representantes de empresas, sem autorização ou procuração. Que no momento da licitação é que o depoente ficou sabendo que não existiam empresas que fizessem todo o procedimento de compra dos veículos e transformação."

As testemunhas de defesa Cíntia Nuciene Sarti de Souza e Julienne Martins de Camargo Coelho afirmaram que ingressaram na Prefeitura de Apiaí/SP após a realização dos convênios noticiados nos autos (fls. 631/632).


O testigo Vandir Alves Cardoso respondeu que não houve corrupção relacionada aos réus. Disse não se recordar de nenhum fato específico acerca da reunião da Comissão de Licitação realizada no dia dos fatos. Esclareceu que os envelopes foram abertos na mesma data, pois era norma daquele comitê, in verbis (fl. 633):


"Que foi funcionário da Prefeitura de Apiaí e aposentou-se como escriturário, não sabe dizer a época em que se aposentou. Que em 2005 o depoente já era aposentado, mas tinha cargo de confiança. Que referido cargo se deu no início da gestão de Donizetti. Que o depoente era Secretário de Administração e ficou no cargo durante todo o mandato de Donizetti. Que o departamento de compras pertencia à Secretaria de Administração. Que os convênios descritos nos autos estavam relacionados com o secretário da saúde e não com a secretaria do depoente. Que não assinou nenhum documento relacionado aos convênios. Que o depoente estava presente nas ocasiões em que a comissão de licitação recebia os envelopes. Que os envelopes foram abertos na mesma data, já que era norma da comissão de licitação. Que não se recorda se representantes das empresas noticiadas nos autos estavam presentes na data da abertura dos envelopes."
Às reperguntas da advogada dos réus, respondeu: "Que não houve corrupção relacionada aos réus do processo, envolvendo os convênios noticiados. Que não se recorda de nenhum fato específico relacionado com a reunião da comissão de Licitação no dia dos fatos."
Às reperguntas do representante do Ministério Público Federal, respondeu: 'Que não chegou a conhecer o Deputado Bispo Wanderval. Que o Prefeito não entrou em contato com representantes das empresas, já que existia uma comissão de licitação formada."

Em prosseguimento da instrução foram ouvidas as testemunhas de fls. 846/853 e 864/865 por meio de gravação audiovisual.


Luiz Antônio Beluzzi foi Secretário de Assuntos Jurídicos na gestão do corréu Donizetti e tinha por atribuição a elaboração dos editais de licitação. Em relação ao convênio que teve seu objeto fracionado, esclareceu que o procedimento se deu por pressão de "Brasília", com vista à devolução dos recursos. A licitação foi cindida para evitar a restituição dos valores. Disse que os procedimentos relativos às pesquisas de preços e dos fornecedores foram realizados pela administração anterior, inclusive a assinatura dos convênios. Afirmou não se recordar de quem entregou os envelopes das licitantes. Explicou que não acompanhava os trabalhos das comissões (mídia, à fl. 854).


Fabio José de Oliveira respondeu que não participou diretamente dos atos licitatórios em tela. Afirmou que as licitações ocorreram em continuidade aos procedimentos iniciados na administração anterior. Ressaltou a seriedade dos responsáveis pela condução dos certames (mídia, à fl. 854).


José Mauro de Oliveira Pontes afirmou não saber nada acerca da situação narrada nos autos. Explicou que não teve participação das atividades relativas aos certames. Confirmou a efetiva utilização do ônibus odontológico (mídia, à fl. 854).


Julia Gonçalves de Campos ocupava o cargo de chefe de gabinete, mas não acompanhava o julgamento das propostas nem participava dos procedimentos relativos à licitação. Negou conhecer qualquer das empresas concorrentes. Afirmou que os bens (van, ônibus e respectiva transformação) foram efetivamente adquiridos e utilizados pelo município até o final da gestão. Respondeu que os recursos foram obtidos no mandato anterior. Sustentou que as prestações de contas foram aprovadas. O Departamento Jurídico era o responsável pela elaboração dos editais (mídia, à fl. 854).


Elisete Maria de Andrade Assis esclareceu que trabalhava no Departamento Pessoal; não presenciava o julgamento das propostas; desconhecia quem eram os responsáveis pela elaboração dos editais. Disse que uma parte do procedimento relativo aos recursos para aquisição da van e do ônibus deu-se no mandato do Dr. Emilson e terminou com o Prefeito Donizetti (mídia, à fl. 854).


Gilmara da Silva Ramos, telefonista, à época, soube dos fatos versados nos autos por comentários de terceiros. Afirmou que o ônibus e a van foram adquiridos e utilizados por tempo considerável (mídia, à fl. 854).


Andréia Sarti de Morais tinha a função de tesoureira e tomou conhecimento da aquisição e feitos licitatórios atinentes à van, ao ônibus e sua transformação em gabinete odontológico. Afirmou que os bens foram realmente adquiridos; o pagamento foi realizado após a exibição de toda documentação atestada pelo secretário acerca do recebimento dos bens; a verba federal foi adquirida durante o mandato do Prefeito Emilson. Esclareceu que o edital era elaborado pelo Departamento Jurídico, juntamente com o Departamento de Compras (mídia, à fl. 854).


Dirceu Carneiro de Oliveira ocupava o cargo de encarregado do serviço de transporte ambulatorial, mas ingressou nesse setor após a aquisição dos veículos. Afirmou que funcionavam regularmente. A van era utilizada para o transporte de pacientes para outros municípios, o ônibus prestava serviços odontológicos (mídia, à fl. 854).


Keraban Vilella Costa Filho, Coordenador de Saúde Bucal, à época, afirmou que utilizou muito o ônibus. Explicou não ter conhecimento acerca do uso da ambulância. Soube da existência do veículo no mandato de Donizetti. Não teve nenhuma participação em relação ao projeto de aquisição/transformação do ônibus. O veículo serviu no bairro Palmitalzinho até a instalação da unidade básica de saúde ser estabelecida e, posteriormente, foi direcionado a outras localidades (mídia, à fl. 866).


Carlos Alberto Dario Bastos de Moraes detinha os cargos de Vice-Prefeito e Secretário da Saúde nos anos de 2005 e 2006. Esclareceu que a carta de licitação foi emitida pela Secretaria de Saúde e que os recursos foram recebidos na gestão do Prefeito Donizetti. Explicou que sua participação limitou-se a solicitar ao prefeito a compra dos bens. Afirmou que o ofício de solicitação da aquisição originava-se na Secretaria da Saúde. Asseverou que a mencionada compra consistia em um projeto do órgão sob seu secretariado. Consignou a real aquisição e utilização dos bens. Disse que foi comprado um ônibus normal e depois adaptado, porque a empresa que vendia o veículo não fazia a adaptação, o que foi feito por outra sociedade empresária. (mídia, à fl. 866)


Como já se consignou, as declarações das testemunhas ouvidas em juízo não têm o condão de infirmar a convicção acerca da perpetração das ações descritas pelo autor, relativamente ao direcionamento das licitações, pois não participaram diretamente dos procedimentos licitatórios, não se recordaram de fato específico acerca da reunião da comissão e obtiveram informações por terceiros.


A explicação de Luiz Antônio Beluzzi para a cisão do certame relativo ao ônibus não convence, à vista da fragilidade do argumento de que teria sido por pressão de "Brasília" com vista à devolução dos recursos. Não apresentou qualquer razão verossímil para se considerar o fracionamento mais rápido ou vantajoso para a administração.


Conforme se infere das declarações da testemunha de defesa, o então Secretário Municipal de Saúde, Carlos Alberto Bastos de Moraes, a empresa que forneceu o ônibus para o município não realizava a transformação em unidade móvel de saúde, razão pela qual tal serviço foi realizado por outra. No entanto, não só a Delta foi destinatária da carta-convite nº 10/2005 como participou desse certame, mais uma circunstância que se identifica com o sistema de ação narrado por Luiz Antônio, no sentido de que era usual a cobertura recíproca entre empresas em licitações. Por outro lado, o fracionamento do objeto da licitação, em razão de a empresa fornecedora do ônibus não realizar a adaptação do veículo, constitui forte elemento probatório acerca do direcionamento.


Não se trata, portanto, de imputação de responsabilidade ao município baseada unicamente no depoimento de Luiz Antônio, mas na análise do conjunto probatório produzido à luz do devido processo legal.


As diversas irregularidades apontadas pelos relatórios do DENASUS, bem como a realização conjunta dos atos administrativos, cujas fases ocorreram rigorosamente nas mesmas datas, o protocolo simultâneo de três empresas concorrentes com titularidades e endereços diversos, o fracionamento do objeto a ser licitado, a licitação de bem diverso ao previsto no Plano de Trabalho, consubstanciam ação planejada e ordenada com o intuito de dar aparência de legalidade aos certames manifestamente direcionados para favorecer a empresa Delta Veículos Especiais Ltda.


Veja-se que a situação apurada nos autos coaduna-se com as narrativas de Luiz Antônio Trevisan Vedoin acerca da obtenção de recursos por meio de emendas parlamentares ao orçamento da União em favor de municípios, cujos agentes públicos municipais, previamente contatados, concordavam em formalizar e conduzir procedimentos licitatórios engendrados para propiciar o direcionamento das licitações. Note-se que o depoente foi expresso quanto às emendas relativas ao exercício de 2003, as quais foram apresentadas em favor do Município de Apiaí e outras entidades e cidades paulistas. Esclareceu que, em Apiaí e Vargem, bastou o parlamentar fazer o contato telefônico com os prefeitos para acertar os detalhes do direcionamento das licitações. (fl. 1085 do anexo I)


Assim, os acervos oral e documental consubstanciam um conjunto harmônico a demonstrar a materialidade e a autoria em relação a Donizetti Borges Barbosa, bem como autoriza concluir que tenham os réus Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima concorrido, voluntária e conscientemente, para o direcionamento da licitação.


Note-se que o então Prefeito Donizetti Borges Barbosa assinou os editais 08/2005, 09/2005 e 10/2005 para a compra do mencionado ônibus e respectiva transformação em UMS, bem como da van, em 05/04/2005 (fls. 364/368, 446/451, do apenso II, volume II e 541/546 do apenso II, volume III), além de ter firmado os termos de homologação e adjudicação (fls. 631/632, 438/439 e 532/533 do apenso II, volume III).


As cartas-convites foram enviadas a três empresas, inclusive para a Delta Veículos Especiais Ltda, na mesma data, a qual sequer realizava o serviço de transformação de veículo em unidade móvel de saúde, a teor do depoimento de Carlos Alberto Dario Bastos de Moraes, Vice-Prefeito e Secretário da Saúde, à época.


Ressalte-se que a mencionada sociedade empresária, conforme esclareceu Luiz Antônio Vedoin no depoimento prestado na Segunda Vara Federal em Cuiabá/MT, pertencia a Sinomar Martins Camargo e foi constituída especificamente para participar de licitações (fl. 974 do apenso II, anexo I). Ademais, conforme asseverou Luiz Antônio, pelo fato de a homologação da licitação, empenho e pagamento estar a cargo dos prefeitos, sem exceção, eles sabiam das circunstâncias em que a licitação iria ocorrer (fls. 987 do apenso II, anexo I). Também se destaca sua assertiva a respeito de emenda parlamentar apresentada em favor do Município de Apiaí/SP e outros no exercício de 2003. Acrescentou que, em Apiaí e (...), bastou o parlamentar fazer o contato por telefone com os prefeitos para acertar os detalhes do direcionamento das licitações. (fl. 1085 do apenso II, anexo I)


Destarte, não se sustentam as afirmações de que não houve anuência do corréu Donizetti B. Barbosa, porque não era Prefeito de Apiaí/SP à época em que o recurso federal foi concedido, já que todos os atos necessários para a execução ocorreram em sua gestão. Aliás, consoante seu depoimento, chegou a pedir prorrogação de prazo de dois convênios, além de solicitar modificação de objeto.


Maria Elisa Manca solicitou informações sobre as disponibilidades de dotações orçamentárias, firmou os convites nº 08/2005, 09/2005 e 10/2005 e os enviou às licitantes, conforme se extrai dos documentos de fls. 370, 373/375, 454 e 457/459 do apenso II, volume II, e fls. 548 e 551/553 do apenso II, volume III.


Conforme declarou, trabalhava no setor de compras e licitações e sua função era formalizar os processos juntamente com o setor jurídico, bem como entregar ou enviar os convites às empresas. Afirmou que realizou as pesquisas prévias de mercado, mas não as juntou aos autos. Infere-se que lhe cabia encontrar os fornecedores para os procedimentos licitatórios (fl. 625).


À vista de suas atribuições, não há como refutar que tivesse conhecimento do direcionamento da licitação, sobretudo no caso do certame relativo à adaptação do ônibus, em que a correspondência foi endereçada a empresa que não realizava o serviço pretendido.


Rubens Barra Rodrigues de Lima, às fls. 627/627 vº, respondeu que foi presidente nos três certames e que antes destes fatos o depoente não trabalhava na prefeitura, na qual ingressou em janeiro de 2005 no cargo em comissão de Procurador Jurídico. Asseverou que deu pareceres relacionados a licitações em outras prefeituras em que trabalhou.


Constata-se que foi nomeado para a Comissão Permanente para o julgamento de licitação no mês em que assumiu o cargo em comissão na Prefeitura de Apiaí-SP. É o que se extrai da Portaria Municipal nº 16, de 03 de janeiro de 2005, em que consta a nomeação de sete membros para o exercício de 2005, sem menção das respectivas atribuições, incluídos os réus Rubens Barra Rodrigues de Lima, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima (fl. 372 do apenso II, volume II).


Não há informação nos autos acerca da indicação, mas o fato é que o corréu Rubens Barra Rodrigues de Lima presidiu os três certames (fls. 435/436, 530/531 e 628/629 do apenso II, volume III). Por outro lado, os demais membros do colegiado afirmaram que tinham atribuições somente na data da abertura dos convites.


Ante sua anterior experiência profissional e seu cargo de Procurador Jurídico, estava qualificado para exercer a devida fiscalização em relação aos atos por ele presididos. Entretanto, não atuou de forma corretiva.


Nas ocasiões de aberturas das propostas somente a empresa Delta Veículos Especiais Ltda apresentou-se regularmente representada por Sinomar Martins Camargo. Ainda assim, constaram em atas as presenças de outras concorrentes, cujos representantes não exibiram procurações e não há alusão a nenhum documento na qualificação. Apesar disso, assinaram os registros (fls. 435/436, 530/531 e 628/629 do apenso II, volume III). Não há notícia de regularização posterior. Ademais, nada se consignou acerca das irregularidades formais apontadas pelo relatório CGU/DENASUS, enumeradas anteriormente.


Perquirido a respeito, o corréu Rubens Barra Rodrigues de Lima respondeu que não vê nenhum óbice em não portarem procuração ou documentos na abertura dos envelopes. Também declarou que os integrantes da Comissão de Licitação não tiveram contato prévio com os representantes das empresas e que resolviam todos os problemas relacionados à espécie. Explicou que o processo já vinha formalizado do Departamento Jurídico, motivo pelo qual não elaborou nada atinente a fracionamento (fl. 627).


Conhecedor de sua responsabilidade como presidente, não é aceitável que deliberasse recomendar a adjudicação sem o exame de todos os documentos pertinentes. Ademais, ainda que seja plausível que terceiro(s) tenha(m) se apresentado na qualidade de preposto(s), não se afigura verossímil que o corréu tenha permitido que ele(s) assinasse(m) as atas em nome das proponentes, à míngua de qualquer identificação ou procuração que os legitimasse(m), sem que o fizesse deliberadamente para propiciar o êxito do ilícito.


Como bem assentou o magistrado a quo, a assertiva de que havia outros prepostos presentes no feito, porém sem portar documentos, é inconvincente, in verbis:


"Nesse ponto, há que se destacar que não convence este juízo a sua afirmação de que, por ocasião da abertura das propostas feitas na mesma data, além de Sinomar Martins Camargo, estava também presente outra pessoa, que, entretanto, não portava qualquer documento ou procuração que pudesse vinculá-lo a empresa representada. Com efeito, é evidente que qualquer pessoa representante de uma empresa deve se identificar através de uma procuração, que deve ser documentada nos autos, quando seu nome não conta do contrato social. Em sendo assim, ao ver deste juízo, são falaciosas as alegações do réu no sentido de que efetivamente existiu uma pessoa representante de outra empresa na data da abertura dos envelopes, já que restou evidenciado que, como os convites foram dirigidos, não existiram representantes de outras empresas na data da entrega dos editais e da abertura dos envelopes.
É oportuno destacar que na ata da carta convite de aquisição do ônibus contou como representante da empresa Manupa o Sr. Diego Rezende (fls. 128 e 435 do apenso II), mas este não apresentou procuração; a empresa De Nigris não teve representante na sessão de abertura de envelopes, apesar de ter protocolado inexplicavelmente os envelopes nessa data (fls. 129 e 400 do apenso II). Do mesmo modo, em relação à transformação do ônibus, constou na ata que a empresa Transform estaria sendo representada por Jordan Azevedo, sendo que este não apresentou procuração (conforme fls. 130 e 628); e a empresa Tapeçaria Jedai não teve representante na sessão de abertura de envelopes, apesar de ter protocolado inexplicavelmente os envelopes nessa data (fls. 130 e 577 verso do apenso II).
Ao ver deste juízo, tais ilegalidades não poderiam passar desapercebidas pelo presidente da comissão de licitação que era o responsável pela legalidade do certame e pela abertura dos envelopes, ficando evidenciado que ao admitir que somente Sinomar Martins Camargo estivesse presente na data da abertura dos envelopes, evidentemente sabia que as cartas convites eram dirigidas. Sua formação jurídica não iria admitir que a representação das pessoas jurídicas que participaram dos certames (notadamente, aquisição do ônibus e transformação) pudesse ser feita sem procuração e sem representantes de algumas empresas, de modo que restou evidenciado o seu dolo, eis que participante do esquema envolvendo o prefeito DONIZETTI BORGES BARBOSA." (fls. 956/957)

Obviamente, a concorrente para a qual se dirigiram os certames não figurar sozinha no julgamento das propostas acaba por dar aparência de idoneidade à concorrência.


Assim, patente o concurso do corréu Rubens Barra Rodrigues de Lima para com a conduta do então Prefeito Donizetti Borges Barbosa.


Os réus Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima, membros da Comissão Permanente para o julgamento de licitações, são servidores concursados da Prefeitura Municipal de Apiaí. A teor de seus depoimentos, somente a partir do ano de 2005 passaram a exercer tal designação. Por outro lado, suas participações nos procedimentos deram-se somente no dia da abertura dos envelopes (fls. 628/630 vº).


O cotejo de suas declarações com as dos outros réus, assim como documentos e depoimentos existentes, não demonstra que tenham concorrido voluntária e conscientemente para a fraude verificada, na medida em que não há qualquer prova nos autos de que tivessem conhecimento do direcionamento pretendido pelos demais apelantes. De outro lado, Luiz C.B. Rosa trabalhava no setor de almoxarifado, antes de integrar a comissão, Adilson R. Almeida e Vanderlei Borges de Lima ocupavam o cargo de escriturário, de modo que, a par da inexistência de provas e por se tratar de um procedimento não afeto às suas áreas funcionais, exsurge que agiram culposamente, o que não afasta a possibilidade de responderem por atuação negligente na Comissão de Licitação.


Para a perpetração da fraude seria imprescindível o atendimento dos aspectos formais exigíveis para a realização do certame, inclusive das atividades atinentes à Comissão de Licitação, que têm a seguinte definição no artigo 6º, inciso XVI, da lei 8.666/93:


"XVI - Comissão - comissão, permanente ou especial, criada pela Administração com a função de receber, examinar e julgar todos os documentos e procedimentos relativos às licitações e ao cadastramento de licitantes."

Exsurge que a lei imputa função de maior complexidade do que a que estes réus, na verdade, desempenhavam. Infere-se de suas declarações que se reuniam somente no dia da abertura dos envelopes para análise dos documentos e propostas, não tinham atribuição específica e não acompanhavam o que acontecia antes ou depois dessa sessão (fls. 628/630).


Portanto, ainda que não tivessem conhecimento dos desígnios dos demais corréus, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima assumiram o encargo de membros da Comissão Permanente, mas não se desincumbiram das responsabilidades inerentes, de modo que propiciaram o êxito da realização da conduta.


Por outro lado, não demonstraram terem sido coagidos a tal proceder.


A propósito do tema o seguinte trecho da obra de Adriano Andrade, Cleber Masson e Landolfo Andrade:


A conduta se diz culposa quando a lesão ao erário, previsível, decorre de comportamento voluntário do agente público, imprudente, negligente ou imperito, contrário a seu dever funcional de boa gestão administrativa e de atenção no trato dos negócios públicos.
É verdade que alguns autores excluem a conduta culposa, entendo-a inconstitucional e incompatível com a noção de desonestidade, que pressupõe a má-fé do agente público. Razão, contudo, não lhes assiste. Isso porque a Constituição Federal não definiu o que seja ato de improbidade administrativa, delegando tal tarefa ao legislador ordinário; este, por sua vez, inspirado no princípio democrático, optou pela eleição da improbidade culposa como modalidade do ilícito, referindo-se expressamente ao dolo e à culpa do agente público nos arts. 5º e 10 da LIA.
Frise-se, demais disso, que a noção de probidade, consoante ficou evidenciado ao analisarmos o seu exato alcance e significado, não está limitada ao conceito de honestidade. Quer-se muito mais dos homens públicos, os quais detêm a confiança do cidadão. Exige-se que assim sejam eles eficientes, diligentes, responsáveis e, sobretudo, justos. Se assim é certo, também outras condutas, que não as dolosas, podem ser tipificadas como ímpobras.
Nesse particular, remarque-se que a LIA está em perfeita sintonia com as diretrizes internacionais. Em diversos modelos comparados, conforme visto, a improbidade já é tida como espécie de má gestão pública que comporta atuações dolosas e culposas.
Para a configuração desse tipo de improbidade, portanto, é indiferente que o sujeito ativo tenha agido com dolo ou culpa. O elemento subjetivo terá influência apenas na fixação das sanções previstas na LIA, que deverão ser proporcionais à maior ou menor gravidade do ato ímprobo praticado" (Interesse Difuso e Coletivos Esquematizados, Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade, 2.ed., rev. atual. e ampli.-Rio de Janeiro:Forense; São Paulo:MÉTODO, 2012, pp. 677/678)

No mesmo sentido, julgado do E. S.T.J.:


..EMEN: PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALEGADA AFRONTA AO ART. 535 E 458 DO CPC. INOCORRÊNCIA. CONFIGURAÇÃO DO ATO DE IMPROBIDADE DO ART. 10, INCISO X, SEGUNDA PARTE, DA LEI 8.429/92. POSSIBILIDADE DE ELEMENTO SUBJETIVO DA CULPA NAS CONDUTAS DO ART. 10. DEMONSTRAÇÃO DO ELEMENTO SUBJETIVO CULPOSO E PREJUÍZO AO ERÁRIO PRESENTES NO ACÓRDÃO A QUO. RECURSO PROVIDO. 1. O aresto recorrido não está eivado de omissão nem de contradição, pois resolveu a matéria de direito valendo-se de elementos que julgou aplicáveis e suficientes para a solução da lide, havendo, na verdade, mero inconformismo em relação aos fundamentos da decisão. 2. A alegação de ofensa aos artigos 1º, 5º e 10, inciso X, da Lei 8.429/92 merece acolhida, pois o acórdão recorrido deixou assente a existência de dano ao erário por responsabilidade do prefeito municipal, à época ordenador de despesas, configurando-se ato de improbidade administrativa. 3. A decisão recorrida reconheceu claramente a responsabilidade do ex-prefeito - Nelson Jorge Maia quanto à realização de obras ineficazes para solução do acúmulo e proliferação de substância conhecida por necrochorume que traz sérios e graves riscos à saúde e à segurança da população, causando efetivamente lesão ao erário do município de Passos/MG. 4. Doutrina e jurisprudência pátrias afirmam que os tipos previstos no art. 10 e incisos (improbidade por lesão ao erário público) prevêem a realização de ato de improbidade administrativa por ação ou omissão, dolosa ou culposa. Portanto, há previsão expressa da modalidade culposa no referido dispositivo, não obstante as acirradas críticas encetadas por parte da doutrina. 5. Restou demonstrada na fundamentação do acórdão atacado a existência do elemento subjetivo da culpa do ex-prefeito bem como o prejuízo que a negligência causou ao erário, caracterizando-se, por isso mesmo, a tipicidade de conduta prevista no art. 10, inc. X, segunda parte, da Lei 8.429/92. 6. Recurso especial provido para restabelecer a condenação do ex-prefeito do município de Passos/MG - Nelson Jorge Maia ao ressarcimento integral do dano, atualizado monetariamente pelos índices legais acrescido de juros de mora na taxa legal, nos termos do art. 12, inc. II, da Lei 8.429/92. ..EMEN:
(RESP 200600151838, CASTRO MEIRA, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:21/10/2009 ..DTPB:.-grifei)

Destarte, em relação aos corréus Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima, não há que se perquirir sobre a ausência de má-fé, à vista de suas condutas culposas, o que não se aplica a Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima, os quais atuaram com o dolo de propiciar a contratação da empresa Delta Veículos Especiais Ltda mediante licitação inidônea.


A afirmação da defesa de que foram realizadas as prévias pesquisas de preço não restou comprovada nos autos. Os relatórios de auditoria apontaram a ausência do documento no feito administrativo. A realização do certame sem a providência prevista no artigo 15, § 1º, da Lei nº 8.666/93 é mais um elemento relevante a corroborar a prática da conduta imputada, pois é compatível com a intenção de, ao final, assegurar-se o êxito de específico concorrente. O argumento de que o ato era realizado informalmente, sem a juntada no respectivo procedimento, afigura-se imprestável para efeito de prova.


Também não merece guarida a alegação de que o relatório CGU/DENASUS é impreciso quanto à diferença de valor pago às licitantes em relação ao preço de mercado, bem como omisso quanto à demonstração dos parâmetros de comparação. A metodologia de cálculo do débito é facilmente encontrada no site do Tribunal de Contas da União.


O acórdão TCU nº 2451/2007/Plenário versou sobre a solicitação da Câmara dos Deputados de auditoria nos recursos federais relativos a denúncias acerca da "Operação Sanguessuga", deflagrada pela Polícia Federal com o objetivo de investigar fraudes em licitações destinadas à aquisição de unidades móveis. Considerou-se válido o método desenvolvido pela Controladoria Geral da União, para fins de quantificação dos débitos e posterior citação dos responsáveis. Conforme consignou o relator Ministro Marcos Vinicios Vilaça: "O Sistema de Cálculo de Prejuízo das Unidades Móveis de Saúde - SGI foi desenvolvido pela CGU com o objetivo de permitir a comparação de preços das UMS adquiridas nos convênios com as disponíveis no mercado. A composição do custo foi realizada com base na soma dos valores do veículo, dos equipamentos integrantes e da transformação em unidade móvel de saúde. Com relação a esse último componente do custo, a equipe destaca as diferenças de qualidade na montagem das UMS. Os valores estimados são baseados em serviços de alto padrão, com materiais de qualidade satisfatória e equipamentos de marcas tradicionais, enquanto as montagens realizadas pelas empresas vencedoras das licitações carecem, muitas vezes, de qualidade aceitável. De acordo com a equipe, "em várias licitações, foram adquiridos ônibus sucateados, realizadas transformações de péssima qualidade e instalados equipamentos desconhecidos - o que configura montagens do tipo fundo de quintal". De qualquer forma, o valor base para comparação pode estar superestimado, conferindo à comparação uma nota de conservadorismo." (Consulta eletrônica de jurisprudência no site do TCU)


O método consiste, em síntese, no estabelecimento de preços de mercado relativos às unidades móveis de saúde e às transformações, por meio de ampla pesquisa, inclusive considerados os praticados pelo grupo Planam, além de valores obtidos na Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas-FIPE e na Secretaria de Fazenda do Estado de Rondônia-Sefaz/RO (tabela do IPVA), que utiliza a FIPE como referência. Assim, ao contrário do argumento da defesa, há nos autos provas que demonstraram o prejuízo ao erário com a aquisição do ônibus e com a respectiva adaptação.


Assim, incabível a alegação genérica de que os valores efetivamente pagos são de mercado, devidamente pautados em pesquisa de preços e orçamento predefinido. Ademais, sequer foram juntadas as consultas prévias nos respectivos processos administrativos, instrumento necessário até para que se estipulasse a adequada modalidade de licitação e obstasse o exaurimento dos recursos com propostas exorbitantes. À vista do descumprimento de norma legal, inviável a aferição da assertiva. Além disso, os apelantes desistiram da prova pericial, à fl. 890, o que denota conformismo com os cálculos então apresentados. Também não repercute para fins de afastamento da responsabilidade que o valor empregado seja inferior ao previsto no Plano de Trabalho, porquanto se demonstrou superfaturamento em relação aos parâmetros utilizados pela Controladoria Geral da União.


Com o intuito de demonstrar a regularidade procedimental afirma-se que a inexistência de autorização para a abertura do certame não obsta sua homologação e que a lei não impõe a identificação da pessoa que retira o edital. Não prospera a alegação. Ao tratar do procedimento e julgamento da licitação, o artigo 38 da Lei nº 8.666/93 prevê seu início, mediante a abertura de processo administrativo, o qual deverá ser instruído com a respectiva autorização, bem como o comprovante da entrega do convite. Confira-se:


Art. 38. O procedimento da licitação será iniciado com a abertura de processo administrativo, devidamente autuado, protocolado e numerado, contendo a autorização respectiva, a indicação sucinta de seu objeto e do recurso próprio para a despesa, e ao qual serão juntados oportunamente:
I - edital ou convite e respectivos anexos, quando for o caso;
II - comprovante das publicações do edital resumido, na forma do art. 21 desta Lei, ou da entrega do convite;

Não faria sentido a legislação exigir a instrução do feito com o comprovante de entrega do convite sem a devida identificação do signatário ou que dispusesse sobre a juntada de autorização de abertura, se sua dispensa ficasse a critério do administrador. Confira-se o escólio de José dos Santos Carvalho filho:


No campo das licitações, o princípio da legalidade impõe, principalmente, que o administrador observe as regras que a lei traçou para o procedimento. É a aplicação do devido processo legal, segundo o qual se exige que a Administração escolha a modalidade certa; que seja bem clara quanto aos critérios seletivos; que só deixe de realizar a licitação nos casos permitidos na lei; que verifique, com cuidado, os requisitos da habilitação dos candidatos, e, enfim, que se disponha a alcançar os objetivos colimados, seguindo os passos dos mandamentos legais. (Manual de Direito Administrativo, José dos Santos Carvalho Filho, 17ª edição, Editora Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2007, pp. 215/216)

Com a razão a sentença ao suscitar a incompatibilidade lógica de o corréu Rubens Barra R. de Lima, à vista de sua formação jurídica, ter permitido a assinatura em nome de sociedade empresária sem que o signatário comprovasse a qualidade de preposto. Como já acentuado, restou duvidosa a efetiva participação dos representantes de empresas mencionados nas atas de julgamento.


Os apelantes invocam a inaptidão probatória do relatório DENASUS, sob o fundamento de que apontou indevidamente o fim da vigência do convênio nº 1832/2003 em 22/02/2007, em vez da data de 24/06/2007, conforme demonstra a documentação acostada na apelação.


Note-se que as considerações dos auditores aludem a falhas administrativas durante a execução do convênio, tal como o prazo de vigência não considerado para prorrogação (fl. 143 do apenso II, volume I). Os recursos foram liberados em 22/04/2004 (fl. 121 do apenso II, volume I). A vigência original final estava fixada para 25/12/2004 e foi prorrogada por duas vezes como se extrai da fl. 123 do apenso II, volume I e, conforme se infere nos documentos que instruem a apelação, houve novos pedidos de dilação (fls. 1049/1066), de modo que eventual inconsistência nesse sentido deve-se às sucessivas renovações de prazo para a prestação de contas, o que não compromete a lisura da auditoria realizada.


Não se sustenta a afirmação de que não haveria como impedir que empresas ligadas a Luiz Antônio Trevisan Vedoin participassem do certame, já que as interessadas em licitar obtêm informações a respeito por meio da internet ou publicações oficiais. O conjunto probatório, conforme já explicitado, não deixa dúvidas quanto à prática do direcionamento a fim de favorecer específica licitante.


No tocante à ausência de prova acerca da divulgação do certame, alude-se que para a espécie não se exige nenhum tipo de publicidade. Não assiste razão aos apelantes.


É certo que a modalidade convite é a mais singela e demanda menos formalismo, razão pela qual não se exige a publicação na imprensa oficial. Todavia, a Lei nº 8.666/93 admite a participação de interessados não convidados. Seu artigo 22, § 3º, dispõe acerca da afixação, em local apropriado, de cópia do instrumento convocatório para propiciar aos demais cadastrados na correspondente especialidade manifestarem seu interesse.


A teor de depoimento de Maria Elisa Manca, responsável pela formalização dos procedimentos junto com o setor jurídico, sequer foram enviados convites a outras empresas, inclusive uma localizada na cidade de Bauru, porque seu preço era mais caro que as enumeradas na inicial. Nada esclareceu acerca da medida prevista pela legislação. Outrossim, os demais réus e testemunhas não se reportaram ao tema. Portanto, não se desconstituiu o apontamento da auditoria acerca da carência probatória nesse sentido. Confira-se o seguinte julgado do E. S.T.J.:


..EMEN: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. OFENSA A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. ESPECIAL. VIA INADEQUADA. LICITAÇÕES. PROCEDIMENTO DE CONVITE DIRECIONADO, SEM PUBLICIDADE. PREJUÍZO AO ERÁRIO IN RE IPSA. ART. 334, INCS. I E IV, DO CPC. FATO NOTÓRIO SEGUNDO REGRAS DE EXPERIÊNCIA ORDINÁRIAS E SOBRE O QUAL MILITA PRESUNÇÃO LEGAL. 1. O Superior Tribunal de Justiça não tem a missão constitucional de interpretar dispositivos da Lei Maior, cabendo tal dever ao Supremo Tribunal Federal, motivo pelo qual não se pode conhecer da dita ofensa ao art. 5º, inc. LXXIII, da Constituição da República vigente. Precedentes. 2. O prejuízo ao erário, na espécie (irregularidade em procedimento licitatório), que geraria a lesividade apta a ensejar a ação popular é in re ipsa, na medida em que o Poder Público deixa de, por condutas de administradores, contratar a melhor proposta (no caso, em razão da ausência de publicidade, houve direcionamento da licitação na modalidade convite a três empresas específicas). 3. Além disto, conforme o art. 334, incs. I e IV, independem de prova os fatos notórios e aqueles em razão dos quais militam presunções legais ou de veracidade. 4. Evidente que, segundo as regras de experiência ordinárias (ainda mais levando em conta tratar-se, na espécie, de administradores públicos), o direcionamento de licitações, sem a devida publicidade, levará à contratação de propostas eventualmente superfaturadas (salvo nos casos em que não existem outras partes capazes de oferecerem os mesmos produtos e/ou serviços). 5. Não fosse isto bastante, toda a sistemática legal colocada na Lei n. 8.666/93 baseia-se na presunção de que a obediência aos seus ditames garantirá a escolha da melhor proposta em ambiente de igualdade de condições. 6. Desta forma, milita em favor da necessidade de publicidade precedente à contratação mediante convite (que se alcança mediante, por exemplo, a fixação da cópia do instrumento convocatório em locais públicos) a presunção de que, na sua ausência, a proposta contratada não será a economicamente mais viável e menos dispendiosa, daí porque o prejuízo ao erário é notório. 7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, não provido. ..EMEN:
(RESP 201000693937, MAURO CAMPBELL MARQUES, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:10/09/2010 ..DTPB:.-grifei)

O fato de as ações ilícitas relatadas por Luiz Antônio Vedoin antecederem o julgamento da licitação não exclui a responsabilização dos membros da comissão, porquanto, como se viu, respondem culposamente pela perpetração de suas condutas.


A circunstância de não ter havido pagamento de qualquer comissão para o prefeito ou servidores não afasta a responsabilidade pelos atos imputados.


A Lei nº 8.429/92, na esteira do disposto no artigo 37 e seu § 4º da Constituição Federal, enumera as condutas dos agentes públicos que configuram atos de improbidade administrativa, discriminados entre os que: importem em enriquecimento ilícito (art. 9º), causem prejuízo ao erário (art. 10) e atentem contra os princípios da administração pública (art. 11).


Aquele que realizou atos que se subsumam em uma ou mais dessas categorias infringe os ditames da Lei de Improbidade Administrativa e, portanto, haverá de suportar as sanções previstas no seu artigo 12, atendido o seu parágrafo único.


A inexistência de enriquecimento ilícito não obsta a caracterização de improbidade, dado que, nestes autos, não se cuida de condutas previstas no artigo 9º da Lei nº 8.429/92, mas, sim, as discriminadas no artigo 10, que correspondem, respectivamente, a causar prejuízo ao erário.


Evidente a ocorrência no caso sob análise, ao menos em relação ao convênio nº 1832/2003, elemento indispensável para a caracterização dos atos de improbidade descritos no artigo 10 da Lei de improbidade, uma vez que a conduta do agente público, em princípio, acarretou não apenas dano estimado em R$ 83.923,58, como também a realização da transformação em desacordo com o Plano de Trabalho aprovado e consequente inexistência de consultório pediátrico/médico e ginecológico, o que privou a população do atendimento almejado com o convênio. Note-se que o valor corresponde ao que foi pago a mais ao estimado de mercado, o que para o ônibus perfaz R$ 41.668,00 e para a transformação R$ 31.075,58, além do saldo não executado de R$ 11.180,00 (fl. 139 do apenso II, volume I). Destarte, houve lesão ao erário. Despiciendo, portanto, o argumento acerca da inexistência de indício de que seria possível a contratação do mesmo serviço de maneira diversa da que foi realizada pela Prefeitura de Apiai/SP, já que os parâmetros foram obtidos por meio de pesquisas, o que indica a existência de outros fornecedores.


Relativamente ao convênio nº 1594/2003, conforme consta à fl. 111 do apenso II, volume I, não se identificou prejuízo ao erário, o que afasta a incidência do artigo 10 da LIA, porque a figura apresenta uma descrição de conduta lesiva. Assim, como observou o juiz a quo, não há se falar em duas práticas de improbidade.


Especificamente acerca da perda patrimonial como requisito do tipo previsto no artigo 10 da Lei de Improbidade, convém destacar a lição de Adriano Andrade, Cleber Masson e Landolfo Andrade, em sua obra sobre direitos difusos e coletivos:


2ª) Perda patrimonial: a substância desta modalidade de improbidade é fornecida pela compreensão da noção de perda patrimonial, que traduz a ideia de repercussão patrimonial negativa, ou seja, redução ilícita de valores patrimoniais. Lesão sem repercussão patrimonial negativa não configura o tipo de improbidade em exame, podendo caracterizar, conforme o caso, enriquecimento ilícito (art. 9º) ou atentado aos princípios da Administração Pública (art.11).
Observe-se que a LIZ adotou a forma ilustrativa "perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação de bens ou haveres públicos", para designar toda e qualquer lesão que afete o patrimônio das entidades referidas no art.1º.
(...)
A respeito do elemento em exame, questão polêmica consiste em saber se a prova da ocorrência da perda patrimonial é sempre necessária, ou se em alguns casos ela se presume, por força de lei.
Para autorizada doutrina, a prova da perda patrimonial é sempre necessária, isto é, o ato de improbidade previsto no art.10 exige, para sua configuração, o efetivo prejuízo ao erário, diante da impossibilidade de condenação ao ressarcimento de dano hipotético. Nem o prejuízo presumido nem o dano moral servem para sua caracterização.
Esse entendimento tem o apoio da jurisprudência amplamente majoritária do STJ:
O ato de improbidade previsto no art. 10 da LIA exige para sua configuração, necessariamente, o efetivo prejuízo ao erário, sob pena de não tipificação do ato impugnado. A lesão ao erário, como requisito elementar do ato de improbidade administrativa previsto no art. 10 da Lei n.º 8.429/92, não pode ser meramente presumida.
(in Interesses Difusos e Coletivos Esquematizado, Editora Método, 2ª edição, p. 678/679)

A defesa escuda-se da prática de improbidade sob o fundamento de que houve a efetiva utilização do objeto licitado, bem como o emprego dos recursos para as respectivas aquisições. O exame do caso dos autos não abrange tais aspectos, os quais restaram incontroversos, mas o caráter fraudulento dos certames e o prejuízo resultante do superfaturamento. O que a lei pretende tutelar no inciso VIII do artigo 10 da Lei nº 8.429/92 é a licitude do procedimento licitatório e sua índole competitiva.


Quanto à alegada impossibilidade de os apelantes apurarem a participação inidônea de empresas, à vista da regularidade documental, não se apresenta plausível. Considerado o interesse daquela constituída para o fim de participar em licitações, por certo seria apresentada toda a documentação necessária para o desiderato, tanto que não se apontou nenhuma inconsistência em relação os documentos exibidos pela Delta Veículos Especiais Ltda, o que não afasta a responsabilidade dos réus, já que a fraude não é relativa à indevida habilitação dos candidatos e, sim, ao modo indevidamente dirigido para se chegar ao resultado.


Assim, demonstrada a materialidade e a autoria do ato ímprobo, a manutenção da condenação é medida que se impõe.


Veja-se que esta Corte já teve oportunidade de apreciar situação análoga, ocasião em que deu parcial provimento à apelação da União e à remessa oficial para reformar a sentença absolutória, in verbis:


PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE. DIRECIONAMENTO E FRAUDE EM PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. SUPERFATURAMENTO. DOLO GENÉRICO E DANO AO ERÁRIO PÚBLICO EVIDENCIADOS. INCIDENCIA DO DISPOSTO NOS ART'S. 10, CAPUT E INCISOS V E VIII E ART. 11, CAPUT E INCISO I, DA LEI Nº 8.429/92. FALTA DE PROVAS DO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO A AFASTAR O DISPOSTO NO ART. 9º, DA MESMA LEI. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE NA FIXAÇÃO DAS PENALIDADES PREVISTAS NO ART. 12 DA REFERIDA LEI.
1. Trata-se de apelação contra sentença de improcedência proferida em ação civil pública ajuizada pela União em face de Marco Antonio Pereira da Rocha, prefeito de Regente Feijó/SP e outros, com vistas a aplicação das penalidades previstas no art. 12, incisos II e III, da Lei nº 8.429/92.
2. É da inicial que o município de Regente Feijó/SP, por intermédio de seu prefeito à época e demais réus, celebrou convênio com a União, via Ministério da Saúde, de nº 2278/2003, para adquirir uma Unidade Móvel de Saúde, com vistas ao fortalecimento do SUS. O convênio previa o valor total de R$ 64.767,69 (sessenta e quatro mil, setecentos e sessenta e sete reais e sessenta e nove centavos), sendo que a contrapartida da União equivalia a R$ 59.970,00 (cinqüenta e nove mil, novecentos e setenta reais) e a do Município, R$ 4.797,69 (quatro mil, setecentos e noventa e sete reais e sessenta e nove centavos).
3. Assim, teriam os requeridos praticado atos de improbidade administrativa, previstos na Lei nº 8.429/92, que importaram em enriquecimento ilícito (art. 9º, caput e incisos II e XI), lesão ao erário público (art. 10, caput e incisos V, VIII, IX, XI e XII), além de violação aos princípios da administração pública (art. 11, caput e inciso I).
4. Segundo a inicial, o procedimento licitatório de responsabilidade do município apresentou diversas irregularidades, ante a inobservancia de preceitos legais de regência, contidos na Lei nº 8.666/93, além de direcionamento do certame e superfaturamento do objeto contratado.
5. O juízo a quo entendeu que tais irregularidades configuraram meros vícios formais, não sendo aptas, por si só, a configurar situação de improbidade, ressaltando que somente se chegaria a tal conclusão se comprovado que os réus praticaram deliberadamente tais condutas para frustrar as regras da licitação. Prosseguindo, não verificou superfaturamento do preço pago pelo objeto contratado, baseando-se no fato de que a unidade adquirida é melhor do que a inicialmente prevista no Plano de Trabalho, que o cálculo estimado do prejuízo não veio acompanhado da respectiva metodologia adotada, que o valor era compatível com o de mercado daquela e que o próprio TCU acabou por dar por prestadas as contas. Mas a análise de todo o contexto volvido ao certame em questão denota fortes indícios de simulacro.
6. Tais irregularidades são todas de ordem formal, é verdade. Mas não se pode desconsiderar que são em grande número para um procedimento relativamente simples, como a carta convite. Como tudo se deu em exíguo lapso de tempo, vez que o Termo de Autuação do procedimento, a autorização do prefeito municipal, o edital de convite e o parecer da assessoria jurídica, o aviso de licitação, a certidão de que afixada cópia do edital no átrio da Prefeitura e as respectivas cartas encaminhadas às empresas concorrentes, datam, todas, de 12/04/2004, pode-se concluir que tais irregularidades decorreram da incomum celeridade na condução do certame.
7. Estas circunstancias, conjugadas a outros elementos, notadamente a questão da modificação do Plano de Trabalho, que previa determinado tipo de veículo, para aquisição de outro de maior valor, ainda que melhor atendesse às necessidades da comunidade local, ocorreu sem a necessária autorização do poder concedente, como previsto no § 2º, da cláusula quinta do convenio. Considerando a celeridade imprimida ao procedimento, a providencia praticamente em nada alteraria o andamento do certame.
8. Também o prejuízo ao erário público ficou demonstrado. A própria empresa Pinesi Veículos Ltda., atualmente Priore Veículos, Peças e Serviços Ltda., em sua defesa preliminar, carreou informações a respeito do veículo, bem como a tabela da concessionária de preços de venda direto ao cliente final.
9. Nesta tabela se constata que o valor da Van 3300 RD então adquirida, para 01/04/2004, sem incidência de IPI e ICMS, ante a imunidade de que goza o município, era de R$ 53.475,00. O valor seria de R$ 64.805,00, se considerado o preço cheio, ou seja, com os impostos. Já o preço de referencia apontado pela Tabela Fipe, carreada aos autos por determinação do juízo, era de R$ 65.282,00, para maio/2004, sem os necessários descontos. Os valores, como visto, são muito aproximados e há que se tomar em conta que se referem a meses diferentes.
10. Prosseguindo, deve-se acrescentar ao valor do veículo a quantia destinada às modificações a serem realizadas com vistas a transformá-lo em uma ambulância. A União considerou um preço médio de R$ 9.112,22 e o efetivamente cobrado pela empresa foi de R$ 14.430,00. Ainda que considerado este segundo valor, chega-se a um total de R$ 67.905,00, valor inferior aos R$ 78.780,00. Assim, houve um prejuízo mínimo aos cofres públicos de R$ 10.875,00.
11. Chama a atenção, ainda, o fato de as três propostas terem apresentado preços muito similares, R$ 78.780,00, R$ 79.100,00 e R$ 79.800,00 e todos mais de R$ 10.000,00 acima do preço de mercado. Isso, aliado ao depoimento da testemunha arrolada pela empresa Pinesi Veículos Ltda., vencedora do certame, Ana Cícera de Oliveira, funcionária da Greencar Veículos Especiais, que apresentou uma das propostas (R$ 79.800,00), reforça a existência de conluio e fraude à licitação. Com efeito, segundo a testemunha afirmou a empresa não fornece os veículos, só faz as adaptações.
12. Também consta dos autos resposta encaminhada pela empresa Greencar Veículos Especiais Ltda., a propósito de ofício encaminhado pela Advocacia da União, no qual afirma que não participou do processo licitatório Carta Convite nº 30/2004, do Município de Regente Feijó/SP, o qual tinha por finalidade a aquisição de um veículo adaptado (unidade móvel de saúde - ambulância).
13. Não se desconhece que foi carreada a respectiva proposta com a assinatura do responsável, de fato muito assemelhada à aposta no referido ofício, como salientado pelo juízo monocrático. Ocorre que, ainda que ele tenha efetivamente assinado tal documento, não haveria como fornecer o veículo, já que só faz as alterações. E certamente não era mesmo a intenção, ao responder negativamente à Advocacia da União quanto à sua participação na licitação em questão.
14. O quadro apresenta, portanto, fortes colores de conluio e fraude, voltados ao direcionamento da licitação, posto que não houve efetiva concorrência, o que permitiu o superfaturamento do bem adquirido, frustrando a licitude do certame, com prejuízo dos cofres públicos.
15. Cabe salientar que, em se tratando de ação de improbidade, geralmente improvável a prova plena e cabal da prática, devendo o julgador pautar-se em todo o arcabouço probatório contido nos autos.
16. No caso concreto, revelado nitidamente o dolo dos requeridos Marco Antonio Pereira da Rocha, Savany de Castro Néri, Solange Malacrida Brocca, César Munhoz e Pinesi Veículos Ltda. É que, sem a participação e concorrência de todos, prefeito, membros da comissão de licitação e empresa vencedora, não seria possível alcançar o desiderato pretendido. E a atuação conjunta decorre de todas essas nuances que permearam a licitação: várias irregularidades formais, celeridade incomum, alteração do Plano de Trabalho, preço acima do mercado, proposta apresentada por empresa que não fornece veículos da espécie.
17. No mínimo, os membros da comissão de licitação, Savany, Solange e César, agiram com negligencia, já que deveriam observar tais nuances e adotar as providencias cabíveis a fim de evitar o prejuízo sofrido.
18. Já em relação aos técnicos do Ministério da Saúde, Julio Augusto Lopes M. Rolim, Marlene Aparecida Mazzo e Almayr Guisard Rocha Filho, a par de não ter havido recurso em face das suas absolvições, é certo que não se constata efetiva participação na fraude pelo só fato de terem sido aprovadas as contas prestadas. A conclusão decorre da aparência de legitimidade que se buscou conferir ao procedimento licitatório, além de ter sido solicitada diligencia para que o município esclarecesse a alteração do objeto adquirido, divergente daquele contido no Plano de Trabalho, restando aceitável a justificativa de que melhor atendia ao interesse da comunidade local.
19. As infrações tratadas nos arts. 9º e 10, da Lei nº 8.429/92, além de dependerem da comprovação de dolo ou culpa por parte do agente supostamente ímprobo, podem exigir, conforme as circunstâncias do caso, a prova de lesão ou prejuízo ao erário.
20. Nos termos da jurisprudência pacífica do STJ, os atos de improbidade administrativa, descritos no art. 11 da Lei n. 8.429/92, dependem da presença do dolo genérico, mas dispensam a demonstração da ocorrência de dano para a Administração Pública ou enriquecimento ilícito do agente.
21. Evidenciada a intenção dos réus de burlar o procedimento licitatório, direcionando o resultado do certame, em detrimento do erário público e constatado prejuízo aos cofres públicos, incide o art. 10, caput e incisos V e VIII, e art. 11, inciso I, ambos da Lei nº 8.429/92.
22. Quanto à questão do enriquecimento ilícito, mesmo em face do valor superfaturado, não se tem provas de sua efetiva destinação e a quem ou em que percentual, de sorte que prejudicada a aplicação do art. 9º, da Lei nº 8.429/92, sob pena de caracterizar a responsabilidade objetiva.
23. Apelo da União e remessa oficial, a que se dá parcial provimento, para reconhecer a prática de atos de improbidade administrativa por parte de Marco Antonio Pereira da Rocha, Savany de Castro Néri, Solange Malacrida Brocca, César Munhoz e Pinesi Veículos Ltda., incidindo o disposto no art. 10, caput e incisos V e VIII, e art. 11, inciso I, ambos da Lei nº 8.429/92, nos termos da fundamentação. Os requeridos são condenados ao ressarcimento integral do dano ao erário público, pro rata, a ser revertido aos cofres da União e do Município na proporção de suas contrapartidas no convenio. Além disso, ficam suspensos os direitos políticos de Marco Antonio por três anos, devendo arcar com multa civil de R$ 3.000,00 (três mil reais); Sanany, Solange e Cesar, devem pagar multa civil de R$ 2.000,00 (dois mil reais), cada qual; e à empresa Pinesi Veículos Ltda, atual Priore Veículos, Peças e Serviços Ltda., aplica-se multa civil de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), além da proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, pelo prazo de três anos. O ressarcimento aos cofres da União equivale a diferença entre o valor pago e o de mercado, considerado o cálculo já demonstrado no corpo desta decisão, qual seja, R$ 10.785,00 (dez mil, setecentos e oitenta e cinco reais), e deverá ser corrigido monetariamente, desde o evento danoso (ato ilícito), conforme entendimento pacífico do C. STJ (REsp 1336977), nos moldes da Resolução nº 267/2013 do Conselho da Justiça Federal, que aprovou o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, já contemplando os ajustamentos decorrentes do quanto decidido nas ADI's 4357 e 4425, especialmente quanto a inconstitucionalidade por arrastamento da Lei nº 9.494/97 retornando ao panorama anteacto, qual seja, taxa SELIC nos termos da art. 39, § 4º, da Lei n. 9.250, de 26.12.95, conforme assentado pelo C. STJ, no REsp 1.270.439, em sede de recurso repetitivo, sendo vedada a incidência cumulada dos juros de mora e correção monetária. (APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0017655-79.2008.4.03.6112/SP-2008.61.12.017655-5/SP- RELATOR: Desembargador Federal CARLOS MUTA-Voto lavrado pelo Juiz Federal Convocado ROBERTO JEUKEN)

Também em caso semelhante, assim decidiu a Primeira Turma do Tribunal Regional da 5ª Região:


CONSTITUCIONAL, PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÕES. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO. APLICABILIDADE DA LEI Nº 8.429/92 AOS AGENTES POLÍTICOS. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. AQUISIÇÃO DE UNIDADES MÓVEIS DE SAÚDE PARA FORTALECIMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS). BURLA AO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO LICITATÓRIO. SIMULAÇÃO E DIRECIONAMENTO DA LICITAÇÃO. IRREGULARIDADE NA DESCRIÇÃO DO OBJETO NO EDITAL. AUSÊNCIA DE PESQUISA DE PREÇOS DE MERCADO. SUPERFATURAMENTO. DINÂMICA FRAUDULENTA. SIMILITUDE EM RELAÇÃO AO CONTEXTO DA "OPERAÇÃO SANGUESSUGA". ARTS. 10 E 11 DA LEI Nº 8.429/92. ELEMENTO SUBJETIVO (DOLO). DEMONSTRAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. ATENDIMENTO AOS DITAMES DO ART. 12 DA LEI Nº 8.429/92 E AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. DESPROVIMENTO DOS RECURSOS. 1. Apelações interpostas pelos réus contra sentença de procedência do pedido de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada com vistas à condenação dos demandados, ex-Prefeito e membros da Comissão de Licitação do Município de Ingá/PB, por graves irregularidades em procedimentos licitatórios - notadamente, direcionamento dos certames com frustração da concorrência (simulação) e superfaturamento -, destinados à aquisição dos bens objeto dos Convênios nº 551/2004 e 554/2004 (unidades móveis de saúde equipadas, uma delas com equipamentos odontológicos), firmados entre a Edilidade e a União/Ministério da Saúde para o fortalecimento do SUS. 2. Se a petição inicial descreve com suficiência as condutas imputadas a cada um dos réus, qualificando-as de ímprobas, por subsunção a tipos inscritos na Lei nº 8.429/92, em cujas penas a parte autora pede a condenação dos demandados, não há como chamá-la de inepta. Rejeição da preliminar de inépcia da petição inicial. 3. "Esta Corte Superior admite a possibilidade de ajuizamento de ação de improbidade em face de agentes políticos, em razão da perfeita compatibilidade existente entre o regime especial de responsabilização política e o regime de improbidade administrativa previsto na Lei n. 8.429/92, cabendo, apenas e tão-somente, restrições em relação ao órgão competente para impor as sanções quando houver previsão de foro privilegiado ratione personae na Constituição da República vigente" (STJ, 2T, REsp 1282046/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES,julgado em 16/02/2012, DJe 27/02/2012). "A Corte Especial do STJ, no julgamento da Rcl 2.790/SC (Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 4.3.2010), pacificou o entendimento de que os agentes políticos podem ser processados por seus atos pela Lei de Improbidade Administrativa (8.429/92)" (STJ, 1T, AgRg no AREsp 46.546/MA, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, julgado em 14/02/2012, DJe 28/02/2012). Rejeição da preliminar de inaplicabilidade da Lei nº 8.429/92 aos agentes políticos. 4. Na sentença estão especificadas, com clareza, as razões pelas quais o Juízo a quo entendeu materializada a improbidade administrativa, no tocante à ação/inação conivente de todos os réus, de modo que não procede a afirmação dos apelantes de que, por lacuna do decisum nesse detalhamento, não teriam conseguido se defender, apropriadamente, sendo cerceados nesse direito. Tanto é verdade que conseguiram se defender, que interpuseram extensas apelações, investindo contra a aquilatação feita pelo Julgador de Piso. Rejeição da preliminar de cerceamento do direito de defesa. 5. In casu, tem-se os principais aspectos a serem realçados: a) em 1º/07/2004, a Edilidade firmou com a União/Ministério da Saúde o Convênio nº 551/2004, tendo por objeto "dar suporte técnico e financeiro para aquisição de unidade móvel de saúde, visando ao fortalecimento do Sistema Único de Saúde - SUS", no valor de R$112.000,00 (contrapartida de R$4.000,00). Segundo parecer técnico de análise da proposta municipal, exarado pela Coordenação Geral de Investimentos em Saúde do Ministério concedente, a unidade móvel de saúde deveria ser do tipo unidade odontológica e deveria estar equipada, inclusive, com um raio x e um equipamento de ultrassom odontológico, imposição que se agregou ao contrato de trabalho. Para o cumprimento do objeto conveniado (aquisição de unidade móvel de saúde odontológica equipada), foi realizada uma tomada de preços (nº 002/04). Observando-se o edital da tomada de preços, depreende-se uma primeira irregularidade, qual seja, a de que o objeto conveniado não foi descrito em sua inteireza. Outro defeito - o mais grave - na licitação foi a falta de pesquisa de preços a servir de base aos trabalhos da comissão de licitação. Estranhamente, retiraram o edital na Prefeitura, em Ingá/PB, em datas bem próximas (04 e 07.01.2004), apenas duas empresas, uma do Paraná (DELTA), outra do Mato Grosso (PLANAM), apenas tendo comparecido, contudo, para participar da licitação a segunda, que restou vencedora, oferecendo a quantia de R$115.950,00 (valor quase idêntico ao dos recursos repassados). Em vistoria in loco pelo Ministério da Saúde, acerca do adimplemento do objeto do convênio, constatou-se a aquisição do bem sem o raio x e o aparelho de ultrassom odontológico, ou seja, que a "unidade móvel adquirida com recursos do convênio não está em conformidade com a especificação descrita no Plano de Trabalho aprovado", adicionando-se que "a unidade móvel foi adquirida, e está sendo utilizada com comprometimento dos serviços, haja vista a não aquisição dos equipamentos já citados". A fiscalização ainda consignou: "O preço praticado com a execução do convênio está acima do aprovado pelo Ministério da Saúde, tendo em vista que os recursos conveniados foram utilizados em quase sua totalidade, isto é, o bem foi adquirido por R$115.950,00 [...] sem no entanto ter sido adquiridos 01 Aparelho de Raio X e 01 Ultra-som Odontológico, previstos no Plano de Trabalho aprovado"; b) na mesma data, 1º.07.2004, a Edilidade subscreveu com a União/Ministério da Saúde o Convênio nº 554/2004, tendo por objeto "dar apoio técnico e financeiro para aquisição de unidade móvel de saúde, visando ao fortalecimento do Sistema Único de Saúde - SUS", no valor de R$80.000,00 (contrapartida de R$2.400,00). Para o cumprimento do objeto conveniado (aquisição de unidade móvel de saúde equipada), foram realizados dois convites (nº 22 e nº 23), a despeito de, nos termos da lei, considerado o valor tomado por base para a compra, ser o caso de tomada de preços. Por conseguinte, uma primeira grave impropriedade no procedimento adotado no caso do convênio em alusão, correspondeu ao fracionamento da aquisição a efetivar, fugindo-se, em decorrência, da modalidade licitatória adequada ao caso, que imporia, inclusive, níveis mais rigorosos de publicidade. Sequer se justificou a razão pela qual se procedeu à fragmentação do objeto, fracionamento esse, ressalte-se, que não foi adotado no caso do convênio antes tratado. Adicionado a este problema, tem-se, outro, igualmente grave, consistente na ausência de identificação das empresas supostamente pesquisadas para a formação dos preços de base da atuação da comissão do processo licitatório. Do Convite nº 22/2004, para a compra de veículo tipo van, adaptado a atendimento médico, participaram, por terem sido convidadas da Edilidade, as empresas PLANAM (do MT), DELTA (do PR) e ESTEVES & ANJOS (do RJ), ganhando a "competição" a primeira, com o oferecimento do valor de R$68.700,00. Do Convite nº 23/2004, para a aquisição de equipamentos médicos e assessórios para o veículo, participaram, por terem sido convidadas da Edilidade, as empresas UNISAU (da BA), FRONTAL (do MT) e ADILVAN (do MT), ganhando a "competição" a segunda, com o oferecimento do valor de R$13.700,00. Coincidentemente, somando-se R$68.700,00 a R$13.700,00, chega-se a R$82.400,00, ou seja, exatamente ao valor do convênio. Em vistoria in loco pelo Ministério da Saúde, acerca do adimplemento do objeto do convênio, em março/2005, ficou dito que o bem conveniado foi adquirido; c) a Controladoria Geral da União, em conjunto com o Departamento Nacional de Auditoria do SUS, confirmou as irregularidades mencionadas (e outras), quanto ao Convênio nº 551/2004 ("Ausência de comprovação de pesquisa de preço anterior à realização do certame"; "Edital publicado sem detalhamento do objeto a ser adquirido"; "Aquisição de Unidade Móvel Odontológica, com prejuízo ao Erário") e ao Convênio nº 554/2004 ("Nas declarações de pesquisa de preços realizadas pelo Presidente da Comissão de Licitação não estão identificadas as empresas pesquisadas, consta apenas a discriminação do objeto e os valores de R$74.000,00 (Convite nº 22/04) e R$16.000,00 (Convite nº 23/04)"; "Fracionamento do objeto em dois certames na modalidade convite com fuga da modalidade tomada de preços"; "Houve falhas na formalização dos processos licitatórios, tendo em vista que os mesmos não foram devidamente autuados, protocolados e numerados [...]"; "O Convenente não aplicou os recursos repassados pelo Fundo nacional de Saúde/Ministério da Saúde no mercado financeiro [...]"; "Aquisição de Unidade Móvel de Saúde, com prejuízo ao erário"); d) além dos cálculos feitos pela Controladoria Geral da União de prejuízo estimado pela aquisição das duas unidades móveis de saúde em tela, por sobrepreço, o Setor Técnico-Científico do Instituto Nacional de Criminalística do Departamento da Polícia Federal, igualmente, apurou superfaturamento, constando suas conclusões em laudos de exames contábeis que passaram, pelo devido contraditório das partes, persistindo íntegros em sua aptidão probatória. Segundo referidos laudos, no caso do Convênio nº 551/2004, considerados veículo e gabinete odontológico com seus equipamentos, houve sobrepreço de R$23.930,91; ao passo que, no caso do Convênio nº 554/2004, apenas o veículo (não os equipamentos) foi adquirido com sobrepreço de R$14.715,00; e) dos depoimentos dos réus, destacam-se: quanto ao réu ANTÔNIO, ex-Prefeito, procurou a todo custo desvincular as licitações em comento do contexto da chamada "Operação Sanguessuga" (mas os procedimentos adotados pelo Município de Ingá/PB são absolutamente idênticos aos que foram narrados como próprios à organização criminosa desbaratada pela Polícia Federal, na qual envolvidas exatamente as pessoas jurídicas que venceram os certames em análise, cabendo notar que, mesmo para a hipótese de o Município de Ingá/PB não ter sido citado nas investigações referenciadas, as ações/inações de que ora acusados os agentes públicos são passíveis de responsabilização por improbidade administrativa); disse que a participação das empresas "independe da gente" (isso poderia até valer para a tomada de preços, mas não para os convites) e que, quanto aos convites, teriam sido convidadas pela Edilidade aquelas empresas por indicação de "colegas" (outros gestores públicos) (essa "indicação" confirma o contexto); afirmou que, por ausência de recursos informáticos, não tinham como se resguardar de fraudes (impossível acreditar nessa versão considerando-se que os fatos remontam a 2004); não soube explicar a razão de as empresas participantes das licitações serem de tão longe, de outra região mesmo do país; quanto ao réu FLÁVIO, ex-Presidente da Comissão de Licitação, mostrando-se bastante desembaraçado (e, pois, com plena capacidade de compreensão do procedimento licitatório e de suas exigências), asseverou que o fato de as empresas serem de outras regiões do país, de fato, chamou sua atenção, mas não se ateve a isso (ou seja, poderia ter tomado alguma medida preventiva, mas optou pela inação); que, realmente, não foi realizada pesquisa de preços (assim, a Administração Pública ficou sem o parâmetro de análise das ofertas), mormente porque tal pesquisa, a seu ver, não se inseria dentro de suas atribuições (mas, ainda que se compreendesse que essa atribuição não era da comissão de licitação - com o que não se pode concordar, haja vista a serventia da pesquisa de preços -, o procedimento não poderia ter seguido sem que os membros da Comissão exigissem do agente público a quem competia a providência, o seu cumprimento); que discutiu com os demais membros acerca do fracionamento do objeto de um dos convênios, optando por fracionar, porque isso se afigurava o melhor para a Administração Pública (o réu, contudo, não comprovou nem a discussão, nem porque aquela era a estratégia mais vantajosa para o ente público); quanto ao réu OSMAR, membro da Comissão de Licitação, acentuou que todos os membros respondiam por todos os atos da comissão (portanto, todos devem ser responsabilizados pelas ações/omissões danosas), bem como não se recordar o motivo pelo qual não teria sido feita pesquisa de preços (assim, confirmou a lacuna), além de referir que empresas de fora não poderiam ser impedidas de participar (se, por um lado, isso é verdadeiro, por outro não exime os membros da comissão de apurarem eventuais fatos que lhes parecerem estranhos); quanto ao réu NESTOR, não lembrou de qualquer realce acerca do endereço das empresas, nem de pesquisa de preços (ou seja, tem-se mais uma confirmação da negligência com que se tratou os procedimentos em questão), negou conhecimento em licitação e reportou-se à chancela de assessoria aos atos da comissão (mas a manifestação da assessoria a que se reportou foi pro forma e sem efeito vinculante, não isentando de responsabilidade os membros da Comissão); quanto à ré SILVIA, seu depoimento nada acrescentou. 6. Esse quadro fático-probatório comprova as imputações feitas pelo autor. O ex-Prefeito, gestor da unidade e ordenador de despesa, chancelou licitações "simuladas", formalmente incorretas e com sobrepreço, adjudicando seus objetos às empresas "vencedoras". Para tanto, contou com a conivência dos membros da Comissão de Licitação, que, cada qual em sua posição, deixaram de realizar pesquisa de preços e deram curso a certames viciados, formal e materialmente, em afronta aos dispositivos da Lei nº 8.666/93. 7. Correto o enquadramento dado pelo Juízo sentenciante: art. 10, V, VIII e XII, e art. 11, I, da Lei nº 8.429/92. Quanto ao elemento subjetivo, é cediço que o STJ pacificou que para a configuração dos tipos do art. 10 basta a existência de culpa, mas para a materialização dos tipos inscritos no art. 11, exige-se o dolo. In casu, o dolo é manifesto, consoante destacado pelo Julgador a quo, mormente pelo procedimento adotado com o claro intuito de dificultar a apuração, a exemplo do incabível informalismo conferido aos trâmites da licitação. Mesmo que assim não fosse - isto é, ainda que o dolo não estivesse revelado pelo contexto dos fatos e das provas -, persistiria hígida a condenação com lastro no art. 10 da Lei nº 8.429/92, ante a, para dizer o mínimo, negligência no trato da coisa pública. 8. As sanções impostas pelo Julgador a quo mostram-se harmoniosas, em relação aos preceitos legais (art. 12 da Lei nº 8.429/92) e aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade: a) para o réu ANTÔNIO: multa civil de R$5.000,00; suspensão dos direitos políticos por 5 anos; e proibição de contratar com o Poder Público e de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário pelo prazo de 5 anos; b) para os réus FLÁVIO, SÍLVIA, NESTOR e OSMAR: multa civil de R$3.000,00; e proibição de contratar com o Poder Público e de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário pelo prazo de 5 anos. Quanto à sanção de ressarcimento do dano, também foi aplicada, nos seguintes termos: "I - Quanto aos réus ANTÔNIO [...], FLÁVIO [...], NESTOR [...] e SILVIA [...], que participaram da execução do convênio nº 551/2004, ressarcimento integral do dano, solidariamente, no valor de R$ 23.930,91 (vinte e três mil novecentos e trinta reais e noventa e um centavos);/II - Quanto aos réus ANTÔNIO [...], FLÁVIO [...], NESTOR [...] e OSMAR [...], que participaram da execução do convênio nº 554/2004, ressarcimento integral do dano, solidariamente, no valor de R$ 14.715,00 (catorze mil setecentos e quinze reais)". 9. Pelo desprovimento das apelações.(AC 200982010029413, Desembargador Federal Francisco Cavalcanti, TRF5 - Primeira Turma, DJE - Data::18/06/2014 - Página::224.)

DA TIPIFICAÇÃO E DA RESPONSABILIZAÇÃO POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA


O caput do artigo 37 da Carta Magna estabelece que: "A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (...)". O seu § 4º prevê a punição por atos de improbidade administrativa a serem especificados em lei (no caso, a Lei nº 8.429/92), sem prejuízo da ação penal.


A Lei de Improbidade Administrativa nº 8.429/92 disciplinou as condutas consideradas desonestas e as sanções correspondentes, tanto no campo interno da administração pública como em relação a particulares que induzirem ou concorrerem para a prática de ato de improbidade ou dele se beneficiarem sob qualquer forma, direta ou indiretamente, consoante dispõe o seu artigo 3º, o qual prevê que suas disposições são aplicáveis, no que couber, também àqueles que não são membros do poder público.


O dever geral de probidade administrativa, contemplado pela Lei Maior no mencionado artigo 37, impõe conduta consoante os princípios da ética na gestão da coisa pública, notadamente a boa fé, a lealdade, a moralidade, o respeito e o zelo pelo patrimônio público. Tem-se, portanto, o desvio de conduta sempre que o agente público se afasta desses padrões, para almejar vantagens materiais ilícitas e/ou causar prejuízo ao erário.


Especificamente com relação à licitação, invoca-se inciso XXI do artigo 37 da Carta Magna na parte em que destaca que: " XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.".


A Lei nº 8.429/92, na esteira do disposto no artigo 37 e seu § 4º da Constituição Federal, enumera as condutas dos agentes públicos que configuram atos de improbidade administrativa, discriminados entre os que: importem em enriquecimento ilícito (art. 9º), causem prejuízo ao erário (art. 10) e atentem contra os princípios da administração pública (art. 11). Impõe aos responsáveis, independentemente das sanções penais, civis e administrativas, as cominações que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato (art. 12, caput), considerada a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente (art. 12, parágrafo único).


In casu, foi constatada a incidência do artigo 10, caput e inciso VIII, que dispõe:


"Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
(...)
VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente; (Vide Lei nº 13.019, de 2014) (Vigência)".

Conforme explicitado anteriormente, restou comprovado o direcionamento da licitação com o intuito de favorecer a empresa Delta Veículos Especiais Ltda, o que culminou no superfaturamento do objeto e prejuízo ao erário, perpetrado por Donizetti Borges Barbosa com a participação voluntária e consciente dos corréus Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima.


Outrossim, ainda que não tivessem conhecimento dos desígnios dos demais corréus, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima assumiram o encargo de membros da comissão permanente, mas não se desincumbiram das responsabilidades inerentes, de modo que propiciaram o êxito da realização das condutas.


Assim, todos os réus infringiram o artigo 10, caput e inciso VIII, da LIA. Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima respondem por dolo, ao passo que Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima por culpa.


É inegável, portanto, que incorreram na prática de graves atos de improbidade, porquanto fizeram tábua rasa das disposições constitucionais e das leis de regência em matéria de licitação, que preveem a observância do princípio da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração, bem como o processamento e julgamento em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, em relação às quais estavam obrigados a obedecê-las.


Para Marçal Justen Filho, improbidade administrativa: "consiste na ação ou omissão violadora do dever constitucional de moralidade no exercício da função pública, que acarreta a imposição de sanções civis, administrativas e penais, de modo cumulativo ou não, tal como definido em lei", ou seja, que "pode envolver tanto uma atuação ativa como uma manifestação omissiva", cuja configuração "pressupõe um elemento subjetivo", que, como regra, "se aperfeiçoa mediante um elemento doloso, admitindo-se a forma culposa como exceção" (Curso de Direito Administrativo, 8ª ed. rev., ampl. e atual.. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2012, p. 1010).


O Superior Tribunal de Justiça apresenta a seguinte orientação:


"O bem jurídico que a Lei de Improbidade busca salvaguardar é, por excelência, a moralidade administrativa, que deve ser, objetivamente considerada: ela não comporta relativização a ponto de permitir só um pouco de ofensa. Daí não se aplicar o princípio da insignificância às condutas judicialmente reconhecidas como ímprobas, pois não existe ofensa insignificante ao princípio da moralidade. Constata-se que, em nosso sistema jurídico, vige o princípio da indisponibilidade do interesse público, a que o Poder Judiciário também está jungido" (STJ, 2ª Turma, REsp 892.818, Rel. Ministro Herman Benjamin, j. 11.11.2008).

"Tanto a doutrina como a jurisprudência do STJ associam a improbidade administrativa à noção de desonestidade, de má-fé do agente público" (STJ, 1ª Turma, REsp 604.151/RS, Rel. p/ acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, DJU 08.06.2006).

"Ementa: (...).
3. Nos termos da jurisprudência do STJ, para que seja reconhecida a tipificação da conduta do réu como incurso nas previsões da Lei de Improbidade Administrativa, é necessária a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos arts. 9º e 11 e, ao menos, pela culpa, nas hipóteses do art. 10 que resulte dano ao erário.
4. Os atos de improbidade administrativa descritos no art. 11 da Lei nº 8.429/92 dependem da presença do dolo genérico, mas dispensam a demonstração da ocorrência de dano para a Administração Pública ou enriquecimento ilícito do agente"
(STJ, 2ª Turma, EDcl no AgRg no REsp 1.314.061/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, v.u., DJe 05.08.2013).

Cabe, portanto, responsabilizá-los por suas condutas ou omissões reprováveis. Incidem as sanções previstas no artigo 12 da Lei de Improbidade Administrativa.


No tocante à insurgência com a dosimetria da sanção, alega-se, em síntese: afronta aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade; a não consideração da lesividade e reprovabilidade dos atos praticados, bem como do respectivo interesse público; a incompatibilidade da reprimenda fixada com o desvalor da conduta; a falta de explicitação dos motivos da punição; a possibilidade da não cumulatividade; enriquecimento ilegal da administração decorrente do ressarcimento integral do dano, ante a prestação do serviço; ausência dos pressupostos para a indisponibilidade de bens; impossibilidade de prover seus sustentos, de familiares e dependentes, à vista da condenação.


DAS SANÇÕES DA LEI Nº 8.429/92


Preambularmente, convém recordar que os ilícitos do artigo 37, § 4º, da C.F., disciplinado nos artigos 9º a 11 da Lei de Improbidade Administrativa, não têm natureza penal. Veja-se o que leciona a Prof. Maria Sylvia Zanella de Pietro:


"A natureza das medidas previstas no dispositivo constitucional está a indicar que a improbidade administrativa, embora possa ter conseqüências na esfera criminal, com a concomitante instauração de processo criminal (se for o caso) e na esfera administrativa (com a perda da função pública e a instauração de processo administrativo concomitante) caracteriza um ilícito de natureza civil e política, porque pode implicar a suspensão dos direitos políticos, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento dos danos causados ao erário."
(DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 770-771)

O Supremo Tribunal Federal, quando apreciou a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.797, ocasião em que declarou inconstitucional a Lei nº 10.628/02, que havia acrescentado os §§ 1º e 2º ao artigo 84 do Código de Processo Penal para manter a competência de foro por prerrogativa de função mesmo após a cessação da função pública e para estendê-la às ações de improbidade, também deixou clara sua natureza civil:


EMENTA:
I a III. Omissis.
IV. Ação de improbidade administrativa: extensão da competência especial por prerrogativa de função estabelecida para o processo penal condenatório contra o mesmo dignatário (§ 2º do art. 84 do C. Pr. Penal introduzido pela L. 10.628/2002): declaração, por lei, de competência originária não prevista na Constituição: inconstitucionalidade. 1. No plano federal, as hipóteses de competência cível ou criminal dos tribunais da União são as previstas na Constituição da República ou dela implicitamente decorrentes, salvo quando esta mesma remeta à lei a sua fixação. 2. Essa exclusividade constitucional da fonte das competências dos tribunais federais resulta, de logo, de ser a Justiça da União especial em relação às dos Estados, detentores de toda a jurisdição residual. 3. Acresce que a competência originária dos Tribunais é, por definição, derrogação da competência originária dos juízos de primeiro grau, do que decorre que, demarcada a última pela Constituição, só a própria Constituição a pode excetuar. 4. Como mera explicitação de competências originárias implícitas na Lei Fundamental, à disposição legal em causa seriam oponíveis as razões já aventadas contra a pretensão de imposição por lei ordinária de uma dada interpretação constitucional. 5. De outro lado, pretende a lei questionada equiparar a ação de improbidade administrativa, de natureza civil (CF, art. 37, § 4º), à ação penal contra os mais altos dignitários da República, para o fim de estabelecer competência originária do Supremo Tribunal, em relação à qual a jurisprudência do Tribunal sempre estabeleceu nítida distinção entre as duas espécies. 6. Quanto aos Tribunais locais, a Constituição Federal - salvo as hipóteses dos seus arts. 29, X e 96, III -, reservou explicitamente às Constituições dos Estados-membros a definição da competência dos seus tribunais, o que afasta a possibilidade de ser ela alterada por lei federal ordinária.
V. omissis. - (destaquei)
(STF, ADI nº 2.797, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 15.09.2005)

A Lei de Improbidade Administrativa distingue três modalidades de atos de improbidade: a) enriquecimento ilícito (art. 9º); b) lesão ao erário (artigo 10º); e c) atentado contra os princípios da administração pública (art. 11). Em correlação com essa classificação, o artigo 12 estabelece nos incisos I, II e III as sanções respectivamente aplicáveis. Especificamente para o prejuízo ao erário, caso dos autos, dispõe:


Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações:
I - (...);
II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;
III - (...);
(...)
Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.

Extraem-se do mencionado dispositivo as seguintes penalidades:


1) - ressarcimento integral do dano.
2) - perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio.
3) - perda da função pública.
4) - suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos.
5) - pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano.
6) - proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios por cinco anos.

Houve, no entanto, importante divergência doutrinária entre os que entendiam que a legislação impunha a aplicação cumulativa dessas penas e aqueles para os quais era possível ao magistrado a dosimetria com base no parágrafo único. Sobre esse aspecto, destaco:


"Desde a edição da Lei nº 8.429/92, a doutrina e a jurisprudência pátrias têm debatido um importante aspecto ligado à aplicação das sanções: a aplicação cumulativa das sanções previstas no artigo 12.
Para parte da doutrina, a redação do art. 12 da LIA impõe a aplicação cumulada das sanções, não havendo margem para o juiz optar por infligir uma ou outra sanção.
Outros, contudo, entenderam que a LIA permite ao juiz, diante das circunstâncias de cada caso, avaliar a dose adequada das penas, decidindo quais devam ser aplicadas à espécie e em que medida, sob o manto dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade."
(ANDRADE, Adriano, MASSON, Cleber, ANDRADE, Landolfo. Interesses Difusos e Coletivos. 2ª Ed. São Paulo: Editora Método. p. 728)

Não obstante, assentou-se no Superior Tribunal de Justiça a orientação de que a aplicação não era necessariamente cumulativa:


ADMINISTRATIVO. LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. DISCRICIONARIEDADE DO JULGADOR NA APLICAÇÃO DAS PENALIDADES. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA N.° 07/STJ.
1. Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Estadual em face de ex-prefeito, por ato de improbidade administrativa, causador de lesão ao erário público e atentatório dos princípios da Administração Pública, consubstanciado na permissão a particulares de uso de bens imóveis públicos, sem permissão legal, enquanto do exercício do cargo eletivo.
2. As sanções do art. 12, da Lei n.° 8.429/92 não são necessariamente cumulativas, cabendo ao magistrado a sua dosimetria; aliás, como deixa entrever o parágrafo único do mesmo dispositivo.
3. O espectro sancionatório da lei induz interpretação que deve conduzir à dosimetria relacionada à exemplariedade e à correlação da sanção, critérios que compõem a razoabilidade da punição, sempre prestigiada pela jurisprudência do E. STJ. Precedentes: RESP 664856/PR, desta relatoria, DJ de 02.05.2006; RESP 507574/MG, Relator Ministro Teori Zavascki, DJ de 08.05.2006; RESP 513.576/MG, Relator p/ acórdão Ministro Teori Zavascki, DJ de 06.03.2006; RESP 291.747, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de  18/03/2002; RESP 300.184/SP, Relator Ministro Franciulli Netto, DJ de 03.11.2003 e RESP 505.068/PR, desta relatoria, DJ de 29.09.2003.
4 a 6- (omissis)
7. Recurso especial desprovido."
(STJ, RECURSO ESPECIAL Nº 631.301 - RS; Rel. MINISTRO LUIZ FUX; 1ª Turma; v.u.; DJ: 25/09/2006)

Para eliminar qualquer dúvida, o legislador adotou a jurisprudência daquela corte superior e editou a Lei nº 12.120/09 por meio da qual deu ao caput do artigo 12 a seguinte redação:


"Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato: (...)".

Ressalta-se a lição doutrinária a respeito:


"Forçoso concluir, portanto, que o legislador, em bom momento e com absoluta correção, pôs fim à controvérsia, admitindo ao juiz aplicar as sanções da LIA, isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade da conduta, a extensão do dano, o proveito patrimonial obtido pelo agente e outros parâmetros, sob o manto dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade".
(op. cit., pág. 729)

Em conclusão, o argumento de que as penas dos incisos I a III do artigo 12 devem ser necessariamente aplicadas de forma cumulativa está superado pela expressa disposição do caput de que "podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente", incluída pela Lei nº 12.120/09 em resposta ao debate que se estabelecera e em consonância com o entendimento do STJ.


In casu, porém, à vista da gravidade dos atos praticados pelos réus, conforme demonstrada anteriormente, com supedâneo no parágrafo único do artigo 12 da Lei nº 8.429/92, no que se refere à fixação das penas entendo que o juízo a quo houve-se bem. Cabe ressaltar que, ao estabelecê-las em patamar próximo ao mínimo legal, bem como ao optar pela cumulatividade, apontou as circunstâncias em que baseava sua decisão. Confira-se:


"Após a análise das condutas de cada um dos réus desta demanda, cumpre passar a fixação da pena, visto que todos os réus incorreram nas condutas tipificadas no artigo 10, inciso VIII da Lei n° 8.429/92, incidindo, portanto, nas penas previstas no artigo 12, inciso II, da referida Lei.
A questão que surge por ocasião das aplicações das sanções é se seria possível a não aplicação cumulativa das sanções elencadas na Lei. O Superior Tribunal de Justiça detém jurisprudência pacífica e consolidada na matéria, no sentido de que as sanções previstas no artigo 12 da Lei n° 8.429/92 não são necessariamente cumulativas, cabendo ao magistrado dosá-las com base no critério da razoabilidade.
Ocorre que, com a alteração da redação do artigo 12, pela Lei n° 12.120/09, tal posicionamento jurisprudencia1 se consolidou como sendo diretriz legal - norma cogente -, uma vez que na nova redação restou expresso que o responsável por ato de improbidade está sujeito às cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato. Portanto, há que se atentar a conduta individual de cada um dos réus nos certames licitatórios ao impor as sanções.
Em primeiro lugar, se assente que o critério para infligir as penas cominadas na Lei consta do parágrafo único do artigo 12, ou seja, deve-se levar em conta a extensão do dano causado e o proveito patrimonial obtido pelos agentes.
No caso em exame, as circunstâncias não são inteiramente desfavoráveis aos réus, uma vez que apesar dos certames terem sido dirigidos para o proveito de um esquema criminoso específico, a ambulância e o ônibus transformado serviram à população, conforme prova dos autos. Outrossim, não houve superfaturamento no que tange ao veículo "van" e, em relação ao ônibus transformado, o valor excedido não é de grande monta, ou seja, diante dos milhões desviados cotidianamente em detrimento do erário, não justifica que a dosagem das sanções, dentre as cominadas no inciso II, do artigo 12, fique em patamar distante do mínimo, ainda que em relação aos réus que agiram com dolo (DONIZETTI BORGES BARBOSA, MARIA ELISA MANCA e RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA).
Feito o registro, inicialmente, no que tange à pena de ressarcimento ao erário, há que se destacar que "o fato de o art. 12 da LIA assentar que as sanções poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente não tem o condão de afastar a obrigatória aplicação do ressarcimento do dano, sempre que isso ocorra", consoante ensinamento constante na obra "improbidade Administrativa - Lei n° 8.429/92 comentada", de autoria de Eurico Ferraresi, editora Método, 1ª edição (2011), página 142.
Nesse mesmo sentido, insta trazer à colação ementa de julgado do Superior Tribunal de Justiça, nos autos do RESP n° 1.184.897/PE, 2ª Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 27/04/2011, "in verbis":
ADMINISTRATIVO IMPROBIDADE DANO AO ERÁRIO. CULPA. IMPROBIDADE CONFIGURADA. RESSARCIMENTO. INSUFICIÊNCIA. APLICAÇÃO DAS SANÇÕES PROPRIAMENTE DITAS. NECESSIDADE. DOSIMETRIA A CARGO DO JULGADOR ORDINÁRIO.
1. Cuidam os autos de Ação de Improbidade Administrativa movida contra ex-prefeita do Município de Rio Formoso/PE, com base em apuração feita pelo Tribunal de Contas das seguintes irregularidades: não-aplicação de material adquirido para saneamento básico e recuperação das vias públicas; dispêndios representados pelo excedente embutido nos custos globais de obras; aquisição de insumos por preços maiores que os praticados no mercado na recuperação de casas populares e escolas; e gastos com material de construção e serviços sem destinação definida.
2 A instância ordinária julgou o pedido procedente em parte para condenar a ré ao ressarcimento do Erário no valor de R$ 25.000,00, deixando, porém, de lhe impor sanções pela prática de improbidade administrativa, ao fundamento de não ter havido comprovação de dolo, mas apenas negligência.
3. O art. 10 da Lei 8.429/1992, que censura as condutas ímprobas por dano ao Erário, admite a modalidade culposa. Precedentes do STJ
4. O ressarcimento não constitui sanção propriamente dita, mas sim conseqüência necessária do prejuízo causado. Caracterizada a improbidade administrativa por dano ao Erário, a devolução dos valores é imperiosa e deve vir acompanhada de pelo menos uma das sanções legais que, efetivamente, visam a reprimir a conduta improba e a evitar o cometimento de novas infrações. Precedentes do STJ.
5. A repercussão do dano, o elemento subjetivo do agente e outras particularidades do caso concreto devem ser avaliados e ponderados pelo julgador ordinário na dosimetria das sanções, aplicáveis cumulativamente ou não, à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
6. Recurso Especial provido, com o retomo do processo ao Tribunal de origem.
Portanto, todos os réus devem ser responsabilizados solidariamente pelo ressarcimento do dano que, conforme já consignado alhures, há que se basear no relatório da auditoria do DENASUS que apurou um prejuízo total de R$ 72.743,58, que, somando o saldo não executado do convênio no valor de R$ 11.180,00, gera um montante final de R$ 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos). Em relação a esse valor, o montante de R$ 61.725,86 deve ser restituído ao Fundo Nacional de Saúde e o montante de R$ 22.197,72 aos cofres do município de Apiaí, nos termos do que determina a parte final do artigo 18 da Lei n° 8.429/92 (fls. 139/140 do apenso II, volume 1).
O valor do dano objeto de ressarcimento (R$ 83.921,58) deve ser acrescido de correção monetária desde a data da elaboração da estimativa feita pelo DENASUS, isto é, desde 12/06/2007, correção que será aplicada na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, nos termos da Resolução n° 134 do CJF de 2010. Em relação aos juros moratórios, entendo que deverão incidir desde a data do evento danoso (disponibilização dos recursos para as empresas fornecedoras do ônibus transformado), incidindo no percentual de 1% (um por cento) ao mês.
Por outro lado, há que se delimitar as demais sanções aos réus, destacando-se que a pena de perda de bens auferidos ilicitamente não se aplica ao caso em comento.
No que tange a DONIZETTI BORGES BARBOSA, MARIA ELISA MANCA e RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA admissível a decretação da perda de função pública, uma vez que os três agiram com dolo. A postura de aceitarem participar de licitações totalmente dirigidas demonstra que utilizaram suas funções públicas sem aquilatar a necessidade de observância dos mais comezinhos princípios que devem nortear a conduta de agentes públicos.
Neste ponto, há que se destacar que "a sanção de perda da função pública somente se efetiva com o trânsito em julgado da sentença, consoante previsto às expressas no parágrafo único do art. 20 da Lei n° 8.429/92. Até em razão dessa circunstância, forçoso reconhecer que a sanção de perda de função, cargo ou emprego atinge qualquer cargo. emprego ou função que o requerido esteja exercendo no momento do trânsito em julgado da sentença, ainda que se trate de cargo, emprego ou função distinto daquele em cujo exercício praticou o ato de improbidade. Além disso, mesmo que o requerido não esteja exercendo qualquer cargo, emprego ou função pública durante a tramitação do processo ou no momento publicação da sentença em cartório, ainda assim tem lugar a aplicação a ele da sanção de perda do cargo, emprego ou função. Nesse caso, referida sanção virá a alcançar qualquer cargo, função ou emprego público cujo exercício inicie depois da sentença, mas antes do seu trânsito em julgado", conforme ensinamento constante na obra "Improbidade Administrativa", de autoria de Pedro Roberto Decomain, editora Dialética, 1ª edição (2007), página 208.
Ao ver deste juízo, o raciocínio jurídico do autor acima mencionado e citado está consentâneo que os dispositivos legais que regem a lei de improbidade administrativa, havendo uma interpretação teleológica da lei, haja vista que o escopo da norma não é somente afastar o condenado por improbidade da função específica que ocupava, mas sim de qualquer função pública que venha a ocupar no momento da definitiva condenação.
Destarte, fica expresso que DONIZETTI BORGES BARBOSA, MARIA ELISA MANCA e RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA perderão os cargos, empregos ou funções públicas que ocuparem no momento do trânsito em julgado desta ação de improbidade.
No que tange aos réus VANDERLEI BORGES DE LIMA, ADILSON RODRIGUES DE ALMEIDA e LUIZ DO CARMO BATISTA ROSA entendo que não cabe neste caso a perda da função pública.
Com efeito, os três são servidores efetivos do executivo municipal, e não exerciam cargos em comissão ou temporários (ao contrário dos três outros réus que agiram dolosamente). Como agiram, ao que tudo indica, de forma culposa; além de terem uma posição subalterna na confecção da fraude, este juízo entende que a perda de suas funções públicas seria uma medida extrema e desproporcional em relação ao papel que desempenharam na confecção do ato ilícito de direcionamento da licitação (condutas meramente formais e anciliares).
Destarte, há que se delimitar a pena de cada qual.
No que tange a DONIZETTI BORGES BARBOSA, além do ressarcimento integral do dano ao erário e da perda da função pública, deve ser sancionado com a suspensão dos direitos políticos por cinco anos; proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos; e pagamento de multa civil de R$ 41.961,79 (quarenta e um mil, novecentos e sessenta e um reais e setenta e nove centavos) que corresponde à metade do valor do dano. A cumulação das penas se faz necessária por ser o principal artífice da fraude, sendo que a aplicação do maior valor da multa civil se faz necessária em razão de seu dolo que se revela superior em razão de seu maior poder de mando em relação à circunstância fática de improbidade descrita na petição inicial.
No que se refere à MARIA ELISA MANCA e a RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA além do ressarcimento integral do dano ao erário e da perda das funções públicas, devem ser sancionados com a suspensão dos direitos políticos por cinco anos; proibição de contratarem com o Poder Público ou receberem benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de cinco anos; e pagamento de multa civil cada qual no valor de R$ 20.980,89 (vinte mil, novecentos e oitenta reais e oitenta e nove centavos) que corresponde a um quarto do valor do dano. A cumulação das penas se faz necessária por terem agido de forma dolosa e incisiva, sendo que o inferior valor da multa civil decorre do menor poder de mando em relação à circunstância fática de improbidade descrita na petição inicial.
Por outro lado, no que tange a VANDERLEI BORGES DE LIMA, RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA, LUIZ DO CARMO BATISTA ROSA além do ressarcimento integral do dano ao erário, devem ser sancionados com a suspensão dos direitos políticos por cinco anos; proibição de contratarem com o Poder Público ou receberem benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de cinco anos; e pagamento de multa civil cada qual no valor de R$ 5.245,22 (cinco mil, duzentos e quarenta e cinco reais e vinte e dois centavos) que corresponde a 1/16 do valor do dano.
Ressalte-se que, nos termos do artigo 20 da Lei n° 8.429/92, a suspensão dos direitos políticos dos condenados só pode ser executada após o trânsito em julgado desta ação de improbidade.
Os valores das multas fixados em detrimento de todos os réus serão revertidos para o Fundo Nacional de Saúde, haja vista que tal espécie de sanção punitiva, ao ver deste juízo, deve gerar beneficio unicamente ao principal ente afetado pelo ato de improbidade. Tais valores devem ser acrescidos somente de correção monetária desde 19/05/2005 (data da nota de empenho do ônibus transformado).
Por fim, fixadas as sanções, há que se tecer considerações sobre a questão da indisponibilidade dos bens dos réus. Com efeito, o Ministério Público Federal requereu na petição inicial o bloqueio de bens dos réus para garantir o cumprimento das condenações (ressarcimento integral do dano e pagamento de multa civil), sendo que a decisão de fis. 32/34 se limitou ao arrolamento dos bens dos acusados (excetuando-se depósitos bancários e aplicações financeiras), haja vista que não havia provas de dilapidação patrimonial.
Este juízo, interpretando as disposições da lei de improbidade, e meditando mais detidamente sobre a questão, entende que a indisponibilidade de bens objeto do artigo 7° da Lei n° 8.429/92 pode atingir bens adquiridos pelos condenados antes ou depois da prática do ato de improbidade, não dependendo de estarem presentes hipóteses concretas e provadas de dilapidação patrimonial ou insolvência, haja vista a incidência do §4° do artigo 37 da Constituição Federal de 1988 e do § único do artigo 70 da Lei n° 8.429/92, que não fazem referência a quaisquer requisitos adicionais para a decretação de indisponibilidade.
Ou seja, ao ver deste juízo, a decretação da indisponibilidade de bens é possível independentemente de prova de dilapidação patrimonial. Entretanto, só pode recair, nos termos expressos do § único do artigo 7º da Lei n° 8.429/92, sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito. Em sendo assim, a indisponibilidade não pode servir para assegurar o ressarcimento da multa civil.
Destarte, no caso destes autos, em sendo proferida sentença condenatória de ressarcimento integral de bens, é de rigor que seja decretada a indisponibilidade de bens presentes e futuros dos réus, mormente aqueles que obraram com dolo. Este juízo entende, portanto, que primeiro há que se indisponibilizar os bens dos réus que incidiram em conduta dolosa, para que depois, caso não bastem para garantir o ressarcimento integral ao erário, sejam indisponibilizados os bens dos que agiram com culpa.
Portanto, determino que seja oficiado ao Cartório de Registro de Imóveis de Apiaí para que seja averbada a indisponibilidade de bens imóveis em nome dos réus DONIZETTI BORGES BARBOSA, MARIA ELISA MANCA e RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA; bem como seja anotada, através do sistema RENAJUD, a indisponibilidade de veículos em nome desses réus (inscritos nos CPF's sob o n° 795.566.208-34, 021.704.368-20 e 445.748.948-49).
Outrossim, determino bloqueio de aplicações financeiras dos réus DONIZETTI BORGES BARBOSA (CPF n° 795.566.208-34), MARIA ELISA MANCA (CPF n° 021.704.368-20) e RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA (CPF n° 445.748.948-49) através do sistema Bacen Jud, até o limite do ressarcimento do dano, isto é, R$ 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos).
Em relação ao parágrafo anterior, note-se que, "é lícita a decretação de indisponibilidade sobre ativos financeiros do agente ou de terceiro beneficiado por ato de improbidade. Precedentes: REsp 1078640/ES, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09/03/2010, DJe 23/03/2010; Resp 535.967/RS. Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/05/2009, DJe 04/06/2009"."


Constata-se que a sentença está bem fundamentada nos elementos de prova dos autos e, no que concerne à fixação das sanções, nada há que se reparar. Houve descrição das condutas de cada um dos réus, apontaram-se os motivos da cumulação das reprimendas, relativamente a Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima, bem como a valoração do pagamento de multa civil teve por base o grau de participação dos apelantes em relação à perpetração da improbidade. Considerou-se a conduta culposa dos apelantes que responderam nessa modalidade, o que resultou em dosimetria mais branda em relação aos demais.


DO RESSARCIMENTO INTEGRAL AO ERÁRIO


O ressarcimento integral do dano, previsto na primeira parte do inciso II do artigo 12 da Lei 8.429/92, pressupõe conduta dolosa ou culposa do agente que implica perda patrimonial. Já se demonstrou sua existência no caso sob exame, ao menos em relação ao convênio nº 1832/2003, elemento indispensável para a caracterização dos atos de improbidade descritos no artigo 10 da LIA, uma vez que a ação imputada aos réus, em princípio, acarretou não apenas prejuízo estimado de R$ 83.923,58, como, também, a realização da transformação em desacordo com o Plano de Trabalho aprovado e consequente inexistência de consultório pediátrico/médico e ginecológico, o que privou a população do atendimento almejado com o convênio. Note-se que o valor corresponde ao que foi pago a mais que o estimado de mercado, o que para o ônibus perfaz R$ 41.668,00 e para a transformação R$ 31.075,58, além do saldo não executado de R$ 11.180,00 (fl. 139 do apenso II, volume I). Assim, à vista da lesão aos cofres públicos, evidente a obrigação de reparação, a qual não tem natureza cominatória, mas constitui medida decorrente do ato lesivo, não impeditiva da incidência das reprimendas previstas para a espécie, a teor da jurisprudência do E.STJ. Confira-se:


..EMEN: AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM RAZÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RECURSO ESPECIAL. EX-PREFEITO. EXISTÊNCIA DE PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE NA CONDENAÇÃO. REPARAÇÃO DE DANO QUE NÃO SE CONFUNDE COM APLICAÇÃO DE PENA. LEGALIDADE DA OBRIGAÇÃO DE RESSARCIR O PREJUÍZO, ALÉM DA SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS. ARTIGO 12, I, DA LEI 8.429/92. RESTABELECIMENTO DA SOLUÇÃO APLICADA NA SENTENÇA. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais contra Elias Antônio Filho, ex-prefeito de Ijaci/MG, em que se discute o cometimento de ato de improbidade. Sentença julgando parcialmente procedente o pedido e condenando o demandado ao ressarcimento de 260 (duzentos e sessenta) sacos de cimento, além da cominação das penas de suspensão de direitos políticos e proibição de contratar com o Poder Público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de cinco anos. Interposta apelação pelo ex-prefeito, o TJMG deu-lhe parcial provimento por entender que as penalidades por atos de improbidade administrativa hão de ser aplicadas levando-se em conta a gravidade do ato punível e a amplitude de seus efeitos danosos, devendo ser mantida apenas a obrigatoriedade do reembolso. Recurso especial do Ministério Público de Minas Gerais alegando violação do art. 12 da Lei nº 8.429/92, em razão da proibição de aplicação isolada da obrigação de ressarcimento do dano pelo citado dispositivo, pois além de ressarcir o dano, o administrador ímprobo deve ser punido pela conduta desonesta. Contra-razões sustentando a necessidade de aplicação do princípio da proporcionalidade nas sanções previstas na Lei de Improbidade. Parecer do Ministério Público Federal pelo provimento do apelo. 2. Não se vislumbra nenhuma ilegalidade no fato de o recorrido, ex-prefeito, ser compelido a ressarcir o prejuízo econômico que causou ao Município de Ijaci/MG, do qual, note-se, era o chefe do Poder Executivo, além de receber sanções de direito de natureza pessoal, tais como a suspensão dos direitos políticos e as restrições no relacionamento com o Poder Público, medidas que o artigo 12, I, da Lei 8.429/92, com clareza, autoriza serem aplicadas. 3. Recurso especial conhecido e provido para o efeito de que sejam impostas ao recorrido as sanções de suspensão dos direitos políticos pelo prazo de cinco anos, a partir do trânsito em julgado, bem como a proibição de contratar com o Poder Público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, além da obrigação de ressarcir ao Erário o prejuízo de 260 (duzentos e sessenta) sacos de cimento, consoante o disposto às fls. da sentença. 558/559. ..EMEN:(RESP 200400757308, JOSÉ DELGADO, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJ DATA:08/05/2006 PG:00175 ..DTPB:.)

DA PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA


Registre-se que a Lei nº 8.429/92 prevê em seu artigo 12 a perda da função pública como forma de sanção, a qual tem como finalidade (Interesses difusos e coletivos esquematizado, ANDRADE, Adriano, MASSON, Cleber e LANDOLFO, Andrade, 2ª ed. ver., atual. e ampli., Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012, p. 720): [...] afastar dos quadros da Administração Pública todos os agentes que demonstraram pouco ou nenhum apreço pelos princípios regentes da atividade estatal, denotando uma deformidade de caráter incompatível com a natureza da função exercida. Constatada, portanto, a prática de ato que vá de encontro aos preceitos que a norteiam, a penalidade serve para impedir que continue a desempenhar qualquer atividade nociva à sociedade na qualidade de agente público. Dessa maneira, não há restrição de sua aplicação a uma determinada categoria de pessoas. (Improbidade administrativa, GARCIA, Emerson e ALVES, Rogério Pacheco, 6ª ed., rev. e ampl. e atualizada, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 552):


[...] a todos aqueles que exerçam, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades referidas no art. 1º da Lei nº 8.429/1992, o que alcança os que desenvolvam determinada atividade pública em razão de concessão, permissão, autorização etc., devendo tal vínculo ser dissolvido.
[...] A denominada "Lei de Improbidade" objetiva afastar da atividade pública todos os agentes que demonstram pouco apreço pelo princípio da juridicidade, denotando uma degeneração de caráter incompatível com a natureza da atividade desenvolvida, o que tornaria no mínimo insensata a restrição dos efeitos da lei quando patente sua pertinência, já que similares os substratos embasadores.
Por outro lado, a própria Lei nº 8.429/1992, em seu art. 2º, conferiu significado amplo à expressão agente público. Em razão disto, não é possível limitar a aplicação da sanção a determinada categoria quando a norma proibitiva é extensiva a todas. [...] ao ato ímprobo, qualquer que seja a atividade desempenhada ou a forma de investidura, pode ser aplicada a penalidade de exclusão, cognominada de "perda da função pública" pela Lei nº 8.429/1992.

Saliente-se que não é somente a função relacionada ao ato considerado ímprobo que deve ser cessada, mas toda atividade pública, justamente em razão da já mencionada falta de consideração dos agentes em relação aos princípios norteadores da administração. A finalidade da LIA é (GARCIA, Emerson e ALVES, Rogério Pacheco, obra citada, p. 553):


[...] erguer um óbice entre o agente e o conjunto de atos que normalmente deveria praticar para desempenhar uma obrigação que lhe fora imposta pela lei. Com isso, remove-se a obrigação (dever positivo) e abre-se espaço à abstenção (dever negativo), sempre com o propósito de preservar o interesse público, ao qual o ímprobo já demonstrara possuir pouco apreço.
Deve incidir, assim, sobre toda e qualquer função pública que esteja sendo exercida pelo agente ao tempo do trânsito em julgado da sentença condenatória, mesmo que diferente da exercida à época em que praticou o ato ímprobo. (ANDRADE, Adriano, MASSON, Cleber e LANDOLFO, obra citada, p. 720).

Ademais, a lei não estabelece qualquer prazo de suposta duração dessa medida repressiva, como fez com relação aos direitos políticos e à contratação com o poder público. A própria redação do dispositivo, do qual consta especificamente a palavra "perda", demonstra que não há que se falar em limitação temporal. Se o legislador almejasse qualquer tipo de restrição, teria utilizado outra expressão, como fez, reitere-se, quando indicou como sanções a suspensão (e não perda) dos direitos políticos de cinco a oito anos e a proibição de contratação com o poder público ou de recebimento de benefícios ou incentivos ficais pelo prazo de cinco anos. Em ambas resta evidente a pretensão de se impor um limite, o que não se verifica quanto à perda da função pública. Sobre o tema já dissertaram Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves (obra citada, p. 551), no sentido de que a penalidade objetiva dissolver a relação jurídica estabelecida entre o agente ímprobo e o poder público e, mais, afirmam que:


A dissolução é definitiva, não tendo delimitação temporal, logo, ressalvada hipótese de ser ajuizada eventual ação autônoma de impugnação, é insuscetível de reversão, consumando seus efeitos com o trânsito em julgado da sentença que impôs a sanção de perda da função.

Destarte, pelas mesmas razões descritas com relação à lei de improbidade, vê-se que o constituinte expressamente estabeleceu no dispositivo que os atos ímprobos importarão a "perda" da função pública e não a suspensão de seu exercício, por exemplo, como fez com relação à suspensão dos direitos políticos. Por outro lado, tal não significa que aqueles que são penalizados com a mencionada sanção não possam ingressar novamente na carreira pública em outra função (GARCIA, Emerson e ALVES, Rogério Pacheco, obra citada, p. 558):


A exclusão do agente não é fator impeditivo ao seu reingresso em outra função pública, desde que esteja no pleno gozo de seus direitos políticos e obtenha êxito no procedimento seletivo; assim, respeitadas possíveis restrições relativas à atividade a ser exercida, poderá o agente retornar à carreira pública, não havendo previsão de um período de impedimento. Previsões dessa natureza, aliás, acaso incorporadas ao regime jurídico da categoria, não poderão assumir contornos de perpetuidade, de modo a obstar indefinidamente o reingresso do agente. Entendimento contrário terminaria por afrontar o princípio geral de direito sancionador previsto no art. 5º, XLVII, b, da Constituição da República, direcionado à seara penal, mas plenamente aplicável à improbidade administrativa.

Destaque-se julgado do Superior Tribunal de Justiça a respeito:


ADMINISTRATIVO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - ART. 12 DA LEI 8.429/1992 - PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA - ABRANGÊNCIA DA SANÇÃO - PARÂMETROS: EXTENSÃO DOS DANOS CAUSADOS E PROVEITO OBTIDO - SÚMULA 7/STJ - RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM.
1. Hipótese em que o Tribunal de origem deixou de condenar o agente na perda da função pública, sob o fundamento de que o mesmo não mais se encontrava no exercício do cargo, no qual cometeu os atos de improbidade administrativa.
2. A Lei 8.429/1992 objetiva coibir, punir e afastar da atividade pública todos os agentes que demonstraram pouco apreço pelo princípio da juridicidade, denotando uma degeneração de caráter incompatível com a natureza da atividade desenvolvida.
3. A sanção de perda da função pública visa a extirpar da Administração Pública aquele que exibiu inidoneidade (ou inabilitação) moral e desvio ético para o exercício da função pública, abrangendo qualquer atividade que o agente esteja exercendo ao tempo da condenação irrecorrível.
4. A simples configuração do ato de improbidade administrativa não implica condenação automática da perda da função pública, pois a fixação das penas previstas no art. 12 da Lei 8.429/1992 deve considerar a extensão do dano e o proveito obtido pelo agente, conforme os parâmetros disciplinados no parágrafo único desse dispositivo legal. Precedente do STJ.
5. É indispensável que se faça uma valoração da extensão dos danos causados, bem como do proveito obtido pelo agente, ao aplicar a sanção de perda da função pública. Análise obstaculizada, em recurso especial, em razão da Súmula 7/STJ.
6. Recurso especial provido, para determinar o retorno dos autos à origem, para que se verifique a possibilidade de condenação do recorrido na perda da função pública.
(REsp 924.439/RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/08/2009, DJe 19/08/2009 - ressaltei)


DA SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS


Sobre a abrangência dos direitos políticos o Ministro Gilmar Mendes pontua que:


"A expressão ampla refere-se ao direito de participação no processo político como um todo, ao direito ao sufrágio universal e ao voto periódico, livre, direto, secreto e igual, à autonomia de organização do sistema partidário, à igualdade de oportunidade dos partidos. (...)
Os direitos políticos abrangem o direito ao sufrágio, que se materializa no direito de votar, de participar da organização da vontade estatal e no direito de ser votado. Como anota Romanelli Silva, no ordenamento jurídico brasileiro, o sufrágio abrange o direito de voto, mas vai além dele, ao permitir que os titulares exerçam o poder por meio de participação em plebiscitos, referendos e iniciativas populares"
(MENDES, Gilmar F., COELHO, Inocêncio M., BRANCO, Paulo G.G., CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL, 5ª ed., São Paulo: Saraiva, p. 855)

A Constituição Federal veda a cassação dos direitos políticos, mas admite sua perda ou suspensão nas situações que discrimina:


Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:
I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado;
II - incapacidade civil absoluta;
III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;
IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5º, VIII;
V - improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º. (grifei)

Fundada na autorização constitucional, a Lei nº 8.429/92 previu nos três incisos do seu artigo 12 diferentes períodos para a suspensão dos direitos políticos: oito a dez anos no caso de enriquecimento ilícito (inciso I); cinco a oito anos se houver lesão ao erário (inciso II); três a cinco anos se a condenação for por infração aos princípios da administração pública (inciso III). Extrai-se ainda dessa norma que todas as condutas ímprobas tipificadas nos artigos 9º ao 11 são passíveis de receber essa reprimenda e que o legislador limitou-se a estabelecer relação entre as que considerou mais graves e a duração da pena, sem qualquer referência à qualificação do agente.


DA PROIBIÇÃO DE CONTRATAR COM O PODER PÚBLICO OU RECEBER BENEFÍCIOS OU INCENTIVOS FISCAIS OU CREDITÍCIOS


A sanção em questão foi cominada nos três incisos do artigo 12 da LIA por prazo certo, mas com distintas graduações: o enriquecimento ilícito acarreta a proibição de contratar por dez anos, o dano ao erário por cinco e a violação de princípios por três. Cuida-se de punição que, por um lado, tem claro escopo de resguardar a administração do contato prejudicial com o agente ímprobo e, por outro, impõe sanção pecuniária indireta, na medida em que o impede de perceber vantagens dessa natureza de um ente estatal. Acerca da interpretação da extensão dessa penalidade, vale destacar a lição doutrinária:


"À proibição de contratar deve ser dispensada uma interpretação condizente com a extensão atribuída a essa sanção pelo texto legal, abrangendo todos os contratos passíveis de serem estabelecidos com o Poder Público, que sejam unilaterais ou bilaterais, onerosos ou gratuitos, comutativos ou aleatórios. A proibição de contratar implica, ipso iure, na proibição de participar de licitação.
À expressão Poder Público deve ser dispensada interpretação condizente com a teleologia da norma, alcançando a administração pública, direta ou indireta, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e não somente o sujeito passivo do ato de improbidade praticado pelo ímprobo. A aplicação dessa sanção resulta da incompatibilidade verificada entre a conduta do ímprobo e o vínculo a ser mantido com a administração pública, o que torna desinfluente qualquer especificidade em relação a esta, já que a sanção circunda a esfera subjetiva do ímprobo, a qual não é delimitada pelo ente que tenha sido lesado pelo ato de improbidade, tornando-se extensiva a todos os demais."
(GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco; IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, 6ª ed., Rio de Janeiro, Ed. Lumen Júris, p. 584/585)

Veja-se também o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:


ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SANÇÕES. COMINAÇÃO. PROIBIÇÃO DE CONTRATAR COM O PODER PÚBLICO E RECEBIMENTO DE INCENTIVOS FISCAIS OU CREDITÍCIOS. AGENTE PÚBLICO. VEDAÇÃO DECORRENTE DO CARGO. LEI 8.429/92. INEXISTÊNCIA DE CONDIÇÃO NAS SANÇÕES, QUE PODEM SER APLICADAS ISOLADA OU CUMULATIVAMENTE. COMINAÇÃO. COMPETÊNCIA DAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A Lei 8.429/92 prescreve, em seu art. 12, que as sanções poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente, a depender da gravidade do fato. Não há imposição de nenhuma condição para aplicar qualquer de suas modalidades, razão pela qual não há falar em inocuidade de proibição de contratar com o Poder Público ou de receber quaisquer tipos de benefícios fiscais ou creditícios com base na ocupação de cargo pelo agente infrator e o consequente impedimento de fruição de tais benesses.
2. É imperativo o reconhecimento da possibilidade de se aplicar aos agentes públicos a proibição de contratar com o Poder Público ou de receber quaisquer tipos de benefícios fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente.
3. A penalização é da competência das instâncias ordinárias, que, ao fazê-lo, sopesam proporcionalmente o ato praticado, a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente, cominando-lhe as sanções que se demonstram suficientes.
4. Recurso especial parcialmente provido para, afastando a fundamentação do aresto recorrido ora combatida, determinar ao juízo competente que analise o cabimento de aplicação das sanções de proibição de contratar com o Poder Público ou de receber quaisquer tipos de benefícios fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente. (grifei)
(REsp 1043842 / RS; Min. Arnaldo Esteves Lima; 1ª Turma. J. em 04/11/2010)

Evidencia-se que não se sustenta o argumento para deixar de aplicar a pena. A proibição é ampla e recai sobre qualquer contrato com o poder público e alcança todas as esferas da administração dos diferentes entes federados. Conforme a corte superior, sua aplicação depende apenas da gravidade do ato praticado, a qual, in casu, é manifesta e já foi salientada nos tópicos anteriores.


DA MULTA CIVIL


A multa civil está prevista expressamente como sanção em todos os incisos do artigo 12 da Lei nº 8.429/92, ou seja, o seu pagamento pode ser determinado em todas as situações de improbidade, quais sejam, enriquecimento ilícito, dano ao erário e violação a princípios da administração pública. Tem por objetivo desestimular a prática dos atos de improbidade administrativa, mediante a cominação de forte repercussão no patrimônio do agente infrator (ANDRADE, Adriano, MASSON, Cleber e LANDOLFO, obra citada, p. 725). De acordo com Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves (obra citada, p. 579-580), a penalidade de natureza pecuniária atinge o patrimônio do ímprobo, bem jurídico que é diluído com a aplicação da sanção, e apresenta muitas vantagens, entre elas o papel punitivo que desempenha sobre o infrator e o intimidativo sobre os demais agentes que potencialmente podem praticar novas infrações, além de ser um importante instrumento usado no combate à improbidade.


Assim, a aplicação da multa certamente traz mais benefícios sociais do que prejuízos, já que, como anteriormente explanado, além de punir o infrator, exerce papel intimidativo sobre os demais agentes que também potencialmente poderiam ter o mesmo comportamento.


DA INDISPONIBILIDADE DE BENS


A indisponibilidade patrimonial é medida de natureza cautelar e, em consequência, sua concessão demanda a presença do fumus boni iuris e do periculum in mora, nos termos do que dispõe o Código de Processo Civil, a partir de seu artigo 798, verbis:


Art. 798. Além dos procedimentos cautelares específicos, que este Código regula no Capítulo II deste Livro, poderá o juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação.
Art. 799. No caso do artigo anterior, poderá o juiz, para evitar o dano, autorizar ou vedar a prática de determinados atos, ordenar a guarda judicial de pessoas e depósito de bens e impor a prestação de caução.

A Lei n.º 8.429/92 prevê especificamente a indisponibilidade de bens no âmbito das ações civis públicas de improbidade administrativa, onde o periculum in mora está implícito no próprio comando legal, uma vez que visa a "assegurar o integral ressarcimento do dano", exigida do requerente tão somente a demonstração, em tese, da prática de conduta ímproba pelo requerido, com dano ao erário e/ou do enriquecimento ilícito do agente. Dispõe o referido dispositivo legal:


Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.
Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito.

O perigo da demora presumido para a constrição em debate nas ações civis públicas em que se apuram atos de improbidade é pacificamente reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça, consoante se observa dos acórdãos a seguir transcritos. Veja-se:


..EMEN: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. ART. 7º DA LEI 8.429/1992. VIOLAÇÃO CONFIGURADA. PERICULUM IN MORA PRESUMIDO. 1. Trata-se, originariamente, de Ação Civil Pública por improbidade administrativa fruto de dito "esquema" de fraude à licitação. Descreve a inicial "a atuação da empresa LEALMAQ - Leal Máquinas Ltda., que detinha sob seu prestígio e operação um esquema igualmente criminoso, tendente ao desvio de recursos públicos, mediante, no mais das vezes, a realização de um simulacro de licitação e, enfim, venda superfaturada de veículo adaptado ao uso como ambulância, ao veículo 'nu' ou, simplesmente, de serviço de adaptação de veículos adquiridos por outra forma". Em concreto, narrou-se fraude na aquisição de furgão (ambulância) e equipamentos médico-hospitalares por meio de licitação (convite), após convênio celebrado entre o Município de São José da Varginha e a União. A auditoria realizada identificou direcionamento do certame; e ausência de pesquisa de preços de mercado, de documentação de habilitação das empresas, do recebedor da mercadoria na nota fiscal, tudo em prejuízo ao Erário. 2. Requerida a indisponibilidade de bens, foi ela indeferida na origem, por ausência de prova de dilapidação e desproporcionalidade. A irresignação dos recorrentes está amparada na tese da verossimilhança demonstrada documentalmente e do periculum in mora implícito. 3. Assente na Segunda Turma do STJ o entendimento de que a decretação de indisponibilidade dos bens não se condiciona à comprovação de dilapidação efetiva ou iminente de patrimônio, porquanto visa, justamente, a evitar dilapidação patrimonial. Posição contrária tornaria difícil, e muitas vezes inócua, a efetivação da Medida Cautelar em foco. O periculum in mora é considerado implícito. Precedentes do STJ inclusive em Recursos derivados da Operação Arca de Noé (Edcl no REsp 1.211.986/MT, Segunda Turma, Rel. Ministro Herman Benjamin, DJe 9.6.2011; REsp 1.205.119/MT, Segunda Turma, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Dje 28.10.2010; REsp 1203133/MT, Segunda Turma, Rel. Ministro Castro Meira, DJe 28.10.2010; REsp 1.161.631/PR, Segunda Turma, Rel. Ministro Humberto Martins, DJe 24.8.2010; REsp 1.177.290/MT, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, Dje 1.7.2010; REsp 1.177.128/MT, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, Dje 16.9.2010; REsp 1.134.638/MT, Segunda Turma, Relator Ministra Eliana Calmon, Dje 23.11.2009). 4. A constrição patrimonial alcança o valor da totalidade da lesão ao Erário, sua repercussão no enriquecimento ilícito do agente, excluídos os bens impenhoráveis, exceto se adquiridos com o produto do ato ímprobo. Precedente do STJ. 5. Recursos Especiais providos para conceder a medida de indisponibilidade de bens. ..EMEN:
(RESP 201200299813, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:09/05/2013 ..DTPB:.) - negritei

..EMEN: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. FATOS RELACIONADOS COM A OPERAÇÃO SANGUESSUGA. PERICULUM IN MORA PRESUMIDO. CONSTRIÇÃO. LIMITES. VALOR DO DANO. 1. Trata-se, originariamente, de Ação Civil Pública por improbidade administrativa por fraude à licitação, superfaturamento de preços, fracionamento de compra para enquadramento em modalidade "Convite", dispensa de pesquisa de mercado para estabelecer o valor do bem licitado, tudo para aquisição de unidade móvel de saúde - tudo, conforme consta na inicial, no contexto da Operação Sanguessuga, da Polícia Federal. A inicial aponta prejuízo de aproximadamente R$ 70 mil, em valores históricos. 2. A decisão de primeiro grau indeferiu a medida de indisponibilidade de bens. O acórdão recorrido, ao manter o decisum, admitiu o periculum in mora presumido em demandas que versem sobre a improbidade administrativa, para a seguir mitigar essa posição, com amparo nas palavras de Desembargador no sentido de exigir "elementos indiciários suficientes para que demonstre pelo menos a tendência de que esses bens poderão desaparecer, ser alienados, algum ato praticado pelos réus". No mais, rejeita a pretensão por entender que "a constrição patrimonial não pode incidir indiscriminadamente sobre todos os bens imóveis, veículos e ativos financeiros, porquanto estaria a constituir medida desproporcional e ilegal. O texto legal é claro: recairá sobre os bens necessários ao ressarcimento do dano ou sobre o acréscimo patrimonial". 3. O art. 7º, parágrafo único, da LIA delimita a indisponibilidade aos "bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito". Em nenhum momento impõe a constrição desproporcional da totalidade do patrimônio do réu, ainda que superior ao valor debatido na demanda. A petição inicial tampouco pede constrição indiscriminada. Ao contrário, expõe, em juízo ponderado, as balizas da medida pretendida, acatando o limite legal. 4. Uma coisa é indeferir a medida por entender que a indisponibilidade de bens em valor superior é desproporcional. Outra é usar esse mesmo fundamento para afastar qualquer indisponibilidade, interpretação que se rejeita. A jurisprudência do STJ é corrente em admitir a constrição até o limite da dívida, sem que se cogite de desproporcionalidade, mas sim de estrito cumprimento do comando normativo. Confiram-se: AgRg no AgRg no AREsp 100.445/BA, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 23.5.2012; REsp 1.161.631/SE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 24.8.2010; REsp 702.338/PR, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 11.9.2008. 5. Assente na Segunda Turma do STJ o entendimento de que a decretação de indisponibilidade dos bens não está condicionada à comprovação de dilapidação efetiva ou iminente de patrimônio, porquanto visa, justamente, a evitar dilapidação patrimonial. Posição contrária tornaria difícil, e muitas vezes inócua, a efetivação da Medida Cautelar em foco. O periculum in mora é considerado implícito. Precedentes do STJ inclusive em Recursos derivados da Operação Arca de Noé (Edcl no REsp 1.211.986/MT, Segunda Turma, Rel. Ministro Herman Benjamin, DJe 9.6.2011; REsp 1.205.119/MT, Segunda Turma, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Dje 28.10.2010; REsp 1.203.133/MT, Segunda Turma, Rel. Ministro Castro Meira, DJe 28.10.2010; REsp 1.161.631/PR, Segunda Turma, Rel. Ministro Humberto Martins, DJe 24.8.2010; REsp 1.177.290/MT, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, Dje 1.7.2010; REsp 1.177.128/MT, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, Dje 16.9.2010; REsp 1.134.638/MT, Segunda Turma, Relator Ministra Eliana Calmon, Dje 23.11.2009). 6. Recurso Especial provido para conceder a medida de indisponibilidade de bens suficientes para assegurar o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito. ..EMEN:(RESP 201102227785, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:19/12/2012 ..DTPB:.)

Assim, não há que se falar em necessidade de comprovação da possível dilapidação do patrimônio dos réus ou do acréscimo indevido, porquanto provada a perpetração de improbidade, in casu.


Quanto à suposta insolvência suscitada, em decorrência da decretação de indisponibilidade de bens, bem como da condenação a ressarcimento ao erário e multa civil, por não disporem do atinente montante, sequer foi comprovada e, portanto, não pode justificar a não imposição da medida cautelar ou o abrandamento das reprimendas.


Por fim, incabível a afirmação de que a restituição de valores resultaria em enriquecimento ilícito da administração, decorrente do ressarcimento integral do dano, ante a prestação do serviço. Não incide na espécie o artigo 59 da Lei nº 8.666/93, o qual trata da nulidade do contrato administrativo, matéria manifestamente estranha ao caso.


Repise-se que restou inconteste o prejuízo, em razão do superfaturamento dos objetos licitados, o que impõe a devolução dos valores relativos à perda patrimonial. A prestação de serviços propiciada pelos veículos adquiridos não elide a fraude perpetrada, já que tal ocorreria independentemente do preço da aquisição.


Já se destacou anteriormente que, no caso dos autos, é inegável que incorreram os réus na prática de graves atos de improbidade, porquanto fizeram tábua rasa das disposições constitucionais e das leis de regência em matéria de licitação, que preveem a observância do princípio da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração, bem como o processamento e julgamento em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, em relação às quais estavam obrigados a obedecê-las. Ademais, em relação ao convênio nº 1832/2003, a conduta acarretou não apenas prejuízo estimado de R$ 83.923,58, como também a realização da transformação em desacordo com o plano de trabalho aprovado e consequente inexistência de consultório pediátrico/médico e ginecológico, o que privou a população do atendimento almejado com o convênio. A evidente reprovabilidade é tanto mais perniciosa quando envolve recursos oriundos do Ministério da Saúde, os quais se destinam a melhorar a qualidade de assistência ao usuário do Sistema Único de Saúde.


Destarte, a decisão orientou-se pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade ao dimensionar as sanções aplicadas, as quais não merecem reforma.


DO DISPOSITIVO


Ante o exposto, rejeito a preliminar e nego provimento à apelação dos réus e à remessa oficial tida por interposta.


É como voto.






André Nabarrete
Desembargador Federal


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