D.E. Publicado em 10/09/2015 |
|
|
|
|
|
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e negar provimento à apelação e à remessa oficial, tida por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANDRE NABARRETE NETO:10023 |
Nº de Série do Certificado: | 581F94C33111A9E0F4D844669D64D3CB |
Data e Hora: | 27/08/2015 17:01:03 |
|
|
|
|
|
RELATÓRIO
Apelação (fls. 989/1080) interposta por Donizetti Borges Barbosa e outros contra sentença (fls. 925/971) proferida nos autos da ação civil pública por atos de improbidade administrativa, que julgou o pedido parcialmente procedente para condenar os apelantes como incursos no artigo 10, inciso VIII, da Lei nº 8.429/92 e, em consequência, com fulcro no artigo 12, inciso II, dessa mesma lei, condenou 1) DONIZETTI BORGES BARBOSA às seguintes penalidades: a) ressarcimento do dano suportado pelo erário, de forma solidária, cujo valor é de R$ 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos), acrescido de correção monetária, desde 12/06/2007, a ser aplicada na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, nos termos da Resolução nº 134/2010 do CJF, e juros moratórios, com incidência desde a data do evento danoso, no percentual de 1% (um por cento) ao mês; b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; c) pagamento de multa civil no valor de R$ 41.961,79 (quarenta e um mil, novecentos e sessenta e um reais e setenta e nove centavos), devidamente acrescido de correção monetária, desde 19/05/2005; d) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja o réu sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos; e) sanção de perda de função, cargo ou emprego que atinge qualquer cargo, emprego ou função em exercício no momento do trânsito em julgado da sentença, ainda que distinto daquele do qual se praticou o ato de improbidade; 2) MARIA ELISA MANCA: a) ressarcimento do dano suportado pelo erário, de forma solidária, cujo valor é de RS 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos), acrescido de correção monetária, desde 12/06/2007, a ser aplicada na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, nos termos da Resolução nº 134/2010 do CJF, e juros moratórios, com incidência desde a data do evento danoso, no percentual de 1% (um por cento) ao mês; b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; c) pagamento de multa civil no valor de RS 20.980,89 (vinte mil, novecentos e oitenta reais e oitenta e nove centavos), devidamente acrescido de correção monetária, desde 19/05/2005; d) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja a ré sócia majoritária, pelo prazo de 5 (cinco) anos; e) sanção de perda de função, cargo ou emprego que atinge qualquer cargo, emprego ou função em exercício no momento do trânsito em julgado da sentença, ainda que distinto daquele do qual se praticou o ato de improbidade; 3) RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA: a) ressarcimento do dano suportado pelo erário, de forma solidária, cujo valor é de R$ 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos), acrescido de correção monetária, desde 12/06/2007, a ser aplicada na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, nos termos da Resolução nº 134/2010 do CJF, e juros moratórios, com incidência desde a data do evento danoso, no percentual de 1% (um por cento) ao mês; b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; c) pagamento de multa civil no valor de R$ 20.980,89 (vinte mil, novecentos e oitenta reais e oitenta e nove centavos), devidamente acrescido de correção monetária, desde 19/05/2005; d) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja o réu sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos; e) sanção de perda de função, cargo ou emprego que atinge qualquer cargo, emprego ou função em exercício no momento do trânsito em julgado da sentença, ainda que distinto daquele do qual se praticou o ato de improbidade; 4) VANDERLEI BORGES DE LIMA: a) ressarcimento do dano suportado pelo erário, de forma solidária, cujo valor é de RS 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos), acrescido de correção monetária, desde 12/06/2007, a ser aplicada na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, nos termos da Resolução nº 134/2010 do CJF, e juros moratórios, com incidência desde a data do evento danoso, no percentual de 1% (um por cento) ao mês; b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; c) pagamento de multa civil no valor de R$ 5.245,22 (cinco mil, duzentos e quarenta e cinco reais e vinte e dois centavos), devidamente acrescido de correção monetária, desde 19/05/2005; d) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja o réu sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos; 5) LUIZ DO CARMO BATISTA ROSA: a) ressarcimento do dano suportado pelo erário, de forma solidária, cujo valor é de RS 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos), acrescido de correção monetária, desde 12/06/2007, a ser aplicada na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, nos termos da Resolução nº 134/2010 do CJF, e juros moratórios, com incidência desde a data do evento danoso, no percentual de 1% (um por cento) ao mês; b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; c) pagamento de multa civil no valor de R$ 5.245,22 (cinco mil, duzentos e quarenta e cinco reais e vinte e dois centavos), devidamente acrescido de correção monetária, desde 19/05/2005; d) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja o réu sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos; 6) ADILSON RODRIGUES DE ALMEIDA: a) ressarcimento do dano suportado pelo erário, de forma solidária, cujo valor é de R$ 83.921,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e um reais e cinquenta e oito centavos), acrescido de correção monetária, desde 12/06/2007, a ser aplicada na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, nos termos da Resolução nº 134/2010 do CJF, e juros moratórios, com incidência desde a data do evento danoso, no percentual de 1% (um por cento) ao mês; b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; c) pagamento de multa civil no valor de R$ 5.245,22 (cinco mil, duzentos e quarenta e cinco reais e vinte e dois centavos), devidamente acrescido de correção monetária, desde 19/05/2005; d) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja o réu sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos. Assinalou a observância do disposto no artigo 20 da Lei n° 8.429/92, no sentido de que as penas de perda da função pública e suspensão dos direitos políticos só poderão ser eventualmente aplicadas após o trânsito em julgado da sentença. Em relação à indisponibilidade de bens dos réus DONIZETTI BORGES BARBOSA, MARIA ELISA MANCA e RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA, determinou o bloqueio imediato de ativos financeiros pelo sistema "BACEN JUD", até o limite de RS 83.923,58, e averbação no Cartório de Registro de Imóveis de Apiaí da indisponibilidade de bens imóveis em nome dos réus DONIZETTI BORGES BARBOSA, MARIA ELISA MANCA e RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA, bem como anotação, por meio do sistema "RENAJUD", dos veículos em nome desses réus. Não houve condenação a custas e honorários advocatícios.
Na inicial, o MPF narra que a atuação fiscalizadora da Controladoria-Geral da União - CGU em municípios de diferentes regiões do país revelou, no ano de 2004, a existência de uma organização criminosa que, desde o ano de 2000, desviava verbas federais, oriundas do Fundo Nacional de Saúde - FNS, destinadas à compra de ambulâncias, repassadas a prefeituras e outras entidades por meio de convênios firmados com o Ministério da Saúde.
Aduz o órgão ministerial que:
a) com pequenas variações, o esquema montado para desvio de dinheiro público consistia no comércio de emendas individuais ou genéricas ao orçamento geral da União, fraude em licitação e superfaturamento na compra de ambulâncias e/ou equipamentos hospitalares;
b) em 4 de maio de 2006, a Polícia Federal deflagrou a chamada "Operação Sanguessuga" para desarticular a quadrilha que atuava na área da saúde. Dezenas de parlamentares, prefeitos e empresários foram flagrados nesse esquema, grupo que passou a ser chamado de "MÁFIA DAS SANGUESSUGAS";
c) o sistema era operado, principalmente, por Darci José Vedoin e seu filho Luiz Antônio Trevisan Vedoin, proprietários da maioria das empresas utilizadas nas fraudes às licitações, algumas de "fachada", abertas em nomes de parentes e "laranjas", controladas, via de regra, pela PLANAM - Comércio e Representações;
d) o estratagema se desenvolvia em fases distintas, porém articuladas. Primeiro, os membros entravam em contato com prefeitos interessados em adquirir unidade móvel de saúde (ambulâncias) do governo federal sem a necessidade de se submeterem aos trâmites normais. Para seguir esse "atalho", eram oferecidos aos interessados todos os "serviços" necessários para forjar e direcionar licitações fraudulentas em que venceria uma das empresas do grupo criminoso. Em alguns casos, os contatos com os prefeitos eram feitos pelo próprio parlamentar;
e) obtida a anuência/conivência do prefeito, dava-se início à segunda fase, voltada à obtenção dos recursos. Nessa etapa, senadores e respectivos assessores preparavam emendas parlamentares individuais ou genéricas ao orçamento da União, com vista à destinação de verbas para aquisição pelos municípios "contemplados" de unidades móveis de saúde e equipamentos correlatos. Num terceiro momento, correspondente à execução orçamentária, eram confeccionados e apresentados ao Ministério da Saúde pré-projetos e projetos, os quais resultavam na formalização dos convênios e, consequentemente, no repasse dos recursos às prefeituras;
f) já celebrado o convênio, a ação do grupo se desenvolvia no âmbito municipal, momento em que, com a participação dos servidores locais, mais especificamente dos membros das comissões de licitação, além do prefeito e secretários, eram forjados os processos licitatórios para garantir a vitória de uma das empresas do grupo;
g) as vantagens econômicas obtidas com essa prática eram rateadas entre todos que contribuíam para seu êxito: empresários, parlamentares, agentes e funcionários públicos;
h) durante mais de 5 (cinco) anos, o grupo executou praticamente todos os atos necessários à concretização do fim ilícito colimado. A organização elaborava, previamente, muitos dos documentos necessários para o processamento das diferentes etapas da atividade delitiva;
i) uma espécie de Kit de licitação fraudulenta era disponibilizado aos "interessados", mormente quando a modalidade escolhida era a carta-convite. Assim, nenhuma das etapas política ou administrativa necessárias para o desvio dos recursos públicos fugia ao controle da quadrilha;
j) o presente feito tem por objeto a persecução dos responsáveis pela execução da fraude no processo licitatório para aquisição de unidade móvel de saúde no Município de Apiaí/SP, Convênio n° 1594/2003, SIAF nº 496077, processo n° 25.000.087131/2003-17, relativo à aquisição de 1 (um) veículo tipo van, com capacidade para 16 (dezesseis) pessoas, destinado ao transporte de pacientes, no valor total de R$ 68.000,00 (sessenta e oito mil reais), dos quais R$ 39.990,00 (trinta e nove mil, novecentos e noventa reais) foram repassados pelo Ministério da Saúde e R$ 24.301,27 (vinte e quatro mil, trezentos e um reais e vinte e um centavos) são provenientes de contrapartida, e o Convênio nº 1832/2003, SIAF n° 496078, Processo nº 25.000.093646/2003-12, para a aquisição de 1 (um) ônibus equipado para atendimento médico e odontológico, no valor total de R$ 145.180,00 (cento e quarenta e cinco mil, cento e oitenta reais), dos quais R$ 95.980,00, mais os rendimentos de R$ 10.800,00, foram repassados pelo Ministério da Saúde e R$ 38.400,00 (trinta e oito mil e quatrocentos reais) correspondem à contrapartida da prefeitura. Os termos dos convênios foram assinados pelo Prefeito de Apiaí, à época, Emílson Couras da Silva, e pelo Ministro de Estado da Saúde, Humberto Sérgio Costa;
k) os recursos necessários para a aprovação e execução do Convênio n° 1594/2003 tiveram origem na Emenda Parlamentar ao Orçamento da União n° 36050013, de autoria do Deputado Federal Gilberto Kassab, e os do Convênio n° 1832/2003 na Emenda Parlamentar ao Orçamento da União n° 36000001, de autoria do Deputado Federal Bispo Wanderval Santos;
l) coube ao Prefeito DONIZETTI BORGES BARBOSA dar continuidade aos "trabalhos" no âmbito municipal, iniciado por solicitação do Secretário Municipal de Saúde, Carlos Alberto Bastos de Moraes, dos seguintes processos licitatórios:
l.1)- Processo n° 09/2005 - Carta-Convite n° 08/2005 (Convênio n° 1832/2003), para aquisição de 1 (um) ônibus modelo não inferior a 1997, versão vazio, para adaptação de equipamentos médicos e odontológicos;
l.2)- Processo n° 11/2005 - Carta-Convite n° 10/2005 (Convênio n° 1832/2003), para a transformação do veículo (ônibus) em unidade móvel de saúde;
l.3)- Processo n° 10/2005 - Carta-Convite n° 09/2005 (Convênio n° 1594/2003), para aquisição de 1 (um) veículo tipo van, adaptada para atendimento médico - denominada Unidade Móvel de Saúde;
m) os editais foram publicados no mesmo dia, 05/04/2005;
n) a Comissão de Licitacão, instituída pela Portaria Municipal n° 16, de 3 de janeiro de 2005, foi composta, nos três processos, por RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA - Presidente, e pelos membros LUIZ DO CARMO BATISTA ROSA, ADILSON RODRIGUES DE ALMEIDA e VANDERLEI BORGES DE LIMA;
o) com relação à Carta-Convite n° 08/2005 - Processo nº 09/2005, cujo objeto foi a aquisição de 1 (um) ônibus para ser adaptado, foram "convidadas" as seguintes empresas:
- Delta Veículos Especiais Ltda - Curitiba/PR;
- De Nigris Distrib. de Veículos Ltda - São Paulo/SP;
- Manupa Com. Veículos, Al. Pap. Elét. E Rep. Ltda - Sto. Antônio Jardim/SP;
p) as propostas apresentadas (fls. 429, 432 e 434) foram:
- Delta: R$ 78.000,00 (setenta e oito mil reais);
- De Nigris: R$ 79.900,00 (setenta e nove mil e novecentos reais)
- Manupa: R$ 79.950,00 (setenta e nove mil, novecentos e cinquenta reais);
q) conforme a ata de julgamento, de 13/04/2005, todas as empresas foram consideradas habilitadas. Venceu a empresa Delta Veículos Especiais Ltda;
r) o representante da Manupa não apresentou a procuração, bem como a De Nigris não teve nenhum representante, de modo que, sob o aspecto formal, somente a Delta estava representada por Sinomar Martins Camargo;
s) no tocante à Carta-Convite n° 10/2005 - Processo nº 11/2005, com vista à transformação do ônibus em unidade móvel de saúde, foram convidadas as seguintes empresas:
- Delta Veículos Especiais Ltda - Curitiba/PR;
- Tapeçaria Jaedi de Medianeira Ltda - Medianeira/PR;
- Transform Indústria e Comércio de Veículos Especiais Ltda - Franca/SP;
t) as propostas apresentadas foram:
- Delta: R$ 58.200,00 (cinquenta e oito mil e duzentos reais);
- Transform: R$ 56.000,00 (cinquenta e seis mil reais);
- Tapeçaria Jaedi: R$ 64.800,00 (sessenta e quatro mil e oitocentos reais);
u) as empresas foram consideradas habilitadas, a teor da ata de julgamento, de 13/04/2005. Venceu a empresa Transform Indústria e Comércio de Veículos Especiais Ltda;
v) o representante da Transform, Jordan Azevedo, não apresentou o instrumento de mandato, bem como a Tapeçaria Jaedi não enviou preposto, portanto, apenas a empresa Delta estava regularmente representada;
x) as homologações e adjudicações dos dois certames ocorreram na mesma data: 02/05/2005;
y) os dois procedimentos licitatórios tiveram origem nos recursos oriundos do Convênio n° 1832/2003, SIAF 496078, Processo n° 25000.093646/2003-12, referente à Emenda Parlamentar n° 36000001 da autoria do Deputado Federal Bispo Wanderval e, segundo o Plano de Trabalho apresentado ao Ministério da Saúde pela Prefeitura de Apiaí/SP, destinava-se à aquisição de um veículo (ônibus) dotado de equipamentos para atendimento médico e odontológico;
z) com relação à Carta-Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, alusiva à aquisição de um veículo tipo van - Unidade Móvel de Saúde, foram convidadas as seguintes empresas:
- Delta Veículos Especiais Ltda - Curitiba/PR;
- Manupa Com. Veículos, Al. Pap. Elét. E Rep. Ltda - Sto. Antônio Jardim/SP;
- Transform Indústria e Comércio de Veículos Especiais Ltda - Franca/SP;
a.1) As propostas apresentadas foram:
- DeIta: R$ 68.380,00 (sessenta e oito mil, trezentos e oitenta reais);
- Manupa: R$ 74.500,00 (setenta e quatro mil e quinhentos reais);
- Transform: R$ 71.450,00 (setenta e um mil, quatrocentos e cinquenta reais);
b.1) conforme registrado na ata de julgamento, de 13/04/2005, todas as empresas foram consideradas habilitadas. Venceu a empresa Delta Veículos Especiais Ltda;
c.1) somente a Delta estava representada formalmente por Sinomar Martins Camargo. A Transform estaria representada por Jordan Azevedo que, no entanto, não apresentou a respectiva procuração. Outrossim, em relação à Manupa, o suposto representante, Diego Rezende, também não apresentou o instrumento de mandato;
d.1) a homologação e adjudicação ocorreram em 02/05/2005;
e.1) na auditoria realizada pelo DENASUS constataram-se inúmeras irregularidades que comprovam a preparação fraudulenta do certame. Quanto à Carta-Convite nº 09/2005 registrou-se:
e.1.1.) não consta documento autorizador para a abertura do processo licitatório;
e.1.2) não se demonstrou a realização prévia de pesquisa de preço de mercado;
e.1.3) o objeto licitado não é compatível com o do Plano de Trabalho apresentado ao Ministério da Saúde, o qual previa a compra de veículo com capacidade para 16 passageiros, e o edital descreve veículo adaptado para atendimento médico;
e.1.4) não há documentos comprobatórios da ampla divulgação do certame;
e.1.5) não há identificação correta de quem retirou o edital em nenhum dos recibos;
e.1.6) as assinaturas de Antônio da Silva Filho no comprovante de entrega do edital, na declaração do empregador e na proposta não conferem com a assinatura no contrato social da empresa Transform;
e.1.7) não há no processo licitatório indicação da disponibilidade dos recursos financeiros e minuta do edital com aprovação da assessoria jurídica, conforme exigem, respectivamente, os artigos 14 e 38, parágrafo único, da Lei n° 8.666/93;
e.1.8) a aquisição de um veículo diverso daquele apresentado no Plano de Trabalho gerou um prejuízo social à população, que poderia ser melhor atendida por um veículo com capacidade para 16 pessoas, principalmente nos casos de deslocamento para consultas e tratamentos em outros municípios;
f.1) quanto à Carta-Convite n° 08/2005, Processo n° 09/2005, para aquisição de 1 ônibus e à Carta-Convite n° 10/2005, Processo n°11/2005, para a transformação do veículo, a análise do DENASUS foi simultânea em razão de ambos decorrerem do Convênio n° 1832/2003. Constatou-se o seguinte:
f.1.1) apesar de os recursos terem sido liberados em 22/04/2004, o prazo para prestação de contas passou a ser 23/02/2006, devido às sucessivas ocorrências nos termos de prorrogações;
f.1.2) em 14/12/2005, a Prefeitura Municipal de Apiaí solicitou a reformulação do Plano de Trabalho do Convênio n° 1832/2003;
f.1.3) os processos de licitação nºs 09/2003 e 11/2003 não estão devidamente numerados;
f.1.4) houve fracionamento do objeto da licitação para fugir à modalidade correta, que seria tomada de preços;
g.1) quanto ao Convite n° 08/2005 - Processo n° 09/2005:
g.1.1) não consta a realização de pesquisa de mercado/preço em nenhum dos processos;
g.1.2) não há informações sobre eventual publicação dos editais;
g.1.3) não há a identificação das pessoas que retiraram os editais;
g.1.4) consta da ata que Diego Rezende, que representaria a Manupa, não apresentou a devida procuração;
g.1.5) as assinaturas de Antônio da Silva Filho no comprovante de entrega do edital (Conv. 10/2005 - Processo n° 11/2005), na declaração do empregador e na proposta não conferem com a assinatura no contrato social da Transform;
g.1.6) a De Nigris não teve nenhum representante na sessão de abertura dos envelopes, porém teria protocolado os envelopes na mesma data, 13/04/05, às l0h28;
g.1.7) consta da ata (processo n° 11/2005) que Jordan Azevedo, que representaria a Transform, não apresentou a devida procuração;
g.1.8) a Tapeçaria Jaedi não teve nenhum representante na sessão de abertura dos envelopes (processo n° 11/2005), porém teria protocolado os envelopes na mesma data, 13/04/05, às l0h28;
g.1.9) na verificação in loco realizada pelo FNS, Relatórios nºs 308-1/2004 e 308-2/2005, não foi encontrada a documentação referente ao pedido de reformulação do Plano de Trabalho "aprovado";
g.1.10) não há, no processo licitatório, aprovação do ordenador de despesas à requisição no tocante à abertura do processo licitatório, indicação da disponibilidade dos recursos financeiros e minuta do edital com aprovação da assessoria jurídica, conforme exigem, respectivamente, os artigos 14 e 38, parágrafo único, da Lei n° 8.666/93;
h.1) na verificação física foi constatado:
h.1.1) licenciamento do veículo vencido;
h.1.2) inexistência do consultório pediátrico/médico e ginecológico, conforme constavam no Plano de Trabalho aprovado, no edital de licitação e na nota fiscal. Foi verificado que no veículo existiam dois consultórios odontológicos: um equipado em funcionamento e outro, também montado, porém inadequado para utilização;
h.1.3) o veículo não estava dotado de portas sanfonadas nem cortinas e, embora indicada na nota fiscal n° 448, da Transform, não foi encontrada torneira elétrica;
i.1) a auditoria do DENASUS, segundo os cálculos apresentados às fls. 138/139, apurou um prejuízo total de R$ 72.743,58 (setenta e dois mil, setecentos e quarenta e três reais e cinquenta e oito centavos). Acrescentado a esse valor o saldo não executado do convênio de R$ 11.180,00 (onze mil, cento e oitenta reais), chega-se ao montante de R$ 83.923,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e três reais e cinquenta e oito centavos);
j.1) a análise dos três processos licitatórios em questão não deixa dúvidas de que se trata de fraudes consumadas pela "Máfia das Sanguessugas";
k.1) a significativa quantidade de irregularidades verificadas na formalização e condução dos processos licitatórios revela que houve coordenação de ações para burlar o caráter competitivo que deveria nortear os certames;
l.1) nesses procedimentos licitatórios já estavam definidas quais seriam as empresas vencedoras;
m.1) a Delta Veículos Especiais Ltda venceu nos dois processos para aquisição dos veículos e o convênio teve origem em emenda parlamentar de autoria do Deputado Federal Bispo Wanderval e ambos convergiram para os mesmos processos licitatórios;
n.1) o desmembramento (fracionamento) do processo de aquisição da unidade móvel de saúde em duas licitações, conforme se demonstrou, reforça as conclusões extraídas das investigações conduzidas pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal, no sentido de que o esquema de fraude nas licitações dava-se, prioritariamente, pela utilização da modalidade carta-convite, o que possibilitava a escolha prévia das empresas "licitantes";
o.1) para viabilizar o emprego de tal modalidade licitatória, comumente desmembrava-se o objeto do convênio e eram realizadas duas licitações de valor não superior a R$ 80.000,00, uma para aquisição do veículo e outra para a aquisição dos equipamentos médicos, porém invariavelmente as unidades móveis de saúde eram entregues, já montadas, pela mesma empresa;
p.1) Luiz Antônio Trevisan Vedoin, por ocasião de seu interrogatório realizado, em 03.07.2006, na 2ª Vara Federal de Cuiabá/MT - Processo n° 2006.36.00.007594-5, mencionou que, para evitar a tomada de preço, havia o fracionamento do objeto licitatório, bem como se manifestou acerca da constituição e participação de específicas empresas;
q.1) nos três processos identificam-se manipulações que apontam para o fracionamento do objeto a ser licitado para possibilitar a opção pela modalidade carta-convite e que a Delta participou sozinha dos certames. As demais empresas, cientes ou não, serviram apenas para fazer número, inclusive a Transform, a qual supostamente teria vencido a licitação para transformar o ônibus em unidade móvel de saúde;
r.1) chama a atenção, também, o fato de as empresas Delta, De Nigris e Jaedi terem os seus envelopes protocolados no mesmo dia, 13/04/05, e na mesma hora, l0h28. Os envelopes da Manupa foram protocolados no dia 13/04/05, às l0h5l, e os da Transform, na mesma data, às l0h39, não obstante as supostas licitantes tivessem sede em Municípios e Estados diferentes;
s.1) DONIZETTI BORGES BARBOSA ocupava, na data dos fatos, o cargo de Prefeito Municipal e nessa condição foi o responsável pela execução dos Convênios nos 1594/2003 (Convite no 09/05 - Proc. no 10/05) e 1832/2003 (Convite n° 08/05 - Proc. n° 09/05 e Convite n° 10/05 - Proc. Nº 11/05);
t.1) MARIA ELISA MANCA, funcionária do Departamento de Compras, foi quem deu os primeiros passos para deflagrar a formalização das licitações fictícias, ao solicitar informações sobre dotações orçamentárias e assinar os convites supostamente enviados às empresas "licitantes", o que demonstra pleno conhecimento dos fins fraudulentos daquele procedimento;
u.1) RUBENS BARRA RODRIGUES DE LIMA atuou como Presidente da Comissão de Licitação, responsável pela formalização e julgamento do Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, referente ao Convênio n° 1594/2003 - SIAF n° 496077, do Convite n° 08/2005 - Processo n° 09/2005, e do Convite n° 10 - Processo n° 11/2005, ambos referentes ao Convênio n° 1832/2003;
v.1) LUIZ DO CARMO BATISTA ROSA, membro da Comissão de Licitação, responsável pela formalização e julgamento do Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, referente ao Convênio nº 1594/2003 - SIAF n° 496077, do Convite nº 08/2005 - Processo nº 09/2005, e do Convite nº 10 - Processo n° 11/2005, ambos referentes ao Convênio nº 1832/2003;
y.1) ADILSON RODRIGUES DE ALMEIDA, membro da Comissão de Licitação, responsável pela formalização e julgamento do Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, referente ao Convênio n° 1594/2003 - SIAF n° 496077, do Convite n° 08/2005 - Processo n° 09/2005, e do Convite n° 10 - processo n° 11/2005, ambos referentes ao Convênio nº 1832/2003;
z.1) VANDERLEI BORGES DE LIMA, membro da Comissão de Licitação, responsável pela formalização e julgamento do Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, referente ao Convênio nº 1594/2003 - SIAF n° 496077, do Convite n° 0812005 - Processo n° 09/2005, e do Convite n° 10 - processo n° 11/2005, ambos referentes ao Convênio n° 1832/2003;
a.2) os requeridos que fizeram parte da Comissão de Licitação e descuraram das obrigações inerentes a essa função respondem solidariamente por todos os atos irregulares e ilícitos praticados e descritos na presente ação.
A Prefeitura do Município de Apiaí/SP, bem como a União manifestaram interesse em integrar a lide como litisconsortes ativos (fls. 53 e 71).
Defesa preliminar dos requeridos, às fls. 74/101.
Contestação, às fls. 518/561. Resposta do MPF, às fls. 566/574, e da União, à fl. 579.
Depoimentos dos réus, às fls. 623/631, e das testemunhas, às fls. 631/633 vº, 846/854 e 864/866.
Alegações finais do Parquet, às fls. 894/897, da União, à fl. 901, e dos réus, às fls. 914/921.
Prolatada sentença, às fls. 925/971.
Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca, Rubens Barra Rodrigues de Lima, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima interpuseram recurso de apelação (fls. 989/1048), no qual aduziram, em síntese, que:
a) não há prova da aludida ocorrência de fraudes, no que tange às regras de licitação e do suposto direcionamento descrito na inicial ou de outros elementos que revelariam burla ao caráter competitivo do certame;
b) a prestação de contas do convênio federal e os processos licitatórios foram devidamente aprovados pelos órgãos competentes (Controladoria da União e Tribunal de Contas do Estado de São Paulo);
c) as irregularidades não podem ser imputadas aos municípios apenas por terem sido mencionados no depoimento pessoal de Luiz Antônio Trevisan Vedoin;
d) o veículo tipo van e o ônibus adaptado, ambos direcionados para a área da saúde, são utilizados pela população que se beneficia com a oportuna aquisição;
e) os preços pagos em todas as licitações são de mercado, devidamente pautados em pesquisa de preços e orçamento predefinido;
f) não houve pagamento de qualquer comissão para prefeitos ou servidores e os contatos foram realizados diretamente pelos parlamentares responsáveis pelas emendas;
g) ausente má-fé ou o dano ao erário, requisitos para a prática de ato de improbidade;
h) trata-se de licitações idôneas, na medida em que houve convênio federal e respeitaram-se os trâmites legais e administrativos para se chegar ao repasse do recurso público, o qual foi devidamente utilizado;
i) impossibilidade de ter sido obtida a anuência de DONIZETTI BORGES BARBOSA, pois não era prefeito à época em que o recurso federal foi concedido;
j) o que ocorreu foi o fato de o Prefeito DONIZETTI BORGES BARBOSA se apressar em utilizar o recurso deixado pela gestão passada;
k) foi o anterior prefeito quem assinou o convênio;
l) o Município de Apiaí realizou os 02 (dois) procedimentos licitatórios em 13/04/2005 para a aquisição dos veículos, à vista do prazo de vigência do convênio n° 1832/2003, o qual se encerraria em 16/06/2005;
m) a aquisição do ônibus e sua transformação totalizaram R$ 134.000,00 (cento e trinta e quatro mil reais), valor inferior ao do Plano de Trabalho aprovado pelo Ministério da Saúde (R$ 144.000,00-cento e quarenta e quatro mil reais);
n) o relatório apresentado pelo DENASUS, alusivo à diferença de valor em relação ao preço de mercado, é impreciso, utiliza o sistema SGI da CGU, desconhecido publicamente, e não demonstra os parâmetros de comparação de preços com outros fornecedores;
o) a Prefeitura de Apiaí investiu recursos próprios de contrapartida no valor de R$ 10.705,33 (dez mil, setecentos e cinco reais e trinta e três centavos), após a aprovação de novo Plano de Trabalho pelo Ministério da Saúde, dentro da vigência do Convênio que se encerrou em 24/06/2007;
p) no que se refere ao Convite n° 08/2005, a ausência de representante legal no momento da sessão de abertura não anula a licitação e não impede a participação no certame, nem tampouco a presença de representante sem a devida procuração;
q) a apresentação da habilitação e da proposta já permitem a participação no certame;
r) a melhor apresentada foi a da Delta Veículos Especias Ltda, no valor de R$ 78.000,00;
s) quanto ao Convite n° 10/2005, caso se tratasse de procedimento fraudulento, a Delta novamente sairia vencedora, todavia não foi o que ocorreu;
t) a empresa Transform Indústria e Comércio de Veículos Especiais Ltda, apesar de representada por Jordan Azevedo, sem procuração, venceu por apresentar o menor valor - R$ 56.000,00, assim como no tocante ao Convite n° 09/2005, no qual a empresa Delta Veículos Especiais teve êxito por exibir a menor quantia, R$ 68.380,00;
u) relativamente à auditoria realizada pelo DENASUS, o relatório apresentado é bastante impreciso ao mencionar prejuízo ao erário no valor de 83.923,58 (oitenta e três mil, novecentos e vinte e três reais e cinquenta e oito centavos), bem como ao apontar uma diferença no valor de R$ 61.256,42 em relação ao valor de mercado, aferida por meio do sistema SGI da CGU;
v) os membros da Comissão de Licitação não têm relação com a execução dos processos licitatórios no tocante à aquisição dos bens e seus pagamentos;
x) quanto à utilização de saldos remanescentes, a Prefeitura Municipal pediu reformulações e obteve autorizações do Ministério da Saúde, na vigência do convênio, com prazo final até o dia 24 de junho de 2007, embora equivocadamente o relatório do órgão mencionasse a data de término em 22/02/2007;
y) em 16 de maio de 2007 mais uma vez houve pedido de prorrogação, porém o Ministério da Saúde quedou-se inerte;
z) os equívocos constantes do relatório do DENASUS, quanto ao termo final, revelam que se cuida de documento que não denota total confiança, mais um motivo plausível para a absolvição dos apelantes;
a.1) os apontamentos não levam a crer que houve fraude em processos licitatórios ou que os apelantes poderiam beneficiar alguém ou alguma empresa participante;
b.1) foram adquiridos o ônibus, bem como o veículo tipo van com capacidade para 16 passageiros, ou seja, houve Planos de Trabalho distintos;
c.1) quanto à realização de pesquisa prévia de mercado, realmente haveria a necessidade de seu encarte no processo. Ocorre que a pesquisa era feita de maneira informal, porém o fator mais importante é que o valor efetivamente pago condiz com o preço de mercado à época;
d.1) além de não ter havido pagamento para nenhum servidor de Apiaí, também não houve superfaturamento do bem licitado, nem houve prejuízo para o município, tampouco atitude dolosa de Maria Elisa Manca;
e.1) não houve dano ao erário, razão pela qual totalmente descabida a condenação a ressarcimento;
f.1) favoreceram-se o município e sua população, a qual se beneficia com a utilização do ônibus e da ambulância, situação distinta de outras cidades, nas quais verdadeiramente constatou-se ilicitude nas aquisições, inclusive em relação ao preço médio pago por cada unidade;
g.1) há possibilidade de empresas interessadas tomarem conhecimento antecipado acerca da abertura de possíveis processos licitatórios mediante o acesso à internet, motivo pelo qual não haveria como impedir a participação daquelas ligadas a Luiz Antonio Trevisan Vedoin, dado o atendimento aos requisitos e cláusulas de edital;
h.1) a operação "Máfia das Sanguessugas" foi deflagrada em 2006, depois das homologações dos certames em tela;
i.1) a ausência de documento de autorização para a abertura do processo licitatório configura um vício formal, sanável com a homologação do certame;
j.1) a pretensa inexistência de prova acerca da ampla divulgação do certame justifica-se, à vista da modalidade licitatória, a qual não a exige;
l.1) da mesma forma, a lei não obriga a identificação de quem retira o edital, nem tampouco obriga que se retire;
m.1) o ato de improbidade administrativa importa no dolo do agente, enriquecimento ilícito e aferição de vantagem patrimonial, o que não se verifica nos autos;
n.1) os apelantes, integrantes da Comissão Permanente de Licitação, são servidores públicos da Prefeitura Municipal de Apiaí e seguiram ordens emanadas de superiores imediatos, no tocante à formalização dos processos licitatórios;
o.1) cumpriram com suas obrigações na qualidade de integrantes da Comissão de Licitações do município e agiram em todas as licitações de maneira idônea;
p.1) se existiu algum ilícito atinente à operação intitulada como "Máfia das Sanguessugas", os apelantes não tiveram participação alguma, não obtiveram nenhum tipo de favorecimento e nem beneficiaram outrem;
q.1) Donizetti Borges Barbosa, apesar de Chefe do Executivo, não participava diretamente dos processos licitatórios, bem como não recebeu favorecimento algum com os três procedimentos em tela;
r.1) inexistente conduta dolosa do prefeito, pois não o era à época em que o recurso foi concedido;
s.1) relativamente a Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima, suas atuações consistiam em examinar a documentação apresentada pelos participantes do pleito e adjudicar a compra a quem oferecesse o "menor preço";
t.1) os licitantes trouxeram para o certame documentos merecedores de fé pública, os quais "efetivamente e aparentemente" provavam que as empresas estavam aptas a participar do certame. Portanto, quase impossível que simples servidores, sem técnica adequada, reconhecessem a existência de fraude ou outros ilícitos;
u.1) não cabia a Maria Elisa Manca, Rubens Barra Rodrigues de Lima, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima e até mesmo ao Prefeito Donizetti Borges Barbosa perquirirem quanto à veracidade dos papéis, aparentemente com chancela dos órgãos públicos fornecedores;
v.1) Maria Elisa Manca jamais realizou processo licitatório sem a prévia pesquisa detalhada de preços praticados no mercado. Em algumas oportunidades deixou de realizar alguns procedimentos formais como a juntada nos respectivos procedimentos ou a transcrição em um documento hábil, o que não pode ser interpretado como conduta dolosa;
x.1) os apelantes Vanderlei Borges de Lima, Adilson Rodrigues de Almeida, Luiz do Carmo Batista Rosa não tinham experiência e conhecimento técnico em licitações e não participaram anteriormente em certames dessa natureza;
y.1) os réus não recebiam remuneração extra pelo desempenho de suas funções na Comissão de Licitações, estavam subordinados ao prefeito e foram convocados em virtude de ser funcionários efetivos de carreira;
z.1) a própria decisão recorrida noticia que os apelantes Adilson, Vanderlei e Luiz Do Carmo tiveram condutas meramente formais e auxiliares no âmbito dos dois processos licitatório (aquisição do ônibus e sua transformação);
a.2) a condenação imposta a Adilson, Vanderlei e Luiz do Carmo é altamente excessiva, porquanto percebem remuneração suficiente apenas para a manutenção básica;
b.2) não se pode imputar aos membros da comissão licitante atos e fatos anteriores ao julgamento do certame, que desconheciam e não tinham meios de conhecer;
c.2) não se demonstraram o elemento subjetivo ou a má fé dos apelantes, nem o prejuízo causado ao erário, de modo que descaracterizada a tipicidade de conduta;
d2) pelas drásticas sanções previstas na Lei 8.429/92, deve-se atentar para os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade;
e2) indevida a postulação de ressarcimento de valores que efetivamente foram empregados pelo ente público por constituir-se verdadeiro enriquecimento ilícito;
f.2) a presunção de conluio com empresas participantes do certame impõe que elas e os respectivos sócios integrem a lide, o que não se verificou nos autos;
g.2) a pena de suspensão de direitos políticos, além de não estar fundamentada e, consequentemente, sem graduação, é desproporcional ao ato praticado;
h.2) exige-se que sejam conhecidos os motivos que determinaram ao julgador optar por punição tão grave;
i.2) a mera irregularidade de gestão, sem maiores prejuízos significativos para o erário, não caracteriza ato de improbidade, sob pena de se impossibilitar a gerência da coisa pública e violação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade;
j.2) todos os valores foram devidamente empregados para a finalidade para a qual se destinaram;
k.2) não há descrição de como teriam concorrido os apelantes para a prática do delito imputado e sequer indício de que tenham obtido qualquer vantagem pecuniária com a aquisição de ambulância;
l.2) o próprio Tribunal de Contas não identificou qualquer prejuízo ao erário em relação à aquisição da unidade móvel de saúde;
m.2) a prática do ato de improbidade não tem o condão de determinar a aplicação obrigatória de todas as sanções;
n.2) a pena de proibição de contratar com o poder público foi prevista, à toda evidência, para ser imposta ao terceiro que se beneficia do ato de improbidade;
o.2) a conclusão a que se chega é a de que deverão ser aplicadas as penas possíveis, à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, para fins de dosimetria, conforme o disposto no parágrafo único do artigo 12 da Lei nº 8.429/92;
p.2) não se observaram critérios tais como a lesividade e reprovabilidade das condutas e o respectivo interesse público para efetivar a dosimetria da sanção;
q.2) a conduta dos apelantes não se revestiu de maiores anormalidades, se comparada com casos análogos;
r.2) quanto ao ressarcimento integral do dano, realizada a prestação do serviço, ainda que decorrente de suposta contratação ilegal, a condenação na espécie é considerada indevida, sob pena de enriquecimento ilícito da administração pública;
s.2) por se tratar de ação fundada no artigo 10 (prejuízo ao erário), deve-se demonstrar a efetiva lesividade do ato, ou seja, o desfalque patrimonial sofrido;
t.2) o ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios seriam incompatíveis com o desvalor da conduta praticada pelos apelantes;
u.2) entre as infrações descritas nos incisos do artigo 10 da Lei nº 8429/92 existem notórias diferenças de gravidade;
v.2) algumas das sanções previstas no inciso II do artigo 12 admitem variações entre limites mais ou menos amplos;
x.2) a amplitude das infrações, as diferenças de gravidade entre elas e as infinitas variações possíveis nas condutas conduzem à conclusão de que é possível a aplicação a certos casos de apenas um ou algumas dentre as sanções previstas;
y.2) é indispensável a individuação da pena, com a indicação dos fundamentos e das razões para a aplicação de cada uma delas;
z.2) a pena aplicada deve guardar coerência com a prova dos autos e proporção com a natureza do ilícito praticado, bem como suas circunstâncias, além de se considerar a individualização da penalidade;
a.3) imprescindível seja informado e devidamente caracterizado o elemento volitivo do agente;
b.3) não há indícios de que a vontade dos apelantes não estivesse voltada à consecução do interesse público, bem como de conduta desidiosa dos requeridos, de modo a ensejar sua tipificação no artigo 10 da Lei 8.429/92;
c.3) o mencionado enquadramento, apesar de admitir conduta culposa, exige como elemento nuclear do tipo a lesão ao erário;
d.3) o simples desvio de finalidade, ainda que em proveito do agente, resulta no ato inválido e pode ensejar a imposição de sanções, mas não as graves consequências previstas para a conduta ímproba;
e.3) restou injustificada a decretação de indisponibilidade de bens e valores dos recorrentes ante a inexistência de elemento comprobatório de dilapidação ou acréscimo patrimoniais indevidos;
f.3) não se demonstrou que Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima tinham conhecimento do ocorrido;
g.3) a condenação ao ressarcimento no montante de R$ 83.923,58 e multa correspondente ao valor do dano implica os condenados desembolsarem quantia superior a todos seus bens e valores e em impedimento de eles praticarem atos da vida civil.
Pleitearam, por fim, a reforma do decisum e o provimento do recurso, para julgar improcedente a ação civil pública de improbidade administrativa.
Recebida a apelação nos efeitos suspensivo e devolutivo (fl. 1109), mantidos os da indisponibilidade, foram apresentadas contrarrazões pelo Ministério Público Federal (fls. 1112/1117 vº), nas quais se requereu seja negado provimento ao apelo. Destacam-se no contra-arrazoado:
a) a farta documentação que instrui os autos, objeto de extensa e detalhada análise por parte do Ministério Público Federal e da União, revelaram que os réus/apelantes praticaram atos fraudulentos em procedimentos licitatórios;
b) os certames em questão foram realizados em consonância com as regras desenvolvidas e os objetivos ilícitos almejados pela denominada "Máfia das Ambulâncias";
c) irrelevante que os convênios e os recursos tenham sido assinados e recebidos pela administração anterior e que os veículos adquiridos foram efetivamente utilizados na prestação de serviços à população de Apiaí, uma vez que o processamento dos certames fictícios ocorreu, na sua totalidade, por ação dos corréus e a causa de pedir da presente ação são as fraudes praticadas nos processos licitatórios;
d) as provas concretas existentes e apontadas nos autos demonstram a materialidade das práticas fraudulentas e sua simetria com a dinâmica do esquema criminoso;
e) também foi robustamente comprovada a participação direta e consciente dos corréus na perpetração das fraudes, os quais executaram os atos necessários e imprescindíveis para forjar as supostas licitações;
f) não há reparos a serem feitos na dosimetria das sanções aplicadas, assentada nitidamente nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, considerado o grau de participação e de responsabilidade individual dos réus na linha de desdobramento dos atos fraudulentos;
g) a condenação de natureza pecuniária impõe a decretação de indisponibilidade e/ou bloqueio de bens que se encontre em nome dos apelantes, medida cautelar respaldada em preceitos legais e constitucionais;
h) todos os aspectos fáticos e jurídicos relatados nos autos, seja em relação à materialidade, à autoria e aos prejuízos resultantes das fraudes nos processos licitatórios, restaram cabalmente confirmados ao final da instrução processual.
A União ratificou as contrarrazões apresentadas pelo Parquet. (fl. 1123)
Dada vista ao órgão ministerial, que opinou fosse desprovido o recurso (fls. 1136/1143).
É o relatório.
À revisão.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANDRE NABARRETE NETO:10023 |
Nº de Série do Certificado: | 7E722C5A1991809E |
Data e Hora: | 23/06/2015 15:35:26 |
|
|
|
|
|
VOTO
O Ministério Público Federal propôs ação de improbidade administrativa contra Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca, Rubens Barra Rodrigues de Lima, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima (fls. 02/29), com o objetivo de responsabilizá-los, nos termos da Lei nº 8.429/92, por prática de fraude no processo licitatório para aquisição de unidade móvel de saúde no âmbito do Município de Apiaí-SP, em relação aos convênios nº 1594/2003 e 1832/2003, firmados com o Ministério da Saúde.
Foi submetida ao crivo deste tribunal pela apelação interposta e pelo reexame necessário que se impõe quanto à parte em que o autor, Ministério Público Federal, e os litisconsortes ativos, União e Município de Apiaí/SP, tiveram a ação julgada parcialmente procedente.
DO REEXAME NECESSÁRIO
Inicialmente, ressalte-se que se trata de caso de remessa obrigatória, embora a Lei nº 7.347/85 silencie a respeito, porquanto, por interpretação sistemática das ações de defesa dos interesses difusos e coletivos, conclui-se aplicável analogicamente o artigo 19 da ação popular (Lei nº 4.717/65), verbis:
Nesse sentido, a jurisprudência do S.T.J.:
DA PRELIMINAR
Do litisconsórcio passivo necessário
Sustentam os apelantes que o suposto conluio com empresas participantes do certame impõe sejam os respectivos sócios incluídos na lide. Sem razão sob esse aspecto. Estabelece o artigo 47 do CPC, verbis:
No caso dos autos, não existe lei que determine a obrigatoriedade e, à vista da natureza da relação jurídica (ação civil pública de improbidade administrativa), tem o apelado, na qualidade de demandante, a faculdade de definir o polo passivo da ação a partir dos elementos de convicção que tiver contra cada um dos acusados, agentes públicos ou não. Destarte, deve ser afastada a alegação de necessidade da inclusão dos terceiros nominados e beneficiários indiretos do suposto ato ímprobo no polo passivo (artigos 3º da Lei de Improbidade Administrativa, 2º, 3º, 128, 214, 267, inciso IV, 284, 285, 293 e 301, inciso III, do CPC e 5º, incisos LIV e LV, da CF/88).
Por outro lado, como asseverou o Parquet, parlamentares e respectivos assessores, membros de determinadas famílias e outros devem figurar como réus em ações específicas, propostas em outras varas, principalmente em Cuiabá/MT (fl. 06).
Rejeito a preliminar arguida.
DAS CONDUTAS IMPUTADAS AOS RÉUS
A imputação de improbidade administrativa decorre, em síntese, de supostas irregularidades perpetradas na formalização e condução de processos licitatórios com o intuito de burlar o caráter competitivo dos certames (Convites nºs 08/2005, 09/2005 e 10/2005, Convênios nºs 1594/2003 e 1832/2003) e favorecer empresas licitantes e pessoas atuantes na denominada "Máfia das Sanguessugas", em prejuízo do Município de Apiaí e da União, bem como da inobservância às normas e aos princípios que disciplinam e regem as licitações públicas. A inicial assinalou a incidência do artigo 10, caput e incisos VIII, IX, XI e XII, bem como do artigo 11, caput e inciso I, ambos da Lei nº 8.429/92.
Dispõem os mencionados dispositivos legais:
De acordo com autor, Donizetti Borges Barbosa ocupava, na data dos fatos, o cargo de Prefeito Municipal e nessa condição foi o responsável pela execução dos Convênios nº 1594/2003 (Convite no 09/05) e nº 1832/2003 (Convite n° 08/05 e Convite n° 10/05), de modo que teve participação direta, porquanto se constituía em conditio sine qua non para a concretização das fraudes relatadas.
Ainda segundo o MPF, Maria Elisa Manca, funcionária do Departamento de Compras, foi quem deu os primeiros passos para deflagrar a formalização das licitações fictícias, ao solicitar informações sobre dotações orçamentárias e assinar os convites supostamente enviados às empresas licitantes, o que demonstra pleno conhecimento dos fins fraudulentos daquele procedimento.
Quanto a Rubens Barra Rodrigues de Lima, sustenta o Parquet sua atuação como Presidente da Comissão de Licitação, responsável pela formalização e julgamento do Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, referente ao Convênio n° 1594/2003 - SIAF n° 496077, do Convite n° 08/2005 - Processo n° 09/2005 e do Convite n° 10 - Processo n° 11/2005, ambos referentes ao Convênio n° 1832/2003.
Relativamente a Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima, o órgão ministerial aponta-os como membros da Comissão de Licitação, responsáveis pela formalização e julgamento do Convite n° 09/2005 - Processo n° 10/2005, referente ao Convênio nº 1594/2003 - SIAF n° 496077, do Convite nº 08/2005 - Processo nº 09/2005 e do Convite nº 10 - Processo n° 11/2005, ambos referentes ao Convênio nº 1832/2003. Acrescenta que os integrantes da Comissão de Licitação, os quais descuraram das obrigações inerentes a essa função, respondem solidariamente por todos os atos irregulares e ilícitos praticados e descritos na presente ação, nos termos do artigo 51, § 3º, da Lei nº 8.666/93.
DA PROVA DOS FATOS
Não prospera a tese de inexistência de eventual fraude nos certames mencionados nos autos, à vista da aprovação pelos órgãos competentes (Controladoria da União e Tribunal de Contas do Estado de São Paulo) da prestação de contas do convênio federal e dos respectivos processos licitatórios. A teor do artigo 21, inciso II, da Lei nº 8.429/92, o exame jurisdicional do ato impugnado em sede de ação de improbidade administrativa não se vincula à aprovação ou rejeição levadas a efeito pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas. Nesse sentido iterativa jurisprudência do S.T.J.:
Os elementos colhidos não deixam dúvidas quanto à materialidade do ato de improbidade descrito no artigo 10, caput e inciso VIII, da Lei nº 8.429/92.
Os autos estão instruídos com vasta documentação reunida no Procedimento Administrativo nº 1.34.016.000335/2006-19, iniciado pela Procuradoria da República no Município de Sorocaba/SP para apuração de eventual irregularidade no tocante à aquisição de equipamentos e unidades móveis de saúde com recursos liberados pelo Ministério da Saúde à Prefeitura de Apiaí e outros. O acervo contém excerto dos trabalhos da CPMI "das ambulâncias", bem como relatórios de fiscalizações e auditorias realizadas no âmbito da Controladoria-Geral da União e do Departamento Nacional de Auditoria do SUS-DENASUS. Também constam interrogatórios de Ronildo Pereira Medeiros e de Luiz Antônio Trevisan Vedoin, realizados no processo em trâmite na Segunda Vara Federal em Cuiabá/MT, Seção Judiciária do Estado de Mato Grosso, nos quais os depoentes, sobretudo Luiz Antônio, explicitam ações realizadas em vários Estados federativos com o intuito de direcionar o resultado de licitações para aquisições de unidades móveis de saúde, de modo a favorecer empresas ligadas ao grupo do qual participava o interrogado.
Do depoimento de mais de 150 páginas juntadas no anexo I, apenso II, destacam-se os seguintes pontos bem sintetizados pelo magistrado a quo, que ora transcrevo:
Conforme se delimitou na petição inicial, estes autos versam sobre os convênios nº 1594/2003 e 1832/2003, os quais resultaram em três licitações realizadas no Município de Apiaí/SP no ano de 2005, nos moldes narrados por Luiz Antônio Trevisan Vedoin.
Os apelantes Rubens Barra Rodrigues de Lima, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima foram nomeados membros da Comissão Permanente para o Julgamento de Licitações para o exercício de 2005 por meio da Portaria Municipal de Apiaí/SP nº 16, de 03/01/2005 (fl. 372 do apenso II, volume II).
Os instrumentos convocatórios sob análise tramitaram de modo concomitante. É possível observar que os pedidos de autorizações para início dos certames, assinaturas dos editais, consultas sobre eventuais existências de dotação orçamentária, manifestações do Secretário de Finanças, bem como os envios de solicitações de propostas às licitantes foram realizados conjuntamente em cada fase do andamento procedimental. Outrossim, os envelopes apresentados pelas empresas Delta Veículos Especiais Ltda, De Nigris Distribuidora de Veículos Ltda e Tapeçaria Jaedi de Medianeira Ltda (fl. 379, 400 e 577 vº do apenso II, volumes II e III) foram protocolizados na Prefeitura Municipal de Apiaí/SP, com singular simultaneidade, em 13/04/2005, às 10h28, o que constitui indício de procedimento planejado. Assinale-se que Luiz Antônio Vedoin esclareceu no interrogatório que, nos casos de licitação por convite, o grupo repassava aos municípios ou instituições não governamentais o nome das empresas que deveriam ser destinatárias. Também ficava à disposição para elaborar o edital ou fazê-lo conjuntamente (fl. 986 do apenso II, anexo I), o que demonstra que se conduzia uma ação orquestrada com os mencionados entes, com vista a assegurar o sucesso das concorrentes indicadas, situação semelhante à observada no Município de Apiaí/SP, mormente à vista do sincronismo verificado na marcha procedimental e o fato de a sociedade empresária constituída no âmbito da organização delatada por Luiz Antônio Vedoin ter participado das três licitações sob exame.
Relativamente ao certame nº 08/2005, verifica-se que, em 01/04/2005, o Secretário Municipal de Saúde, Carlos Alberto Bastos de Moraes, solicitou autorização para a abertura de licitação pelo Departamento de Compras, Material e Patrimônio, com vista à aquisição de um veículo ônibus ano/modelo não inferior a 1997 para uso do Setor de Saúde (fl. 363 do apenso II, volume II).
Assinado o edital de licitação na modalidade convite para a compra do mencionado ônibus, em 05/04/2005, pelo Prefeito Municipal de Apiaí/SP, Donizetti Borges Barbosa (fls. 364/368 do apenso II, volume II).
A corré Maria Elisa Manca figura como signatária do ofício encaminhado pelo Departamento de Compras, em 05/04/2005, ao Secretário Municipal de Finanças, Vanderlei Borges de Lima, a fim de obter informação sobre a eventual existência de dotação orçamentária para a compra, a qual teria o valor aproximado de R$ 80.000,00 (fl. 370 do apenso II, volume II), o qual respondeu positivamente à consulta na mesma data (fl. 371 do apenso II, volume II).
Foram enviadas, em 05/04/2005, solicitações de propostas às empresas Delta Veículos Especiais Ltda, De Nigris Distribuidora de Veículos Ltda, Manupa Com. de Veículos, A. Pap. Elet. e Rep. Ltda (fls. 373/375 do apenso II, volume II), cujos recibos de cópias do edital constam às fls. 376/378.
No tocante à carta-convite nº 09/05, consta que, em 01/04/2005, o Secretário Municipal de Saúde, Carlos Alberto Bastos de Moraes, solicitou autorização para a abertura de licitação pelo Departamento de Compras, Material e Patrimônio, com vista à aquisição de um veículo van 0 km (fls. 445 do apenso II, volume II).
Foi firmado o edital de licitação na modalidade convite para a compra do mencionado veículo, em 05/04/2005, pelo Prefeito Municipal de Apiaí/SP, Donizetti Borges Barbosa (fls. 446/451 do apenso II, volume II).
A corré Maria Elisa Manca figura como signatária do ofício encaminhado pelo Departamento de Compras, em 05/04/2005, ao Secretário Municipal de Finanças, Vanderlei Borges de Lima, a fim de obter informação sobre a eventual existência de dotação orçamentária para a compra, a qual teria o valor aproximado de R$ 70.000,00 (fl. 454 do apenso II, volume II), o qual respondeu positivamente à consulta na mesma data (fl. 455 do apenso II, volume II).
Foram enviadas, em 05/04/2005, solicitações de propostas às empresas Delta Veículos Especiais Ltda, Manupa, Comércio de Veículos, Alimentação, Papelaria, Eletroeletrônico e Representações Ltda e Transform Ind. e Com. de Veic. Especiais Ltda (fls. 457/459 do apenso II, volume II), cujos recibos de cópias do edital constam às fls. 460/462.
No que concerne ao convite nº 10/05, observa-se que, em 01/04/2005, o Secretário Municipal de Saúde, Carlos Alberto Bastos de Moraes, solicitou abertura de licitação pelo Departamento de Compras, Material e Patrimônio para transformação de um ônibus em unidade médico odontológica (fls. 540 do apenso II, volume III).
Foi firmado o edital de licitação na modalidade convite para a transformação, em 05/04/2005, pelo Prefeito Municipal de Apiaí/SP, Donizetti Borges Barbosa (fls. 541/546 do apenso II, volume III).
A corré Maria Elisa Manca figura como signatária do ofício encaminhado pelo Departamento de Compras, em 05/04/2005, ao Secretário Municipal de Finanças, Vanderlei Borges de Lima, a fim de obter informação sobre a eventual existência de dotação orçamentária para a realização do serviço, a qual teria o valor aproximado de R$ 58.000,00 (fl. 548 do apenso II, volume III), o qual respondeu positivamente à consulta na mesma data (fl. 549 do apenso II, volume III).
Foram enviadas, em 05/04/2005, solicitações de propostas às empresas Transform Ind. e Com. de Veic. Especiais Ltda, Delta Veículos Especiais Ltda e Tapeçaria Jaedi de Medianeira Ltda (fls. 551/553 do apenso II, volume III), cujos recibos de cópias do edital constam às fls. 554/556.
A empresa Delta Veículos Especiais Ltda venceu o certame relativo à carta convite nº 08/2005, convênio nº 1832/2003 (fl. 125 do apenso II, volume I), para fornecimento do ônibus, ofertado por R$ 78.000,00. Participaram também as empresas De Nigris Distribuidora de Veículos Ltda e Manupa, Comércio de Veículos, Alimentação, Papelaria, Eletroeletrônico e Representações Ltda (fls. 435/443 do apenso II, volume III).
Outrossim, Delta Veículos Especiais Ltda obteve vitória na licitação por convite nº 09/2005 para a compra de um veículo tipo van, na qual concorreram Manupa, Comércio de Veículos, Alimentação, Papelaria, Eletroeletrônico e Representações Ltda e Transform Ind. e Com. de Veic. Especiais Ltda (fls. 444/536 do apenso II, volume III).
Quanto à transformação do ônibus, objeto da carta-convite nº 10/2005, convênio nº 1832/2003 (fl. 125 do apenso II, volume I), a empresa Transform Ind. e Com. de Veic. Especiais Ltda obteve resultado favorável em detrimento das concorrentes Delta Veículos Especiais Ltda e Tapeçaria Jaedi de Medianeira Ltda (fls. 540/642 do apenso II, volume III).
Consta dos elementos coligidos a auditoria realizada, no período de 21 a 22 de setembro de 2006, na Prefeitura Municipal de Apiaí/SP por determinação do Ministro de Estado e Saúde, com a finalidade de verificar a execução do convênio nº 1832/2003. O crédito orçamentário decorreu da emenda parlamentar nº 36000001 de autoria do Deputado Federal Bispo Wanderval (fl. 119 do apenso II, volume I). O respectivo relatório, elaborado pelo DENASUS/COSIN/Controladoria Geral da União, descreve detalhadamente o objeto do plano de trabalho. Confira-se:
O convênio nº 1832/2003 foi executado mediante as cartas-convites nº 08/2005, processo 09/2005 (aquisição do ônibus), e nº 10/2005, processo nº 11/2005 (transformação de um ônibus em unidade móvel de saúde).
Conforme ressaltado no mencionado relatório, houve fracionamento do objeto da licitação para evitar a tomada de preços, modalidade correta para a espécie.
Também se destacam apontamentos dos auditores, no sentido de que os respectivos procedimentos administrativos não estão devidamente numerados; não consta a realização de pesquisa de preço de mercado; há divergência entre as descrições do Plano de Trabalho e as do edital; falta identificação dos signatários das retiradas dos editais, além de as assinaturas de Antônio da Silva Filho, apostas no comprovante de entrega de edital e no contrato social da Empresa Transform-Ind. e Com. De Veíc. Especiais Ltda serem diferentes.
Quanto aos valores utilizados, foi apontado prejuízo estimado de R$ 72.743,58, in verbis:
Acerca da verificação física assentou-se:
Por fim, conclui o relato:
Como visto, os auditores constataram a inexistência de consultório pediátrico/médico e ginecológico, em desacordo com o Plano de Trabalho. Também verificaram que, no respectivo local reservado, havia outro consultório odontológico montado, porém não adequado para utilização.
Relativamente ao convite nº 08/2005, aduziu-se que o representante da empresa Manupa não apresentou a procuração; a empresa De Nigris não teve nenhum representante, todavia os envelopes foram protocolados no dia 13/04/2005, às 10h28.
Quanto ao convite nº 10/2005, aludiu-se à não representação da empresa Tapeçaria Jaedi de Medianeira Ltda e falta de instrumento de mandato de Jordan Azevedo, representante da empresa Transform Ind. e Com. De Veic. Especiais Ltda, embora os envelopes tenham sido protocolados no dia 13/04/2005, às 10h28.
O relatório também consignou que a homologação e adjudicação das empresas vencedoras para aquisição do ônibus (Delta Veículos Especiais Ltda) e para transformação em unidade móvel de saúde (Transform Ind. e Com. de Veic. Especiais Ltda) ocorreram no mesmo dia, 02/05/2005, bem como foram assinadas pelo prefeito municipal (fls. 130/144 do apenso II, volume I).
O relato da auditoria em relação ao convênio nº 1594/2003, convite 09/2005 (fl. 101 do apenso II, volume I), descreve o objeto como um veículo van 0 Km, capacidade 16 pessoas. A respeito das impropriedades constatadas no certame, apontam-se: ausência de autorização para a abertura do procedimento licitatório; existência de folhas não numeradas; falta de pesquisa prévia de preço de mercado; incompatibilidade do bem licitado com o Plano de Trabalho; não demonstração da ampla divulgação; inexistência de identificação de quem retirou o edital e do agente recebedor do bem; deixou de constar no feito indicação da disponibilidade dos recursos e minuta do edital com aprovação da assessoria jurídica da entidade.
As considerações dos auditores atestam o não atendimento ao que restou proposto no Plano de Trabalho, porquanto diversamente do objeto avençado, foi adquirido um veículo com menor capacidade de transportar os pacientes, usuários SUS, do que o previsto, in verbis:
As diversas irregularidades formais apontadas pelos auditores, tanto na fase inicial quanto nas demais etapas do feito licitatório, no tocante à ausência da autorização para a abertura do certame, da identificação de quem retirou o edital e do agente recebedor do bem, inexistência de comprovação de ampla divulgação da licitação, existência de folhas não numeradas, falta de pesquisa prévia de preço de mercado, de indicação da disponibilidade dos recursos e da minuta do edital com aprovação da assessoria jurídica da entidade, mais do que representarem em meras irregularidades administrativas, têm por consequência imediata maior dificuldade para o exercício dos controles interno ou externo por órgãos competentes, já que ausentes elementos relevantes nos três feitos administrativos.
Note-se que a Delta Veículos Especiais Ltda foi destinatária das três cartas-convites (08/2005, 09/2005 e 10/2005) e venceu os dois certames relativos às aquisições do veículo van e do ônibus (cartas-convites nº 08/2005 e 09/2005). Conforme declarou Luiz Antônio Trevisan Vedoin, no interrogatório colhido na Segunda Vara da Seção Judiciária do Estado de Mato Grosso, trata-se de empresa pertencente a Sinomar Martins Camargo, a qual foi constituída, em razão da necessidade de uma empresa do Estado do Paraná participar de licitações naquela unidade federativa, além de esclarecer que a Delta passou a dar cobertura às suas empresas no ano de 2005 (fl. 974 do apenso II, anexo I).
Por outro lado, conforme ressaltado no relatório de auditoria (convênio nº 1832/2003), houve fracionamento do objeto da licitação para evitar a tomada de preços, modalidade correta para a espécie. Como descrito pelo interrogado Luiz Antônio, eram realizados dois procedimentos licitatórios, de modo que ocorria um certame destinado à aquisição da unidade móvel de saúde e outro, exclusivamente, para a aquisição dos equipamentos médico-hospitalares. A providência garantia a utilização da carta-convite, o que propiciava o controle do resultado.
A circunstância de a empresa Transform Ind. e Com. de Veic. Especiais Ltda ter obtido resultado favorável em detrimento das concorrentes Delta Veículos Especiais Ltda e Tapeçaria Jaedi de Medianeira Ltda para transformação do ônibus em unidade médico odontológica não afasta o imputado certame dirigido que ora se examina, considerado que tal prática também integrava o modus operandi do grupo, no qual uns se dedicavam à venda de unidades móveis, ao passo que outros à comercialização de equipamentos médico-hospitalares (fl. 971 do apenso II, anexo I).
Outrossim, quanto ao convênio nº 1593/2003, constata-se que foi adquirido um veículo diverso do que o previsto no Plano de Trabalho. Consoante o objeto avençado, cuida-se de um veículo van com capacidade para 16 pessoas, entretanto licitou-se uma ambulância (fl. 105 do apenso II, volume I), justamente o que a Delta Veículos Especiais Ltda comercializava, conforme se denota dos documentos de fls. 463/464 do apenso II, volume III.
Consoante se observa, o direcionamento de licitações para favorecer específica fornecedora está manifestamente delineado nos autos.
Os depoimentos dos réus e das testemunhas de defesa, colhidos em juízo, não são aptos a refutar a conclusão anterior.
O réu Donizetti Borges Barbosa negou os fatos imputados, às fls. 623/624. Esclareceu que quem cuidava das licitações era a comissão e que a parte formal dos procedimentos ficava a cargo da corré Maria Elisa. Asseverou que pediu prorrogação de prazo em relação a dois convênios e modificação de objeto. Reconheceu que Sinomar Martins Camargo foi uma vez à prefeitura para indagar ao depoente acerca de licitação que teria interesse em participar, mas o depoente orientou-o a procurar a comissão. Que Sinomar ligou algumas vezes para o declarante, a fim de procurar saber se já havia sido autorizada a abertura da licitação, in verbis:
Maria Elisa Manca declarou, às fls. 625/625 vº, que trabalhava no setor de compras e licitações e sua função era formalizar os processos juntamente com o setor jurídico, bem como entregar ou enviar os convites às empresas. Que preparou os convites mencionados na inicial. Esclareceu que realizou as pesquisas de mercado, mas não as juntou ao processo, in verbis:
Rubens Barra Rodrigues de Lima respondeu, às fls. 627/627 vº, que foi presidente nas três licitações. Asseverou que deu pareceres jurídicos relacionados a licitações em outras prefeituras em que trabalhou. Esclareceu que a adjudicação era "montada" pelo setor de compras e, após a assinatura do prefeito, o feito seguia para a homologação do certame pela comissão. Disse que os envelopes eram entregues fechados no setor de protocolo e recebiam um número, in verbis:
Em seu depoimento, às fls. 628/628 vº, Luiz do Carmo Batista Rosa afirmou que nunca exerceu cargo em comissão de licitação antes da gestão do Prefeito Donizetti. Explicou que fazia parte da comissão descrita na inicial e que todos os integrantes se reuniam e analisavam a documentação e a proposta, in verbis:
O corréu Adilson Rodrigues de Almeida aduziu, às fls. 629/629 vº, que, no dia do julgamento, a decisão era tomada de forma conjunta. Afirmou que só participava desse ato, pois não tinha atribuições anteriores relacionadas às licitações. Aludiu à presença de pelo menos um representante de empresa, mas não se recordava de seu nome, in verbis:
Vanderlei Borges de Lima disse, às fls. 630/630 vº, que ele e Adilson tinham conhecimentos contábeis, razão pela qual faziam a conferência relativa à fase de habilitação. Respondeu que as cartas-convites foram abertas no mesmo dia em horários diferentes. Esclareceu que havia vários representantes das empresas no dia da abertura dos envelopes, mas não se recordava do número ou identidade deles, in verbis:
As testemunhas de defesa Cíntia Nuciene Sarti de Souza e Julienne Martins de Camargo Coelho afirmaram que ingressaram na Prefeitura de Apiaí/SP após a realização dos convênios noticiados nos autos (fls. 631/632).
O testigo Vandir Alves Cardoso respondeu que não houve corrupção relacionada aos réus. Disse não se recordar de nenhum fato específico acerca da reunião da Comissão de Licitação realizada no dia dos fatos. Esclareceu que os envelopes foram abertos na mesma data, pois era norma daquele comitê, in verbis (fl. 633):
Em prosseguimento da instrução foram ouvidas as testemunhas de fls. 846/853 e 864/865 por meio de gravação audiovisual.
Luiz Antônio Beluzzi foi Secretário de Assuntos Jurídicos na gestão do corréu Donizetti e tinha por atribuição a elaboração dos editais de licitação. Em relação ao convênio que teve seu objeto fracionado, esclareceu que o procedimento se deu por pressão de "Brasília", com vista à devolução dos recursos. A licitação foi cindida para evitar a restituição dos valores. Disse que os procedimentos relativos às pesquisas de preços e dos fornecedores foram realizados pela administração anterior, inclusive a assinatura dos convênios. Afirmou não se recordar de quem entregou os envelopes das licitantes. Explicou que não acompanhava os trabalhos das comissões (mídia, à fl. 854).
Fabio José de Oliveira respondeu que não participou diretamente dos atos licitatórios em tela. Afirmou que as licitações ocorreram em continuidade aos procedimentos iniciados na administração anterior. Ressaltou a seriedade dos responsáveis pela condução dos certames (mídia, à fl. 854).
José Mauro de Oliveira Pontes afirmou não saber nada acerca da situação narrada nos autos. Explicou que não teve participação das atividades relativas aos certames. Confirmou a efetiva utilização do ônibus odontológico (mídia, à fl. 854).
Julia Gonçalves de Campos ocupava o cargo de chefe de gabinete, mas não acompanhava o julgamento das propostas nem participava dos procedimentos relativos à licitação. Negou conhecer qualquer das empresas concorrentes. Afirmou que os bens (van, ônibus e respectiva transformação) foram efetivamente adquiridos e utilizados pelo município até o final da gestão. Respondeu que os recursos foram obtidos no mandato anterior. Sustentou que as prestações de contas foram aprovadas. O Departamento Jurídico era o responsável pela elaboração dos editais (mídia, à fl. 854).
Elisete Maria de Andrade Assis esclareceu que trabalhava no Departamento Pessoal; não presenciava o julgamento das propostas; desconhecia quem eram os responsáveis pela elaboração dos editais. Disse que uma parte do procedimento relativo aos recursos para aquisição da van e do ônibus deu-se no mandato do Dr. Emilson e terminou com o Prefeito Donizetti (mídia, à fl. 854).
Gilmara da Silva Ramos, telefonista, à época, soube dos fatos versados nos autos por comentários de terceiros. Afirmou que o ônibus e a van foram adquiridos e utilizados por tempo considerável (mídia, à fl. 854).
Andréia Sarti de Morais tinha a função de tesoureira e tomou conhecimento da aquisição e feitos licitatórios atinentes à van, ao ônibus e sua transformação em gabinete odontológico. Afirmou que os bens foram realmente adquiridos; o pagamento foi realizado após a exibição de toda documentação atestada pelo secretário acerca do recebimento dos bens; a verba federal foi adquirida durante o mandato do Prefeito Emilson. Esclareceu que o edital era elaborado pelo Departamento Jurídico, juntamente com o Departamento de Compras (mídia, à fl. 854).
Dirceu Carneiro de Oliveira ocupava o cargo de encarregado do serviço de transporte ambulatorial, mas ingressou nesse setor após a aquisição dos veículos. Afirmou que funcionavam regularmente. A van era utilizada para o transporte de pacientes para outros municípios, o ônibus prestava serviços odontológicos (mídia, à fl. 854).
Keraban Vilella Costa Filho, Coordenador de Saúde Bucal, à época, afirmou que utilizou muito o ônibus. Explicou não ter conhecimento acerca do uso da ambulância. Soube da existência do veículo no mandato de Donizetti. Não teve nenhuma participação em relação ao projeto de aquisição/transformação do ônibus. O veículo serviu no bairro Palmitalzinho até a instalação da unidade básica de saúde ser estabelecida e, posteriormente, foi direcionado a outras localidades (mídia, à fl. 866).
Carlos Alberto Dario Bastos de Moraes detinha os cargos de Vice-Prefeito e Secretário da Saúde nos anos de 2005 e 2006. Esclareceu que a carta de licitação foi emitida pela Secretaria de Saúde e que os recursos foram recebidos na gestão do Prefeito Donizetti. Explicou que sua participação limitou-se a solicitar ao prefeito a compra dos bens. Afirmou que o ofício de solicitação da aquisição originava-se na Secretaria da Saúde. Asseverou que a mencionada compra consistia em um projeto do órgão sob seu secretariado. Consignou a real aquisição e utilização dos bens. Disse que foi comprado um ônibus normal e depois adaptado, porque a empresa que vendia o veículo não fazia a adaptação, o que foi feito por outra sociedade empresária. (mídia, à fl. 866)
Como já se consignou, as declarações das testemunhas ouvidas em juízo não têm o condão de infirmar a convicção acerca da perpetração das ações descritas pelo autor, relativamente ao direcionamento das licitações, pois não participaram diretamente dos procedimentos licitatórios, não se recordaram de fato específico acerca da reunião da comissão e obtiveram informações por terceiros.
A explicação de Luiz Antônio Beluzzi para a cisão do certame relativo ao ônibus não convence, à vista da fragilidade do argumento de que teria sido por pressão de "Brasília" com vista à devolução dos recursos. Não apresentou qualquer razão verossímil para se considerar o fracionamento mais rápido ou vantajoso para a administração.
Conforme se infere das declarações da testemunha de defesa, o então Secretário Municipal de Saúde, Carlos Alberto Bastos de Moraes, a empresa que forneceu o ônibus para o município não realizava a transformação em unidade móvel de saúde, razão pela qual tal serviço foi realizado por outra. No entanto, não só a Delta foi destinatária da carta-convite nº 10/2005 como participou desse certame, mais uma circunstância que se identifica com o sistema de ação narrado por Luiz Antônio, no sentido de que era usual a cobertura recíproca entre empresas em licitações. Por outro lado, o fracionamento do objeto da licitação, em razão de a empresa fornecedora do ônibus não realizar a adaptação do veículo, constitui forte elemento probatório acerca do direcionamento.
Não se trata, portanto, de imputação de responsabilidade ao município baseada unicamente no depoimento de Luiz Antônio, mas na análise do conjunto probatório produzido à luz do devido processo legal.
As diversas irregularidades apontadas pelos relatórios do DENASUS, bem como a realização conjunta dos atos administrativos, cujas fases ocorreram rigorosamente nas mesmas datas, o protocolo simultâneo de três empresas concorrentes com titularidades e endereços diversos, o fracionamento do objeto a ser licitado, a licitação de bem diverso ao previsto no Plano de Trabalho, consubstanciam ação planejada e ordenada com o intuito de dar aparência de legalidade aos certames manifestamente direcionados para favorecer a empresa Delta Veículos Especiais Ltda.
Veja-se que a situação apurada nos autos coaduna-se com as narrativas de Luiz Antônio Trevisan Vedoin acerca da obtenção de recursos por meio de emendas parlamentares ao orçamento da União em favor de municípios, cujos agentes públicos municipais, previamente contatados, concordavam em formalizar e conduzir procedimentos licitatórios engendrados para propiciar o direcionamento das licitações. Note-se que o depoente foi expresso quanto às emendas relativas ao exercício de 2003, as quais foram apresentadas em favor do Município de Apiaí e outras entidades e cidades paulistas. Esclareceu que, em Apiaí e Vargem, bastou o parlamentar fazer o contato telefônico com os prefeitos para acertar os detalhes do direcionamento das licitações. (fl. 1085 do anexo I)
Assim, os acervos oral e documental consubstanciam um conjunto harmônico a demonstrar a materialidade e a autoria em relação a Donizetti Borges Barbosa, bem como autoriza concluir que tenham os réus Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima concorrido, voluntária e conscientemente, para o direcionamento da licitação.
Note-se que o então Prefeito Donizetti Borges Barbosa assinou os editais 08/2005, 09/2005 e 10/2005 para a compra do mencionado ônibus e respectiva transformação em UMS, bem como da van, em 05/04/2005 (fls. 364/368, 446/451, do apenso II, volume II e 541/546 do apenso II, volume III), além de ter firmado os termos de homologação e adjudicação (fls. 631/632, 438/439 e 532/533 do apenso II, volume III).
As cartas-convites foram enviadas a três empresas, inclusive para a Delta Veículos Especiais Ltda, na mesma data, a qual sequer realizava o serviço de transformação de veículo em unidade móvel de saúde, a teor do depoimento de Carlos Alberto Dario Bastos de Moraes, Vice-Prefeito e Secretário da Saúde, à época.
Ressalte-se que a mencionada sociedade empresária, conforme esclareceu Luiz Antônio Vedoin no depoimento prestado na Segunda Vara Federal em Cuiabá/MT, pertencia a Sinomar Martins Camargo e foi constituída especificamente para participar de licitações (fl. 974 do apenso II, anexo I). Ademais, conforme asseverou Luiz Antônio, pelo fato de a homologação da licitação, empenho e pagamento estar a cargo dos prefeitos, sem exceção, eles sabiam das circunstâncias em que a licitação iria ocorrer (fls. 987 do apenso II, anexo I). Também se destaca sua assertiva a respeito de emenda parlamentar apresentada em favor do Município de Apiaí/SP e outros no exercício de 2003. Acrescentou que, em Apiaí e (...), bastou o parlamentar fazer o contato por telefone com os prefeitos para acertar os detalhes do direcionamento das licitações. (fl. 1085 do apenso II, anexo I)
Destarte, não se sustentam as afirmações de que não houve anuência do corréu Donizetti B. Barbosa, porque não era Prefeito de Apiaí/SP à época em que o recurso federal foi concedido, já que todos os atos necessários para a execução ocorreram em sua gestão. Aliás, consoante seu depoimento, chegou a pedir prorrogação de prazo de dois convênios, além de solicitar modificação de objeto.
Maria Elisa Manca solicitou informações sobre as disponibilidades de dotações orçamentárias, firmou os convites nº 08/2005, 09/2005 e 10/2005 e os enviou às licitantes, conforme se extrai dos documentos de fls. 370, 373/375, 454 e 457/459 do apenso II, volume II, e fls. 548 e 551/553 do apenso II, volume III.
Conforme declarou, trabalhava no setor de compras e licitações e sua função era formalizar os processos juntamente com o setor jurídico, bem como entregar ou enviar os convites às empresas. Afirmou que realizou as pesquisas prévias de mercado, mas não as juntou aos autos. Infere-se que lhe cabia encontrar os fornecedores para os procedimentos licitatórios (fl. 625).
À vista de suas atribuições, não há como refutar que tivesse conhecimento do direcionamento da licitação, sobretudo no caso do certame relativo à adaptação do ônibus, em que a correspondência foi endereçada a empresa que não realizava o serviço pretendido.
Rubens Barra Rodrigues de Lima, às fls. 627/627 vº, respondeu que foi presidente nos três certames e que antes destes fatos o depoente não trabalhava na prefeitura, na qual ingressou em janeiro de 2005 no cargo em comissão de Procurador Jurídico. Asseverou que deu pareceres relacionados a licitações em outras prefeituras em que trabalhou.
Constata-se que foi nomeado para a Comissão Permanente para o julgamento de licitação no mês em que assumiu o cargo em comissão na Prefeitura de Apiaí-SP. É o que se extrai da Portaria Municipal nº 16, de 03 de janeiro de 2005, em que consta a nomeação de sete membros para o exercício de 2005, sem menção das respectivas atribuições, incluídos os réus Rubens Barra Rodrigues de Lima, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima (fl. 372 do apenso II, volume II).
Não há informação nos autos acerca da indicação, mas o fato é que o corréu Rubens Barra Rodrigues de Lima presidiu os três certames (fls. 435/436, 530/531 e 628/629 do apenso II, volume III). Por outro lado, os demais membros do colegiado afirmaram que tinham atribuições somente na data da abertura dos convites.
Ante sua anterior experiência profissional e seu cargo de Procurador Jurídico, estava qualificado para exercer a devida fiscalização em relação aos atos por ele presididos. Entretanto, não atuou de forma corretiva.
Nas ocasiões de aberturas das propostas somente a empresa Delta Veículos Especiais Ltda apresentou-se regularmente representada por Sinomar Martins Camargo. Ainda assim, constaram em atas as presenças de outras concorrentes, cujos representantes não exibiram procurações e não há alusão a nenhum documento na qualificação. Apesar disso, assinaram os registros (fls. 435/436, 530/531 e 628/629 do apenso II, volume III). Não há notícia de regularização posterior. Ademais, nada se consignou acerca das irregularidades formais apontadas pelo relatório CGU/DENASUS, enumeradas anteriormente.
Perquirido a respeito, o corréu Rubens Barra Rodrigues de Lima respondeu que não vê nenhum óbice em não portarem procuração ou documentos na abertura dos envelopes. Também declarou que os integrantes da Comissão de Licitação não tiveram contato prévio com os representantes das empresas e que resolviam todos os problemas relacionados à espécie. Explicou que o processo já vinha formalizado do Departamento Jurídico, motivo pelo qual não elaborou nada atinente a fracionamento (fl. 627).
Conhecedor de sua responsabilidade como presidente, não é aceitável que deliberasse recomendar a adjudicação sem o exame de todos os documentos pertinentes. Ademais, ainda que seja plausível que terceiro(s) tenha(m) se apresentado na qualidade de preposto(s), não se afigura verossímil que o corréu tenha permitido que ele(s) assinasse(m) as atas em nome das proponentes, à míngua de qualquer identificação ou procuração que os legitimasse(m), sem que o fizesse deliberadamente para propiciar o êxito do ilícito.
Como bem assentou o magistrado a quo, a assertiva de que havia outros prepostos presentes no feito, porém sem portar documentos, é inconvincente, in verbis:
Obviamente, a concorrente para a qual se dirigiram os certames não figurar sozinha no julgamento das propostas acaba por dar aparência de idoneidade à concorrência.
Assim, patente o concurso do corréu Rubens Barra Rodrigues de Lima para com a conduta do então Prefeito Donizetti Borges Barbosa.
Os réus Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima, membros da Comissão Permanente para o julgamento de licitações, são servidores concursados da Prefeitura Municipal de Apiaí. A teor de seus depoimentos, somente a partir do ano de 2005 passaram a exercer tal designação. Por outro lado, suas participações nos procedimentos deram-se somente no dia da abertura dos envelopes (fls. 628/630 vº).
O cotejo de suas declarações com as dos outros réus, assim como documentos e depoimentos existentes, não demonstra que tenham concorrido voluntária e conscientemente para a fraude verificada, na medida em que não há qualquer prova nos autos de que tivessem conhecimento do direcionamento pretendido pelos demais apelantes. De outro lado, Luiz C.B. Rosa trabalhava no setor de almoxarifado, antes de integrar a comissão, Adilson R. Almeida e Vanderlei Borges de Lima ocupavam o cargo de escriturário, de modo que, a par da inexistência de provas e por se tratar de um procedimento não afeto às suas áreas funcionais, exsurge que agiram culposamente, o que não afasta a possibilidade de responderem por atuação negligente na Comissão de Licitação.
Para a perpetração da fraude seria imprescindível o atendimento dos aspectos formais exigíveis para a realização do certame, inclusive das atividades atinentes à Comissão de Licitação, que têm a seguinte definição no artigo 6º, inciso XVI, da lei 8.666/93:
Exsurge que a lei imputa função de maior complexidade do que a que estes réus, na verdade, desempenhavam. Infere-se de suas declarações que se reuniam somente no dia da abertura dos envelopes para análise dos documentos e propostas, não tinham atribuição específica e não acompanhavam o que acontecia antes ou depois dessa sessão (fls. 628/630).
Portanto, ainda que não tivessem conhecimento dos desígnios dos demais corréus, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima assumiram o encargo de membros da Comissão Permanente, mas não se desincumbiram das responsabilidades inerentes, de modo que propiciaram o êxito da realização da conduta.
Por outro lado, não demonstraram terem sido coagidos a tal proceder.
A propósito do tema o seguinte trecho da obra de Adriano Andrade, Cleber Masson e Landolfo Andrade:
No mesmo sentido, julgado do E. S.T.J.:
Destarte, em relação aos corréus Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima, não há que se perquirir sobre a ausência de má-fé, à vista de suas condutas culposas, o que não se aplica a Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima, os quais atuaram com o dolo de propiciar a contratação da empresa Delta Veículos Especiais Ltda mediante licitação inidônea.
A afirmação da defesa de que foram realizadas as prévias pesquisas de preço não restou comprovada nos autos. Os relatórios de auditoria apontaram a ausência do documento no feito administrativo. A realização do certame sem a providência prevista no artigo 15, § 1º, da Lei nº 8.666/93 é mais um elemento relevante a corroborar a prática da conduta imputada, pois é compatível com a intenção de, ao final, assegurar-se o êxito de específico concorrente. O argumento de que o ato era realizado informalmente, sem a juntada no respectivo procedimento, afigura-se imprestável para efeito de prova.
Também não merece guarida a alegação de que o relatório CGU/DENASUS é impreciso quanto à diferença de valor pago às licitantes em relação ao preço de mercado, bem como omisso quanto à demonstração dos parâmetros de comparação. A metodologia de cálculo do débito é facilmente encontrada no site do Tribunal de Contas da União.
O acórdão TCU nº 2451/2007/Plenário versou sobre a solicitação da Câmara dos Deputados de auditoria nos recursos federais relativos a denúncias acerca da "Operação Sanguessuga", deflagrada pela Polícia Federal com o objetivo de investigar fraudes em licitações destinadas à aquisição de unidades móveis. Considerou-se válido o método desenvolvido pela Controladoria Geral da União, para fins de quantificação dos débitos e posterior citação dos responsáveis. Conforme consignou o relator Ministro Marcos Vinicios Vilaça: "O Sistema de Cálculo de Prejuízo das Unidades Móveis de Saúde - SGI foi desenvolvido pela CGU com o objetivo de permitir a comparação de preços das UMS adquiridas nos convênios com as disponíveis no mercado. A composição do custo foi realizada com base na soma dos valores do veículo, dos equipamentos integrantes e da transformação em unidade móvel de saúde. Com relação a esse último componente do custo, a equipe destaca as diferenças de qualidade na montagem das UMS. Os valores estimados são baseados em serviços de alto padrão, com materiais de qualidade satisfatória e equipamentos de marcas tradicionais, enquanto as montagens realizadas pelas empresas vencedoras das licitações carecem, muitas vezes, de qualidade aceitável. De acordo com a equipe, "em várias licitações, foram adquiridos ônibus sucateados, realizadas transformações de péssima qualidade e instalados equipamentos desconhecidos - o que configura montagens do tipo fundo de quintal". De qualquer forma, o valor base para comparação pode estar superestimado, conferindo à comparação uma nota de conservadorismo." (Consulta eletrônica de jurisprudência no site do TCU)
O método consiste, em síntese, no estabelecimento de preços de mercado relativos às unidades móveis de saúde e às transformações, por meio de ampla pesquisa, inclusive considerados os praticados pelo grupo Planam, além de valores obtidos na Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas-FIPE e na Secretaria de Fazenda do Estado de Rondônia-Sefaz/RO (tabela do IPVA), que utiliza a FIPE como referência. Assim, ao contrário do argumento da defesa, há nos autos provas que demonstraram o prejuízo ao erário com a aquisição do ônibus e com a respectiva adaptação.
Assim, incabível a alegação genérica de que os valores efetivamente pagos são de mercado, devidamente pautados em pesquisa de preços e orçamento predefinido. Ademais, sequer foram juntadas as consultas prévias nos respectivos processos administrativos, instrumento necessário até para que se estipulasse a adequada modalidade de licitação e obstasse o exaurimento dos recursos com propostas exorbitantes. À vista do descumprimento de norma legal, inviável a aferição da assertiva. Além disso, os apelantes desistiram da prova pericial, à fl. 890, o que denota conformismo com os cálculos então apresentados. Também não repercute para fins de afastamento da responsabilidade que o valor empregado seja inferior ao previsto no Plano de Trabalho, porquanto se demonstrou superfaturamento em relação aos parâmetros utilizados pela Controladoria Geral da União.
Com o intuito de demonstrar a regularidade procedimental afirma-se que a inexistência de autorização para a abertura do certame não obsta sua homologação e que a lei não impõe a identificação da pessoa que retira o edital. Não prospera a alegação. Ao tratar do procedimento e julgamento da licitação, o artigo 38 da Lei nº 8.666/93 prevê seu início, mediante a abertura de processo administrativo, o qual deverá ser instruído com a respectiva autorização, bem como o comprovante da entrega do convite. Confira-se:
Não faria sentido a legislação exigir a instrução do feito com o comprovante de entrega do convite sem a devida identificação do signatário ou que dispusesse sobre a juntada de autorização de abertura, se sua dispensa ficasse a critério do administrador. Confira-se o escólio de José dos Santos Carvalho filho:
Com a razão a sentença ao suscitar a incompatibilidade lógica de o corréu Rubens Barra R. de Lima, à vista de sua formação jurídica, ter permitido a assinatura em nome de sociedade empresária sem que o signatário comprovasse a qualidade de preposto. Como já acentuado, restou duvidosa a efetiva participação dos representantes de empresas mencionados nas atas de julgamento.
Os apelantes invocam a inaptidão probatória do relatório DENASUS, sob o fundamento de que apontou indevidamente o fim da vigência do convênio nº 1832/2003 em 22/02/2007, em vez da data de 24/06/2007, conforme demonstra a documentação acostada na apelação.
Note-se que as considerações dos auditores aludem a falhas administrativas durante a execução do convênio, tal como o prazo de vigência não considerado para prorrogação (fl. 143 do apenso II, volume I). Os recursos foram liberados em 22/04/2004 (fl. 121 do apenso II, volume I). A vigência original final estava fixada para 25/12/2004 e foi prorrogada por duas vezes como se extrai da fl. 123 do apenso II, volume I e, conforme se infere nos documentos que instruem a apelação, houve novos pedidos de dilação (fls. 1049/1066), de modo que eventual inconsistência nesse sentido deve-se às sucessivas renovações de prazo para a prestação de contas, o que não compromete a lisura da auditoria realizada.
Não se sustenta a afirmação de que não haveria como impedir que empresas ligadas a Luiz Antônio Trevisan Vedoin participassem do certame, já que as interessadas em licitar obtêm informações a respeito por meio da internet ou publicações oficiais. O conjunto probatório, conforme já explicitado, não deixa dúvidas quanto à prática do direcionamento a fim de favorecer específica licitante.
No tocante à ausência de prova acerca da divulgação do certame, alude-se que para a espécie não se exige nenhum tipo de publicidade. Não assiste razão aos apelantes.
É certo que a modalidade convite é a mais singela e demanda menos formalismo, razão pela qual não se exige a publicação na imprensa oficial. Todavia, a Lei nº 8.666/93 admite a participação de interessados não convidados. Seu artigo 22, § 3º, dispõe acerca da afixação, em local apropriado, de cópia do instrumento convocatório para propiciar aos demais cadastrados na correspondente especialidade manifestarem seu interesse.
A teor de depoimento de Maria Elisa Manca, responsável pela formalização dos procedimentos junto com o setor jurídico, sequer foram enviados convites a outras empresas, inclusive uma localizada na cidade de Bauru, porque seu preço era mais caro que as enumeradas na inicial. Nada esclareceu acerca da medida prevista pela legislação. Outrossim, os demais réus e testemunhas não se reportaram ao tema. Portanto, não se desconstituiu o apontamento da auditoria acerca da carência probatória nesse sentido. Confira-se o seguinte julgado do E. S.T.J.:
O fato de as ações ilícitas relatadas por Luiz Antônio Vedoin antecederem o julgamento da licitação não exclui a responsabilização dos membros da comissão, porquanto, como se viu, respondem culposamente pela perpetração de suas condutas.
A circunstância de não ter havido pagamento de qualquer comissão para o prefeito ou servidores não afasta a responsabilidade pelos atos imputados.
A Lei nº 8.429/92, na esteira do disposto no artigo 37 e seu § 4º da Constituição Federal, enumera as condutas dos agentes públicos que configuram atos de improbidade administrativa, discriminados entre os que: importem em enriquecimento ilícito (art. 9º), causem prejuízo ao erário (art. 10) e atentem contra os princípios da administração pública (art. 11).
Aquele que realizou atos que se subsumam em uma ou mais dessas categorias infringe os ditames da Lei de Improbidade Administrativa e, portanto, haverá de suportar as sanções previstas no seu artigo 12, atendido o seu parágrafo único.
A inexistência de enriquecimento ilícito não obsta a caracterização de improbidade, dado que, nestes autos, não se cuida de condutas previstas no artigo 9º da Lei nº 8.429/92, mas, sim, as discriminadas no artigo 10, que correspondem, respectivamente, a causar prejuízo ao erário.
Evidente a ocorrência no caso sob análise, ao menos em relação ao convênio nº 1832/2003, elemento indispensável para a caracterização dos atos de improbidade descritos no artigo 10 da Lei de improbidade, uma vez que a conduta do agente público, em princípio, acarretou não apenas dano estimado em R$ 83.923,58, como também a realização da transformação em desacordo com o Plano de Trabalho aprovado e consequente inexistência de consultório pediátrico/médico e ginecológico, o que privou a população do atendimento almejado com o convênio. Note-se que o valor corresponde ao que foi pago a mais ao estimado de mercado, o que para o ônibus perfaz R$ 41.668,00 e para a transformação R$ 31.075,58, além do saldo não executado de R$ 11.180,00 (fl. 139 do apenso II, volume I). Destarte, houve lesão ao erário. Despiciendo, portanto, o argumento acerca da inexistência de indício de que seria possível a contratação do mesmo serviço de maneira diversa da que foi realizada pela Prefeitura de Apiai/SP, já que os parâmetros foram obtidos por meio de pesquisas, o que indica a existência de outros fornecedores.
Relativamente ao convênio nº 1594/2003, conforme consta à fl. 111 do apenso II, volume I, não se identificou prejuízo ao erário, o que afasta a incidência do artigo 10 da LIA, porque a figura apresenta uma descrição de conduta lesiva. Assim, como observou o juiz a quo, não há se falar em duas práticas de improbidade.
Especificamente acerca da perda patrimonial como requisito do tipo previsto no artigo 10 da Lei de Improbidade, convém destacar a lição de Adriano Andrade, Cleber Masson e Landolfo Andrade, em sua obra sobre direitos difusos e coletivos:
A defesa escuda-se da prática de improbidade sob o fundamento de que houve a efetiva utilização do objeto licitado, bem como o emprego dos recursos para as respectivas aquisições. O exame do caso dos autos não abrange tais aspectos, os quais restaram incontroversos, mas o caráter fraudulento dos certames e o prejuízo resultante do superfaturamento. O que a lei pretende tutelar no inciso VIII do artigo 10 da Lei nº 8.429/92 é a licitude do procedimento licitatório e sua índole competitiva.
Quanto à alegada impossibilidade de os apelantes apurarem a participação inidônea de empresas, à vista da regularidade documental, não se apresenta plausível. Considerado o interesse daquela constituída para o fim de participar em licitações, por certo seria apresentada toda a documentação necessária para o desiderato, tanto que não se apontou nenhuma inconsistência em relação os documentos exibidos pela Delta Veículos Especiais Ltda, o que não afasta a responsabilidade dos réus, já que a fraude não é relativa à indevida habilitação dos candidatos e, sim, ao modo indevidamente dirigido para se chegar ao resultado.
Assim, demonstrada a materialidade e a autoria do ato ímprobo, a manutenção da condenação é medida que se impõe.
Veja-se que esta Corte já teve oportunidade de apreciar situação análoga, ocasião em que deu parcial provimento à apelação da União e à remessa oficial para reformar a sentença absolutória, in verbis:
Também em caso semelhante, assim decidiu a Primeira Turma do Tribunal Regional da 5ª Região:
DA TIPIFICAÇÃO E DA RESPONSABILIZAÇÃO POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
O caput do artigo 37 da Carta Magna estabelece que: "A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (...)". O seu § 4º prevê a punição por atos de improbidade administrativa a serem especificados em lei (no caso, a Lei nº 8.429/92), sem prejuízo da ação penal.
A Lei de Improbidade Administrativa nº 8.429/92 disciplinou as condutas consideradas desonestas e as sanções correspondentes, tanto no campo interno da administração pública como em relação a particulares que induzirem ou concorrerem para a prática de ato de improbidade ou dele se beneficiarem sob qualquer forma, direta ou indiretamente, consoante dispõe o seu artigo 3º, o qual prevê que suas disposições são aplicáveis, no que couber, também àqueles que não são membros do poder público.
O dever geral de probidade administrativa, contemplado pela Lei Maior no mencionado artigo 37, impõe conduta consoante os princípios da ética na gestão da coisa pública, notadamente a boa fé, a lealdade, a moralidade, o respeito e o zelo pelo patrimônio público. Tem-se, portanto, o desvio de conduta sempre que o agente público se afasta desses padrões, para almejar vantagens materiais ilícitas e/ou causar prejuízo ao erário.
Especificamente com relação à licitação, invoca-se inciso XXI do artigo 37 da Carta Magna na parte em que destaca que: " XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.".
A Lei nº 8.429/92, na esteira do disposto no artigo 37 e seu § 4º da Constituição Federal, enumera as condutas dos agentes públicos que configuram atos de improbidade administrativa, discriminados entre os que: importem em enriquecimento ilícito (art. 9º), causem prejuízo ao erário (art. 10) e atentem contra os princípios da administração pública (art. 11). Impõe aos responsáveis, independentemente das sanções penais, civis e administrativas, as cominações que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato (art. 12, caput), considerada a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente (art. 12, parágrafo único).
In casu, foi constatada a incidência do artigo 10, caput e inciso VIII, que dispõe:
Conforme explicitado anteriormente, restou comprovado o direcionamento da licitação com o intuito de favorecer a empresa Delta Veículos Especiais Ltda, o que culminou no superfaturamento do objeto e prejuízo ao erário, perpetrado por Donizetti Borges Barbosa com a participação voluntária e consciente dos corréus Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima.
Outrossim, ainda que não tivessem conhecimento dos desígnios dos demais corréus, Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima assumiram o encargo de membros da comissão permanente, mas não se desincumbiram das responsabilidades inerentes, de modo que propiciaram o êxito da realização das condutas.
Assim, todos os réus infringiram o artigo 10, caput e inciso VIII, da LIA. Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima respondem por dolo, ao passo que Luiz do Carmo Batista Rosa, Adilson Rodrigues de Almeida e Vanderlei Borges de Lima por culpa.
É inegável, portanto, que incorreram na prática de graves atos de improbidade, porquanto fizeram tábua rasa das disposições constitucionais e das leis de regência em matéria de licitação, que preveem a observância do princípio da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração, bem como o processamento e julgamento em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, em relação às quais estavam obrigados a obedecê-las.
Para Marçal Justen Filho, improbidade administrativa: "consiste na ação ou omissão violadora do dever constitucional de moralidade no exercício da função pública, que acarreta a imposição de sanções civis, administrativas e penais, de modo cumulativo ou não, tal como definido em lei", ou seja, que "pode envolver tanto uma atuação ativa como uma manifestação omissiva", cuja configuração "pressupõe um elemento subjetivo", que, como regra, "se aperfeiçoa mediante um elemento doloso, admitindo-se a forma culposa como exceção" (Curso de Direito Administrativo, 8ª ed. rev., ampl. e atual.. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2012, p. 1010).
O Superior Tribunal de Justiça apresenta a seguinte orientação:
Cabe, portanto, responsabilizá-los por suas condutas ou omissões reprováveis. Incidem as sanções previstas no artigo 12 da Lei de Improbidade Administrativa.
No tocante à insurgência com a dosimetria da sanção, alega-se, em síntese: afronta aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade; a não consideração da lesividade e reprovabilidade dos atos praticados, bem como do respectivo interesse público; a incompatibilidade da reprimenda fixada com o desvalor da conduta; a falta de explicitação dos motivos da punição; a possibilidade da não cumulatividade; enriquecimento ilegal da administração decorrente do ressarcimento integral do dano, ante a prestação do serviço; ausência dos pressupostos para a indisponibilidade de bens; impossibilidade de prover seus sustentos, de familiares e dependentes, à vista da condenação.
DAS SANÇÕES DA LEI Nº 8.429/92
Preambularmente, convém recordar que os ilícitos do artigo 37, § 4º, da C.F., disciplinado nos artigos 9º a 11 da Lei de Improbidade Administrativa, não têm natureza penal. Veja-se o que leciona a Prof. Maria Sylvia Zanella de Pietro:
O Supremo Tribunal Federal, quando apreciou a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.797, ocasião em que declarou inconstitucional a Lei nº 10.628/02, que havia acrescentado os §§ 1º e 2º ao artigo 84 do Código de Processo Penal para manter a competência de foro por prerrogativa de função mesmo após a cessação da função pública e para estendê-la às ações de improbidade, também deixou clara sua natureza civil:
A Lei de Improbidade Administrativa distingue três modalidades de atos de improbidade: a) enriquecimento ilícito (art. 9º); b) lesão ao erário (artigo 10º); e c) atentado contra os princípios da administração pública (art. 11). Em correlação com essa classificação, o artigo 12 estabelece nos incisos I, II e III as sanções respectivamente aplicáveis. Especificamente para o prejuízo ao erário, caso dos autos, dispõe:
Extraem-se do mencionado dispositivo as seguintes penalidades:
Houve, no entanto, importante divergência doutrinária entre os que entendiam que a legislação impunha a aplicação cumulativa dessas penas e aqueles para os quais era possível ao magistrado a dosimetria com base no parágrafo único. Sobre esse aspecto, destaco:
Não obstante, assentou-se no Superior Tribunal de Justiça a orientação de que a aplicação não era necessariamente cumulativa:
Para eliminar qualquer dúvida, o legislador adotou a jurisprudência daquela corte superior e editou a Lei nº 12.120/09 por meio da qual deu ao caput do artigo 12 a seguinte redação:
Ressalta-se a lição doutrinária a respeito:
Em conclusão, o argumento de que as penas dos incisos I a III do artigo 12 devem ser necessariamente aplicadas de forma cumulativa está superado pela expressa disposição do caput de que "podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente", incluída pela Lei nº 12.120/09 em resposta ao debate que se estabelecera e em consonância com o entendimento do STJ.
In casu, porém, à vista da gravidade dos atos praticados pelos réus, conforme demonstrada anteriormente, com supedâneo no parágrafo único do artigo 12 da Lei nº 8.429/92, no que se refere à fixação das penas entendo que o juízo a quo houve-se bem. Cabe ressaltar que, ao estabelecê-las em patamar próximo ao mínimo legal, bem como ao optar pela cumulatividade, apontou as circunstâncias em que baseava sua decisão. Confira-se:
Constata-se que a sentença está bem fundamentada nos elementos de prova dos autos e, no que concerne à fixação das sanções, nada há que se reparar. Houve descrição das condutas de cada um dos réus, apontaram-se os motivos da cumulação das reprimendas, relativamente a Donizetti Borges Barbosa, Maria Elisa Manca e Rubens Barra Rodrigues de Lima, bem como a valoração do pagamento de multa civil teve por base o grau de participação dos apelantes em relação à perpetração da improbidade. Considerou-se a conduta culposa dos apelantes que responderam nessa modalidade, o que resultou em dosimetria mais branda em relação aos demais.
DO RESSARCIMENTO INTEGRAL AO ERÁRIO
O ressarcimento integral do dano, previsto na primeira parte do inciso II do artigo 12 da Lei 8.429/92, pressupõe conduta dolosa ou culposa do agente que implica perda patrimonial. Já se demonstrou sua existência no caso sob exame, ao menos em relação ao convênio nº 1832/2003, elemento indispensável para a caracterização dos atos de improbidade descritos no artigo 10 da LIA, uma vez que a ação imputada aos réus, em princípio, acarretou não apenas prejuízo estimado de R$ 83.923,58, como, também, a realização da transformação em desacordo com o Plano de Trabalho aprovado e consequente inexistência de consultório pediátrico/médico e ginecológico, o que privou a população do atendimento almejado com o convênio. Note-se que o valor corresponde ao que foi pago a mais que o estimado de mercado, o que para o ônibus perfaz R$ 41.668,00 e para a transformação R$ 31.075,58, além do saldo não executado de R$ 11.180,00 (fl. 139 do apenso II, volume I). Assim, à vista da lesão aos cofres públicos, evidente a obrigação de reparação, a qual não tem natureza cominatória, mas constitui medida decorrente do ato lesivo, não impeditiva da incidência das reprimendas previstas para a espécie, a teor da jurisprudência do E.STJ. Confira-se:
DA PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA
Registre-se que a Lei nº 8.429/92 prevê em seu artigo 12 a perda da função pública como forma de sanção, a qual tem como finalidade (Interesses difusos e coletivos esquematizado, ANDRADE, Adriano, MASSON, Cleber e LANDOLFO, Andrade, 2ª ed. ver., atual. e ampli., Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012, p. 720): [...] afastar dos quadros da Administração Pública todos os agentes que demonstraram pouco ou nenhum apreço pelos princípios regentes da atividade estatal, denotando uma deformidade de caráter incompatível com a natureza da função exercida. Constatada, portanto, a prática de ato que vá de encontro aos preceitos que a norteiam, a penalidade serve para impedir que continue a desempenhar qualquer atividade nociva à sociedade na qualidade de agente público. Dessa maneira, não há restrição de sua aplicação a uma determinada categoria de pessoas. (Improbidade administrativa, GARCIA, Emerson e ALVES, Rogério Pacheco, 6ª ed., rev. e ampl. e atualizada, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 552):
Saliente-se que não é somente a função relacionada ao ato considerado ímprobo que deve ser cessada, mas toda atividade pública, justamente em razão da já mencionada falta de consideração dos agentes em relação aos princípios norteadores da administração. A finalidade da LIA é (GARCIA, Emerson e ALVES, Rogério Pacheco, obra citada, p. 553):
Ademais, a lei não estabelece qualquer prazo de suposta duração dessa medida repressiva, como fez com relação aos direitos políticos e à contratação com o poder público. A própria redação do dispositivo, do qual consta especificamente a palavra "perda", demonstra que não há que se falar em limitação temporal. Se o legislador almejasse qualquer tipo de restrição, teria utilizado outra expressão, como fez, reitere-se, quando indicou como sanções a suspensão (e não perda) dos direitos políticos de cinco a oito anos e a proibição de contratação com o poder público ou de recebimento de benefícios ou incentivos ficais pelo prazo de cinco anos. Em ambas resta evidente a pretensão de se impor um limite, o que não se verifica quanto à perda da função pública. Sobre o tema já dissertaram Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves (obra citada, p. 551), no sentido de que a penalidade objetiva dissolver a relação jurídica estabelecida entre o agente ímprobo e o poder público e, mais, afirmam que:
Destarte, pelas mesmas razões descritas com relação à lei de improbidade, vê-se que o constituinte expressamente estabeleceu no dispositivo que os atos ímprobos importarão a "perda" da função pública e não a suspensão de seu exercício, por exemplo, como fez com relação à suspensão dos direitos políticos. Por outro lado, tal não significa que aqueles que são penalizados com a mencionada sanção não possam ingressar novamente na carreira pública em outra função (GARCIA, Emerson e ALVES, Rogério Pacheco, obra citada, p. 558):
Destaque-se julgado do Superior Tribunal de Justiça a respeito:
DA SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS
Sobre a abrangência dos direitos políticos o Ministro Gilmar Mendes pontua que:
A Constituição Federal veda a cassação dos direitos políticos, mas admite sua perda ou suspensão nas situações que discrimina:
Fundada na autorização constitucional, a Lei nº 8.429/92 previu nos três incisos do seu artigo 12 diferentes períodos para a suspensão dos direitos políticos: oito a dez anos no caso de enriquecimento ilícito (inciso I); cinco a oito anos se houver lesão ao erário (inciso II); três a cinco anos se a condenação for por infração aos princípios da administração pública (inciso III). Extrai-se ainda dessa norma que todas as condutas ímprobas tipificadas nos artigos 9º ao 11 são passíveis de receber essa reprimenda e que o legislador limitou-se a estabelecer relação entre as que considerou mais graves e a duração da pena, sem qualquer referência à qualificação do agente.
DA PROIBIÇÃO DE CONTRATAR COM O PODER PÚBLICO OU RECEBER BENEFÍCIOS OU INCENTIVOS FISCAIS OU CREDITÍCIOS
A sanção em questão foi cominada nos três incisos do artigo 12 da LIA por prazo certo, mas com distintas graduações: o enriquecimento ilícito acarreta a proibição de contratar por dez anos, o dano ao erário por cinco e a violação de princípios por três. Cuida-se de punição que, por um lado, tem claro escopo de resguardar a administração do contato prejudicial com o agente ímprobo e, por outro, impõe sanção pecuniária indireta, na medida em que o impede de perceber vantagens dessa natureza de um ente estatal. Acerca da interpretação da extensão dessa penalidade, vale destacar a lição doutrinária:
Veja-se também o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
Evidencia-se que não se sustenta o argumento para deixar de aplicar a pena. A proibição é ampla e recai sobre qualquer contrato com o poder público e alcança todas as esferas da administração dos diferentes entes federados. Conforme a corte superior, sua aplicação depende apenas da gravidade do ato praticado, a qual, in casu, é manifesta e já foi salientada nos tópicos anteriores.
DA MULTA CIVIL
A multa civil está prevista expressamente como sanção em todos os incisos do artigo 12 da Lei nº 8.429/92, ou seja, o seu pagamento pode ser determinado em todas as situações de improbidade, quais sejam, enriquecimento ilícito, dano ao erário e violação a princípios da administração pública. Tem por objetivo desestimular a prática dos atos de improbidade administrativa, mediante a cominação de forte repercussão no patrimônio do agente infrator (ANDRADE, Adriano, MASSON, Cleber e LANDOLFO, obra citada, p. 725). De acordo com Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves (obra citada, p. 579-580), a penalidade de natureza pecuniária atinge o patrimônio do ímprobo, bem jurídico que é diluído com a aplicação da sanção, e apresenta muitas vantagens, entre elas o papel punitivo que desempenha sobre o infrator e o intimidativo sobre os demais agentes que potencialmente podem praticar novas infrações, além de ser um importante instrumento usado no combate à improbidade.
Assim, a aplicação da multa certamente traz mais benefícios sociais do que prejuízos, já que, como anteriormente explanado, além de punir o infrator, exerce papel intimidativo sobre os demais agentes que também potencialmente poderiam ter o mesmo comportamento.
DA INDISPONIBILIDADE DE BENS
A indisponibilidade patrimonial é medida de natureza cautelar e, em consequência, sua concessão demanda a presença do fumus boni iuris e do periculum in mora, nos termos do que dispõe o Código de Processo Civil, a partir de seu artigo 798, verbis:
A Lei n.º 8.429/92 prevê especificamente a indisponibilidade de bens no âmbito das ações civis públicas de improbidade administrativa, onde o periculum in mora está implícito no próprio comando legal, uma vez que visa a "assegurar o integral ressarcimento do dano", exigida do requerente tão somente a demonstração, em tese, da prática de conduta ímproba pelo requerido, com dano ao erário e/ou do enriquecimento ilícito do agente. Dispõe o referido dispositivo legal:
O perigo da demora presumido para a constrição em debate nas ações civis públicas em que se apuram atos de improbidade é pacificamente reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça, consoante se observa dos acórdãos a seguir transcritos. Veja-se:
Assim, não há que se falar em necessidade de comprovação da possível dilapidação do patrimônio dos réus ou do acréscimo indevido, porquanto provada a perpetração de improbidade, in casu.
Quanto à suposta insolvência suscitada, em decorrência da decretação de indisponibilidade de bens, bem como da condenação a ressarcimento ao erário e multa civil, por não disporem do atinente montante, sequer foi comprovada e, portanto, não pode justificar a não imposição da medida cautelar ou o abrandamento das reprimendas.
Por fim, incabível a afirmação de que a restituição de valores resultaria em enriquecimento ilícito da administração, decorrente do ressarcimento integral do dano, ante a prestação do serviço. Não incide na espécie o artigo 59 da Lei nº 8.666/93, o qual trata da nulidade do contrato administrativo, matéria manifestamente estranha ao caso.
Repise-se que restou inconteste o prejuízo, em razão do superfaturamento dos objetos licitados, o que impõe a devolução dos valores relativos à perda patrimonial. A prestação de serviços propiciada pelos veículos adquiridos não elide a fraude perpetrada, já que tal ocorreria independentemente do preço da aquisição.
Já se destacou anteriormente que, no caso dos autos, é inegável que incorreram os réus na prática de graves atos de improbidade, porquanto fizeram tábua rasa das disposições constitucionais e das leis de regência em matéria de licitação, que preveem a observância do princípio da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração, bem como o processamento e julgamento em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, em relação às quais estavam obrigados a obedecê-las. Ademais, em relação ao convênio nº 1832/2003, a conduta acarretou não apenas prejuízo estimado de R$ 83.923,58, como também a realização da transformação em desacordo com o plano de trabalho aprovado e consequente inexistência de consultório pediátrico/médico e ginecológico, o que privou a população do atendimento almejado com o convênio. A evidente reprovabilidade é tanto mais perniciosa quando envolve recursos oriundos do Ministério da Saúde, os quais se destinam a melhorar a qualidade de assistência ao usuário do Sistema Único de Saúde.
Destarte, a decisão orientou-se pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade ao dimensionar as sanções aplicadas, as quais não merecem reforma.
DO DISPOSITIVO
Ante o exposto, rejeito a preliminar e nego provimento à apelação dos réus e à remessa oficial tida por interposta.
É como voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANDRE NABARRETE NETO:10023 |
Nº de Série do Certificado: | 581F94C33111A9E0F4D844669D64D3CB |
Data e Hora: | 26/08/2015 17:39:27 |