D.E. Publicado em 29/09/2015 |
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EMENTA
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO ANULATÓRIA. AUTO DE INFRAÇÃO. MULTA ADMINISTRATIVA. COMPANHIA AÉREA. ARTIGO 302, III, "U", LEI 7.565/1986. EXTRAVIO DE BAGABEM. RECURSO DESPROVIDO.
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ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação à sentença de improcedência, em ação ordinária, ajuizada para anular o auto de infração 328/SAC-GL/2008 lavrado pela ANAC, afastando-se, assim, a cobrança dos créditos pelo processo administrativo 60830.014723/2008-19.
Alegou que: (1) a conduta descrita no auto de infração foi tipificada pela autoridade no artigo 302, III, "u", da Lei 8.565/86 ("infringir as Condições Gerais de Transporte, bem como as demais normas que dispõem sobre os serviços aéreos"); (2) além de tal dispositivo mostrar-se excessivamente genérico, apenas fazendo referência à infração das "Condições Gerais de Transporte", não se indicou norma específica capaz de tipificar a conduta da autora, ao especificar qual seria o dispositivo dessas "Condições" que teria sido violado; (3) não houve caracterização de qualquer fato contrário às "Condições", pois a bagagem foi entregue à passageira reclamante, embora com atraso, sem qualquer protesto, portanto, nos termos do artigo 32, parágrafo único, da Portaria ANAC 676/GC-5/2000 ("A execução do contrato inicia-se com a entrega deste comprovante e termina com o recebimento da bagagem pelo passageiro, sem o protesto oportuno"); (4) o atraso na entrega da bagagem não configura infração à Portaria ANAC 676/2000, mas fato corriqueiro; (5) os fatos descritos no auto de infração, e que teriam justificado a aplicação da multa, ocorreram em janeiro/2008 (entrega de bagagem em atraso), enquanto o Enunciado 11/JR/ANAC-2010, que motivou a aplicação da sanção, somente foi editada posteriormente ("Configura-se a infração administrativa de extravio no momento em que a bagagem não é restituída ao passageiro no local do destino, quando do seu desembarque. Sendo assim, eventual restituição da bagagem no prazo de 30 dias, ou o pagamento da indenização após este lapso temporal, não excluirá a responsabilidade administrativa da empresa, somente evitará a configuração de infração diversa"), não podendo o comando desse Enunciado retroagir para atingir os fatos ocorridos anteriormente, sob pena de afronta ao artigo 2° XIII, da Lei 9.784/99; (6) houve decadência do direito de constituição da multa, pelo decurso de dois anos, nos termos do artigo 319 do Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei 7.565/86), que não foi revogado pela Lei 9.873/99; (7) ocorreu a prescrição, nos termos do artigo 1°, §1°, da Lei 9.873/99, pois notificada da lavratura do auto de infração em abril/2008, com apresentação de defesa dentro do prazo, a decisão somente foi proferida em outubro/2011, sendo a autora notificada em janeiro/2012, estando caracterizada, assim, a paralisação do processo durante três anos; e (8) houve inovação legislativa da Resolução ANAC 13/2007, que motivou a aplicação de multa em valor muito superior ao limite legalmente previsto no artigo 299 da Lei 7.565/86.
A sentença julgou improcedente o pedido.
Apelou a autora, reiterando os termos da inicial.
Com contrarrazões, vieram os autos à esta Corte.
Dispensada a revisão, na forma regimental.
É o relatório.
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VOTO
Senhores Desembargadores, a ação ordinária 0021231-43.2013.403.6100 foi ajuizada para anular o auto de infração ANAC 328/SAC-GL/2008 e a decisão no processo administrativo 60830.014723/2008-19, que aplicaram multa administrativa à companhia aérea autora, no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais) pela prática de infração prevista no artigo 302, III, "u" da Lei 7.565/1986.
No caso, o passageiro do vôo AF 5013 / AF 442 (Dublin/Charles de Gaulle/Rio de Janeiro) efetuou "Registro de Ocorrência (RO)" perante a ANAC, em 13/04/2008, informando que ao desembarcar do vôo 442 da autora, no Aeroporto Antônio Carlos Jobim no Rio de Janeiro, em 04/04/2008, às 23:15h, não recebeu sua bagagem. Assim, reconhecendo o extravio, a companhia aérea teria se comprometido a enviar sua bagagem até às 9:00h do dia seguinte, sendo entregue, no entanto, somente após às 11:00h (f. 34): "Cheguei no Aeroporto às 5:30h do dia 5/4/08 e a mala foi extraviada. A cia aérea se comprometeu a enviar a bagagem até às 9:00h do dia seguinte, mas só entregaram após às 11:00h"
A fiscalização da ANAC efetuou a apuração dos fatos narrados no "Registro de Ocorrência", e constatou a veracidade das afirmações do passageiro (f. 37):
Desta forma, constatadas irregularidades no transporte das bagagens do passageiro, a ANAC lavrou, em 15/04/2008, o auto de infração 328/SAC-GL/2008, nos termos do artigo 302, III, "u", do Código Brasileiro de Aeronáutica (f. 38):
Notificada, a companhia aérea apresentou defesa, em abril/2008 (f. 39/40), sendo, então, proferida decisão no processo administrativo gerado (60830.014723/2008-19), aplicando penalidade de multa administrativa à autora (f. 47/50):
Notificada em janeiro/2012 (f. 52), a autora apresentou recurso à decisão (f. 54/8), que foi indeferido (f. 62/9), encerrando a discussão na via administrativa.
A companhia aérea impugnou judicialmente o sancionamento administrativo, alegando que, além de não ter ocorrido afronta às "Condições Gerais de Transporte" (Portaria 676/GC-5/2000), tendo em vista a efetiva devolução da bagagem ao passageiro sem protesto, a tipificação dos fatos, sem indicação de qual comando nas "Condições Gerais de Transporte" teria sido violado, apenas mencionando o artigo 302, III, "u", da Lei 7.565/86, mostra-se demasiadamente genérica. Aduziu, outrossim, que o atraso na entrega das bagagens não configuraria infração às "Condições", e que a alteração no entendimento, no sentido do extravio, como infração administrativa, configurar-se pela falta de restituição das bagagens no momento do desembarque, consolidada no Enunciado 11/JR/ANAC-2010, sendo posterior aos fatos, não aplicaria. Por fim, alegou a decadência, prescrição, e inovação legislativa na multa prevista na Resolução ANAC 13/2007.
Inicialmente, cabe destacar que o fato narrado pelo passageiro, quanto à não-restituição da bagagem no desembarque, em 04/04/2008, às 23:15h, mas apenas no dia seguinte, às 11:00h, não é impugnado pela apelante que, ao contrário, reconhece sua ocorrência, alegando apenas que tal inconveniente é comum no cotidiano dos aeroportos, não podendo ser caracterizado como infração às "Condições Gerais de Transporte".
A fiscalização da ANAC considerou que tal fato se amoldaria à hipótese prevista no artigo 302, III, "u", da Lei 7.565/86: "Art. 302. A multa será aplicada pela prática das seguintes infrações: [...] III - infrações imputáveis à concessionária ou permissionária de serviços aéreos: [...] u) infringir as Condições Gerais de Transporte, bem como as demais normas que dispõem sobre os serviços aéreos".
De fato, o artigo 35 das "Condições Gerais de Transporte", aprovada pela Portaria 676/2000 do Comando da Aeronáutica, dispõe que "a bagagem será considerada extraviada se não for entregue ao passageiro no ponto de destino".
Dispõe, ainda, o parágrafo único do artigo 32 que "a execução do contrato inicia-se com a entrega deste comprovante e termina com o recebimento da bagagem pelo passageiro, sem o protesto oportuno".
No caso, diversamente do que alegou a autora, houve protesto por parte do passageiro após o recebimento da bagagem, relativamente ao atraso decorrente de sua ausência quando do momento do desembarque, consubstanciado no "Registro de Ocorrência" (f. 34/5).
Cabe ressaltar que o protesto não se refere apenas a avarias na mercadoria restituída, podendo se referir, tal como ocorreu no caso, ao atraso na restituição, tal como expressamente prevê o artigo 234, §5°, da Lei 7.565/86 ("Procede-se ao protesto, no caso de avaria ou atraso...") e o artigo 33 das "Condições Gerais de Transporte" ("O protesto, nos casos de avaria ou atraso, far-se-á mediante ressalva lançada em documento específico ou por qualquer comunicação escrita encaminhada ao transportador").
Das premissas decorrentes dos dispositivos supratranscritos, decorre a conclusão de que o efetivo cumprimento das normas contidas nas "Condições Gerais de Transporte", relativamente à bagagem dos passageiros, deve considerar a entrega do comprovante de despacho, com a identificação pormenorizada dos itens de identificação, e o recebimento da bagagem do passageiro, sem que haja protesto por avaria ou atraso.
Assim, a existência de protesto por atraso na restituição da bagagem, com constatação de sua efetiva ocorrência, demonstram a caracterização do descumprimento das "Condições Gerais de Transporte", a comprovar a correta tipificação da hipótese ao artigo 302, III, "u", da Lei 7.565/86, por se configurar, em tal hipótese, a infração administrativa de "extravio da bagagem", caracterizada pela falta de entrega ao passageiro no ponto de destino (artigo 35 - "A bagagem será considerada extraviada se não for entregue ao passageiro no ponto de destino").
Mesmo que a condição de bagagem extraviada não tenha perdurado por mais do que algumas horas, é certo que sua entrega dentro dos trinta dias, prevista no §2° do artigo 35 da Portaria, não tem o efeito de afastar o atraso ocorrido na restituição, caracterizador da infração, mas apenas de excluir a necessidade de indenização do passageiro.
Desta forma, mostra-se manifestamente impertinente a alegação de inaplicabilidade do Enunciado 11/JR/ANAC-2010, sob fundamento de ter sido aprovada em novembro/2010, posteriormente aos fatos.
Com efeito, tal enunciado dispõe que "configura-se a infração administrativa de extravio no momento em que a bagagem não é restituída ao passageiro no local do destino, quando do seu desembarque. Sendo assim, eventual restituição da bagagem no prazo de 30 dias, ou o pagamento da indenização após este lapso temporal, não excluirá a responsabilidade administrativa da empresa, somente evitará a configuração de infração diversa."
Ora, como visto, a caracterização da infração administrativa decorre de simples interpretação das normas que regem o contrato de transporte de bagagem na legislação aérea, sendo irrelevante que, posteriormente aos atos infracionais, tenha se editado norma interpretativa sobre o tema, mesmo porque não se cuidou de alteração de entendimento administrativo sobre o tema.
Nem se alegue que o artigo 302, III, "u", da Lei 7.565/86, que fundamentou a aplicação da sanção, tenha sido demasiado genérico, a impossibilitar a tipificação do fato, sendo necessária a expressa referência ao dispositivo transgredido das "Condições Gerais de Transporte".
Com efeito, os fatos ocorridos foram tipificados como infração administrativa descrita no artigo 302, III, "u", da Lei 7.565/86, ou seja, "infringir as Condições Gerais de Transporte, bem como as demais normas que dispõem sobre os serviços aéreos".
Embora tal norma possua aparente generalidade, exigindo complementação por parte da autoridade aeroportuária para a definição das "Condições Gerais de Transporte", o auto de infração e o processo administrativo de aplicação de sanção descreveram pormenorizadamente os fatos, mencionando, ainda, que a conduta da companhia aérea acarretou infração ao artigo 32, parágrafo único, e artigo 35 da Portaria 676/GC5/2000 ("Condições Gerais de Transporte").
Desta forma, inocorre motivação genérica, pois além de terem sido especificados os dispositivos das "Condições Gerais de Transporte" efetivamente infringidos, possibilitou-se a apresentação de defesa e recurso por parte da companhia aérea, bem como o ajuizamento da presente ação, cujas alegações não se restringem a apenas alegar a motivação genérica do auto de infração/processo administrativo sancionador.
Não se verifica, outrossim, o decurso do prazo prescricional para o exercício da pretensão punitiva pela administração pública.
De fato, o extravio da bagagem do passageiro ocorreu em 05/04/2008, e sendo o fato posterior à edição da Lei 9.457/97, é o prazo previsto em seu artigo 1° que se aplica ao caso: "Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado".
Neste sentido, os seguintes precedentes:
Não se aplica o prazo prescricional de dois anos previsto no artigo 319 da Lei 7.565/86 ("As providências administrativas previstas neste Código prescrevem em 2 (dois) anos, a partir da data da ocorrência do ato ou fato que as autorizar, e seus efeitos, ainda no caso de suspensão, não poderão exceder esse prazo"), pois a previsão do artigo 1° da Lei 9.457/97 regulou inteiramente a matéria, ao deixar expresso se tratar de prazo prescricional de ação punitiva da Administração Pública Federal no exercício do poder de polícia.
Assim, nos termos do artigo 2°, §1°, do Decreto-lei 4.657/42 ("Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro"), constata-se a ocorrência de revogação tácita, tendo em vista que "a lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior".
Por sua vez, pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a instauração do processo administrativo, como início dos atos necessários ao exercício do poder de polícia, interrompe o curso do prazo da prescrição da ação punitiva, pois demonstra o inequívoco interesse da Administração na apuração dos fatos, afastando sua inércia.
Neste sentido, o seguinte julgado:
No caso, o processo administrativo 60830014723200819 teve início com o auto de infração 328/SAC-GL/2008 (f. 38), lavrado em 15/04/2008, conforme artigo 4° da Resolução ANAC 13/2007, demonstrando inocorrer a prescrição da pretensão punitiva da Administração Pública.
Alegou a autora, ainda, a ocorrência da prescrição prevista no artigo 1°, §1°, da Lei 9.873/99: "Art. 1º...§ 1° Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso."
No caso, não se verificou decurso de tal prazo, pois efetuado o "Registro de Ocorrência" em 13/04/2008 (f. 34), o auto de infração foi lavrado em 15/04/2008 (f. 38), sendo apresentada defesa pela companhia aérea em abril/2008 (f. 39). Em abril/2010 (f. 44) e abril/2011 (f. 45) foram promovidas diligências internas em decorrência da alteração de competência, sendo proferida decisão no processo administrativo em 11/10/2011 (f. 47/50).
Assim, foi interposto recurso administrativo em janeiro/2012 (f. 54/9), sendo efetuada sua análise pela Junta Recursal da ANAC em outubro/2013 (f. 62/9), o que demonstra a inocorrência de paralisação do processo administrativo por mais de três anos.
Por fim, quanto à alegação de que a multa, aplicada de acordo com o Anexo III da Resolução ANAC 13/2007, estaria prevista em patamar superior ao limite previsto no artigo 299 da Lei 7.565/86 (mil valores de referência), a jurisprudência encontra-se consolidada, firme no sentido de que a atualização e conversão do valor da multa infracional em reais, prevista originalmente em "unidades de referência", por ato normativo da ANAC, não ofende o princípio da legalidade, por estar abrangida e limitada no poder regulamentar conferido pelo artigo 47, I, da Lei 11.182/2005:
Neste sentido, a jurisprudência regional:
Ante o exposto, nego provimento à apelação.
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Data e Hora: | 17/09/2015 17:15:12 |