D.E. Publicado em 11/12/2015 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial e aos apelos para reduzir o quantum indenizatório para R$ 10.000,00 (dez mil reais), a serem pagos por cada réu apelante, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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Data e Hora: | 03/12/2015 16:32:47 |
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RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO: Trata-se de remessa oficial e recursos de apelação interpostos por BANCO SCHAHIN S/A e INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra a r. sentença proferida pelo MM. Juízo Federal da 6ª Vara Cível de Campinas/SP que, nos autos de ação de indenização por danos materiais e morais decorrentes de empréstimo consignado fraudulento movida por SILVIO FERNANDO BARBARINI, julgou procedente o pedido para: (i) condenar o BANCO BRADESCO S/A a pagar ao autor a quantia de R$10.000,00 (dez mil reais) a título de danos morais, acrescida de juros de mora de 1% a.a. e correção monetária a partir da abertura da conta corrente em nome do autor; (ii) condenar o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL a ressarcir os danos materiais, consistentes nos descontos indevidos realizados no benefício previdenciário do autor, com juros de mora de 1% (um por cento) a.a. e correção monetária, a partir de cada desconto indevido, bem como pagar, a título de danos morais, R$ 15.000,00 (quinze mil reais) por ter autorizado o desconto indevido, R$ 3.000,00 (três mil reais), por ter se recusado a atender imediatamente a reclamação do autor e R$ 2.000,00 (dois mil reais), por não ter instaurado qualquer procedimento administrativo para investigar a reclamação do autor, totalizando o montante de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), que devem ser acrescidos de juros de mora de 1% a.a. e correção monetária; (iii) condenar o BANCO SCHAHIN S/A a pagar ao autor o dobro dos valores descontados do benefício previdenciário do autor como danos materiais e, por danos morais, R$ 10.000,00 (dez mil reais) por não ter observado as regras de empréstimo ditadas pelo BACEN; R$ 30.000,00 (trinta mil reais), por ter provocado os descontos no benefício do autor; R$ 10.000,00 (dez mil reais) por não ter dado ouvidos às reclamações do autor para cessar os descontos e por ter provocado diligências à Polícia e ao INSS e R$ 10.000,00 (dez mil reais), por não ter observado as disposições da Lei nº 10.820/2003 que regulamenta as consignações, totalizando R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), sobre os quais devem incidir juros de mora de 1% a.a. e correção monetária, a partir do primeiro desconto no benefício do autor.
O INSS interpôs embargos de declaração (fls. 335/336), os quais foram julgados improcedentes, sendo o embargante condenado por litigância de má fé à multa de 1% sobre o valor da causa (fls. 338/340).
O BANCO SCHAHIN, em seu apelo, pede a reforma da sentença argumentando que tomou todos os cuidados necessários na celebração do contrato de empréstimo, sendo tão vítima quanto o autor e que o quantum indenizatório é excessivo (fls. 342/348).
Já o INSS, em seu recurso, pede a revogação da condenação por litigância de má fé em razão da interposição dos embargos de declaração, bem como a reforma da sentença sustentando, em síntese, que os valores debitados indevidamente já foram ressarcidos ao autor (fls. 193 e 303), razão pela qual não há que se falar em repetição de indébito, inexistência de responsabilidade da autarquia, não comprovação dos danos morais e a redução do quantum indenizatório (fls. 374/399).
Regularmente processados os recursos, com contrarrazões, subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É O RELATÓRIO.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO: Cuida-se de ação de indenização buscando reparação pelos prejuízos materiais e morais decorrentes de indevido desconto relativo a empréstimo nos proventos de aposentadoria do autor.
A sentença julgou procedente o pleito. O Banco Schahin e o INSS apelaram.
A responsabilidade dos apelantes é inconteste.
No caso, o autor observou desconto indevido em seu benefício previdenciário. Procurou o INSS a fim de notificar o ocorrido e obter esclarecimentos, sendo que recebeu a informação de que o desconto se referia a um empréstimo.
Surpreendido e indignado, tendo em vista que ele não efetuara empréstimo algum, o autor pediu à Autarquia a regularização da situação e, mesmo tendo comparecido diversas vezes à agência do INSS, munido inclusive de Boletim de Ocorrência, nenhuma providência foi tomada pelo INSS.
O autor então descobriu que o empréstimo foi realizado junto ao Banco Schahin S.A., e o valor depositado em conta do Banco Bradesco, aberta em Campina Grande/PB.
Incansável, o autor procurou a agência do Banco Bradesco na cidade de Valinhos/SP e relatou o caso ao gerente, que solicitou o fechamento imediato da conta corrente aberta em nome do autor na agência de Campina Grande/PB.
Tanto o empréstimo, como a abertura da conta corrente junto ao banco Bradesco de Campina Grande/PB foram efetuadas por um falsário.
O Código Civil, em seus artigos 186 e art. 927, § único, definiu ato ilícito e a consequente obrigação por parte de quem o pratica de indenizar o prejudicado:
E, para que haja o dever de indenizar, é necessário o preenchimento dos requisitos da responsabilidade civil, a saber: dano, conduta ilícita e nexo de causalidade, tendo em vista tratar-se de responsabilidade civil objetiva, nos termos da Súmula n.º 297 do C. Superior Tribunal de Justiça: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".
O Código de Defesa do Consumidor dispõe nos artigos 6º, inciso VIII e 14:
No caso, ao perceber a ocorrência do desconto indevido em seus proventos de aposentadoria, o autor compareceu à agência do INSS e pediu o cancelamento dos descontos, explicando que não havia compactuado com nenhum empréstimo.
É certo que, mesmo após o comparecimento do autor, inclusive munido de Boletim de Ocorrência, fato que sem dúvida apontava credibilidade em suas argumentações, a Autarquia não tomou qualquer providência no sentido de averiguar se o contrato feito em seu nome era legítimo. Tanto é assim que os descontos prosseguiram nos meses subsequentes.
Nesse passo, a Autarquia descumpriu os comandos contidos na Instrução Normativa INSS/DC nº 121/05, a qual dispõe acerca do procedimento a ser adotado no caso de reclamação do beneficiário, a saber:
Nos termos da instrução normativa referida, a natureza da relação jurídica que a Autarquia mantém com os segurados não está adstrita somente na concessão do benefício previdenciário, mas também na obrigação de zelar pela observância da legalidade de eventuais descontos, assim como dos procedimentos necessários à verificação de ilegalidades, segundo os preceitos constitucionais que devem pautar a sua atuação, em especial, à proteção constitucional de irredutibilidade dos benefícios previdenciários.
Lembre-se que o INSS é pessoa jurídica de direito público, estando sujeito ao regime jurídico administrativo típico e, consequentemente, aos parâmetros da responsabilidade objetiva pela teoria do risco administrativo, impondo-se o enquadramento dos atos lesivos por ela praticados no vigor do artigo 37, § 6º da Constituição Federal, que dispõe que "as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".
Assim, para que o ente público responda objetivamente pela teoria do risco administrativo, é suficiente que se prove a sua conduta, o resultado danoso e o nexo de causalidade e efeito entre ambos, porém, com possibilidade de exclusão ou moderação da responsabilidade na hipótese de caso fortuito/força maior ou culpa exclusiva ou concorrente da vítima.
É certo que o INSS ocupa a posição de intermediário entre o Banco e o segurado e, assim, tem a obrigação de verificar a regularidade e legitimidade do empréstimo antes de autorizar o desconto consignado, justamente para conferir fundamento ao ato de redução do benefício previdenciário.
Não se trata, portanto, de um agente irresponsável de retenção e repasse, eis que constitui ente público obrigado constitucionalmente a indenizar pelos danos que causa a particulares. Assim, ao não proceder com a devida cautela que se impõe a um órgão público, acaba por dar causa ao dano, tanto material quanto moral, este consistente nos constrangimentos ocasionados ao segurado, quer pela inadvertida e repentina diminuição de seu orçamento propriamente dito, quer pela procura de solução nos escaninhos administrativos do órgão, sem obter resposta eficaz ao problema que enfrentava.
Tanto é assim que o segurado tomou todas as providências junto ao órgão previdenciário para denunciar e impedir o desconto indevido, sem obter resultado algum, chegando ao ato extremo de lavrar boletim de ocorrência em delegacia de polícia, fatos que demonstram o elevado grau de constrangimento e dissabor por ele vivido.
Da mesma forma é de ser admitida a responsabilidade objetiva da instituição financeira ré, em função da relação de consumo, pela qual "o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos" (art. 14, caput, Código do Consumidor).
Como bem colocado na sentença, "Embora não tenha sido esclarecido como realmente se deu o contato do falsificador com o BANCO SCHAHIN, é alta a probabilidade que tudo se passou por via telefônica, haja vista que tal fato já foi noticiado em diversas ações civis públicas intentadas em alguns Estados da Federação, máxime quando se nota que o suposto estelionatário abriu conta na agência do Bradesco da Paraíba/PB, pessoalmente em 02.12.2005 e no dia 05.12.2005 já constava informação no HISCRE do INSS sobre a consignação, mediante informação transmitida pelo BANCO SCHAHIN S/A sediado em São Paulo/SP."
Tal fato demonstra a negligência com que foi tratada a avença do contrato em questão, chancelado pela instituição bancária não obstante o risco evidente de fraude.
Não por outra razão, o próprio Banco reconheceu o equívoco cometido e devolveu os valores indevidamente descontados, mas é certo que o fez apenas após o ajuizamento deste feito.
Dessa feita, é certo que o dano moral se encontra presente, seja em razão do valor do benefício percebido pelo autor, que evidencia que qualquer redução comprometeria o próprio sustento do segurado e de sua família, seja pelos transtornos sofridos pelo demandante, que diligenciou várias vezes na tentativa de resolver a questão, tendo, inclusive, chegado ao ponto de lavrar boletim de ocorrência denunciando o desfalque sofrido.
Quanto ao dano moral, é de sua essência ser compensado financeiramente a partir de uma estimativa que guarde pertinência com o sofrimento causado. Contudo, tratando-se de uma estimativa, não há formulas ou critérios matemáticos que permitam especificar a precisa correspondência entre o fato danoso e as consequências morais e psicológicas sofridas pelo ofendido.
A jurisprudência tem se encaminhado no sentido de que o arbitramento deve ser feito com razoabilidade e moderação, sendo proporcional ao grau de culpa e ao porte econômico do réu, valendo-se o juiz de sua experiência e bom senso para sopesar as peculiaridades do caso concreto, de forma que a condenação cumpra sua função punitiva e pedagógica, compensando o sofrimento do indivíduo sem, contudo, proporcionar o seu enriquecimento sem causa.
Nesse sentido é a orientação do E. Superior Tribunal de Justiça:
Na presente ação, analisadas as peculiaridades que envolveram o caso, entendo que os valores fixados na sentença em relação aos apelantes são excessivos, na medida em que configuram inadmissível enriquecimento sem causa ao autor.
Deveras, sopesadas as peculiaridades do caso concreto, com observância do princípio da razoabilidade e das teorias do valor do desestímulo (caráter punitivo da sanção pecuniária) e da compensação, que visam atender ao duplo objetivo - caráter compensatório e função punitiva da sanção (prevenção e repressão), o valor da indenização por danos morais deve ser reduzido para R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada réu apelante.
Considerando a reforma do julgado no tocante à quantificação indenizatória, a atualização monetária deve ser aplicada a partir da data do novo arbitramento, ou seja, data do julgamento por esta c. Corte.
Esse, aliás, é o posicionamento consolidado no âmbito do e. STJ, consoante se depreende do aresto abaixo reproduzido:
Tal entendimento está inclusive sumulado nos seguintes termos:
Súmula 362, STJ: A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento.
No tocante à condenação ao pagamento de multa por litigância de má-fé, dispõem os artigos 17 e 18 do CPC:
Assim, a condenação imposta à parte que age de má-fé visa punir a conduta maliciosa, o desrespeito ao dever de lealdade, não apenas à parte adversa, mas essencialmente à dignidade da instituição judiciária.
No escólio do festejado mestre ARRUDA ALVIM (In "Deveres da partes e dos procuradores no direito processual civil", Revista de Processo nº 69, ano 18, pág. 10): "Para se conseguir, pois uma medida satisfatória, no campo do processo, um comportamento compatível com as finalidades de justiça e do Direito, fins dinamizadores da atividade jurisdicional, mas cuja atividade depende da conduta dos litigantes, necessário é o estabelecimento de uma série de regras entrosadas, mediante as quais se traçam limites socialmente aceitáveis de comportamento, que as partes devem observar. Tais regras em última análise, sintetizam-se no chamado Princípio da Lealdade Processual."
Contudo, a imposição da multa pressupõe a comprovação do dolo da parte no entravamento do trâmite processual, manifestado por conduta maliciosa e temerária, com o efetivo prejuízo ocasionado à parte contrária, a quem reverte o produto da arrecadação da multa. Esta é a orientação consignada pelo C. Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica no seguinte aresto:
No caso em exame, não se verifica conduta do INSS para obstar o andamento do processo maliciosamente, razão pela qual não é cabível a multa por litigância de má fé.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à remessa oficial e aos apelos para reduzir o quantum indenizatório para R$ 10.000,00 (dez mil reais), a serem pagos por cada réu apelante, bem como excluir a condenação do INSS ao pagamento de multa por litigância de má fé.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 03/12/2015 16:32:50 |