D.E. Publicado em 03/12/2015 |
|
|
|
|
|
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, conceder a ordem para determinar o trancamento da ação penal originária, nos termos do voto da relatora, acompanhada pelo voto do Des. Fed. José Lunardelli, vencido o Des. Fed. Nino Toldo que denegava a ordem, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | MARIA CECILIA PEREIRA DE MELLO:10057 |
Nº de Série do Certificado: | 7DBF4B4E05D00880 |
Data e Hora: | 25/11/2015 18:06:42 |
|
|
|
|
|
DECLARAÇÃO DE VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO: Cuida-se de habeas corpus impetrado com a finalidade de trancar ação penal em que o paciente é acusado de tráfico de drogas por haver importado, pelos correios, 11 (onze) sementes de maconha, provenientes da Holanda.
A e. Relatora concedeu a ordem, determinando o trancamento da ação penal, sob os seguintes fundamentos: (i) as sementes de maconha, no estado em que se encontravam, não poderiam ser consideradas drogas, uma vez que não possuem tetrahidrocanabinol (THC) em sua composição; (ii) ainda que fossem consideradas drogas, a importação das 11 (onze) sementes melhor se amoldaria ao art. 28, § 1º, da Lei nº 11.343/2006, eis que, no caso, "o produto importado claramente se destinava à semeadura, cultivo e colheita de planta destinada à preparação de pequena quantidade de droga para consumo próprio"; (iii) no entanto, a apreensão das sementes ocorreu antes que chegassem ao seu destino final, de modo que a conduta do paciente, tal como posta, não se enquadraria em nenhum dos dispositivos mencionados na Lei de Drogas; (iv) "embora as sementes ainda não estivessem semeadas, e da forma como posta não pudessem ser consideradas drogas ou matérias-primas destinadas à produção de drogas, não há como negar que são de uso, importação, exportação, manipulação e comércio proibido, não podendo, portanto, serem importadas, caracterizando o crime de contrabando", razão pela qual a conduta narrada na denúncia teria que ser desclassificada para o art. 334-A do Código Penal; (v) mesmo assim, a denúncia não poderia ser recebida porque faltaria justa causa, na medida em que seria aplicável ao caso o chamado princípio da insignificância, dada a pequena quantidade de sementes apreendida. Entendeu, enfim, que, embora a conduta mereça censura, não tem potencialidade lesiva à saúde pública, quer porque as sementes teriam destinação pessoal, quer porque a quantidade era pequena.
Peço vênia para, respeitosamente, discordar da e. Relatora.
Com efeito, cumpre destacar, de início, que somente é cabível o trancamento de ação penal em habeas corpus, quando estiverem comprovadas, desde logo e sem qualquer dúvida, (i) a atipicidade da conduta, (ii) a extinção da punibilidade ou (iii) a evidente ausência de justa causa. É nesse sentido a pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, conforme se pode verificar, a título exemplificativo, pela leitura das seguintes ementas:
Pois bem. No caso em exame, não se pode afirmar, de plano, que a conduta seja atípica, pois a própria Relatora reconhece a controvérsia acerca da classificação da conduta do paciente. Com efeito, entendeu a Relatora que, ante a inexistência de tetrahidrocanabinol (THC) na composição das sementes de maconha, a conduta estaria tipificada no art. 334-A do Código Penal. Contudo, entendeu que, dada a baixa quantidade de sementes, aplicar-se-ia ao caso o chamado princípio da insignificância.
Discordo desse entendimento, conforme já externei em outras oportunidades perante a Décima Primeira Turma. A título exemplificativo, cito o voto-vista que apresentei no Reexame Necessário Criminal (REENEC) nº 0002789-09.2015.4.03.6181/SP. Naquela oportunidade destaquei:
Portanto, a despeito da classificação típica atribuída à conduta discutida nos autos, a semente de maconha é proscrita no Brasil e sua importação é evidentemente proibida. Ainda que não apresente o THC em sua composição, isso não a descaracteriza como elemento essencial para a produção da maconha. Afinal, da semente germinará a planta de cuja folha se originará a droga.
Além disso, no caso, ainda que se trate de importação de pequena quantidade de semente de maconha para uso pessoal, a conduta continuaria típica (Lei 11.343/06, art. 28), embora não apenada com prisão, o que afasta a possibilidade de trancamento da ação penal.
Essa tese, entretanto, não pode ser examinada na via restrita do habeas corpus, mas perante o Juízo a quo, na instância ordinária, onde poderão ser produzidas provas a respeito dos fatos narrados, sob pena de supressão de instância.
Enfim, não é evidente a ausência de justa causa para a ação penal, até porque não concordo com as premissas lançadas no voto da e. Relatora, razão pela qual não posso concordar com a sua conclusão, não sendo possível o trancamento da ação penal.
Posto isso, DENEGO A ORDEM.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | NINO OLIVEIRA TOLDO:10058 |
Nº de Série do Certificado: | 4E280B4612C2E3B1 |
Data e Hora: | 25/11/2015 14:37:46 |
|
|
|
|
|
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO: Cuida-se de Habeas Corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de GUSTAVO FUGANHOLI, contra ato do Juízo Federal da 2ª Vara de Bauru/SP, praticado nos autos da ação penal nº 0001011-38.2014.403.6181, que, no dia 31/07/2015, recebeu a denúncia imputando-lhe a conduta descrita no artigo 33, §1º, inciso I e artigo 40, inciso I, ambos da Lei 11.343/2006 (fls. 34/35).
Trata-se de importação de 11 (onze) sementes de maconha, provenientes da Holanda, apreendidas na Empresa de Correio desta Capital, cujo destinatário era o paciente.
Ouvido perante a autoridade policial, o paciente confessou ter adquirido as sementes pela internet, a pedido de um amigo, as quais seriam plantadas para consumo próprio, não sabendo informar em qual país o vendedor estava hospedado.
Alega o impetrante que a conduta imputada ao paciente é atípica, visto que o laudo pericial foi taxativo ao afirmar que as sementes não possuem efeito entorpecente, não podendo ser consideradas matérias-primas ou insumo destinado à preparação da maconha.
Aduz, também, que a quantidade de sementes apreendidas conjugadas com a absoluta transparência e regularidade da importação claramente evidenciam que a intenção do paciente era o plantio para consumo pessoal e não para o tráfico de entorpecentes.
Nesse contexto, afirma que a importação de sementes em comento corresponderia, claramente, a meros atos preparatórios do crime previsto no artigo 28, §1º, da Lei 11.343/2006.
Assevera, ainda, que não é o caso de se desclassificar a conduta para o delito tipificado no artigo 334-A do Código Penal, visto que a quantidade de sementes importadas e as condições pessoais do paciente revelam que o caso pode ser resolvido pelo princípio da insignificância, diante da ausência de periculosidade social, reduzidíssimo grau de reprovabilidade e inexpressividade da lesão jurídica provocada.
Requer, assim, a concessão liminar da ordem de habeas corpus, para determinar o trancamento da ação penal, e, ao final, sua concessão definitiva.
Liminar concedida conforme fls. 46/47-vº.
Informações prestadas às fls. 51/52-vº.
Em parecer o Parquet Federal opina pela denegação da ordem.
É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO: Segundo consta da denúncia, no dia 02/12/2014, na sede da Empresa de Correios desta Capital, especificamente no Serviço de Remessas Postais Internacional da Alfândega de São Paulo, foi apreendida a encomenda nº RE101383644NL, postada em "Den Haag", Holanda, tendo como destinatário o paciente, residente na cidade de Lençóis Paulista/SP, contendo 11 (onze) sementes.
O conteúdo da embalagem apreendida foi submetido a exame químico toxicológico, sendo constatado pelo Laudo Pericial de nº 1386/2014 NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP que as sementes encontradas são da espécie Cannabis Sativa Linneu, planta popularmente conhecida por maconha.
Submetida à nova perícia, o Laudo Pericial nº 1462/2014 - INC/DITEC/DPF confirmou que as citadas sementes tinham potencialidade germinativa.
Dito isso, cumpre assinalar que de fato as 11 (onze) sementes de maconha, no estado em que se encontravam, não podem ser consideradas drogas, uma vez que não possuem tetrahidrocanabinol (THC) em sua composição.
Da mesma forma, embora as sementes sejam aptas a gerar "pés de maconha", também não podem ser consideradas matérias-primas, ao menos juridicamente. Isso porque para que as sementes tornem-se próprias para o consumo devem ser primeiramente semeadas e fertilizadas até estarem prontas para a colheita.
Conclui-se, assim, que não se extrai a maconha da semente, mas sim da planta germinada da semente (TRF 3 - RSE 0016794-07.2013.4.03.6181. Décima Primeira Turma. Relator Desembargador Federal José Lunardelli. Julgado em 04/08/2015).
Penso, assim, que, se fosse o caso, a importação das 11 sementes, melhor se amoldaria ao artigo 28, §1º, da Lei 11.343/2006, eis que, no caso, o produto importado claramente se destinava à semeadura, cultivo e colheita de planta destinada à preparação de pequena quantidade de droga para consumo próprio.
A par disso, verifica-se que mencionado artigo restringe as condutas típicas em "semear", "cultivar" ou "colher" plantas, vejamos:
No entanto, no caso dos autos, as sementes foram apreendidas ainda no curso do seu trajeto, pois tinham como destino final a cidade de Lençóis Paulista/SP e foram apreendidas no setor de Serviços de Remessas Postais Internacional da Alfândega de São Paulo, não chegando sequer a serem semeadas.
Portanto, a conduta praticada pelo paciente, tal como posta, na verdade, não se enquadra em quaisquer dos dispositivos mencionados da Lei 11.343/2006.
Entretanto, embora as sementes ainda não estivessem semeadas, e da forma como posta não pudessem ser consideradas drogas ou matérias-primas destinadas à produção de drogas, não há como negar que são de uso, importação, exportação, manipulação e comércio proibido, não podendo, portanto, serem importadas, caracterizando o crime de contrabando.
Nessa esteira, é de rigor a desclassificação da conduta narrada na denúncia para o artigo 334-A do Código Penal, que tem por escopo a proibição da importação e uso das sementes de maconha a fim de proteger a saúde pública.
Dito isso, dispõe o artigo 395 do Código de Processo Penal que a denúncia será rejeitada quando: I) for manifestamente inepta; II) faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou III) faltar justa causa para o exercício da ação penal.
Dentro desse cenário, penso que a denúncia também não pode ser recebida, eis que falta justa causa para a deflagração da ação penal, caracterizada pela irrelevância penal da conduta delitiva do acusado.
Com efeito, a lei penal não deve ser invocada para atuar em hipóteses desprovidas de significação social, ou quando a lesão ao bem jurídico protegido for irrelevante.
Embora não desconheça a impossibilidade, em regra, da aplicação do princípio da insignificância para os crimes de contrabando, penso que no caso em tela não há como entender que 11 sementes de maconha seriam capazes de colocar minimamente em risco a saúde pública, tendo em vista a presença dos parâmetros considerados pelos Tribunais Superiores para o reconhecimento da insignificância: a) mínima ofensividade da conduta; b) ausência de periculosidade do agente; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e d) inexpressividade da lesão jurídica.
Nesse sentido, trago julgado desta Corte:
Ademais, o paciente aduz ter adquirido as sementes para uso próprio, o que não se mostra desarrazoado, seja pela pequena quantidade, seja pela forma de aquisição, restando, para mim, evidente a ausência de propósito comercial.
Nessa senda, embora a conduta do paciente mereça censura, por qualquer ângulo que se analise falta justa causa para o exercício da ação penal, eis que não se amolda aos crimes previstos na Lei 11.343/2006, bem como não é capaz de demonstrar, diante da pequena quantidade e ausência de propósito comercial, afronta aos interesses de toda a sociedade, cabendo invocar, no específico caso, o princípio da insignificância, sendo forçoso reconhecer pelo trancamento da ação penal, ante a ausência de justa para a mesma.
Por derradeiro, anoto que eventual controvérsia acerca da classificação jurídica atribuída ao fato imputado ao paciente, se resolve pela aplicação do princípio in dubio pro reo.
Ante o exposto, concedo a ordem para determinar o trancamento da ação penal originária.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | MARIA CECILIA PEREIRA DE MELLO:10057 |
Nº de Série do Certificado: | 7DBF4B4E05D00880 |
Data e Hora: | 25/11/2015 18:06:45 |