D.E. Publicado em 14/03/2016 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento interposto por INSTITUTO AOCP em face da decisão que, em ação ordinária, deferiu pedido de antecipação de tutela para o fim de determinar que a inscrição da autora seja mantida como cotista (parda) e, nesta condição, seja ela convocada para as demais fases do concurso, caso a sua classificação assim lhe assegure.
Na inicial a autora Larissa Machado de Oliveira narra que participou do concurso para provimento de cargo de enfermeira no Hospital Universitário da Universidade Federal da Grande Dourados (concurso público nº 13/2014 - EBSERH, edital n° 03); autodeclarou-se parda, em razão de ser filha de pai negro e mãe branca, concorrendo assim a uma das 20 vagas reservadas aos candidatos negros (Lei n° 12.990/2014).
Logrou êxito em atingir 57 (cinquenta e sete) pontos na prova objetiva. Contudo, ao ser convocada para a entrevista de confirmação da autodeclaração, a Comissão Avaliadora concluiu que ela não possui os traços fenotípicos que ensejam ao enquadramento como pardo ou negro.
A candidata impugnou a decisão da Comissão Avaliadora, mas teve seu recurso indeferido, mantendo-se sua exclusão do certame.
Buscou assim a via judicial a fim de assegurar sua manutenção no concurso; reitera que é parda, filha de pai negro, e que tem duas irmãs, sendo que uma delas é sua irmã gêmea, todas com fenótipo de cor parda (fl. 106/121).
A d. juíza da causa considerou presente a prova da verossimilhança do alegado, pois "analisando o contido no edital não há critérios objetivos para a constatação se o candidato apresenta ou não o candidato de fenótipo de pardo, como no caso da autora. Logo, a avaliação de tal condição me parece muito subjetiva. Ademais, sequer foi consignado na a decisão que não a considerou parda, quais os critérios fenótipos de negro ou pardo que ela não possui. E, como se sabe, a Administração possui o dever de primar pela impessoalidade ao praticar os seus atos, de forma que a ampla subjetividade de uma decisão que, em tese, extrapola o limite da discricionariedade, pode violar tal princípio."
Ainda, consignou a magistrada federal que "o perigo da demora é evidente eis que a colocação da autora como candidata não cotista por certo que fará com que a sua colocação seja pior e, consequentemente, poderá estar privada de ser convocada para as demais fases do certame".
Nas razões recursais a parte agravante INSTITUTO AOCP sustenta, em resumo, que foram aplicados os exatos termos do edital de abertura, não ocorrendo qualquer ilegalidade a ser sanada pelo Poder Judiciário no tocante a reprovação da candidata no procedimento de confirmação da autodeclaração como negra/parda.
Destaca que no caso o procedimento adotado pela Comissão Avaliadora está de acordo com as orientações mencionadas na decisão proferida pelo Superior Tribunal Federal na ADPF 186, a saber: a) autodeclaração pelo candidato no ato da inscrição (autoidentificação); (b) realização da sessão de fotografias; (c) julgamento pela Comissão Especializada por fenótipo e não por ascendência (heteroidentificação) - entrevista de confirmação da autodeclaração como negro; e (d) possibilidade de recurso pelo candidato.
Efeito suspensivo deferido às fls. 135/136.
Contraminuta apresentada no prazo legal, fls. 139/148.
É o relatório.
VOTO
Não foram apresentadas quaisquer argumentações que modificassem o entendimento deste Relator, exposto quando da prolação da decisão que analisou o pedido de efeito suspensivo do presente recurso.
Por esta razão, transcrevo os fundamentos daquela decisão, adotando-os como razão de decidir o mérito deste agravo.
"A intervenção do Poder Judiciário no âmbito de concurso público deve restringir-se ao exame da legalidade do certame e do respeito às normas do edital que o norteia.
Basta lembrar que há muitos anos o STF já teve o ensejo de afirmar que "...não cabe ao Poder Judiciário sobrepor-se aos critérios da comissão julgadora, para rever as notas atribuídas aos candidatos" (RMS 15.543/DF, DJ 13/04/66). Esse entendimento mantém-se atual, pois a Corte Suprema recentemente repisou que o "...Poder Judiciário é incompetente para, substituindo-se à banca examinadora de concurso público, reexaminar o conteúdo das questões formuladas e os critérios de correção das provas, consoante pacificado na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Precedentes (v.g., MS 30.433 AgR/DF, Rel. Min. GILMAR MENDES; AI 827001 AgR/RJ, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA; MS 27.260/DF, Rel. Min. CARLOS BRITTO, Red. para o acórdão Min. CÁRMEN LÚCIA)..." (MS 30.859/DF, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 23/10/2012). A exceção corre por conta de erro material grosseiro, visível ictu oculi, que deve ser sindicado pelo Judiciário.
Esse pensamento é correto, pois o alcance do art. 5º, XXXV, da CF, não permite que o Juiz incursione no cenário que a lei reserva à administração em geral, e assuma para si a responsabilidade pelo resultado de concursos públicos, intervindo no certame sempre que algum candidato assim reclame. Não sendo caso de afronta à lei ou de arbitrariedade de comissão de concurso, não há razão jurídica que legitime a invasão pelo Juiz de competência alheia.
Fora desses casos restritos, o Juiz não pode substituir a comissão de concurso nas suas conclusões e dirigir o resultado do certame.
Do edital - só impugnado pela autora após sua desclassificação - consta expressamente (fl. 86 - destaquei):
Como se vê, a autodeclaração pelo candidato é condição necessária, mas não suficiente, para concorrer às vagas reservadas aos cotistas de cor negra/parda.
O edital previu que a autodeclaração seria confirmada por uma banca julgadora segundo o critério do fenótipo, que é a manifestação visível ou detectável da constituição genética de um determinado indivíduo.
Assiste razão à agravante ao afirmar que "as alegações de ancestralidade e consanguinidade não são definidoras de direitos para que os candidatos possam figurar nas vagas reservadas", até porque o edital já definiu previamente os critérios orientadores para tanto.
A decisão da Comissão Avaliadora, composta segundo a agravante por três estudiosos das relações raciais no Brasil, com Doutorado em Ciências Sociais e ativistas de movimentos negros organizados, à unanimidade concluiu que a candidata não apresentava traço fenótipo de negro/pardo e os elementos constantes dos autos não são suficientes para infirmar tal conclusão.
É certo que a conclusão da Comissão Avaliadora não pode ser arbitrária, mas obviamente tem um traço ponderável de subjetividade que é próprio do critério do fenótipo (conjunto de caracteres visíveis de um indivíduo ou de um organismo, em relação à sua constituição e às condições do seu meio ambiente, ou seja, aparência) adotado pelo edital e não contrariado pela agravada até sofrer a desclassificação; sendo assim, é invocável recente aresto do STF que ressalvou o não cabimento de revisão judicial de critério subjetivo de resultado de prova, que originariamente cabe à banca (AI 80.5328 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 25/09/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-199 DIVULG 09-10-2012 PUBLIC 10-10-2012).
Além dessa impossibilidade de o Judiciário se sobrepor ao critério que se reserva à banca examinadora, repito: a candidata só se recordou de investir contra o critério do edital depois de não ser favorecida por ele; até então, para ela nada havia de errado nas providências elencadas para apuração de cota racial no certame a que se candidatou."
Ante o exposto, voto por dar provimento ao agravo de instrumento.
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