Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 18/07/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0007888-82.2010.4.03.6100/SP
2010.61.00.007888-3/SP
RELATORA : Desembargadora Federal MÔNICA NOBRE
APELANTE : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : SP000004 RAQUEL VIEIRA MENDES E LÍGIA SCAFF VIANNA
APELADO(A) : NATURA COSMETICOS S/A
ADVOGADO : SP169118A DURVAL ARAUJO PORTELA FILHO
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 7 VARA SAO PAULO Sec Jud SP
No. ORIG. : 00078888220104036100 7 Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

TRIBUTÁRIO.DIFERENÇA DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS IRPJ/CSLL. GLOSA NAS BASES DE CÁLCULOS. REMUNERAÇÃO DEBÊNTURES EMITIDAS PELA APELADA E SUBSCRITAS PELOS SEUS ACIONISTAS. PRELIMINAR CONTRARRAZÕES. REJEITADA. REMESSA OFICIAL E APELAÇAO UNIÃO FEDERAL. IMPROVIDAS.
-Afastada a preliminar arguida em contrarrazões, de não conhecimento do apelo por ausência de ataque às razões da sentença, porquanto nos termos do citado artigo 514, inciso II, do Código de Processo Civil de 1973, a apelação deve apresentar os fundamentos de fato e de direito. Trata-se, pois, da positivação do denominado "princípio da dialeticidade", o qual cumpre ao apelante apresentar as razões de sua inconformidade, impugnando os argumentos da decisão proferida na origem.No caso em apreço, as razões de apelação apresentadas pela ré enfrentam os argumentos contidos no julgado singular.
-No tocante à possibilidade da remuneração das debêntures exclusivamente com base na participação nos lucros, há que se observar o disposto no art. 56 da Lei 6.404/76. Da leitura de tal dispositivo, depreende-se que a debênture pode atribuir ao seu titular juros e/ou participação no lucro e/ou prêmio de reembolso, de onde se conclui que o pagamento de juros é, portanto, uma faculdade prevista na referida legislação.
-A ausência de circulação monetária, no sentido exclusivamente físico, não implica na inexistência de circulação econômica e jurídica de recursos financeiros.
-As debêntures diferenciam-se de despesas operacionais, na medida em que as despesas operacionais alcançam insumos ou custos diversos do contribuinte e não deduções financeiras como as debêntures.
-In casu, não há como ser acolhida a pretensão da apelante, visto que o disposto no art. 47 e parágrafos da Lei nº 4.506/64 (e art. 299 do RIR), não se aplica à questão suscitada nos autos, porquanto não refletem os fatos ora narrados, bem como anterior à vigência da legislação que dispõe sobre dedutibilidade de despesas
-O disposto no art. 462 do RIR/99 não impõe qualquer restrição quanto à dedutibilidade da remuneração das debêntures - salvo as regras gerais próprios dos atos jurídicos gerais, a sua efetiva existência, validade, como a forma e os seus requisitos gerais.
-O art. 187 da Lei das S/A obedece ao critério de divisão de resultados. A operação efetivada pela apelada, portanto, atende aos requisitos de validade dos atos jurídicos em geral, então prevista no art. 82 do CC/1916, quais sejam objeto lícito, agentes capazes e forma prescrita em lei.
- No caso concreto, a emissão das debêntures obedeceu às disposições da Lei da S/A como a preferência de sua emissão aos acionistas. O fato de os acionistas terem sido os subscritores das debêntures não descaracterizou o negócio ou o tornou ilegal, eis que é expressamente previsto em lei a possibilidade dos acionistas da companhia passarem a ser seus debenturistas, aspecto que não pode ser utilizado para caracterizar a operação como anormal e, portanto, desnecessária.
-Constada a legalidade e eficácia da emissão de debêntures e sua subscrição, devendo ser afastada a glosa da base de cálculo efetuada efetivada pela autoridade fiscal no IRPJ da autora no processo administrativo nº. 19.515.002923/2003-85.
-Não havendo previsão legal à adição de despesas operacionais não dedutíveis para o IRPJ (art. 47 da Lei 4.506/64), não se pode exigir da apelada qualquer quantia a título de CLS, visto que ausente previsão legal que determinasse a adição dessas despesas em sua base de cálculo.
-Na hipótese dos autos, considerando o valor da causa (R$ 22.633.213,49 em 07/04/2010 - fls. 76), bem como a matéria discutida nos autos, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido ao seu serviço, mantidos os honorários advocatícios nos termos em que fixado pelo r. juízo a quo (1%). De acordo com os enunciados aprovados pelo Plenário do C. STJ, na sessão de 09/03/2016, a data do protocolo do recurso é parâmetro para aplicação da honorária de acordo com as regras do então vigente Código de Processo Civil/1973.
-Negado provimento à remessa oficial e à apelação da União Federal.




ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial e à apelação da União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 06 de julho de 2016.
MÔNICA NOBRE
Desembargadora Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0007888-82.2010.4.03.6100/SP
2010.61.00.007888-3/SP
RELATORA : Desembargadora Federal MÔNICA NOBRE
APELANTE : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : SP000004 RAQUEL VIEIRA MENDES E LÍGIA SCAFF VIANNA
APELADO(A) : NATURA COSMETICOS S/A
ADVOGADO : SP169118A DURVAL ARAUJO PORTELA FILHO
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 7 VARA SAO PAULO Sec Jud SP
No. ORIG. : 00078888220104036100 7 Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

Cuida-se de remessa oficial e apelação da União Federal em face da r. sentença de fls. 2298/2306 e 2311/2313, mediante a qual restou julgado procedente o pedido, a fim de reconhecer a inexistência de relação jurídica tributária impositiva entre a autora e a ré referentes a créditos tributários de Imposto de Renda Pessoa Jurídica e Contribuição Social sobre o Lucro do período base de 1999, decorrentes de glosa de redução efetuada pela autora nas bases de cálculo desses tributos (P. A. n 19.515.002923/2003-85), referente à dedutibilidade dos valores das debêntures emitidas pela autora e subscritas por seus acionistas. A r. sentença, decretou, ainda, a nulidade do auto de infração, na forma da fundamentação supra em especial o art. 462 do RIR, e do artigo 269, I, do Código de Processo Civil, bem como concedeu a antecipação da tutela, para suspender a exigibilidade dos créditos tributários de IRPJ e CSL objeto da notificação ART/TSR/SARAC N 001/10, de 04.01.2010, oriunda do processo administrativo n 19.515.002923/2003-85.11. A ré União Federal foi condenada a arcar com custas e honorários advocatícios arbitrados em 1% do valor dado à causa.

Em suas razões, a União Federal argumenta, em apertada síntese, seja com a ausência de normalidade e usualidade no negócio de emissão de debêntures, ora em análise, seja com a indedutibilidade da remuneração dessas debêntures da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Há, portanto, necessidade da manutenção da autuação no tocante aos valores da CSLL, bem como a impossibilidade de se glosar da autuação o valor do suposto crédito utilizado pela autora para fins de retenção do IR-Fonte quando do pagamento da participação no lucro das debêntures emitidas. Pleiteia, por fim, a redução do valor dos honorários advocatícios (fls. 2327/2352).


Contrarrazões a fls. 2356/2456, nas quais a ora apelada alega, preliminarmente, o não conhecimento do recurso de apelação, em razão do não atendimento ao princípio da dialeticidade, insculpido no artigo 514, II do Código de Processo Civil de 1973. No mérito, sustenta que a sentença reflete, de forma cristalina, a aplicação do Direito e está em perfeita harmonia, motivo pelo qual não merece reforma.

É o Relatório.


VOTO

Afasto a preliminar arguida em contrarrazões, de não conhecimento do apelo por ausência de ataque às razões da sentença, porquanto nos termos do citado artigo 514, inciso II, do Código de Processo Civil de 1973, a apelação deve apresentar os fundamentos de fato e de direito. Trata-se, pois, da positivação do denominado "princípio da dialeticidade", o qual cumpre ao apelante apresentar as razões de sua inconformidade, impugnando os argumentos da decisão proferida na origem.

No caso em apreço, as razões de apelação apresentadas pela ré enfrentam os argumentos contidos no julgado singular.

Portanto, rejeito a preliminar arguida.

Passo, então, à análise do mérito.


O cerne da controvérsia travada nestes autos diz respeito à diferença de créditos tributários de Imposto de Renda Pessoa Jurídica - IRPJ e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSL, relativos ao período-base de 1999, em razão da glosa, nas bases de cálculos dos referidos tributos, da remuneração assegurada a debêntures emitidas pela apelada e subscritas pelos seus acionistas.

In casu, questiona-se a interpretação da lei no tocante à correta qualificação jurídica da participação nos lucros, atribuídas às debêntures de emissão privada, para fins de sua dedutibilidade na base de cálculo do IRPJ, ou seja, se tais participações devem ser consideradas como redutoras do resultado da apelada e, consequentemente, submetidas ao regime geral de dedutibilidade das despesas operacionais da pessoa jurídica, previsto no art. 47, §§1º e 2º da Lei 4.504/64 (art. 299 do RIR/99), ou, se tais participações seguem o regime da dedutibilidade incondicional que lhe é próprio, conforme determinado pelo art. 58, II do Decreto-lei 1.598/77 (cf art. 462 do RIR/99)

As normas, anteriormente mencionadas pelas partes, possuem a seguinte redação:


Seção III
Custos, Despesas Operacionais e Encargos
Subseção I
Disposições Gerais
Despesas Necessárias
Art. 299. São operacionais as despesas não computadas nos custos, necessárias à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47).
§1º São necessárias as despesas pagas ou incorridas para a realização das transações ou operações exigidas pela atividade da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, 1º).
§2º As despesas operacionais admitidas são as usuais ou normais no tipo de transações, operações ou atividades da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, 2º).
§3º O disposto neste artigo aplica-se também às gratificações pagas aos empregados, seja qual for a designação que tiverem.


CAPÍTULO IX
LUCRO DISTRIBUÍDO E LUCRO CAPITALIZADO
Seção I
Participações
Subseção I
Participações Dedutíveis
Art. 462. Podem ser deduzidas do lucro líquido do período de apuração as participações nos lucros da pessoa jurídica (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 58):
I - asseguradas a debêntures de sua emissão;
II - atribuídas a seus empregados segundo normas gerais aplicáveis, sem discriminações, a todos que se encontrem na mesma situação, por dispositivo do estatuto ou contrato social, ou por deliberação da assembléia de acionistas ou sócios quotistas;
III - atribuídas aos trabalhadores da empresa, nos termos da Medida Provisória nº 1.769-55, de 1999 (art. 359).

Por primeiro, destaco que, à época dos fatos, a apelada, Natura Cosméticos, era tida como sociedade anônima de capital fechado, isto é, sem participação na bolsa de valores.

À época dos fatos, era ela detentora de uma dívida com seus acionistas, devidamente registrada em seu passivo.

Pois bem, Em 02/05/1998, a ora apelada emitiu debêntures remuneradas com base nos seus lucros, as quais foram subscritas por seus acionistas e integralizadas mediante compensação dos créditos, mantidos em contas correntes (conforme registra a Ata de Reunião da Diretoria a fls. 139/141).

Anoto, por pertinente, que, em razão dos acionistas encontrarem-se na posição de credores da autora, a título de dividendos naquele ano, uma parte da integralização ocorreu por meio da compensação (art. 1.009 do Código Civil), de forma que os acionistas nunca sacaram os dividendos já apontados em conta no valor de R$ 66.801.000,00 (sessenta e seis milhões e oitocentos e um mil reais), pois tal valor serviu de integralização às debêntures, subscritas - repito - por esses acionistas.

Diante de tal situação, entendeu o Fisco que as participações no lucro asseguradas às debêntures seriam indedutíveis das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, visto que não teria havido nenhuma captação de recursos externos ao argumento de que os acionistas foram os subscritores das debêntures, pelo fato de que não teria havido pagamento de juros a título de remuneração das debêntures e, portanto, não teria havido circulação monetária para aquisição das debêntures.

Pois bem.

No tocante à possibilidade da remuneração das debêntures exclusivamente com base na participação nos lucros, há que se observar o disposto no art. 56 da Lei 6.404/76, cuja redação é a seguinte:


Art. 56. A debênture poderá assegurar ao seu titular juros, fixos ou variáveis, participação no lucro da companhia e prêmio de reembolso.

Da leitura de tal dispositivo, depreende-se que a debênture pode atribuir ao seu titular juros e/ou participação no lucro e/ou prêmio de reembolso, de onde se conclui que o pagamento de juros é, portanto, uma faculdade prevista na referida legislação.

De outra feita, a ausência de circulação monetária, no sentido exclusivamente físico, não implica na inexistência de circulação econômica e jurídica de recursos financeiros.

In casu, o que caracteriza a circulação monetária e o ingresso de novos recursos financeiros para a apelada é a natureza do negócio jurídico pelo qual a mesma passou a reter os recursos em seu poder, embora inalteradas as figuras originais de credor e devedor, foi efetivada a compensação nos termos em que disposto no art. 1009 no Código Civil vigente à época.

Ressalto, por oportuno, que a escolha do negócio jurídico para equacionar a dívida em aberto da apelada para com os seus acionistas recaiu na emissão de debêntures privadas remuneradas com base em participação nos lucros da companhia, mas poderia perfeitamente ter recaído sobre o instituto do mútuo remunerado com base nas taxas de juros usuais de mercado, nos termos em que dispõe o Parecer Normativo - PN CST nº 138/75.

Com efeito, as debêntures diferenciam-se de despesas operacionais, na medida em que as despesas operacionais alcançam insumos ou custos diversos do contribuinte e não deduções financeiras como as debêntures.


Ademais, não há como se analisar as razões pelas quais as debentures foram emitidas, ou por quais motivos decidiu-se por esta ou aquela forma de captação de recursos, devendo o aplicador da lei se limitar à legalidade ou não de tal captação. Admitida em lei, é o quanto basta.


De fato, não há como ser acolhida a pretensão da apelante, União Federal, visto que o disposto no art. 47 e parágrafos da Lei nº 4.506/64 (e art. 299 do RIR), não se aplica à questão suscitada nos autos, porquanto não refletem os fatos ora narrados, bem como anterior à vigência da legislação que dispõe sobre dedutibilidade de despesas, nos seguintes termos:

Art. 46. São custos as despesas e os encargos relativos à aquisição, produção e venda dos bens e serviços objeto das transações de conta própria, tais como: I - O custo de aquisição dos bens ou serviços revendidos ou empregados na produção dos bens ou serviços vendidos;
II - Os encargos de depreciação, exaustão e amortização;
IlI - Os rendimentos pagos a terceiros;
IV - Os impostos, taxas e contribuições físcais ou parafiscais, exceto o impôsto de renda;
V - As quebras e perdas razoáveis, de acôrdo com a natureza do bem e da atividade, ocorridas na fabricação no transporte e manuseio;
VI - As quebras ou perdas de estoque por deterioração, obsolescência ou pela ocorrência de riscos não cobertos por seguro, desde que comprovadas:
a) por laudo ou certificado de autoridade sanitária ou de seguranças que especifique e identifique as quantidades destruídas ou inutilizadas, e as razões da providência;
b) por certificado de autoridade competente nos casos de incêndios, inundações, ou outros eventos semelhantes;
c) mediante laudo de autoridade fiscal chamada a certificar a destruiç ão de bens obsoletos, inventáveis ou danificados, quando não houver valor residual apurável.

De fato, a legislação fiscal não considera a participação nos lucros assegurada às debêntures como despesa integrada nos resultados operacionais da empresa, subsumidas ao art. 299 do RIR/99, mas como participações dedutíveis.

Anoto, ainda, que o disposto no art. 462 do RIR/99 não impõe qualquer restrição quanto à dedutibilidade da remuneração das debêntures - salvo as regras gerais próprios dos atos jurídicos gerais, a sua efetiva existência, validade, como a forma e os seus requisitos gerais.

Por outro lado, o art. 187 da Lei das S/A obedece ao critério de divisão de resultados. Senão vejamos:

Demonstração do Resultado do Exercício
Art. 187. A demonstração do resultado do exercício discriminará:
I - a receita bruta das vendas e serviços, as deduções das vendas, os abatimentos e os impostos;
II - a receita líquida das vendas e serviços, o custo das mercadorias e serviços vendidos e o lucro bruto;
III - as despesas com as vendas, as despesas financeiras, deduzidas das receitas, as despesas gerais e administrativas, e outras despesas operacionais;
IV - o lucro ou prejuízo operacional, as outras receitas e as outras despesas; (Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009)
V - o resultado do exercício antes do Imposto sobre a Renda e a provisão para o imposto;
VI - as participações de debêntures, empregados, administradores e partes beneficiárias, mesmo na forma de instrumentos financeiros, e de instituições ou fundos de assistência ou previdência de empregados, que não se caracterizem como despesa; (Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009)
VII - o lucro ou prejuízo líquido do exercício e o seu montante por ação do capital social.
§1º Na determinação do resultado do exercício serão computados:
a) as receitas e os rendimentos ganhos no período, independentemente da sua realização em moeda; e
b) os custos, despesas, encargos e perdas, pagos ou incorridos, correspondentes a essas receitas e rendimentos.

A operação efetivada pela apelada, portanto, atende aos requisitos de validade dos atos jurídicos em geral, então prevista no art. 82 do CC/1916, quais sejam objeto lícito, agentes capazes e forma prescrita em lei.

Realmente, consta dos autos a Ata da Assembléia Geral que deliberou na forma legítima sua emissão, bem como as publicações oficiais e os registros do ato na Junta Comercial e no Cartório de Registro de Imóveis.

Ademais, a emissão das debêntures obedeceu às disposições da Lei da S/A como a preferência de sua emissão aos acionistas:


Art. 52. A companhia poderá emitir debêntures que conferirão aos seus titulares direito de crédito contra ela, nas condições constantes da escritura de emissão e, se houver, do certificado.
(...)Valor Nominal
Art. 54. A debênture terá valor nominal expresso em moeda nacional, salvo nos casos de obrigação que, nos termos da legislação em vigor, possa ter o pagamento estipulado em moeda estrangeira.
Art. 56. A debênture poderá assegurar ao seu titular juros, fixos ou variáveis, participação no lucro da companhia e prêmio de reembolso.
§1º Os acionistas terão direito de preferência para subscrever a emissão de debêntures com cláusula de conversibilidade em ações, observado o disposto nos artigos 171 e 172.

Anoto, ainda, que o pagamento de cada debênture legítimo foi o relativo a 0,0005% (cinco milésimos percentuais) dos lucros da autora, conforme explicitada na escritura de emissão das 140 mil debêntures no valor nominal de R$ 1.000,00 (mil reais cada). E o pagamento das debêntures ocorreu em parte da conversão dos dividendos dos acionistas, através de compensação, o que na prática comercial é praxe, dada a dinâmica da vida empresarial.

Por sua vez, em sede de Direito Comercial vige o princípio da ampla legalidade, de forma que aquilo que não está vedado na letra da lei é tido como lícito.

Cabe ressaltar que o fato de os acionistas terem sido os subscritores das debêntures não descaracterizou o negócio ou o tornou ilegal, eis que é expressamente previsto em lei a possibilidade dos acionistas da companhia passarem a ser seus debenturistas, aspecto que não pode ser utilizado para caracterizar a operação como anormal e, portanto, desnecessária.

Aliás, muito provavelmente, somente os acionistas da apelada se submeteriam a integralizar as debêntures nas bases em que pactuadas, o que justifica plenamente uma emissão de natureza privada.

No presente caso, ressalto que a operação ora questionada, contemplou a efetiva natureza jurídica do capital de risco nela contratado e não à figura dos contratantes (acionistas e sociedade).

Portanto, conclui-se, que é legal e eficaz a emissão de debêntures e sua subscrição, devendo ser afastada a glosa da base de cálculo efetuada efetivada pela autoridade fiscal no IRPJ da autora no processo administrativo nº. 19.515.002923/2003-85.


Já no que concerne à dedutibilidade dos valores das debêntures emitidas da base de cálculo do CSL, ressalto a utilização de parâmetros equivalentes ao imposto de renda, ao menos quanto às normas de apuração de pagamento.

Nesse sentido é o disposto no art. 2º da Lei n. 7.689/88, in verbis:


Art. 2º A base de cálculo da contribuição é o valor do resultado do exercício, antes da provisão para o imposto de renda.

Por sua vez, o art. 57 da Lei nº 8.981/95 dispõe que:


Art. 57. Aplicam-se à Contribuição Social sobre o Lucro (Lei nº 7.689, de 1988) as mesmas normas de apuração e de pagamento estabelecidas para o imposto de renda das pessoas jurídicas, inclusive no que se refere ao disposto no art. 38, mantidas a base de cálculo e as alíquotas previstas na legislação em vigor, com as alterações introduzidas por esta Lei. (Redação dada pela Lei nº 9.065, de 1995)
§1º Para efeito de pagamento mensal, a base de cálculo da contribuição social será o valor correspondente a dez por cento do somatório:
a) da receita bruta mensal;
b) das demais receitas e ganhos de capital;
c) dos ganhos líquidos obtidos em operações realizadas nos mercados de renda variável;
d) dos rendimentos produzidos por aplicações financeiras de renda fixa.
(...) 3º A pessoa jurídica que determinar o Imposto de Renda a ser pago em cada mês com base no lucro real (art. 35), deverá efetuar o pagamento da contribuição social sobre o lucro, calculando-a com base no lucro líquido ajustado apurado em cada mês.
§4º No caso de pessoa jurídica submetida ao regime de tributação com base no lucro real, a contribuição determinada na forma dos 1º a 3º será deduzida da contribuição apurada no encerramento do período de apuração.

Assim, não havendo previsão legal à adição de despesas operacionais não dedutíveis para o IRPJ (art. 47 da Lei 4.506/64), não se pode exigir da apelada qualquer quantia a título de CLS, visto que ausente previsão legal que determinasse a adição dessas despesas em sua base de cálculo.

Desse modo, entendo ser inequívoca, na espécie, a dedutibilidade dos valores das debêntures emitidas pela autora nas bases de cálculo da CSL, o que torna ilícita a glosa fiscal realizada pela autoridade fiscal, nos autos do Processo Administrativo n 19.515.002923/2003-85.

Em relação à condenação em honorários, mormente quanto ao percentual fixado, o Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que, "vencida a Fazenda Pública, a fixação dos honorários não está adstrita aos limites percentuais de 10% e 20%, podendo ser adotado como base de cálculo o valor dado à causa ou à condenação, nos termos do art. 20, § 4º, do CPC de 1973, ou mesmo um valor fixo, segundo o critério de equidade", in verbis:


PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. ILEGITIMIDADE PASSIVA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ARBITRAMENTO POR EQUIDADE. FAZENDA PÚBLICA SUCUMBENTE. PRETENSÃO DE MAJORAR O VALOR FIXADO NA ORIGEM. SÚMULA 7 DO STJ. INCIDÊNCIA.
1. Na hipótese em foco, a Fazenda Nacional, em face do acolhimento da exceção de pré-executividade, foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 1.500,00, levando-se em conta a análise dos critérios estipulados no artigo 20, §§ 3º e 4º, do CPC.
2. A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que: "Vencida a Fazenda Pública, a fixação dos honorários não está adstrita aos limites percentuais de 10% e 20%, podendo ser adotado como base de cálculo o valor dado à causa ou à condenação, nos termos do art. 20, § 4º, do CPC, ou mesmo um valor fixo, segundo o critério de equidade. (Recurso Especial 1.155.125/MG, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 6/4/2010, julgado sob o rito do art. 543-C, do CPC).
3. A revisão da verba honorária fixada pela origem, com base no critério de equidade, encontra óbice na Súmula 7 do STJ. (REsp 1.186.053/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 12/5/2010).
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 216.958/AL, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/10/2012, DJe 08/10/2012)
Por sua vez, o entendimento firmado pelo C. Superior Tribunal de Justiça, adotado por esta Quarta Turma, é no sentido de que não podem ser arbitrados em valores inferiores a 1% do valor da causa, nem em percentual excessivo (EDcl no REsp 792.306/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 23/06/2009, DJe 06/08/2009).

Na hipótese dos autos, considerando o valor da causa (R$ 22.633.213,49 em 07/04/2010 - fls. 76), bem como a matéria discutida nos autos, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido ao seu serviço, entendo que devem ser mantidos os honorários advocatícios nos termos em que fixado pelo r. juízo a quo (1%).

Note-se que, de acordo com os enunciados aprovados pelo Plenário do C. STJ, na sessão de 09/03/2016, a data do protocolo do recurso é parâmetro para aplicação da honorária de acordo com as regras do então vigente Código de Processo Civil/1973, como na espécie.

Conclui-se, portanto, pela manutenção da r. sentença a quo.

Ante o exposto, nego provimento à apelação da União Federal e à remessa oficial, mantendo in totum a r. sentença a quo, consoante fundamentação.

É o meu voto.


MÔNICA NOBRE
Desembargadora Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): Monica Autran Machado Nobre:10069
Nº de Série do Certificado: 4D18C32A04A80C7A5DB4EAA4A7328164
Data e Hora: 07/07/2016 17:26:20