Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 03/02/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000780-70.2008.4.03.6100/SP
2008.61.00.000780-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : VIVIANA GONCALVES
ADVOGADO : SP259254 PHELIPE VICENTE DE PAULA CARDOSO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO
APELADO(A) : Caixa Economica Federal - CEF
ADVOGADO : SP168287 JOÃO BATISTA BAITELLO JUNIOR e outro(a)
PARTE RÉ : TRONA QUIMICA LTDA e outro(a)
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO
PARTE RÉ : MARCIA REGINA KULAIF
No. ORIG. : 00007807020084036100 12 Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO MONITÓRIA. CONTRATO DE LIMITE DE CRÉDITO PARA AS OPERAÇÕES DE DESCONTO. NÃO CONHECIMENTO: ILEGITIMIDADE DE PARTE APELANTE. COBRANÇA DE TAC CUMULADA COM TARIFAS DE SERVIÇOS. CONHECIMENTO DO AGRAVO RETIDO: INDEFERIMENTO DA PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL CONTÁBIL NÃO SINTETIZA CERCEAMENTO DE DEFESA. DOCUMENTOS HÁBEIS À PROPOSITURA DA AÇÃO. DESNECESSIDADE DE DEMAIS PROVAS (DOCUMENTAL E ORAL). APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. POSSIBILIDADE. CLÁUSULA DÉCIMA SEGUNDA: PENA CONVENCIONAL, DESPESAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CLÁUSULA INÓCUA. INCLUSÃO OU MANUTENÇÃO DO NOME DO DEVEDOR NO CADASTRO DOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO CREDITÍCIA. POSSIBILIDADE. CLÁUSULA NONA. AUTOTUTELA AFASTADA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. EXCLUSÃO DA TAXA DE RENTABILIDADE. CABIMENTO. AGRAVO RETIDO IMPROVIDO E APELAÇÃO PARCIALMENTE CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Verifica-se que não se pode conhecer do pleito de reconhecimento de ilegitimidade passiva da apelante e a legitimidade passiva de Marco Antônio Kufaif, uma vez que referida questão foi apreciada na decisão de fls. 336/342 e, não tendo a corré Viviana Gonçalves interposto recurso de agravo, tal matéria está atingida pela preclusão.
2. Também não se conhece da apelação quanto à ilegalidade da TAC e de sua cumulação com as tarifas de serviços, uma vez que a apelante traz à baila questão não suscitada nos autos, restando evidente que inova em sede recursal.
3. Conhece-se do agravo retido interposto, porquanto cumprida a exigência do artigo 523, caput, do Código de Processo Civil de 1973, vigente à época da interposição da apelação.
4. Trata-se de questão eminentemente de direito, cuja solução prescinde da produção de prova pericial, porque limita-se à determinação de quais os critérios aplicáveis à atualização do débito, não havendo se falar em remessa dos cálculos da autora ao contador judicial. Precedentes.
5. A parte ré, ora apelante, sustenta que o não deferimento da produção de prova pericial configura cerceamento de defesa. Não há que se falar em cerceamento de defesa. O cerceamento de defesa é obstáculo que o juiz, ou outra autoridade, opõe ao litigante para impedir que pratique, ou sejam praticados, atos que lhe deem guarida aos seus interesses na lide. Pode dar motivo a que o processo seja anulado. Dá-se por coação no curso do processo ou abuso de poder, o que não é observado no decorrer do processo. Ante o exposto, a não produção de prova pericial contábil não sintetiza cerceamento de defesa.
6. Há prova escrita - contrato assinado pelas devedoras e as planilhas de evolução do débito - sem eficácia de título executivo, prevendo pagamento de soma em dinheiro, de forma que estão satisfeitos os requisitos do artigo 1.102a do CPC - Código de Processo Civil/1973 (art. 700 do CPC/2015), sendo cabível a ação monitória. Súmula 247 do STJ.
7. Os documentos que acompanham a inicial são suficientes à propositura da presente ação, não havendo necessidade de produção de demais provas quer sejam documental ou oral.

8. A aplicação da Lei nº 8.078/1990 (CDC - Código de Defesa do Consumidor) aos contratos bancários é questão superada no âmbito dos Tribunais Superiores. O Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento no sentido de que as instituições financeiras, como prestadoras de serviços especialmente contemplados no artigo 3º, §2º, estão submetidas às disposições da lei consumerista, editando a Súmula n° 297: "o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

9. O contrato foi firmado em 28/04/2006 e prevê expressamente a forma de cálculo dos juros. Ainda que se entenda que o cálculo dos juros implica em capitalização, tratando-se de contrato bancário firmado posteriormente à vigência da Medida Provisória nº 1.963-17, de 30/03/2000 (em vigor a partir da publicação no DOU de 31/03/2000), por diversas vezes reeditada, a última sob nº 2.170-36, de 23/08/2001, ainda em vigor por força do artigo 2º da Emenda Constitucional nº 32, de 11/09/2001, é lícita da capitalização dos juros, nos termos do artigo 5º. Precedentes.
10. Conforme previsão contratual (cláusula décima segunda), no caso de a credora se socorrer do Judiciário para a cobrança de seu crédito, a devedora pagará, a título de pena convencional, multa contratual correspondente a 2% (dois por cento) sobre tudo quanto for devido, mais despesas judiciais e honorários advocatícios à base de 20% (vinte por cento) sobre o valor total da dívida apurada. Embora prevista em contrato, a CEF não está pretendendo a cobrança da pena convencional, como se verifica na planilha de evolução da dívida. Ademais, não há interesse nem tampouco necessidade de declaração da nulidade da referida cláusula, uma vez que é inócua.

11. Cabe ao Juiz a fixação dos honorários advocatícios, nos termos do artigo 20 do Código de Processo Civil/1973 (artigo 85 do CPC/2015), não estando o magistrado vinculado à eventual cláusula contratual. Esse é o entendimento jurisprudencial, conforme anota Theotonio Negrão, in Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, Ed.Saraiva, 38a ed., nota 27 ao citado artigo 20 do CPC/1973.

12. No contrato em questão, uma vez inadimplente o réu, como devedor, deve arcar com as consequências, sendo uma delas a inscrição do nome nos cadastros de proteção ao crédito. Da inscrição do nome em órgãos de serviços de proteção ao crédito há expressa previsão legal no art. 43 da Lei nº 8.078/90, no sentido de que em inadimplência pode haver a inscrição da parte.

13. A inclusão do apelante confessadamente devedor no cadastro público de inadimplentes não se apresenta prima facie como modo coercitivo de pagamento da dívida porque a Caixa Econômica Federal tem a seu favor instrumento sério destinado a isso, a execução do contrato, e o fato do processo estar em trâmite não justifica a exclusão do cadastro.

14. A disposição contratual (cláusula nona) concede à CEF de forma indiscriminada o bloqueio de saldo da(s) conta(s) bancária(s) da parte ré, o que se demonstra abusiva, na medida que coloca o consumidor em desvantagem excessiva, caracterizando, dessa forma, a infringência da normal contida no art. 51, IV, §1º, I, do Código de Defesa do Consumidor.

15. Deve ser afastada a cláusula contratual (nona) que autoriza a compensação do débito oriundo do contrato com créditos eventualmente existentes em outras contas ou aplicações de titularidade da parte ré.

16. As Súmulas nº 30, nº 294 e nº 296 do Superior Tribunal de Justiça são claras ao reconhecer a legitimidade da aplicação da comissão de permanência, uma vez caracterizada a inadimplência do devedor, contanto que não haja cumulação com índice de atualização monetária ou taxa de juros.

17. A comissão de permanência, prevista na Resolução nº 1.129/1986 do BACEN, já traz embutida em seu cálculo a correção monetária, os juros remuneratórios e os encargos oriundos da mora. Todavia, a autora embargada pretende a cobrança de uma taxa variável de juros remuneratórios, apresentada sob a rubrica "taxa de rentabilidade", à comissão de permanência.

18. Tanto a taxa de rentabilidade, como quaisquer outros encargos decorrentes da mora (como, v.g. multa ou juros moratórios), não podem ser cumulados com a comissão de permanência, por configurarem verdadeiro bis in idem. Precedentes.

19. O exame dos discriminativos de débito revela que a atualização da dívida deu-se pela incidência da comissão de permanência, acrescida de taxa de rentabilidade (composta da taxa "TR + 2,01% AM" ou "TR + 2,52% AM"), sem inclusão de juros de mora ou multa moratória. Destarte, necessária a exclusão dos cálculos da taxa de rentabilidade que, conforme anteriormente exposto não pode ser cumulada com a comissão de permanência.

20. Agravo retido improvido e apelação parcialmente conhecida e, na parte conhecida, parcialmente provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido e conhecer parcialmente do recurso de apelação e, na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 24 de janeiro de 2017.
HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000780-70.2008.4.03.6100/SP
2008.61.00.000780-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : VIVIANA GONCALVES
ADVOGADO : SP259254 PHELIPE VICENTE DE PAULA CARDOSO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO
APELADO(A) : Caixa Economica Federal - CEF
ADVOGADO : SP168287 JOÃO BATISTA BAITELLO JUNIOR e outro(a)
PARTE RÉ : TRONA QUIMICA LTDA e outro(a)
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO
PARTE RÉ : MARCIA REGINA KULAIF
No. ORIG. : 00007807020084036100 12 Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (RELATOR):

Trata-se de apelação interposta por Viviana Gonçalves face da sentença de fls. 364/370, integrada aos declaratórios de fls. 380/381, que JULGOU PROCEDENTE o pedido formulado, declarando constituído de pleno direito o título executivo judicial, com fundamento no artigo 1.102, do Código de Processo Civil, condenando os réus a pagar a importância de R$ 65.833,38 (sessenta e cinco mil e oitocentos e trinta e três reais e trinta e oito centavos), valor em 31.10.2007, acrescida de correção monetária, nos termos do Provimento nº 64/05, da Corregedoria-Geral do TRF da 3ª Região e o Manual de Cálculos aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, com incidência de juros de mora a partir da citação, a serem apurados na data da efetiva liquidação. Condenou os réus ao pagamento pro rata de custas e honorários advocatícios, estes, no percentual de dez por cento sobre o valor da condenação. Ressaltou que tais valores somente deverão ser pagos pela corré VIVIANE GONÇALVES somente se no prazo estabelecido pelo art.12 da Lei 1.060/50, comprovar a AUTORA a perda da condição de necessitada da referida corré, nos termos do 2º do art.11 da referida lei.

A apelante, requer, preliminarmente, a apreciação do agravo retido em face da decisão que indeferiu a produção de prova pericial contábil, oral e documental. No mérito, sustenta: a) a ilegitimidade passiva do apelante e a legitimidade passiva de Marco Antônio Kufaif; b) a aplicação do Código de Defesa do Consumidor; c) a vedação da capitalização de juros, nos termos da Súmula 121 do STF; d) a ilegalidade da comissão de permanência cumulada com a taxa de rentabilidade e juros de mora; e) a ilegalidade da cobrança da TAC e de sua cumulação com tarifas de serviços; f) a ilegalidade da cobrança da pena convencional, despesas processuais e prefixação de honorários advocatícios; g) a ilegalidade da autotutela da cláusula nona; g) a necessidade de impedir a inclusão ou determinar a retirada do nome da apelante do cadastro de restrição ao crédito. Requer, por fim, a condenação da apelada ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios.

Sem contrarrazões, subiram os autos.

É o breve relatório.

VOTO

O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (RELATOR):

Inicialmente, verifico que não se pode conhecer do pleito de reconhecimento de ilegitimidade passiva da apelante e a legitimidade passiva de Marco Antônio Kufaif, uma vez que referida questão foi apreciada na decisão de fls. 336/342 e, não tendo a corré Viviana Gonçalves interposto recurso de agravo, tal matéria está atingida pela preclusão.

Também não conheço da apelação quanto à ilegalidade da TAC e de sua cumulação com as tarifas de serviços, uma vez que a apelante traz à baila questão não suscitada nos autos, restando evidente que inova em sede recursal.

Ademais, conheço do agravo retido interposto, porquanto cumprida a exigência do artigo 523, caput, do Código de Processo Civil de 1973, vigente à época da interposição da apelação.

Passo a análise do agravo retido e das questões remanescentes devolvidas para a apreciação por este Tribunal.

Da desnecessidade de produção de prova pericial contábil

É do réu o ônus da impugnação específica dos fatos alegados na petição inicial, nos termos do artigo 302 do CPC/1973 (artigo 341 do CPC/2015).

Tal interpretação vem ao encontro da busca de efetividade ditada pelas reformas do CPC, que já introduziu norma expressa de que "cálculos se combatem com cálculos" no âmbito dos embargos do executado (artigo 739-A, §5º, do CPC/1973) e da impugnação ao cumprimento da sentença (artigo 475-L, §2º, do CPC/1973 - atual artigo 525, §4º, do CPC/2015).

No caso dos autos, as planilhas e os cálculos juntados à inicial apontam a evolução do débito. Por outro lado, o embargante não impugna especificadamente nenhum valor cobrado pela embargada, ou seja, não aponta qualquer elemento concreto no sentido de infirmar a correção formal dos cálculos e justificar a produção de perícia contábil.

Na verdade, o réu embargante sequer apresentou cálculos dos valores que entende devidos, limitando-se a sustentar que o saldo devedor imputado à apelante é abusivo, descabido e indevido, devendo ser determinada a perícia contábil para verificação de eventual cobrança de taxas abusivas.

Dessa forma, não há divergência quanto aos cálculos apresentados pela autora embargada, mas a pretensão de que a atualização da dívida seja feita segundo critérios diversos dos previstos em contrato, que o réu embargante entende aplicáveis.

Portanto, trata-se de questão eminentemente de direito, cuja solução prescinde da produção de prova pericial, porque limita-se à determinação de quais os critérios aplicáveis à atualização do débito, não havendo se falar em remessa dos cálculos da autora ao contador judicial.

Nesse sentido, aponto precedentes do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:

AÇÃO MONITÓRIA - CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO DIRETO AO CONSUMIDOR - NULIDADE DA SENTENÇA - CERCEAMENTO DE DEFESA - INOCORRÊNCIA - PRELIMINAR REJEITADA - CABIMENTO DA AÇAO MONITÓRIA - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - COMISSÃO DE PERMANÊNCIA - TAXA DE RENTABILIDADE - TAXA DE JUROS SUPERIOR A 12% AO ANO - ABUSIVIDADE - INOCORRÊNCIA - CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS REMUNERATÓRIOS - POSSIBILIDADE - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA - RECURSO DE APELAÇÃO DOS EMBARGANTES E DA CEF IMPROVIDOS - SENTENÇA MANTIDA. 1.O artigo 330 do Código de Processo Civil permite ao magistrado julgar antecipadamente a causa e dispensar a produção de provas quando a questão for unicamente de direito e os documentos acostados aos autos forem suficientes ao exame do pedido....3.Considerando que os valores, índices e taxas que incidiram sobre o valor do débito estão bem especificados nos autos e, além disso, a questão relativa ao abuso na cobrança dos encargos contratuais é matéria exclusivamente de direito, porquanto basta mera interpretação das cláusulas do contrato firmado entre as partes para se apurar as ilegalidades apontadas, não há necessidade de produção de perícia contábil. Preliminar de cerceamento de defesa rejeitada...

(TRF 3ª Região, 5ª Turma, AC 200561050003184, Rel. Des. Fed. Ramza Tartuce, j. 16/02/2009, DJ 21/07/2009 p. 299)

PROCESSO CIVIL - AÇÃO MONITÓRIA AJUIZADA PELA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL REFERENTE À CONTRATO DE CRÉDITO - PRESENÇA DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA O AJUIZAMENTO DA AÇÃO - JUROS CAPITALIZADOS - APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - VERBA HONORÁRIA - JUSTIÇA GRATUITA. 1. No que tange à alegação de nulidade da sentença em face da ocorrência de cerceamento de defesa, argüida pela parte ré em suas razões de apelação, entendo que especificamente em relação aos contratos que têm, ou terminam tendo, por objeto o empréstimo ou mútuo, todas as condições ajustadas estão expressas nos instrumentos, possibilitando ao credor calcular o valor da dívida e seus encargos e ao devedor discutir a dívida subseqüente. 2. A prova escrita fornecida pela Caixa Econômica Federal, comprova indubitavelmente a obrigação assumida pelo devedor (conforme contrato assinado às fls. 09/13, acompanhado do demonstrativo de débito de fls. 17/25). 3. Toda a documentação apresentada pela parte autora, fornece elementos suficientes para o ajuizamento da ação monitória, afastando-se inclusive, a necessidade de prova pericial, posto que as matérias controvertidas são de direito, perfeitamente delineadas na lei e no contrato, pelo que rejeito a matéria preliminar argüida...

(TRF 3ª Região, 1ª Turma, AC 200561000063811, Rel. Des. Fed. Johonsom di Salvo, j. 19/08/2008, DJe 20/10/2008)

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À AÇÃO MONITÓRIA. ALEGAÇÕES GENÉRICAS E ABSTRATAS. AUSÊNCIA DE CAUSA DE PEDIR. INÉPCIA DA INICIAL. MANIFESTO PROPÓSITO PROTELATÓRIO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. 1. O contrato de abertura de crédito em conta-corrente, acompanhado do demonstrativo de débito, constitui documento hábil para o ajuizamento da ação monitória (Súmula 247 do Superior Tribunal de Justiça). 2. É inepta a petição inicial dos embargos à monitória se o embargante, impugnando genérica e abstratamente o valor da dívida, cinge-se a requerer a produção de prova pericial para demonstrar a prática de 'juros extorsivos' e a cobrança de 'taxas indevidas'...

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, AC 200361130027585, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos, j. 14/11/2006, DJ 07/12/2007 p. 594)

Ademais, sustenta a parte ré, ora apelante, que o não deferimento da produção de prova pericial configura cerceamento de defesa. Não há que se falar em cerceamento de defesa. O cerceamento de defesa é obstáculo que o juiz, ou outra autoridade, opõe ao litigante para impedir que pratique, ou sejam praticados, atos que lhe deem guarida aos seus interesses na lide. Pode dar motivo a que o processo seja anulado. Dá-se por coação no curso do processo ou abuso de poder, o que não é observado no decorrer do processo. Ante o exposto, a não produção de prova pericial contábil não sintetiza cerceamento de defesa.

Dos documentos hábeis à propositura da ação monitória.

A embargada ajuizou a ação monitória com base no "Contrato de Limite de Crédito para as Operações de Desconto", acompanhado de demonstrativos de débitos e cálculos de evolução da dívida.

Há, portanto, prova escrita - contrato assinado pelas devedoras e as planilhas de evolução do débito - sem eficácia de título executivo, prevendo pagamento de soma em dinheiro, de forma que estão satisfeitos os requisitos do artigo 1.102a do CPC - Código de Processo Civil/1973 (art. 700 do CPC/2015), sendo cabível a ação monitória.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido da adequação da ação monitória para a cobrança de contrato de abertura de crédito em conta-corrente:

Súmula 247: O contrato de abertura de crédito em conta-corrente, acompanhado do demonstrativo de débito, constitui documento hábil para o ajuizamento da ação monitória.

Assim, entendo que os documentos que acompanham a inicial são suficientes à propositura da presente ação, não havendo necessidade de produção de demais provas quer sejam documental ou oral.

Da aplicação do CDC - Código de Defesa do Consumidor às instituições financeiras.

A aplicação da Lei nº 8.078/1990 (CDC - Código de Defesa do Consumidor) aos contratos bancários é questão superada no âmbito dos Tribunais Superiores. O Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento no sentido de que as instituições financeiras, como prestadoras de serviços especialmente contemplados no artigo 3º, §2º, estão submetidas às disposições da lei consumerista, editando a Súmula n° 297: "o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

No mesmo sentido firmou-se o entendimento do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADIn 2.591-DF, DJ 29/09/2006, p. 31, assentando-se que "as instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor", excetuando-se da sua abrangência apenas "a definição do custo das operações ativas e a remuneração das operações passivas praticadas na exploração da intermediação de dinheiro na economia".

Da capitalização dos juros.

Não prospera o argumento de que não é admissível a capitalização dos juros, com apoio na Súmula 121 do Supremo Tribunal Federal.

No caso dos autos, o contrato foi firmado em 28/04/2006 e prevê expressamente a forma de cálculo dos juros.

Ainda que se entenda que o cálculo dos juros implica em capitalização, tratando-se de contrato bancário firmado posteriormente à vigência da Medida Provisória nº 1.963-17, de 30/03/2000 (em vigor a partir da publicação no DOU de 31/03/2000), por diversas vezes reeditada, a última sob nº 2.170-36, de 23/08/2001, ainda em vigor por força do artigo 2º da Emenda Constitucional nº 32, de 11/09/2001, é lícita da capitalização dos juros, nos termos do artigo 5º:

Art. 5o Nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano.

Nesse sentido situa-se a orientação do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. CONTRATO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS. POSSIBILIDADE. - A capitalização dos juros é admissível nos contratos bancários celebrados a partir da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17 (31.3.00), desde que pactuada. Agravo improvido.

(STJ, 2ª Seção, AgRg nos EREsp 1041086/RS, Rel.Min. Sidnei Beneti, j. 26/11/2008, Dje 19/12/2008)

Da pena convencional e da fixação de honorários advocatícios em cláusula contratual.

Conforme previsão contratual (cláusula décima segunda, fl. 18), no caso de a credora se socorrer do Judiciário para a cobrança de seu crédito, a devedora pagará, a título de pena convencional, multa contratual correspondente a 2% (dois por cento) sobre tudo quanto for devido, mais despesas judiciais e honorários advocatícios à base de 20% (vinte por cento) sobre o valor total da dívida apurada.

Embora prevista em contrato, a CEF não está pretendendo a cobrança da pena convencional, como se verifica nas planilhas de evolução da dívida, de fls. 25/123.

Ademais, não há interesse nem tampouco necessidade de declaração da nulidade da referida cláusula, uma vez que é inócua.

Com efeito, cabe ao Juiz a fixação dos honorários advocatícios, nos termos do artigo 20 do Código de Processo Civil/1973 (artigo 85 do CPC/2015), não estando o magistrado vinculado à eventual cláusula contratual. Esse é o entendimento jurisprudencial, conforme anota Theotonio Negrão, in Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, Ed.Saraiva, 38a ed., nota 27 ao citado artigo 20 do CPC/1973 (artigo 85 do CPC/2015):

O arbitramento da honorária, em razão do sucumbimento processual, está sujeito a critérios de valoração, perfeitamente delineados na lei processual (art.20, 3°, do CPC/1973 - art. 85, §2º do CPC/2015); e sua fixação é ato do juiz e não pode ser objeto de convenção das partes (RT 509/169). No mesmo sentido, quanto à impossibilidade de fixação do valor dos honorários advocatícios pelas partes: RT 828/254.

Dessa forma, cabe ao Juiz da causa, no caso de cobrança de valores financiados, a fixação dos honorários advocatícios, consideradas as circunstâncias do caso concreto, independentemente da existência de cláusula contratual. O mesmo se diga quanto à fixação da responsabilidade pelas despesas processuais.

Assim, conforme se verificam dos demonstrativos de débito de fls. 25/123, a autora não incluiu qualquer valor a esse título no montante cobrado.

Da inscrição do nome do réu em cadastro restritivo de crédito (SERASA / SPC).

Requer a apelante que seu nome não seja incluído, ou caso já tenha, a exclusão de seu nome de cadastros restritivos de crédito, uma vez que a apelada cobrou valores a maior, em razão da incidência de cláusulas contratuais ilegais e/ou abusivas.

No contrato em questão, uma vez inadimplente o réu, como devedor, deve arcar com as consequências, sendo uma delas a inscrição do nome nos cadastros de proteção ao crédito. Da inscrição do nome em órgãos de serviços de proteção ao crédito há expressa previsão legal no art. 43 da Lei nº 8.078/90, no sentido de que em inadimplência pode haver a inscrição da parte.

A inclusão do apelante confessadamente devedor no cadastro público de inadimplentes não se apresenta prima facie como modo coercitivo de pagamento da dívida porque a Caixa Econômica Federal tem a seu favor instrumento sério destinado a isso, a execução do contrato, e o fato do processo estar em trâmite não justifica a exclusão do cadastro.

Da autotutela - cláusula autorizadora de utilização de saldos.

A apelante busca a declaração de nulidade da cláusula que autoriza a CEF a utilizar os saldos de qualquer conta ou aplicação financeira, da titularidade da parte ré, em qualquer unidade da instituição financeira, para amortização das obrigações assumidas no contrato que embasa a presente ação.

Observo que a referida disposição contratual concede à CEF de forma indiscriminada o bloqueio de saldo da(s) conta(s) bancária(s) da parte ré, o que se demonstra abusiva, na medida que coloca o consumidor em desvantagem excessiva, caracterizando, dessa forma, a infringência da normal contida no art. 51, IV, §1º, I, do Código de Defesa do Consumidor.

Destarte, deve ser afastada a cláusula contratual (nona) que autoriza a compensação do débito oriundo do contrato com créditos eventualmente existentes em outras contas ou aplicações de titularidade da parte ré.

Da comissão de permanência

As Súmulas nº 30, nº 294 e nº 296 do Superior Tribunal de Justiça são claras ao reconhecer a legitimidade da aplicação da comissão de permanência, uma vez caracterizada a inadimplência do devedor, contanto que não haja cumulação com índice de atualização monetária ou taxa de juros:

Súmula nº 30. A comissão de permanência e a correção monetária são inacumuláveis.

Súmula nº 294. Não é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão de permanência, calculada pela taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa do contrato.

Súmula nº 296. Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado.

A comissão de permanência, prevista na Resolução nº 1.129/1986 do BACEN, já traz embutida em seu cálculo a correção monetária, os juros remuneratórios e os encargos oriundos da mora. Todavia, a autora embargada pretende a cobrança de uma taxa variável de juros remuneratórios, apresentada sob a rubrica "taxa de rentabilidade", à comissão de permanência.

Tanto a taxa de rentabilidade, como quaisquer outros encargos decorrentes da mora (como, v.g. multa ou juros moratórios), não podem ser cumulados com a comissão de permanência, por configurarem verdadeiro bis in idem. Nesse sentido firmou-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

Direito econômico. Agravo no recurso especial. Ação revisional de contrato bancário. Comissão de permanência. Cumulação com outros encargos moratórios. Impossibilidade. - É admitida a incidência da comissão de permanência após o vencimento da dívida, desde que não cumulada com juros remuneratórios, juros moratórios, correção monetária e/ou multa contratual. Agravo no recurso especial não provido.

STJ, 2ª Seção, AGREsp 706.368, Rel.Min. Nancy Andrighi, j. 27/04/2005, DJ 08/08/2005, p. 179

Agravo regimental. Recurso especial. Ação de cobrança. Contrato de abertura de crédito em conta-corrente. Cumulação da comissão de permanência com juros moratórios e multa contratual. Precedentes da Corte. 1. Confirma-se a jurisprudência da Corte que veda a cobrança da comissão de permanência com os juros moratórios e com a multa contratual, ademais de vedada a sua cumulação com a correção monetária e com os juros remuneratórios, a teor das Súmulas nº 30, nº 294 e nº 296 da Corte. 2. Agravo regimental desprovido.

STJ, 2ª Seção, AGREsp 712801, Rel.Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 27/04/2005, DJ 04/05/2005, p. 154

CONTRATO BANCÁRIO. REVISÃO CONTRATUAL. RELATIVIZAÇÃO DO PACTA SUNT SERVANDA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. COMPROVAÇÃO DO ERRO. DESNECESSIDADE. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. NÃO CUMULATIVIDADE COM OUTROS ENCARGOS MORATÓRIOS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A revisão dos contratos é possível em razão da relativização do princípio pacta sunt servanda, para afastar eventuais ilegalidades, ainda que tenha havido quitação ou novação. [...] 3. A comissão de permanência é admitida durante o período de inadimplemento contratual, não podendo, contudo, ser cumulada com qualquer dos demais encargos moratórios. 4. Agravo regimental improvido.

STJ, 4ª Turma, AGREsp 879268, Rel.Min. Hélio Quaglia Barbosa, j. 06/02/2007, DJ 12/03/2007, p. 254

AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO MONITÓRIA. APRESENTAÇÃO PELA AUTORA DO CÁLCULO DISCRIMINADO DO DÉBITO ADEQUADO AOS PADRÕES LEGAIS. COMISSÃO DE PERMANENCIA ADMITIDA, SEM CUMULAÇÃO, TODAVIA, COM A CORREÇÃO MONETÁRIA E A "TAXA DE RENTABILIDADE". - Exigência da chamada "taxa de rentabilidade", presente na comissão de permanência, cuja exata qualificação jurídica está a depender da análise de estipulação contratual (Súmula n. 5 - STJ). - Admitida pela agravante que a "taxa de rentabilidade" é um dos elementos da comissão de permanência, resta claro ser indevida a cobrança cumulativa das duas parcelas. - Consoante assentou a Segunda Seção, a comissão de permanência abrange, além dos juros remuneratórios e da correção monetária, a multa e os juros de mora (AgRg no REsp n. 706.368-RS e 712.801-RS). - Agravo regimental improvido, com imposição de multa.

STJ, 4ª Turma, AgREsp 491437, Rel.Min. Barros Monteiro, j. 03/05/2005, DJ 13/06/2005, p. 310

No caso dos autos, o exame dos discriminativos de débito de fls. 25/123, revela que a atualização da dívida deu-se pela incidência da comissão de permanência, acrescida de taxa de rentabilidade (composta da taxa "TR + 2,01% AM" ou "TR + 2,52% AM"), sem inclusão de juros de mora ou multa moratória.

Destarte, necessária a exclusão dos cálculos da taxa de rentabilidade que, conforme anteriormente exposto não pode ser cumulada com a comissão de permanência.

No mais, há de ser mantida a r. sentença nos seus termos.

Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo retido e conhecer parcialmente do recurso de apelação e, na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento para que seja afastada a cláusula contratual nona, bem como, para determinar a aplicação da comissão de permanência, excluída a Taxa de Rentabilidade.

HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal


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