|
|
|
|
|
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo da defesa para reconhecer a nulidade da ação penal em razão do indevido compartilhamento de dados sigilosos obtidos pela Receita Federal junto às instituições financeiras sem prévia autorização judicial e anular o feito, desde o recebimento da denúncia, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | JOSE MARCOS LUNARDELLI:10064 |
Nº de Série do Certificado: | 71D062F09822A461 |
Data e Hora: | 09/12/2016 19:16:41 |
|
|
|
|
|
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:
Cuida-se de apelação interposta por HILARIO CHINÇAKU HASHIMOTO e TOYOKA JANDIRA HASHIMOTO contra a r. sentença de fls. 184/190, por meio da qual o i. magistrado de primeiro grau julgou parcialmente procedente a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal em face dos ora apelantes pela prática do crime descrito no art. 1º, I e II, da Lei nº 8.137/90, por duas vezes.
Segundo a denúncia de fls. 31/35, os acusados teriam omitido rendimentos de suas declarações anuais de ajuste (DAAs 2002 e 2003), reduzindo, dessa maneira, o imposto de renda pessoa física devido nos anos-calendário de 2001 e 2002.
Consta da inicial acusatória que a Receita Federal apurou a omissão de rendimentos a partir de depósitos cuja origem não restou demonstrada em constas bancárias mantidas pelos denunciados, em conjunto e individualmente, junto ao Banco do Brasil (AG 3586-6, contas nº 6.112-3 e nº 65.184-2), à Caixa Econômica Federal (AG 2156, contas nº 001.0002132-9 e nº 013.00013016-4), ao Banco Real (AG 0428, conta nº 7.707780-1), ao Banco Bradesco (AG 2188-1, conta nº 6.879-9), ao Banco Sudameris (AG 063, conta nº 10733-4200-5), ao Banco América do Sul (AG 0120-1, conta nº 282.536-8) e ao Baco Santander Banespa (AG 0090, conta nº 01021100-0 e nº 22780-9).
Narra, ainda, a denúncia que, em razão de tais fatos, a fiscalização tributária apurou, no bojo dos procedimentos administrativos-fiscais nº 10865.00762/2006-93 e nº 10865.000763/2006-38, a redução de imposto de renda no valor de R$483.361,20 (HILÁRIO) e R$470.983,10 (TOYOKA), além dos correspondentes consectários.
A denúncia foi recebida em 19/11/2010 (fl. 36).
Processado o feito, sobreveio a r. sentença de fls.184/190, por meio da qual o Juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal, para:
i. condenar o réu HILÁRIO CHIÇAKU HASHIMOTO pela prática do crime do art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90, à pena de 02 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 100 (cem) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. A pena corporal foi substituída por duas restritivas de direitos consistentes em uma pena de prestação de serviços à comunidade e uma pena de prestação pecuniária, no valor de 15 (quinze) salários mínimos, a ser cumprida nos termos da Resolução CNJ nº 154, de 13 de julho de 2012.
ii. condenar a ré TOYOKA JANDIRA HASHIMOTO pela prática do crime do art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90 à pena de 02 (dois) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 90 (noventa) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. A pena corporal foi substituída por duas restritivas de direitos consistentes em uma pena de prestação de serviços à comunidade e uma pena de prestação pecuniária, no valor de 14 (quatorze) salários mínimos, a ser cumprida nos termos da Resolução CNJ nº 154, de 13 de julho de 2012.
iii. absolver os réus da imputação da prática do crime do art. 1º, II, da Lei nº 8.137/90, com fundamento no art. 386, II, do Código de Processo Penal, por não haver prova da existência do fato.
Por fim, fixou como valor mínimo para reparação dos danos o quantum apurado nos processos administrativos fiscais em que figuram como sujeitos passivos cada um dos réus, com fundamento no art. 387, IV, do CPP, e condenou os réus no pagamento das custas processuais.
A sentença foi publicada em 22/04/2014 (fl. 191).
Em suas razões de recurso de fls. 201/219, os apelantes sustentam a ocorrência de prescrição da pretensão punitiva estatal, com base na pena concretamente aplicada, ao fundamento de que entre as datas em que os delitos se consumaram, 27/04/2001 e 29/04/2002, e a data do recebimento da denúncia (19/11/2010) teria transcorrido lustro temporal superior a oito anos.
Por fim, afirmam a ilegalidade da quebra do seu sigilo bancário pela autoridade fazendária, sem autorização judicial prévia, sustentando a inconstitucionalidade do art. 6º da Lei Complementar nº 105/2001.
Contrarrazões oferecidas pelo órgão ministerial oficiante em primeiro grau às fls. 222/237, pela manutenção da sentença condenatória.
A Procuradoria Regional da República, por meio do parecer de fls. 245/248, opinou pelo desprovimento do recurso defensivo.
É o relatório.
Sujeito à revisão, na forma regimental.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | JOSE MARCOS LUNARDELLI:10064 |
Nº de Série do Certificado: | 71D062F09822A461 |
Data e Hora: | 19/10/2016 14:37:02 |
|
|
|
|
|
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI: Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso interposto.
Rejeito, inicialmente, a alegação de prescrição da pretensão punitiva estatal na modalidade retroativa com base na pena concretamente aplicada.
Isto porque, nos termos da Súmula Vinculante nº 24, o crime material do art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90, apenas se consuma com a constituição definitiva do crédito tributário, o que, no caso dos autos, ocorreu em 03/05/2006 (quanto ao réu HILÁRIO - fl. 491 do apenso I) e em 05/05/2006 (quanto à ré TOYOKA - fl. 441 do apenso II).
Assim, o prazo prescricional incidente à espécie (oito anos) não se esgotou entre a data dos fatos e a data do recebimento da denúncia, em 19/11/2010 (fl. 36), nem entre esta data e a da publicação da sentença condenatória, em 22/04/2014.
No mais, cumpre apreciar a alegação da defesa no sentido da ilegalidade da quebra de sigilo bancário diretamente pela Receita Federal, com base no art. 6º da Lei Complementar nº 105/2001.
A defesa aduz, em síntese, a ilicitude da prova obtida mediante quebra de sigilo bancário do acusado sem autorização judicial prévia.
A alegação comporta acolhida, ainda que por fundamento diverso.
A despeito da existência de diversas ADIs questionando a validade do disposto no art. 6º, da Lei Complementar 105/2001 , bem como do julgamento do RE 601.314, cuja repercussão geral foi reconhecida em 23/10/2009, é certo que o Supremo Tribunal Federal não se manifestou definitivamente sobre o tema.
Com efeito, o acórdão proferido pelo E. STF - Supremo Tribunal Federal no julgamento levado a efeito no dia 24.02.2016, que tinha por objeto o RE 601314 e as ADIs 2859, 2390, 2386 e 2397 apenas tangenciou a questão ao longo dos debates, tendo, por fim, julgado improcedentes os pedidos de reconhecimento de inconstitucionalidade do artigo 6°, da Lei Complementar 105/2001, fixando quanto ao tema 225 da repercussão geral, as seguintes teses:
Não é possível afirmar, portanto, que o STF analisou a questão da dispensa de exigência de prévia autorização judicial para o compartilhamento com o Ministério Público pela Receita dos dados obtidos por esta última mediante a quebra de sigilo para fins penais com base na Lei Complementar nº 105/2001.
Por outro lado, o pronunciamento feito pelo Plenário da Suprema Corte no RE 389.808 se deu em caráter incidental, carecendo, portanto, de efeito vinculante.
Não obstante, o C. Superior Tribunal de Justiça, a quem compete, nos termos do art. 105, III, "a", da Constituição Federal, apreciar, em grau de recurso, decisões que contrariem lei federal, adotou posição no sentido de que, para utilização em processo criminal, os dados bancários devem ser obtidos com autorização judicial.
Assim, as Turmas que compõem a Terceira Seção do STJ reputam ilegal o compartilhamento, pela Receita Federal, de dados sigilosos obtidos sem autorização judicial, e reconhecem a nulidade de tal prova no âmbito penal e, por conseguinte, da ação penal fundada em tais dados. Confira-se:
Tal entendimento foi, igualmente, fixado no âmbito da Quarta Seção deste Regional.
Diante de tais razões, ressalvado o meu entendimento pessoal sobre a questão, sigo o posicionamento adotado pelo C. Superior Tribunal de Justiça para reconhecer a ilegalidade da utilização, para fins penais, da prova obtida mediante quebra de sigilo bancário pela autoridade fazendária, sem autorização judicial.
Reconhecida a nulidade de tal prova, tem-se que, no caso dos autos, não subsistem elementos sequer indiciários da materialidade delitiva aptos a embasar o recebimento da denúncia e o regular desenvolvimento da instrução processual penal.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao apelo da defesa para reconhecer a nulidade da ação penal em razão do indevido compartilhamento de dados sigilosos obtidos pela Receita Federal junto às instituições financeiras sem prévia autorização judicial e anular o feito, desde o recebimento da denúncia.
É como voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | JOSE MARCOS LUNARDELLI:10064 |
Nº de Série do Certificado: | 71D062F09822A461 |
Data e Hora: | 09/12/2016 19:16:44 |