Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 19/03/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002615-76.2007.4.03.6117/SP
2007.61.17.002615-9/SP
RELATORA : Desembargadora Federal DIVA MALERBI
APELANTE : Estado de Sao Paulo
ADVOGADO : SP094553 CLERIO RODRIGUES DA COSTA e outro(a)
APELANTE : Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovaveis IBAMA
ADVOGADO : SP179488B ISABELLA MARIANA SAMPAIO PINHEIRO DE CASTRO e outro(a)
APELANTE : ASSOCIACAO DOS PLANTADORES DE CANA DA REGIAO DE JAU SP ASSOCICANA
ADVOGADO : SP020309 HAMILTON DIAS DE SOUZA e outro(a)
APELANTE : SINDICATO DA INDUSTRIA DA FABRICACAO DO ALCOOL NO ESTADO DE SAO PAULO SIFAESP e outros(as)
: SINDICATO DA INDUSTRIA DO ACUCAR NO ESTADO DE SAO PAULO SIAESP
ADVOGADO : SP021910 ANGELA MARIA DA MOTTA PACHECO e outro(a)
APELANTE : UNICA UNIAO DA AGROINDUSTRIA CANAVIEIRA DO ESTADO DE SAO PAULO
ADVOGADO : SP021910 ANGELA MARIA DA MOTTA PACHECO e outro(a)
: SP194984 CRISTIANO SCORVO CONCEIÇÃO
APELADO(A) : Ministerio Publico Federal
: Ministerio Publico do Estado de Sao Paulo
PROCURADOR : MARCOS SALATI e outro(a)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL. APELAÇÕES. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. INEXISTÊNCIA DE LITISPENDÊNCIA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO IBAMA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. CONTROLE INCIDENTAL DE CONSTITUCIONALIDADE SOBRE LEGISLAÇÃO ESTADUAL. POSSIBILIDADE. MÉRITO. PRÁTICA DE QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR. AUTORIZAÇÃO POR ÓRGÃO AMBIENTAL COMPETENTE. GRADUAL ELIMINAÇÃO. LEGALIDADE. PRECEDENTES DO STF, STJ E TJ/SP. APELAÇÕES PROVIDAS.
1. Inexistentes ações com as mesmas partes litigantes, o mesmo pedido e a mesma causa de pedir, não há falar-se em litispendência.
2. O coautor e ora recorrido Ministério Público Federal, órgão da União, é legitimado ativo para a propositura de ação civil pública (arts. 6º, VII, "b" e 39, II e III da LC 75/93 e art. 5º, I, da Lei 7.347/85), o que se mostra determinante para a fixação da competência da Justiça Federal neste caso, aliada à presença do IBAMA no polo passivo, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal. Jurisprudência do C. STF.
3. O IBAMA detém atribuição supletiva em matéria de licenciamento ambiental, nos termos da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), razão pela qual, se lhe é imputada omissão ou desídia em relação às licenças concedidas pelos Estados-membros, exsurge a respectiva legitimidade passiva ad causam para figurar nas ações em que essas condutas são discutidas.
4. A ação civil pública constitui instrumento processual adequado para que veiculadas as pretensões ora deduzidas, pois, a apontada inconstitucionalidade das leis estaduais, na parte em que dispõem sobre a queima da palha de cana-de-açúcar, não consubstanciou objeto principal do feito - o que, decerto, não seria possível, sob pena de usurpação da competência exclusiva do C. STF - mas, isso sim, pleito incidental, sob forma de controle difuso de constitucionalidade "incidenter tantum", perfeitamente cabível no âmbito das ações desta espécie. Entendimento pacificado no C. STF.
5. O C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 586.224/SP (Plenário), repercussão geral reconhecida, adotou o entendimento de que lei estadual prevendo a gradual eliminação da prática da queima da palha de cana -de-açúcar, de forma progressiva e planejada, reflete uma desejável forma de compatibilização entre interesses da sociedade.
6. Pelo RE 586.224/SP, houve declaração de inconstitucionalidade de lei municipal que vedava, por completo, a prática da queima de cana -de-açúcar, dada a sua incompatibilidade com lei estadual - no caso, a Lei Paulista nº 11.241/2002 - que impõe a respectiva eliminação, mas de forma gradativa, até o ano de 2031. Esse julgado avançou no tema, reconhecendo que a eliminação gradual da prática de queima , contraposta à respectiva eliminação abrupta, surge como o meio mais adequado de compatibilização de interesses relativos à dignidade humana, saúde e proteção ao trabalho, entre o mais.
7. Também o E. Superior Tribunal de Justiça, ao se debruçar sobre o tema da queima da cana -de-açúcar, já se posicionou no sentido de que tal prática, embora inflija certos danos ambientais, não é ilegal, se realizada com amparo em autorizações expedidas pelos órgãos ambientais competentes, como no caso ora sob exame, a CETESB (AgRg no AREsp 48.149/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe: 17/04/2012).
8. Merece registro, ainda, a jurisprudência pacífica do E. Tribunal de Justiça de São Paulo, no sentido de que o art. 27 da Lei 4.771/65 (antigo Código Florestal) permitia o emprego do fogo em práticas agropastoris, se precedida de permissão do Poder Público, disposição essa que, em essência, foi repetida pela novel Codificação Florestal (Lei nº 12.651/12), no seu art. 38, inciso I, a qual estabeleceu que, em locais ou regiões cujas peculiaridades justifiquem o emprego do fogo em práticas agropastoris ou florestais, este será possível mediante prévia aprovação do órgão estadual ambiental competente do Sisnama, para cada imóvel rural ou de forma regionalizada, que estabelecerá os critérios de monitoramento e controle (TJSP; Apelação 4010911-86.2013.8.26.0506; Rel. Des. Eutálio Porto; 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; j. em 10/03/2016; Apelação 0007768-15.2010.8.26.0070; Rel. Des. Torres de Carvalho; 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; j. em 24/04/2014).
9. No caso ora sob exame, agiu a CETESB em conformidade com o direito, pois, na condição de órgão estadual competente, expediu, com base em lei, licenças e autorizações para a queima da palha de cana -açúcar, prática essa que, nos termos da jurisprudência supramencionada, não é ilegal, estando em viés de progressiva extinção.
10. Dá-se provimento às apelações da Associação dos Plantadores de Cana da Região de Jaú/SP - Associcana, do IBAMA e do ESTADO DE SÃO PAULO, para que julgados improcedentes os pedidos iniciais. Sem custas, despesas processuais ou verba honorária (art. 18 da Lei 7.437/65).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento às apelações da Associação dos Plantadores de Cana da Região de Jaú/SP - Associcana, do IBAMA e do ESTADO DE SÃO PAULO , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 08 de março de 2018.
DIVA MALERBI
Desembargadora Federal


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002615-76.2007.4.03.6117/SP
2007.61.17.002615-9/SP
RELATORA : Desembargadora Federal DIVA MALERBI
APELANTE : Estado de Sao Paulo
ADVOGADO : SP094553 CLERIO RODRIGUES DA COSTA e outro(a)
APELANTE : Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovaveis IBAMA
ADVOGADO : SP179488B ISABELLA MARIANA SAMPAIO PINHEIRO DE CASTRO e outro(a)
APELANTE : ASSOCIACAO DOS PLANTADORES DE CANA DA REGIAO DE JAU SP ASSOCICANA
ADVOGADO : SP020309 HAMILTON DIAS DE SOUZA e outro(a)
APELANTE : SINDICATO DA INDUSTRIA DA FABRICACAO DO ALCOOL NO ESTADO DE SAO PAULO SIFAESP e outros(as)
: SINDICATO DA INDUSTRIA DO ACUCAR NO ESTADO DE SAO PAULO SIAESP
ADVOGADO : SP021910 ANGELA MARIA DA MOTTA PACHECO e outro(a)
APELANTE : UNICA UNIAO DA AGROINDUSTRIA CANAVIEIRA DO ESTADO DE SAO PAULO
ADVOGADO : SP021910 ANGELA MARIA DA MOTTA PACHECO e outro(a)
: SP194984 CRISTIANO SCORVO CONCEIÇÃO
APELADO(A) : Ministerio Publico Federal
: Ministerio Publico do Estado de Sao Paulo
PROCURADOR : MARCOS SALATI e outro(a)

RELATÓRIO

A SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL DIVA MALERBI (RELATORA): - Trata-se de apelações interpostas pelo INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA, ESTADO DE SÃO PAULO, ASSOCIAÇÃO DOS PLANTADORES DE CANA DA REGIÃO DE JAÚ/SP - ASSOCICANA, SINDICATO DA INDÚSTRIA DA FABRICAÇÃO DO ÁLCOOL NO ESTADO DE SÃO PAULO, SINDICATO DA INDÚSTRIA DO AÇÚCAR NO ESTADO DE SÃO PAULO - SIAESP, ÚNICA - UNIÃO DA AGROINDÚSTRIA CANAVIEIRA DO ESTADO DE SÃO PAULO em face da r. sentença de proferida nesta ação civil pública ambiental ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, com pedido de tutela antecipada.

Na petição inicial, alegou-se, em síntese, o seguinte: a) a denominada queima controlada da palha de cana-de-açúcar possui aptidão para lançar na atmosfera grandes quantidades de poluentes danosos à saúde, fato esse agravado quando a correspondente realização coincide com os meses de menores índices de umidade na região englobada pela Subseção Judiciária de Jaú; b) a legislação estadual Paulista, que autoriza tais queimadas, está eivada pelo vício da inconstitucionalidade, pois é complacente com a degradação ambiental; c) ser ilegal a não exigência de estudo ambiental e relatório de impacto ambiental - EIA/RIMA - para o desenvolvimento dessa atividade; d) seja reconhecido que ao IBAMA pertence a atribuição exclusiva para a realização do licenciamento ambiental nesses casos, ou, caso assim não se entenda, que se determine à Autarquia, de forma alternativa, a assunção imediata dessa atividade, no exercício de atribuição supletiva, em razão da inexcusável omissão do Estado de São Paulo em licenciar adequadamente essas queimas; e) logo, ser imperioso que se anulem todas as licenças ambientais concedidas pelo Estado Bandeirante, que tenham por objeto a autorização para a queima controlada da palha da cana-de-açúcar na área compreendida pela 17ª Subseção Judiciária, bem como seja esse réu compelido a abster-se de outorgar novas licenças e autorizações da espécie e, ainda, ser de rigor que os aludidos atos administrativos passem à atribuição do IBAMA, respeitados os trâmites legais; f) em caso de descumprimento da medida judicial em qualquer das suas circunstâncias, ser necessária a imposição de multa diária não inferior a R$ 10.000,00.

A tutela antecipada foi deferida (fls. 95/133), o que desafiado por recurso de agravo de instrumento pelo Estado de São Paulo (fls. 521/544), cujo efeito suspensivo foi negado por este Colendo Tribunal; também o IBAMA apresentou agravo de instrumento. Mediante pedido de suspensão da execução da tutela antecipada, promovido pelo Estado Bandeirante, a Egrégia Presidência desta Corte houve por bem suspender tal decisum, nos termos da decisão copiada às fls. 566/575 e 711/712.

Por meio da decisão proferida às fls. 736/737, a ASSOCICANA, a SIAESP e a ÚNICA foram admitidas como assistentes litisconsorciais do Estado de São Paulo.

Contestações do Estado de São Paulo às fls. 1.169/1.220, do IBAMA às fls. 1.222/1.248, do SIAESP e da ÚNICA (petição conjunta) às fls. 1.342/1.390 e da ASSOCICANA às fls. 796/829.

Réplica às fls. 1.394/1.408.

Sobreveio a r. sentença (fls. 1.578/1.615) pela qual, consoante adiantado, julgados procedentes os pedidos, nos termos do dispositivo redigido na seguinte conformidade:

"[...]
Ante o exposto, julgo procedente o pedido, com resolução de mérito, nos termos do art. 269, I, do Código Civil, para:
a) declarar nulas todas as licenças expedidas pelo Estado de São Paulo, bem como vedar a expedição de novas, tendo como objeto a queima controlada de palha de cana-de-açúcar na área compreendida por esta Subseção Judiciária Federal;
b) declarar que compete ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA - promover o licenciamento ambiental da atividade de queima de palha de cana-de-açúcar na área desta Subseção Judiciária Federal, bem assim condená-lo a exigir, no âmbito do licenciamento, para expedição da licença, prévio estudo de impacto ambiental e respectivo relatório;c) fixar multa de R$ 100.000,00 (cem mil reais) para o órgão responsável por cada licença expedida sem a observância dos mandamentos desta sentença, a ser revertido ao Fundo de Defesa dos Interesses Difusos, sem prejuízo da aplicação de sanções civis, administrativas e penais decorrentes da desobediência.
Incabível condenação em honorários advocatícios, nos termos do art. 18 da Lei nº 7.347/85, sistematicamente interpretado, pois não há má-fé por parte das requeridas e assistentes. Se o Ministério Público, em sede de ação civil pública, não paga honorários, com exceção dos casos de má-fé, também não deve recebê-los, senão de quem age de má-fé. Nesse sentido: STJ, RESP 785.489/DF, rel. Min. Castro Meira).Confirmo a antecipação dos efeitos da tutela (fls. 95/133).Como expressamente assinalou e eminente Desembargadora Federal Presidente do e. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, na decisão que suspendeu a antecipação dos efeitos da tutela, ela "produzirá seus efeitos até que sentença seja proferida nos autos originários" (fls. 566/575). Desse modo, com o advento desta sentença, cessam os efeitos daquela r. decisão superior.
[...]".

Os Embargos de declaração opostos pelo SIFAESP, SIAESP e ÚNICA foram rejeitados (fls. 1.742/1.744).

Apelou a Associação dos Plantadores de Cana da Região de Jaú/SP - Associcana (fls. 1.754/1.795), argumentando, em suma, na seguinte conformidade: i) nulidade da r. sentença por cerceamento de defesa, em razão da não produção de prova pericial; ii) litispendência em face da Ação nº 441/00, em trâmite na 02ª Vara da Comarca de Jaú; iii) no tocante ao mérito, ser descabido que se postule do IBAMA qualquer intervenção na questão da queima da palha de cana-de-açúcar, eis que inexistente hipótese de omissão do Estado de São Paulo; iv) a queima da palha da cana-de-açúcar é expressamente autorizada pelo Decreto 2.661/98, inexistindo qualquer legislação federal que proíba tal prática; v) a lei estadual que disciplina o emprego de fogo no Estado de São Paulo é hígida e não contraria quaisquer outras normas concernentes ao tema ou ao meio ambiente em geral; vi) ser inaplicável, ao caso, as disposições contidas na Resolução CONAMA 237/97, bem como ser prescindível a elaboração de EIA/RIMA em relação à prática da queima da palha de cana-de-açúcar; vii) por sinal, referida atividade, além de não acarretar danos ao meio ambiente ou à população envolvida, favorece os trabalhadores da lavoura, sendo que a respectiva cessação implicaria prejuízos de relevante impacto econômico-social. Dessa forma, invocando também precedentes que, segundo entende, reforçam a sua tese, requereu essa apelante o provimento do recurso, para que julgados improcedentes os pedidos iniciais.

Nas razões de apelação do Estado de São Paulo (fls. 1.806/1.862), afirmou-se, em síntese, o seguinte: a) preliminarmente, ser necessário o reconhecimento da ilegitimidade passiva do IBAMA e, da mesma forma, a incompetência da Justiça Federal; b) existência de litispendência face a Ação nº 441/00, da 2ª Vara da Comarca de Jaú; c) ainda em sede de preliminar, requereu a extinção do processo sem resolução do mérito, dada a impossibilidade jurídica dos pedidos principais de reconhecimento da inconstitucionalidade da legislação estadual que disciplina a queima da cana-de-açúcar; d) no que tange ao mérito, afirma que há previsão de eliminação da queima da cana-de-açúcar, que não pode ocorrer de imediato, a fim de que sejam preservados os interesses de todos os envolvidos; e) serem razoáveis os prazos previstos em lei para a eliminação dessa queima, que, ademais, é fundamental para que atendidos também os interesses dos trabalhadores envolvidos no processo de corte; f) se considerado o processo produtivo como um todo, possível concluir que, ao contrário do afirmado pelo Ministério Público, ele colabora com a manutenção do meio ambiente; g) não há meios disponíveis para que a cultura da cana-de-açúcar seja feita imediatamente de forma mecanizada; h) são constitucionais e legais as normas estaduais que tratam da queima da palha de cana-de-açúcar, assim como de sua eliminação, sendo prescindível a prévia elaboração de EIA/RIMA para o desenvolvimento dessa atividade. Destarte, requereu a inversão do julgado.

Apelou o IBAMA (fls. 1.880/1.923), sustentado, em resumo, que a atividade consistente em queima controlada da palha de cana-de-açúcar prescinde de licenciamento ambiental e, mesmo que assim não fosse, tal ato administrativo não seria de atribuição da Autarquia Federal, dada a ausência de previsão legal ou constitucional a respeito. Apontou, ainda, a desnecessidade de elaboração de EIA/RIMA no caso, bem como ser descabida a pretensão do Parquet em adentrar na discricionariedade administrativa dos órgãos públicos responsáveis. Derradeiramente, insurgiu-se contra o valor da multa fixada pela decisão recorrida em R$ 100.000,00 (cem mil reais), por considerá-la exagerada.

O SIFAESP, o SIAESP e a ÚNICA, conquanto tivessem interposto recurso de apelação (fls. 1.930/1.986) e manifestação (fls. 2.393/2.542), dele desistiram quando os autos já se encontravam neste Colendo Tribunal, o que homologado por meio da decisão interlocutória proferida às fls. 2.647/2.658.

Contrarrazões às fls. 2.211/2.235, sobrevindo o encaminhamento dos autos a esta Egrégia Corte Regional.

O Ministério Público Federal com atribuição nesta instância manifestou-se pelo desprovimento dos apelos (fls. 2.361/2.376, 2.550/2.554 e 2.679/2.680).

Às fls. 2.607/2.612, se anexou cópia de decisão proferida pela Egrégia Corte Especial deste Tribunal no Incidente de Suspensão de Execução de Sentença 0006427-13.2008.4.03.0000/SP, pelo qual, em suma, restou determinado que os efeitos da r. sentença ficariam suspensos unicamente em relação à colheita da safra de 2008.

É o relatório.

À Douta Revisão.

DIVA MALERBI
Desembargadora Federal


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002615-76.2007.4.03.6117/SP
2007.61.17.002615-9/SP
RELATORA : Desembargadora Federal DIVA MALERBI
APELANTE : Estado de Sao Paulo
ADVOGADO : SP094553 CLERIO RODRIGUES DA COSTA e outro(a)
APELANTE : Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovaveis IBAMA
ADVOGADO : SP179488B ISABELLA MARIANA SAMPAIO PINHEIRO DE CASTRO e outro(a)
APELANTE : ASSOCIACAO DOS PLANTADORES DE CANA DA REGIAO DE JAU SP ASSOCICANA
ADVOGADO : SP020309 HAMILTON DIAS DE SOUZA e outro(a)
APELANTE : SINDICATO DA INDUSTRIA DA FABRICACAO DO ALCOOL NO ESTADO DE SAO PAULO SIFAESP e outros(as)
: SINDICATO DA INDUSTRIA DO ACUCAR NO ESTADO DE SAO PAULO SIAESP
ADVOGADO : SP021910 ANGELA MARIA DA MOTTA PACHECO e outro(a)
APELANTE : UNICA UNIAO DA AGROINDUSTRIA CANAVIEIRA DO ESTADO DE SAO PAULO
ADVOGADO : SP021910 ANGELA MARIA DA MOTTA PACHECO e outro(a)
: SP194984 CRISTIANO SCORVO CONCEIÇÃO
APELADO(A) : Ministerio Publico Federal
: Ministerio Publico do Estado de Sao Paulo
PROCURADOR : MARCOS SALATI e outro(a)

VOTO

EMENTA:
ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL. APELAÇÕES. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. INEXISTÊNCIA DE LITISPENDÊNCIA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO IBAMA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. CONTROLE INCIDENTAL DE CONSTITUCIONALIDADE SOBRE LEGISLAÇÃO ESTADUAL. POSSIBILIDADE. MÉRITO. PRÁTICA DE QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR. AUTORIZAÇÃO POR ÓRGÃO AMBIENTAL COMPETENTE. GRADUAL ELIMINAÇÃO. LEGALIDADE. PRECEDENTES DO STF, STJ E TJ/SP. APELAÇÕES PROVIDAS.
1. Inexistentes ações com as mesmas partes litigantes, o mesmo pedido e a mesma causa de pedir, não há falar-se em litispendência.
2. O coautor e ora recorrido Ministério Público Federal, órgão da União, é legitimado ativo para a propositura de ação civil pública (arts. 6º, VII, "b" e 39, II e III da LC 75/93 e art. 5º, I, da Lei 7.347/85), o que se mostra determinante para a fixação da competência da Justiça Federal neste caso, aliada à presença do IBAMA no polo passivo, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal. Jurisprudência do C. STF.
3. O IBAMA detém atribuição supletiva em matéria de licenciamento ambiental, nos termos da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), razão pela qual, se lhe é imputada omissão ou desídia em relação às licenças concedidas pelos Estados-membros, exsurge a respectiva legitimidade passiva ad causam para figurar nas ações em que essas condutas são discutidas.
4. A ação civil pública constitui instrumento processual adequado para que veiculadas as pretensões ora deduzidas, pois, a apontada inconstitucionalidade das leis estaduais, na parte em que dispõem sobre a queima da palha de cana-de-açúcar, não consubstanciou objeto principal do feito - o que, decerto, não seria possível, sob pena de usurpação da competência exclusiva do C. STF - mas, isso sim, pleito incidental, sob forma de controle difuso de constitucionalidade "incidenter tantum", perfeitamente cabível no âmbito das ações desta espécie. Entendimento pacificado no C. STF.
5. O C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 586.224/SP (Plenário), repercussão geral reconhecida, adotou o entendimento de que lei estadual prevendo a gradual eliminação da prática da queima da palha de cana -de-açúcar, de forma progressiva e planejada, reflete uma desejável forma de compatibilização entre interesses da sociedade.
6. Pelo RE 586.224/SP, houve declaração de inconstitucionalidade de lei municipal que vedava, por completo, a prática da queima de cana -de-açúcar, dada a sua incompatibilidade com lei estadual - no caso, a Lei Paulista nº 11.241/2002 - que impõe a respectiva eliminação, mas de forma gradativa, até o ano de 2031. Esse julgado avançou no tema, reconhecendo que a eliminação gradual da prática de queima , contraposta à respectiva eliminação abrupta, surge como o meio mais adequado de compatibilização de interesses relativos à dignidade humana, saúde e proteção ao trabalho, entre o mais.
7. Também o E. Superior Tribunal de Justiça, ao se debruçar sobre o tema da queima da cana -de-açúcar, já se posicionou no sentido de que tal prática, embora inflija certos danos ambientais, não é ilegal, se realizada com amparo em autorizações expedidas pelos órgãos ambientais competentes, como no caso ora sob exame, a CETESB (AgRg no AREsp 48.149/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe: 17/04/2012).
8. Merece registro, ainda, a jurisprudência pacífica do E. Tribunal de Justiça de São Paulo, no sentido de que o art. 27 da Lei 4.771/65 (antigo Código Florestal) permitia o emprego do fogo em práticas agropastoris, se precedida de permissão do Poder Público, disposição essa que, em essência, foi repetida pela novel Codificação Florestal (Lei nº 12.651/12), no seu art. 38, inciso I, a qual estabeleceu que, em locais ou regiões cujas peculiaridades justifiquem o emprego do fogo em práticas agropastoris ou florestais, este será possível mediante prévia aprovação do órgão estadual ambiental competente do Sisnama, para cada imóvel rural ou de forma regionalizada, que estabelecerá os critérios de monitoramento e controle (TJSP; Apelação 4010911-86.2013.8.26.0506; Rel. Des. Eutálio Porto; 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; j. em 10/03/2016; Apelação 0007768-15.2010.8.26.0070; Rel. Des. Torres de Carvalho; 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; j. em 24/04/2014).
9. No caso ora sob exame, agiu a CETESB em conformidade com o direito, pois, na condição de órgão estadual competente, expediu, com base em lei, licenças e autorizações para a queima da palha de cana -açúcar, prática essa que, nos termos da jurisprudência supramencionada, não é ilegal, estando em viés de progressiva extinção.
10. Dá-se provimento às apelações da Associação dos Plantadores de Cana da Região de Jaú/SP - Associcana, do IBAMA e do ESTADO DE SÃO PAULO, para que julgados improcedentes os pedidos iniciais. Sem custas, despesas processuais ou verba honorária (art. 18 da Lei 7.437/65).

A SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL DIVA MALERBI (RELATORA): - Primeiramente, incumbe analisar as preliminares e prejudiciais de mérito suscitadas nas apelações, que se adianta, não merecem acolhida.

A propósito, ocorre a litispendência quando forem propostas ações com as mesmas partes litigantes, o mesmo pedido e a mesma causa de pedir (conceito clássico da tria eadem), definição essa que persistiu inalterada mesmo após a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015 (art. 337, VI, § 1º e § 2º). A ratio essendi da litispendência objetiva a que a parte não promova duas demandas visando o mesmo resultado, o que, frise-se, em regra, ocorre quando o autor formula em face do mesmo sujeito, idêntico pedido, fundado da mesma causa de pedir (nesse sentido: STJ, Mandado de Segurança 19.348/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 1ª Seção, DJe: 03/03/2016).

No que diz respeito ao Processo nº 441/00, outrora em trâmite na 02ª Vara de Jaú, verifica-se não constar o IBAMA como parte ré, diferentemente do que ocorre na presente ação civil pública. A inexatidão entre as partes litigantes nas duas ações, de per si, já seria suficiente para sumariamente afastar qualquer consideração acerca de litispendência.

Isso não bastasse, é presente que o Processo nº 441/00, conquanto também objetive o cancelamento das autorizações concedidas para a prática da queima da cana-de-açúcar ou o respectivo condicionamento à prévia elaboração de EIA/RIMA, não contém pedido de declaração de que ao IBAMA pertence a atribuição primária para o eventual licenciamento nessas hipóteses, cenário que, mais uma vez, distingue aquela causa da ação ora sob análise.

A bem ver, a semelhança entre as causas de pedir e pedidos ventilados nas ações supracitadas conduziria, em tese, ao reconhecimento não de litispendência, mas sim, de conexão (CPC/73, art. 103; CPC/2015, art. 55, caput), cuja consequência essencial importaria na reunião dos processos para julgamento em conjunto, evitando-se o risco de desfechos conflitantes. Tal providência, contudo, não se mostra mais viável, ante o atual descompasso entre as fases das referidas ações (Art. 55, parágrafo único do CPC/2015 e Súmula 235/STJ).

Outrossim, no que tange ao Processo 855/04, que na oportunidade do julgamento estava em curso na 05ª Vara da Comarca de Jaú, observa-se que o correspondente pedido, em suma, é o de instalação de estação para o monitoramento das queimadas e de indenização pelo Estado de São Paulo, ou seja, pleito totalmente estranho ao escopo perseguido nesta ação.

Logo, inexistente o enquadramento legal, não há falar-se em litispendência entre as mencionadas ações, argumento esse que, destarte, fica definitivamente rechaçado.

Prosseguindo, não merece acolhida a alegação acerca de incompetência da Justiça Federal para o julgamento da causa.

Isso porque o coautor e ora recorrido Ministério Público Federal, órgão da União, é legitimado ativo para a propositura de ação civil pública (arts. 6º, VII, "b" e 39, II e III da Lei Complementar nº 75/93 e art. 5º, I, da Lei 7.347/85), o que se mostra determinante para a fixação da competência da Justiça Federal in casu, independentemente da natureza da relação litigiosa travada. Nesse diapasão, vide aresto do C. Superior Tribunal de Justiça:

"RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. DISSÍDIO NOTÓRIO.
1. Os arts. 8º, inc. III e art. 26, § 3º da Lei n. 6.385/1976, arts. 10, IX e 11, VII, da Lei n. 4.595/1964; e art. 81, parágrafo único, inc. I, da Lei 8.078/1990, tidos por violados, não possuem aptidão suficiente para infirmar o fundamento central do acórdão recorrido - a competência para apreciação da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal - , o que atrai a incidência analógica da Súmula 284 do STF, do seguinte teor: É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia.
2. A ação civil pública, como as demais, submete-se, quanto à competência, à regra estabelecida no art. 109, I, da Constituição, segundo a qual cabe aos juízes federais processar e julgar "as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho". Assim, figurando como autor da ação o Ministério Público Federal, que é órgão da União, a competência para a causa é da Justiça Federal.
3. Recurso especial parcialmente conhecido e nesta parte provido para determinar o prosseguimento do julgamento da presente ação civil pública na Justiça Federal".
(REsp 1283737/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 22/10/2013, DJe 25/03/2014)

Ademais, a presença do IBAMA - Autarquia Federal (art. 2º da Lei 7.735/89) - no polo passivo constituiu outro fator a, mais uma vez nos termos do art. 109, I, da Constituição da República, assentar a competência da Justiça Federal para a resolução deste feito.

Nessa esteira, também não prospera o argumento segundo o qual o IBAMA não seria parte legítima para figurar no polo passivo desta demanda.

Com efeito, busca o Parquet, em essência, um provimento judicial que imponha ao IBAMA o dever de atuar supletivamente na fiscalização e combate à queima da palha de cana-de-açúcar em São Paulo, mormente em relação à ausência de EIA/RIMA para a concessão das licenças ambientais, tendo em vista uma indigitada omissão da Autarquia quanto ao cumprimento de suas obrigações nessa seara.

Ora, o IBAMA, como órgão executor da Política Nacional do Meio Ambiente, possui como atribuições, segundo os ditames da Lei 6.938/81 e Resolução CONAMA 237/97, entre outras, os deveres de promover a preservação, conservação e uso racional, fiscalização, controle e fomento dos recursos ambientais. Aliás, o art. 4º da Resolução CONAMA 237/97 dispõe, in verbis:

[...]
Art. 4º - Compete ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, órgão executor do SISNAMA, o licenciamento ambiental, a que se refere o artigo 10 da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, de empreendimentos e atividades com significativo impacto ambiental de âmbito nacional ou regional, a saber:
I - localizadas ou desenvolvidas conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; no mar territorial; na plataforma continental; na zona econômica exclusiva; em terras indígenas ou em unidades de conservação do domínio da União.
II - localizadas ou desenvolvidas em dois ou mais Estados;
III - cujos impactos ambientais diretos ultrapassem os limites territoriais do País ou de um ou mais Estados;

E não há dúvidas de que, potencialmente, a atividade consistente em queima de palha de cana-de-açúcar pode acarretar significativos impactos ambientais que ultrapassam os limites da localidade em que praticado. A efetiva ocorrência, ou não, desses danos, constituiu matéria que ultrapassa os limites possíveis para a aferição das condições da ação, inserindo-se no mérito da lide.

Outrossim, um dos pontos destacados pelo Parquet nesta ação consiste exatamente na inadequação da legislação estadual Paulista ao não prever a exigência de EIA/RIMA no procedimento de expedição de licença para a queima da palha de cana-de-açúcar, fato esse que, nos temos na norma supraexposta, reclama uma atuação supletiva do IBAMA.

Logo, considerado todo esse quadro fático a atrair, nos termos da legislação incidente, um efetivo desempenho do IBAMA, ainda que de forma indireta, esta Egrégia Corte Regional, com supedâneo em jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, vem decidindo que essa Autarquia Federal possui legitimidade passiva nas causas de responsabilização civil por danos ambientais, mormente quando lhe é imputada omissão no seu dever administrativo-fiscalizatório. Confira-se:

"AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APELAÇÕES. REMESSA OFICIAL INTERPOSTA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. DANO AMBIENTAL EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. ENTORNO DE RESERVATÓRIO ARTIFICIAL. IMPRESCINDIBILIDADE DE PERÍCIA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE POLUIDORES DIRETOS E INDIRETOS. LITISCONSÓRCIO PASSIVO FACULTATIVO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO IBAMA.
1. Conhecimento ex officio da remessa oficial, vez que o artigo 19 da Lei nº 4.717/65 aplica-se analogicamente às ações civis públicas, vez que tanto estas quanto as ações populares visam tutelar o patrimônio público lato sensu, estando ambas regidas pelo microssistema processual da tutela coletiva.
2. Danos ambientais supostamente causados pela construção e manutenção de rancho em área de preservação permanente situada às margens do reservatório UHE de Água Vermelha/SP, formado em razão de represamento das águas do Rio Grande, rio federal e bem da União, razão pela qual esse ente federativo possui interesse direto na causa, atraindo a competência da Justiça Federal para processar e julgá-la, mormente pelo fato do IBAMA, autarquia federal, estar inserido no pólo passivo. Preliminar arguida pelo Município de Cardoso/SP em suas contrarrazões rejeitada.
3. Não é o caso de extinguir o feito, sem resolução do mérito, por superveniência perda de objeto, vez que tal pedido formulado pela AES Tietê S.A. carece de fundamento, já que seria necessária perícia técnica para constatar que a cota máxima de operação e a cota máxima maximorum de fato são iguais, sendo insuficiente o documento elaborado pela CETESB, em razão deste não ser o órgão responsável pelo licenciamento do reservatório da UHE Água Vermelha.
4. A responsabilidade objetiva e solidária por danos ambientais enseja o litisconsórcio passivo facultativo entre os vários poluidores, diretos ou indiretos, cabendo ao autor demandar contra qualquer um deles, isoladamente ou em conjunto, sendo perfeitamente cabível requerer a condenação do IBAMA à "obrigação de fazer consistente na fiscalização e acompanhamento técnico ambiental até a completa recuperação da área de preservação permanente", pois, muito embora se inclua entre suas atribuições institucionais, tal providência visa evitar a deficiência e omissão no seu exercício de poder de polícia, conferindo plena utilidade e eficácia à prestação jurisdicional.
5. Ocorrência de cerceamento de direito de ação e defesa, vez que a causa demanda a realização de exame pericial para ser dirimida, seja por versar sobre matéria fática controvertida, seja pelo fato de tanto a parte autora quanto a ré terem postulado tal prova, em especial para constatar a existência e extensão da degradação ambiental, a possibilidade de restauração integral da área degradada, se as edificações e demais formas que impedem a regeneração da vegetação nativa estão situadas em área de preservação permanente e se o espaço territorial em tela foi objeto de eventual inundação.
6. Pedido formulado pela AES Tietê S.A. de extinção do processo por perda superveniente de objeto indeferido, preliminar arguida pelo Município de Cardoso/SP em contrarrazões rejeitada, remessa oficial, tida por interposta, e apelação do Ministério Público Federal providas para anular a r. sentença, devendo os autos retornarem à Vara de Origem para que seja realizada prova pericial, e parte da apelação do IBAMA não conhecida e, na parte conhecida, improvida".
(TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AC 0008726-75.2008.4.03.6106, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, julgado em 10/12/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/12/2015, grifei).

Ademais, conquanto não existisse à época do ajuizamento da ação a Lei Complementar 140/2011 - que fixou normas para a cooperação entre os entes federados no exercício da competência constitucional comum relativa à proteção do meio ambiente -, tem-se que a aludida norma sedimentou todo o entendimento supraexposto acerca da atribuição supletiva do IBAMA em matéria de licenciamento ambiental (artigos 3º, I; 13 e 15), reforçando toda a fundamentação a respeito.

No mais, também não prospera a alegação de que a ação civil pública constituiria instrumento processual inadequado para que veiculadas as pretensões ora deduzidas.

De fato, a apontada inconstitucionalidade das leis estaduais, na parte em que dispõem sobre a queima da palha de cana-de-açúcar, não consubstanciou objeto principal deste feito - o que, decerto, não seria possível, sob pena de usurpação da competência exclusiva do C. Supremo Tribunal Federal - mas, isso sim, pleito incidental, sob forma de controle difuso de constitucionalidade incidenter tantum, perfeitamente cabível no âmbito da ação civil pública. Por sinal, esse o entendimento consolidado no Pretório Excelso:

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE INCIDENTER TANTUM NA AÇÃO CIVIL PÚBLICA: POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
(STF, RE 645508 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 22/11/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-235 DIVULG 12-12-2011 PUBLIC 13-12-2011)
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OCUPAÇÃO DE LOGRADOUROS PÚBLICOS. LEI 754/1994 DO DISTRITO FEDERAL. PEDIDO DE INCONSTITUCIONALIDADE INCIDENTER TANTUM. 1. O Ministério Público tem legitimidade ativa para propor ação civil pública com fundamento na inconstitucionalidade de leis ou atos normativos, desde que incidenter tantum. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF, RE 438328 AgR, Relator(a): Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 24/06/2008, DJe-152 DIVULG 14-08-2008 PUBLIC 15-08-2008 EMENT VOL-02328-05 PP-00971 RT v. 97, n. 877, 2008, p. 107-109 LEXSTF v. 30, n. 360, 2008, p. 165-169)

Sobre o alegado cerceamento de defesa, é de se ter presente que "O juiz é o destinatário final das provas, a quem cabe avaliar sua efetiva conveniência e necessidade, advindo daí a possibilidade de indeferimento das diligências inúteis ou meramente protelatórias, em consonância com o art. 130 do CPC/73, de modo que não existe nulidade quando o julgamento antecipado da lide decorre do entendimento do Juízo a quo de que a matéria de fato depende exclusivamente de prova documental e o feito encontra-se devidamente instruído" (AgInt no AREsp 922.239/SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, DJe: 10/10/2016).

Nesse ponto, afere-se da fundamentação da r. sentença que o MM. Juízo a quo, em análise, concluiu que o estado do processo, nas respectivas condições, amparava um seguro julgamento da causa, situação que tornava prescindível a produção de outras provas. Tal conclusão merece ser mantida, uma vez que a prova coligida, efetivamente, permitiu que o decisum recorrido analisasse todas as questões suscitadas pelas partes, bem como as matérias de fato e de direito, não tendo em nenhuma passagem afastado os argumentos dos réus por suposta ausência de perícia ou outra modalidade de prova.

No mérito, as apelações comportam provimento.

Com efeito, o C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 586.224/SP (Plenário), repercussão geral reconhecida, adotou o entendimento de que lei estadual prevendo a gradual eliminação da prática da queima da palha de cana-de-açúcar, de forma progressiva e planejada, reflete uma desejável forma de compatibilização entre interesses da sociedade. Confira-se a ementa desse julgado:

"RECURSO EXTRAORDINÁRIO EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE ESTADUAL. LIMITES DA COMPETÊNCIA MUNICIPAL. LEI MUNICIPAL QUE PROÍBE A QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR E O USO DO FOGO EM ATIVIDADES AGRÍCOLAS. LEI MUNICIPAL Nº 1.952, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1995, DO MUNICÍPIO DE PAULÍNIA. RECONHECIDA REPERCUSSÃO GERAL. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 23, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, Nº 14, 192, § 1º E 193, XX E XXI, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO E ARTIGOS 23, VI E VII, 24, VI E 30, I E II DA CRFB. 1. O Município é competente para legislar sobre meio ambiente com União e Estado, no limite de seu interesse local e desde que tal regramento seja e harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, VI c/c 30, I e II da CRFB). 2. O Judiciário está inserido na sociedade e, por este motivo, deve estar atento também aos seus anseios, no sentido de ter em mente o objetivo de saciar as necessidades, visto que também é um serviço público. 3. In casu, porquanto inegável conteúdo multidisciplinar da matéria de fundo, envolvendo questões sociais, econômicas e políticas, não é permitido a esta Corte se furtar de sua análise para o estabelecimento do alcance de sua decisão. São elas: (i) a relevante diminuição - progressiva e planejada - da utilização da queima de cana-de-açúcar; (ii) a impossibilidade do manejo de máquinas diante da existência de áreas cultiváveis acidentadas; (iii) cultivo de cana em minifúndios; (iv) trabalhadores com baixa escolaridade; (v) e a poluição existente independentemente da opção escolhida. 4. Em que pese a inevitável mecanização total no cultivo da cana, é preciso reduzir ao máximo o seu aspecto negativo. Assim, diante dos valores sopesados, editou-se uma lei estadual que cuida da forma que entende ser devida a execução da necessidade de sua respectiva população. Tal diploma reflete, sem dúvida alguma, uma forma de compatibilização desejável pela sociedade, que, acrescida ao poder concedido diretamente pela Constituição, consolida de sobremaneira seu posicionamento no mundo jurídico estadual como um standard a ser observado e respeitado pelas demais unidades da federação adstritas ao Estado de São Paulo. 5. Sob a perspectiva estritamente jurídica, é interessante observar o ensinamento do eminente doutrinador Hely Lopes Meireles, segundo o qual "se caracteriza pela predominância e não pela exclusividade do interesse para o município, em relação ao do Estado e da União. Isso porque não há assunto municipal que não seja reflexamente de interesse estadual e nacional. A diferença é apenas de grau, e não de substância." (Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 1996. p. 121.) 6. Função precípua do município, que é atender diretamente o cidadão. Destarte, não é permitida uma interpretação pelo Supremo Tribunal Federal, na qual não se reconheça o interesse do município em fazer com que sua população goze de um meio ambiente equilibrado. 7. Entretanto, impossível identificar interesse local que fundamente a permanência da vigência da lei municipal, pois ambos os diplomas legislativos têm o fito de resolver a mesma necessidade social, que é a manutenção de um meio ambiente equilibrado no que tange especificamente a queima da cana-de-açúcar. 8. Distinção entre a proibição contida na norma questionada e a eliminação progressiva disciplina na legislação estadual, que gera efeitos totalmente diversos e, caso se opte pela sua constitucionalidade, acarretará esvaziamento do comando normativo de quem é competente para regular o assunto, levando ao completo descumprimento do dever deste Supremo Tribunal Federal de guardar a imperatividade da Constituição. 9. Recurso extraordinário conhecido e provido para declarar a inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 1.952, de 20 de dezembro de 1995, do Município de Paulínia.(RE 586224, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 05/03/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-085 DIVULG 07-05-2015 PUBLIC 08-05-2015)

Pelo supracitado precedente do Pretório Excelso, houve declaração de inconstitucionalidade de lei municipal que vedava, por completo, a prática da queima de cana-de-açúcar, dada a sua incompatibilidade com lei estadual - no caso, a Lei Paulista nº 11.241/2002 - que impõe a respectiva eliminação, mas de forma gradativa, até o ano de 2031. Esse julgado, para além de assentar que a competência municipal para legislar sobre meio ambiente é limitada ao interesse local, devendo respeitar a disciplina estabelecida pelos demais entes federados, avançou no tema, reconhecendo que a eliminação gradual dessa prática de queima, contraposta à respectiva eliminação abrupta, surge como o meio mais adequado de compatibilização de interesses relativos à dignidade humana, saúde e proteção ao trabalho, entre o mais. Veja-se, a esse respeito, trecho do voto condutor do V. Acórdão:

"[...]
É exatamente o caso que está sendo julgado nesta Corte no momento. Mesmo que seja mais benéfico, para não dizer inevitável, optar pela mecanização da colheita da cana, por conta da saúde do trabalhador e da população que vive nas proximidades da área de cultura, pelo aumento significativo da produtividade e consequente lucro, não se pode deixar de lado o meio pelo qual se considere mais razoável de obtenção deste objetivo: proibição imediata ou eliminação gradual.
Por óbvio, afigura-se muito mais harmônico com a disciplina constitucional, a eliminação planejada e gradual da queima da cana. Por último, adentrando no plano ambiental, resta a necessidade de se refletir quanto à poluição. Se de uma parte a queima traz prejuízos, de outro, a utilização de máquinas também geram impacto negativo ao meio ambiente. Conforme esclarecido na audiência pública e mencionado no relatório, a decomposição da cana gera gás metano, o que contribui para o efeito estufa, além do surgimento de ervas daninhas e o consequente uso de pesticidas e fungicidas.
Portanto, em que pese a inevitável mecanização total no cultivo da cana, é preciso reduzir ao máximo o seu aspecto negativo. Assim, diante dos valores sopesados, editou-se uma lei estadual que cuida da forma que entende ser devida a execução da necessidade de sua respectiva população. Tal diploma reflete, sem dúvida alguma, uma forma de compatibilização desejável pela sociedade, que, acrescida ao poder concedido diretamente pela Constituição, consolida de sobremaneira seu posicionamento no plano jurídico estadual como um standard a ser observado e respeitado pelas demais unidades da federação adstritas ao Estado de São Paulo.
[...]"

Também o E. Superior Tribunal de Justiça, ao se debruçar sobre o tema da queima da cana-de-açúcar, já se posicionou no sentido de que tal prática, embora inflija certos danos ambientais, não é ilegal, se realizada com amparo em autorizações expedidas pelos órgãos ambientais competentes, como no caso ora sob exame, a CETESB. Veja-se:

"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR. LEGALIDADE. PRÉVIA AUTORIZAÇÃO PELOS ÓRGÃOS COMPETENTES. ACÓRDÃO RECORRIDO NO MESMO SENTIDO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83/STJ. CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS AUTORIZADORES. VERIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. INDENIZAÇÃO PELOS DANOS SUPOSTAMENTE CAUSADOS. INVIABILIDADE. REEXAME DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. AMBOS.
1. Quanto ao tema da legalidade, ou ilegalidade, na queimada da palha de cana-de-açúcar, tem-se que o Tribunal a quo se posicionou no mesmo sentido desta Corte Superior de que tal atividade, embora cause inegáveis danos ao meio ambiente, não é ilegal, desde que sua realização seja expressamente autorizada pelos órgãos ambientais competentes, como no caso presente (fl. 610-613). Assim, é atraído, à espécie, o enunciado nº 83 da Súmula deste STJ, verbis: "não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida." Precedentes: REsp 1179156/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 27/04/2011; AgRg no REsp 1112808/GO, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Primeira Turma, DJe 21/09/2009.
2. Em havendo legislação que regulamente o procedimento, a verificação se foram, ou não, cumpridos os requisitos estabelecidos requer o reexame do contexto fático-probatório dos autos, consequencializando-se a necessária reapreciação da prova, o que é vedado pela letra do enunciado nº 7 da Súmula deste Superior Tribunal de Justiça.
3. O Tribunal a quo, soberano na análise do acervo fático-probatório dos autos, asseverou que, uma vez que considerada lícita e autorizada a atividade da ora agravada, não cabe condená-la a pagar indenização, mesmo sob a alegação de responsabilidade objetiva.
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 48.149/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/04/2012, DJe 17/04/2012)

Merece registro, ainda, a jurisprudência pacífica do E. Tribunal de Justiça de São Paulo, no sentido de que o art. 27 da Lei 4.771/65 (antigo Código Florestal) permitia o emprego do fogo em práticas agropastoris, se precedida de permissão do Poder Público, disposição essa que, em essência, foi repetida pela novel Codificação Florestal (Lei nº 12.651/12), no seu art. 38, inciso I, a qual estabeleceu que, em locais ou regiões cujas peculiaridades justifiquem o emprego do fogo em práticas agropastoris ou florestais, este será possível mediante prévia aprovação do órgão estadual ambiental competente do Sisnama, para cada imóvel rural ou de forma regionalizada, que estabelecerá os critérios de monitoramento e controle. Confira-se:

"APELAÇÃO CÍVEL - Ação civil pública ambiental - Queima da palha de cana-de-açúcar. 1) Sentença que condenou os requeridos na obrigação de não fazer consistente em absterem-se de utilizar o fogo na limpeza do solo, preparo do plantio e para a colheita da cana-de-açúcar nas áreas por eles cultivadas - Impossibilidade - Prática que não é ilícita quando autorizada pelos órgãos ambientais competentes - Precedentes. 2) Condenação ao pagamento de indenização pelos danos ambientais decorrentes da queima - Impossibilidade - Ausência de demonstração do efetivo dano, apto a dar ensejo à indenização - Necessidade de comprovação e quantificação do dano - Impossibilidade de estimativa com critério que não guarde relação com o dano. 3) Pretendida a condenação da Fazenda Pública do Estado ao pagamento das verbas de sucumbência - Não cabimento - Verbas indevidas pelo autor da ação civil pública - Ausência de comprovação de inequívoca má-fé do órgão ministerial - Sentença reformada - Recurso parcialmente provido. (TJSP; Apelação 4010911-86.2013.8.26.0506; Relator (a): Eutálio Porto; Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Foro de Ribeirão Preto - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 10/03/2016; Data de Registro: 14/03/2016)
AÇÃO AMBIENTAL. Batatais. Vedação da queima de palha da cana-de-açúcar, formação de reserva legal, recomposição da área de preservação permanente. 1. Sentença. Nulidade. Inexiste relação jurídica concreta a embasar o pedido; e o pedido em si se limita a condenar a ré a cumprir a lei. A ação foi ajuizada em 9-8-2010 e a relação de contratos de exploração em regime de parceria e de fornecimento juntada a fls. 66/68 demonstra que muitos deles encontravam-se vencidos à época da propositura, sendo que todos os demais venceram no transcurso do processo. A realização da perícia nestes termos mostra-se inviável; não se sabe quais contratos foram renovados, quais imóveis são de propriedade da ré para fins de demarcação ou instituição de reserva legal, e em quais houve intervenção nas áreas de preservação permanente. O pedido não é certo e determinado e a resolução da lide demandaria sentença normativa, que não é própria ao juízo. 2. Queima controlada. Código Florestal. O art. 27 da LF nº 4.771/65 (Código Florestal) abrange as atividades agropastoris, entre elas a cultura da cana-de-açúcar; o art. 38, I da LF nº 12.651/12 permite o uso de fogo em práticas agropastoris ou florestais, mediante prévia aprovação do órgão ambiental competente, que estabelecerá os critérios de monitoramento e controle. 3. Queima controlada. Leis locais. A queima controlada da palha da cana-de-açúcar, quando autorizada pelos órgãos ambientais e executada nos estritos limites da autorização, é atividade lícita. Inexiste previsão na lei ou no Regulamento (a Resolução CONAMA nº 237/97) de apresentação de EIA/RIMA, ficando a exigência de estudos ambientais ao critério do órgão licenciador. Continuam em vigor a LE nº 997/76 e o DE nº 8.468/76, que a regulamentou, eis que harmônicos com a LF nº 6.938/81 e demais legislação federal. As LE nº 10.547/00 e 11.241/02 e o DF nº 2.661/98 não ofendem os art. 24 § 4º, 225 caput e § 1º V da Constituição Federal nem o art. 193 II da Constituição Estadual. Sentença que extinguiu parte dos pedidos e julgou improcedentes os demais. Recurso do Ministério Público desprovido. (TJSP; Apelação 0007768-15.2010.8.26.0070; Relator (a): Torres de Carvalho; Órgão Julgador: 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Foro de Batatais - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 24/04/2014; Data de Registro: 25/04/2014)

Portanto, in casu, agiu a CETESB em conformidade com o direito, pois, na condição de órgão estadual competente, expediu, com base em lei, licenças e autorizações para a queima da palha de cana-açúcar, prática essa que, nos termos da jurisprudência supramencionada, não se mostra ilegal, estando em viés de progressiva extinção.

Diante do desfecho anunciado, ficam prejudicadas as demais alegações dos recorrentes

Ante o exposto, dá-se provimento às apelações da Associação dos Plantadores de Cana da Região de Jaú/SP - Associcana, do IBAMA e do ESTADO DE SÃO PAULO, para que julgados improcedentes os pedidos iniciais. Sem custas, despesas processuais ou verba honorária (art. 18 da Lei 7.437/65).

É como voto.

DIVA MALERBI
Desembargadora Federal


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