D.E. Publicado em 19/04/2010 |
|
|
|
|
|
EMENTA
PROCESSO PENAL - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - LEI 9.605/98, ARTIGOS 40 E 48 - REJEIÇÃO DA DENÚNCIA APENAS NO QUE TANGE AO CRIME CAPITULADO NO ARTIGO 40 DA LEI AMBIENTAL - MATERIALIDADE DELITIVA COMPROVADA - INDÍCIOS DE AUTORIA - DENÚNCIA INTEGRALMENTE RECEBIDA - RECURSO MINISTERIAL PROVIDO.
|
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes os acima indicados, ACORDAM os Desembargadores da Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, nos termos do relatório e voto da Senhora Relatora, constantes dos autos, e na conformidade da ata de julgamento, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado, por unanimidade, em dar provimento ao recurso ministerial, para receber a denúncia também no que diz respeito ao delito previsto no artigo 40 da Lei 9605/98, determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem para que o feito tenha seu regular prosseguimento.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | RAMZA TARTUCE GOMES DA SILVA:0027 |
Nº de Série do Certificado: | 4435CE48 |
Data e Hora: | 09/04/2010 18:59:16 |
|
|
|
|
|
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL RAMZA TARTUCE:
Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra a decisão proferida pelo MM. Juiz Federal da 4ª Vara de São José do Rio Preto - SP, que recebeu parcialmente a denúncia oferecida em face de PEDRO GREGUI, rejeitando-a quanto ao crime previsto no artigo 40 da Lei 9605/98, e acolhendo-a quanto ao crime previsto no artigo 48 da mesma lei supracitada.
Consta da denúncia que PEDRO GREGUI teria causado dano direto ao meio ambiente, mediante intervenção em área de preservação ambiental permanente (APP), localizada a margem do reservatório da Usina Hidrelétrica de Água Vermelha, no loteamento Água Azul, lote 3, mediante a manutenção de área de lazer - "rancho de veraneio", impedindo a regeneração natural da vegetação, no município de Cardoso/SP.
Assim, o réu foi denunciado como incurso nas penas dos artigos 40 e 48 do Código de Processo Penal (fls.02/03).
A fl. 59, o MM. Juiz de primeiro grau rejeitou parcialmente a inicial acusatória para afastar a incidência do crime tipificado no artigo 40 da Lei Ambiental, por não poder o denunciado responder por tal crime, pela ausência de prova da autoria delitiva, pois a construção ocorreu há mais de 15 anos, ou seja, bem antes do advento da Lei Ambiental, além do que o laudo pericial não menciona quando foram realizadas as construções, não havendo comprovação, nos autos, ou sequer indícios de que a destruição em decorrência das construções foi provocada pelo acusado. Entendeu, todavia, que ele pode sofrer a ação penal pela prática do delito previsto no artigo 48 da Lei Ambiental, que também lhe foi imputado pelo órgão acusador, por manter, atualmente, as edificações no local, na medida em que elas impedem a regeneração do meio ambiente.
Por outro lado, o Douto Magistrado recebeu a denúncia promovida contra o acusado, quanto ao crime capitulado no artigo 48 da mesma Lei Ambiental.
Inconformado, o Ministério Público Federal pugna pela reforma da decisão monocrática, argumentando, em apertada síntese que:
a)- não é apenas o ato de construir, no instante em que se edifica, que completa o núcleo do tipo do artigo 40 da Lei Ambiental, mas, sim a atividade antrópica, em área onde essa atividade não deveria existir, que causa o dano e completa o tipo penal;
b)- o momento da edificação é, no caso em tela, irrelevante para a imputação feita ao agente. A conduta relevante é a da intervenção antrópica em área de preservação permanente. A cada intervenção o agente danifica a área e realiza o tipo;
c)- não é apenas a edificação ou a impermeabilização do solo que causa o dano ambiental, mas a presença inadequada e constante de dejetos humanos e químicos, a manutenção do local para habitabilidade, com o uso de pesticidas e constante "limpeza" da vegetação circunvizinha (capina, roça, fogo, etc.). Tudo isso, sem falar no prejuízo causado à fauna terrestre e aquática. Conseqüentemente, a cada intervenção humana (não necessariamente a edificação), o infrator danifica a área e impede a regeneração natural da vegetação local;
d)- no presente caso, a edificação está a menos de 100 metros do reservatório da Usina Hidrelétrica de Água Vermelha, encontrando-se em área de preservação permanente, constando dos autos tratar-se de área destinada ao lazer, o que evidencia a presença e atividade humana em toda a área de proteção permanente, o que, de per si, causa dano ao meio ambiente;
e)- o recorrido vem causando dano a APP reiteradamente, com a simples manutenção de sua presença, causando diariamente dano direto a Unidade de Conservação;
f)- e não é só o ato de construir em área de preservação permanente que tipifica o delito do artigo acima mencionado, mas sim a intervenção antrópica indevida na área;
g)- e, por fim, alega que o delito em questão é permanente, e é em decorrência da vontade do agente que a ação danificadora se protrai no tempo (fls. 62/78).
Em contra-razões de recurso, a defesa do recorrido requereu o desprovimento do recurso, pugnando pela confirmação do "decisum" (fls. 88/97).
A decisão restou mantida, em sede de juízo de retratação (fl. 104).
Após, subiram os autos a esta E. Corte, onde o parecer do Ministério Público Federal é pelo provimento do recurso (fls. 107/112).
Dispensada a revisão, na forma regimental.
É O RELATÓRIO.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | RAMZA TARTUCE GOMES DA SILVA:0027 |
Nº de Série do Certificado: | 4435CE48 |
Data e Hora: | 19/03/2010 15:01:22 |
|
|
|
|
|
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL RAMZA TARTUCE:
A denúncia ofertada às fls.02/03 atende aos requisitos previstos no artigo 41 do Código de Processo Penal. E não se vislumbra qualquer uma das hipóteses elencadas no Código de Processo Penal, a justificar a sua rejeição parcial, no que diz respeito ao delito previsto no artigo 40 da Lei 9605/98.
Inicialmente, observo que a materialidade delitiva restou demonstrada através do Auto de Infração Ambiental (fl.11) e Termo de Embargo/Interdição (fl.12), e, principalmente, pelo Laudo de Exame para Constatação de Dano Ambiental de fls. 40/41, em que o perito ambiental ofereceu respostas aos quesitos formulados pela autoridade policial deprecante, do qual reproduzo os seguintes excertos, a esclarecer que:
Também concluiu o laudo que o local onde se deram as edificações se situa em área de preservação permanente, localizada a margem esquerda da Usina Hidrelétrica de Água Vermelha, conforme se depreende da leitura às respostas aos quesitos 01 a 03 de fl. 40.
Por sua vez, o depoimento do acusado (fl. 37) dá conta de que ele é o proprietário do imóvel construído em área de preservação ambiental, utilizado para seu lazer, o que se consubstancia em indício da autoria delitiva.
E, não se pode deixar de dar razão ao Ministério Público Federal, quando afirma, às fls. 66//67, em suas razões recursais:
Por outro lado, verifico que o MM Juiz de primeiro grau afastou a suposta autoria delitiva, imputada ao réu, sob os seguintes argumentos:
O delito previsto no artigo 40 da Lei 9.605/98 consistente em causar dano em área de preservação permanente é crime instantâneo que se consuma com a degradação ambiental de determinada região.
É bem verdade que o laudo pericial elaborado nos autos não dá conta de quando as edificações foram levantadas. Também houve desmatamento e remoção da flora original, não havendo como precisar se a construção daquelas edificações foi diretamente responsável pelo desmatamento ou se este foi um evento muito anterior, não relacionado a ela.
De outro lado, não pode prosperar a fundamentação contida na sentença de primeiro grau no sentido de que, não tendo o laudo afirmado quando ocorreram as edificações, sendo o depoimento do proprietário o único documento que por ora permite esta conclusão, não se pode responsabilizar o réu pelo cometimento do delito.
Note-se que, prestando declarações à autoridade policial (fl. 37), o réu afirmou ter adquirido a propriedade em 1989, tendo-o adquirido do então proprietário, Hernandes Alves Santana, conforme comprova a cópia do compromisso particular de compra e venda (fl.38). No entanto, alega que, na época da aquisição, desconhecia o fato de que a área era considerada de preservação ambiental permanente, e que não teve a intenção de causar dano ao meio ambiente, como também não teve conhecimento de que não poderia construir naquela área.
Assim, a conclusão de que o réu não foi o responsável pela prática delitiva é prematura e deve ser afastada.
Ora, como sabe, não se pode afastar, por ora, a possibilidade de ser o réu o autor do delito, dada a existência de incerteza quanto à data da edificação.
E, como bem colocado pelo parquet, em suas razões recursais, a simples permanência do recorrido em área de preservação permanente, mantendo o imóvel, limpando o terreno, impermeabilizando o solo, plantando gramíneas, de forma contínua, faz com que a consumação do crime de impedir ou dificultar a regeneração natural da área por meio de seu próprio banco de sementes (artigo 48) não cesse enquanto a área não for desocupada. E, da mesma forma, se houve intervenção humana na APP houve dano ambiental, com a consumação da conduta delituosa (artigo 40).
Ora, considerando que o réu é possuidor do imóvel em questão e mantém as edificações presentes no local e lá elas permanecem até a presente data, conclui-se que há indícios de que ele foi o causador do dano ao meio ambiente, até porque a edificação em área de preservação permanente pressupõe ato antecedente gerador de dano direto à vegetação natural protegida por lei. E a manutenção da edificação impede (ou, ao menos dificulta) a regeneração da vegetação natural.
Destarte, as imputações contidas na denúncia (artigos 40 e 48 da Lei Ambiental) devem ser objeto de instrução processual, vez que tais condutas são, em tese, passíveis de punição.
Rezam os artigos 40 e 48 da Lei 9605/98:
Como acima já se aludiu, a edificação em área de preservação permanente pressupõe ato antecedente gerador de dano direto a vegetação natural protegida por lei. Por outro lado, a manutenção da edificação impede (ou, ao menos, dificulta) a regeneração da vegetação natural.
Portanto, há, em tese, subsunção das condutas imputadas ao réu aos tipos penais acima citados.
E o Juízo a quo, ao rejeitar a denúncia no que tange ao crime capitulado no artigo 40 da Lei 9.605/98, extrapolou os limites da fase de prelibação, analisando profundamente as provas carreadas aos autos com a denúncia, provas estas que poderiam ser complementadas durante o trâmite do processo penal.
Ensina Fernando Capez:
Nesse mesmo sentido, temos os seguintes julgados do E. Superior Tribunal de Justiça:
Deste modo, na fase do recebimento da denúncia, o principio jurídico "in dubio pro societate" deve prevalecer, devendo-se verificar a procedência da acusação e a presença de causas excludentes de antijuridicidade ou de punibilidade no decorrer da ação penal.
Nesse sentido, já se posicionou esta Turma, quando do julgamento do Recurso em Sentido Estrito interposto no Processo nº 1999.61.07.002716-7, da lavra desta Relatora, cuja a ementa transcrevo:
Diante do exposto, dou provimento ao recurso ministerial, para receber a denúncia também quanto ao delito previsto no artigo 40 da Lei 9.605/98, retornando os autos ao Juízo de origem, para regular prosseguimento.
É COMO VOTO.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | RAMZA TARTUCE GOMES DA SILVA:0027 |
Nº de Série do Certificado: | 4435CE48 |
Data e Hora: | 19/03/2010 15:01:19 |