Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 31/03/2017
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002697-62.2015.4.03.6106/SP
2015.61.06.002697-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : SEBASTIAO FRANCISCO VISICATO
ADVOGADO : SP184637 DONALDO LUÍS PAIOLA e outro(a)
APELADO(A) : OS MESMOS
No. ORIG. : 00026976220154036106 1 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. PÁSSAROS SILVESTRES IRREGULARMENTE MANTIDOS EM CATIVEIRO DOMICILIAR PELO ACUSADO, INCLUSIVE ESPÉCIE AMEAÇADA DE EXTINÇÃO, PORTANDO RELAÇÃO NÃO ATUALIZADA DE PASSERIFORMES NO ENDEREÇO DO PLANTEL. ANILHA ALARGADA, NÃO REGISTRADA NO SISPASS OU AUSENTE, EM DESACORDO COM O ARTIGO 32, II e III, DA INSTRUÇÃO NORMATIVA IBAMA N. 10/2011. USO INDEVIDO DE ANILHA DO IBAMA PELO RÉU, SABIDAMENTE, ADULTERADA. DELITOS IMPUTADOS NA DENÚNCIA DEVIDAMENTE TIPIFICADOS NO ARTIGO 29, § 1º, III, E § 4º, I, DA LEI 9.605/98, E NO ARTIGO 296, § 1º, III, DO CÓDIGO PENAL, EM CONCURSO MATERIAL. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO NÃO APLICÁVEL NO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA DE CONFLITO APARENTE DE NORMAS. PRESCRIÇÃO INOCORRIDA. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. DOLO CONFIGURADO. DOSIMETRIA. ATENUANTES DO ARTIGO 65, I, PARTE FINAL, DO CÓDIGO PENAL, E DO ARTIGO 14, I E IV, DA LEI 9.605/98, RECONHECIDAS NA HIPÓTESE, INCLUSIVE DE OFÍCIO, NOS LIMITES DA SÚMULA 231 DO STJ (PENAS-BASE FIXADAS JÁ NO MÍNIMO PATAMAR LEGAL). CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DE PENA DO ARTIGO 29, § 4º, I, DA LEI 9.605/98, DEVIDAMENTE MANTIDA EM RELAÇÃO AO DELITO AMBIENTAL, EM DETRIMENTO DA AGRAVANTE DO ARTIGO 15, II, "Q", DA LEI 9.605/98. SUBSTITUIÇÃO DA SOMA DAS PENAS CORPORAIS APLICADAS AO RÉU POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. APELOS DA ACUSAÇÃO E DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDOS.
1. Em suas razões recursais (fls. 132/135 e 149/152), o Ministério Público Federal pleiteia a reforma parcial da r. sentença, para condenar SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO, também, pela prática do delito previsto no artigo 296, § 1º, inciso I (sic, inciso III), do Código Penal, bem como para aplicar-lhe a causa de aumento (sic, agravante) prevista no artigo 15, inciso II, "q", da Lei 9.605/98, no tocante ao delito ambiental.
2. Já a defesa de SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO, em suas razões recursais (fls. 162/166), pleiteia a reforma parcial da r. sentença, para que: (i) seja o acusado absolvido, também, do crime previsto no artigo 29, § 1º, inciso III, e § 4º, inciso I, da Lei 9.605/98, por estar, supostamente, provado que não cometera os fatos delitivos tais como descritos na denúncia, ou ainda por pretensa falta de provas de autoria e dolo, sob o argumento de que, em tese, desconheceria as normas referentes ao anilhamento de aves silvestres, devido à pouca instrução e idade avançada; (ii) subsidiariamente, seja-lhe aplicada a atenuante do artigo 65, inciso I, do Código Penal, em razão de ter mais de setenta anos de idade na data da sentença, e, por conseguinte, seja reconhecida a prescrição de sua pretensão punitiva, à luz do benefício etário e como medida de política criminal.
3. A despeito da posição adotada pelo magistrado sentenciante às fls. 128/129 da r. sentença e em consonância com o apelo ministerial nesse ponto, não há de se falar em conflito aparente de normas entre os tipos penais descritos no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal (uso indevido de anilha do IBAMA adulterada) e no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98 (guarda irregular de pássaros silvestres, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente), a resultar em equivocada absorção do primeiro (suposto delito-meio) pelo segundo (pretenso delito-fim), sendo de rigor o seu afastamento.
4. Cumpre observar que os tipos penais em epígrafe tutelam bens jurídicos distintos (o primeiro, a fé pública; o segundo, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, destacadamente, a fauna silvestre), além de decorrerem de condutas diversas e autônomas, razão pela qual não se vislumbra, na presente hipótese, a incidência do princípio da consunção.
5. Diversamente do sustentado pela defesa, os elementos de cognição demonstram que o criador amador SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO (CTF n. 1020319), de forma livre e consciente, mantinha, irregularmente, em cativeiro domiciliar, 03 (três) pássaros silvestres, consistentes em 01 (um) canário-da-terra (Sicalis flaveola brasiliensis), 01 (um) tempera-viola (Saltator maximus) e 01 (um) azulão-verdadeiro (Passerina brissonii), espécie esta considerada ameaçada de extinção, sem estarem devidamente anilhados (seja pela ausência de qualquer anilha de identificação, seja pelo visível alargamento dos diâmetros internos de suas anilhas "IBAMA 3,5 060827" e "SOSP 013 25 99 6"), inclusive portando relação de passeriformes desatualizada no endereço de seu plantel, em nítido desacordo com eventual licença, permissão ou autorização obtida junto ao órgão ambiental competente, nos termos do artigo 32, incisos II e III, da Instrução Normativa IBAMA n. 10/2011, os quais vieram a ser apreendidos por policiais militares ambientais, em 10/05/2014, durante a operação "Jubileu de Prata", na própria residência do acusado, no "Sítio Irmãos Visicato", no Município de Monte Aprazível/SP, além de incorrer, também de maneira livre e consciente, no uso indevido de 01 (uma) anilha, em tese, originalmente cadastrada pelo IBAMA e posteriormente adulterada/alargada (de diâmetro interno bastante superior ao normativamente permitido), mantida aposta pelo acusado no tarso do aludido tempera-viola ("IBAMA 3,5 060827"), no mesmo local e ocasião.
6. Ouvidos em juízo (fls. 104-mídia/106), os policiais militares ambientais e testemunhas comuns Jean Carlos Ambrosio e Rodrigo Victor Devechi confirmaram a fiscalização realizada, em 10/05/2014, no Sítio "Irmãos Visicato", onde foram recebidos pelo próprio acusado que lhes franqueara a entrada no local e colaborara com a diligência, tendo lhes apresentado, na ocasião, a sua relação de passeriformes, notadamente, desatualizada. A propósito, destacaram que, antes mesmo da aferição das bitolas das anilhas com o auxílio de um paquímetro, já haviam notado que as anilhas do tempera-viola e do azulão-verdadeiro (este último ameaçado de extinção), de tão alargadas (fl. 59), teriam saído, com facilidade, de seus respectivos tarsos nas mãos dos próprios agentes de fiscalização durante a vistoria, evidenciando, desde logo, sua possível adulteração por alargamento, que, de fato, restou constatada às fl. 15 e 45/60. Além disso, asseveraram que o "canário-da-terra" apreendido no mesmo local encontrava-se, na data dos fatos, desprovido de qualquer anilha de identificação. No mais, o policial militar ambiental Jean Carlos Ambrosio recordou-se ainda que, anteriormente à vistoria de 10/05/2014 (uns cinco anos antes), em outra fiscalização realizada na residência do réu, mas na ausência deste, chegara a lavrar termo circunstanciado em nome de sua esposa, em razão de lá haver apreendido outras aves também desprovidas de anilhas na ocasião.
7. Em seu interrogatório judicial (fls. 104-mídia e 107), o acusado veio a alterar sua versão inicialmente prestada em sede policial à fl. 35, passando a informar que, em verdade, teria "ganho" o "azulão" de sua própria filha, ao passo que o "tempera-viola" teria sido "comprado" de um amigo seu de Votuporanga/SP, cujo nome afirma igualmente não se recordar, ambos há mais de dez anos. Na sequência, passa a declarar, contraditoriamente, que nunca teria vendido ou comprado passeriformes, apenas os teria ganhado. Em relação ao "canário-da-terra", o qual, segundo ele, teria entrado na gaiola "por acidente" havia alguns dias (atrás de comida posta pelo acusado), admitiu, todavia, estar ciente de que não poderia mantê-lo em cativeiro desprovido de qualquer anilha (até mesmo em razão de outra apreensão anteriormente realizada em sua residência há uns dez anos, também por ausência de anilha em seus passeriformes), caindo, por terra, a frágil tese da defesa de que o acusado, supostamente, desconheceria as normas referentes ao anilhamento de aves silvestres, não obstante sua larga experiência enquanto criador amador de passeriformes, admitidamente, há mais de quinze anos, inclusive com cadastro no IBAMA.
8. Restaram incontestes a materialidade e autoria delitivas, assim como o dolo do réu, em relação à prática dos delitos previstos no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal, e no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da Lei 9.605/98, em concurso material, não se olvidando da natureza diversa dos bens jurídicos penalmente tutelados em cada um dos tipos penais em comento, respectivamente, a fé pública e a proteção ao meio ambiente (destacadamente, a fauna silvestre), nem havendo de cogitar, na hipótese, eventual erro sobre a ilicitude do fato ou mesmo sobre os elementos do tipo.
9. Dosimetria e substituição da soma das penas corporais fixadas ao réu por duas restritivas de direitos.
10. Atenuantes do artigo 65, I, parte final, do Código Penal, e do artigo 14, I e IV, da Lei 9.605/98, reconhecidas na hipótese, inclusive de ofício, nos limites da Súmula 231 do STJ (penas-base fixadas já no mínimo patamar legal).
11. Causa especial de aumento de pena do artigo 29, § 4º, i, da lei 9.605/98, devidamente mantida em relação ao delito ambiental, em detrimento da agravante do artigo 15, II, "q", da lei 9.605/98, ora pleiteada, sem razão, pela acusação.
12. De resto, não há de se cogitar o reconhecimento de prescrição antecipada ou virtual da pretensão punitiva, em consonância com a Súmula 438 do Superior Tribunal de Justiça, antes de eventual trânsito em julgado do presente acórdão para acusação. Tampouco se verifica nos autos a ocorrência de eventual prescrição de suas pretensões punitivas tendo em conta o máximo das penas privativas de liberdade abstratamente cominadas aos delitos previstos no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da Lei 9.605/98 (um ano e meio de detenção), e no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal (seis anos de reclusão), assim como o benefício etário a que o réu, de fato, faz jus em razão de dispor de mais de setenta anos de idade na data da sentença (fls. 36, 131 e 147), na forma dos artigos 109, III e V, 115, parte final, 117, e 119, todos do Código Penal.
13. Recursos da acusação e da defesa parcialmente providos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento aos apelos da acusação e da defesa, apenas para (i) condenar SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO em 02 (dois) anos de reclusão, e 10 (dez) dias-multa no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, também pela prática do delito contra a fé pública capitulado no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal, nos moldes dos artigos 49, § 1º, e 68, do mesmo diploma legal, afastando-se a incidência do princípio da consunção no caso concreto; (ii) reconhecer ao réu as atenuantes previstas no artigo 65, I, parte final, do Código Penal (relativamente a ambos os delitos imputados e atendendo nesse ponto ao pleito subsidiário da defesa), assim como no artigo 14, incisos I e IV, da Lei 9.605/98 (ora vislumbradas ex officio, no tocante ao delito ambiental), em que pese suas respectivas penas-base já houvessem sido fixadas no mínimo patamar legal, à míngua de quaisquer agravantes e nos limites da Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça, sem prejuízo da subsequente aplicação da causa especial de aumento de pena prevista no artigo 29, § 4º, I, da Lei 9.605/98, no que se refere ao crime ambiental; (iii) tendo em vista o concurso material entre os tipos penais descritos no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da Lei 9.605/98, e no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal, calcular a soma de suas penas corporais em 02 (dois) anos e 09 (nove) meses de reclusão/detenção, em regime inicial aberto, que ficam substituídas por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo mesmo prazo da soma das penas substituídas, e prestação pecuniária no valor de 01 (um) salário-mínimo, destinada à União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 14 de março de 2017.
JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): JOSE MARCOS LUNARDELLI:10064
Nº de Série do Certificado: 71D062F09822A461
Data e Hora: 15/03/2017 15:32:08



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002697-62.2015.4.03.6106/SP
2015.61.06.002697-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : SEBASTIAO FRANCISCO VISICATO
ADVOGADO : SP184637 DONALDO LUÍS PAIOLA e outro(a)
APELADO(A) : OS MESMOS
No. ORIG. : 00026976220154036106 1 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

RELATÓRIO

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

Trata-se de apelações criminais interpostas pela defesa de SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO e pelo Ministério Público Federal em face da sentença proferida pelo Juízo Federal da 1ª Vara Federal de São José do Rio Preto/SP, que o condenou apenas pela prática do delito previsto no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, inciso I, da Lei 9.605/98.

Narra a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (fls. 65/68):

No dia 10 de maio de 2014, durante a operação denominada "Julibeu de Prata", Policiais Militares Ambientais constataram que Sebastião Francisco Visicato mantinha, em cativeiro, pássaros da fauna silvestre de espécimes nativa em situação irregular, inclusive, com anilha de identificação do IBAMA adulterada.
Na ocasião, foram apreendidos 03 (três) pássaros, os quais, 01 (um) estava sem anilha [canário-da-terra] e 02 (dois) possuíam anilhas supostamente adulteradas [tempera-viola com anilha "IBAMA 04-05 3,5 060827" e azulão verdadeiro com anilha "26 99 6 SOSP 013"), conforme constam na tabela abaixo: [...]
O Laudo de Perícia Criminal Federal atestou que a anilha nº 060827 apresentava incompatibilidade de medidas de diâmetros e altura, concluindo, assim, que trata-se de anilha adulterada. Quanto à outra anilha (26 99 6 SOSP 013) restou prejudicado o exame, pois, não estavam disponíveis padrões para este tipo de anilha (fls. 45/50).
Sendo assim, fora elaborado o Auto de Infração Ambiental (fls. 08), o Termo de Apreensão (fls. 09), as aves foram submetidas à análise (fls. 10), bem como foram enviadas à Estação Ecológica do Noroeste Paulista (IPA) em São José do Rio Preto/SP (fls. 11), para libertação em seu habitat natural.
Instado, às fls. 30, o denunciado afirmou ser criador de pássaros cadastrado no IBAMA; que quando recebeu as aves elas já estavam na situação em que se encontravam no momento da diligência policial, não sabendo informar o nome da pessoa que lhe forneceu as aves com o anilhamento; e quanto ao pássaro sem anilha, informou ter capturado há poucos dias no viveiro dos seus pássaros.
Ademais, necessário se faz mencionar que um dos pássaros apreendidos, o conhecido por Azulão Verdadeiro, consta como espécie ameaçada de extinção no Estado de São Paulo, conforme extrai-se do Laudo Pericial, às fls. 50.
Cumpre ainda salientar que as anilhas são anéis de metal, codificados sequencialmente, e só podem ser fornecidas pelo órgão ambiental (IBAMA). São consideradas selo público, ou seja, sinais de identificação de atos oficiais e, portanto, emitidos pelo governo brasileiro.
Conclui-se, portanto, que SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO, embora registrado como criador amador de pássaros, autorizado, em tese, pela autoridade competente, fez uso indevido de sinal público (anilha de emissão do IBAMA) adulterado, bem como manteve em cativeiro espécimes da fauna silvestre nativa, inclusive espécie ameaçada de extinção, de forma irregular.
Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL denuncia SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO como incurso nas penas do artigo 296, § 1º, inciso III, do Código Penal, em concurso com as penas do artigo 29, § 1º, inciso III e § 4º, inciso I da Lei 9.605/98 [...].

A denúncia do Parquet Federal foi recebida em 19/08/2015 (fls. 69/70).

Resposta à acusação (fls. 90/91).

Decisão afastando as hipóteses de absolvição sumária previstas no artigo 397 do Código de Processo Penal e determinando o prosseguimento do feito (fl. 93).

Alegações finais da acusação (fls. 109/110) e da defesa (fls. 114/120).

Boletim de Ocorrência Ambiental n. 140418 (fls. 04/07) e respectivo relatório de fiscalização e aferição de anilhas (fl. 15); Auto de Infração Ambiental n. 300963 (fl. 08); Termo de Apreensão (fl. 09); Laudo Biológico (fl. 10); Termos de Destinação de aves (fl. 11) e gaiolas (fl. 14); Exame de Constatação relativo às gaiolas (fls. 12/13); registro fotográfico das aves apreendidas durante a fiscalização (fl. 16); Auto de Apreensão das anilhas (fl. 19); Ofício n. 02027.000073/2015-13/ESREG/SP/IBAMA (fls. 39/40) com histórico SISPASS da anilha "IBAMA 04/05 3,5 060827" (fl. 41); Laudo Pericial n. 078/2015 referente às anilhas (fls. 45/50); Termo de Guarda para o Depósito das anilhas "IBAMA 04/05 060827" e "SOSP 013 26 99 6" (fl. 51), envelopadas à fl. 59; relatório policial (fls. 55/56); depoimentos das testemunhas em juízo (fls. 104-mídia/106); interrogatórios do réu em sede policial (fl. 30) e em juízo (fls. 104-mídia e 107).

Após regular instrução, sobreveio a sentença de fls. 126/130, que julgou procedente a denúncia, para condenar SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO a 09 (nove) meses de detenção, em regime inicial aberto, e 15 (quinze) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos, pelo cometimento do crime-fim ambiental previsto no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da Lei 9.605/98, reconhecida a absorção do delito-meio previsto no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal, e substituída a pena corporal aplicada por uma única restritiva de direitos consistente em prestação pecuniária no valor de 01 (um) salário mínimo "mensal" em favor de entidade beneficente a ser designada pelo Juízo da Execução.

Publicada a sentença em 23/05/2016 (fl. 131).

Às fls. 142/145, foram opostos embargos de declaração pelo réu em face da r. sentença de fls. 126/130, os quais restaram acolhidos à fl. 146 (decisão publicada em 22/08/2016 - fl. 147), para esclarecer e alterar, em parte, seu dispositivo, dele ficando excluída a expressão "mensal" relativamente à substituição de sua pena corporal por uma única restritiva de direitos consistente em prestação pecuniária no valor de 01 (um) salário mínimo em favor de entidade beneficente a ser designada pelo Juízo da Execução.

Apela o Ministério Público Federal (fls. 132/135 e 149/152), pleiteando a reforma parcial da r. sentença, para condenar SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO, também, pela prática do delito previsto no artigo 296, § 1º, inciso I (sic, inciso III), do Código Penal, bem como para aplicar-lhe a a causa de aumento (sic, agravante) prevista no artigo 15, inciso II, "q", da Lei 9.605/98, no tocante ao delito ambiental.

Contrarrazões da defesa (fls. 167/175), pelo não provimento do apelo ministerial.

Apela a defesa de SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO (fls. 153/154 e 162/166), pleiteando a reforma parcial da r. sentença, para que: (i) seja o acusado absolvido, também, do crime previsto no artigo 29, § 1º, inciso III, e § 4º, inciso I, da Lei 9.605/98, por estar, supostamente, provado que não cometera os fatos delitivos assim como descritos na denúncia, ou ainda por pretensa falta de provas de autoria e dolo, sob o argumento de que, em tese, desconheceria as normas referentes ao anilhamento de aves silvestres, devido à pouca instrução e idade avançada; (ii) subsidiariamente, seja-lhe aplicada a atenuante do artigo 65, inciso I, do Código Penal, em razão de ter mais de setenta anos de idade na data da sentença, e, por conseguinte, seja reconhecida a prescrição de sua pretensão punitiva, à luz do benefício etário e como medida de política criminal.

Contrarrazões ministeriais (fls. 177/178), pelo parcial provimento do apelo da defesa, apenas no tocante à aplicação da atenuante prevista no artigo 65, inciso I, do Código Penal.

Parecer da Procuradoria Regional da República (fls. 181/188), pelo parcial provimento dos apelos da defesa e da acusação, para condenar o réu, também pela prática delitiva descrita no artigo 296, § 1º, do Código Penal, bem como para reconhecer ao acusado a incidência da atenuante prevista no artigo 65, inciso I, do Código Penal.

É o relatório.

À revisão.

JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): JOSE MARCOS LUNARDELLI:10064
Nº de Série do Certificado: 71D062F09822A461
Data e Hora: 01/02/2017 18:54:45



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002697-62.2015.4.03.6106/SP
2015.61.06.002697-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : SEBASTIAO FRANCISCO VISICATO
ADVOGADO : SP184637 DONALDO LUÍS PAIOLA e outro(a)
APELADO(A) : OS MESMOS
No. ORIG. : 00026976220154036106 1 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

VOTO

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

Em suas razões recursais (fls. 132/135 e 149/152), o Ministério Público Federal pleiteia a reforma parcial da r. sentença, para condenar SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO, também, pela prática do delito previsto no artigo 296, § 1º, inciso I (sic, inciso III), do Código Penal, bem como para aplicar-lhe a causa de aumento (sic, agravante) prevista no artigo 15, inciso II, "q", da Lei 9.605/98, no tocante ao delito ambiental.

Já a defesa de SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO, em suas razões recursais (fls. 162/166), pleiteia a reforma parcial da r. sentença, para que: (i) seja o acusado absolvido, também, do crime previsto no artigo 29, § 1º, inciso III, e § 4º, inciso I, da Lei 9.605/98, por estar, supostamente, provado que não cometera os fatos delitivos tais como descritos na denúncia, ou ainda por pretensa falta de provas de autoria e dolo, sob o argumento de que, em tese, desconheceria as normas referentes ao anilhamento de aves silvestres, devido à pouca instrução e idade avançada; (ii) subsidiariamente, seja-lhe aplicada a atenuante do artigo 65, inciso I, do Código Penal, em razão de ter mais de setenta anos de idade na data da sentença, e, por conseguinte, seja reconhecida a prescrição de sua pretensão punitiva, à luz do benefício etário e como medida de política criminal.


I - DA AUSÊNCIA DE CONFLITO APARENTE DE NORMAS E DA INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO NO CASO CONCRETO

A despeito da posição adotada pelo magistrado sentenciante às fls. 128/129 da r. sentença e em consonância com o apelo ministerial nesse ponto, não há de se falar em conflito aparente de normas entre os tipos penais descritos no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal (uso indevido de anilha do IBAMA adulterada) e no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98 (guarda irregular de pássaros silvestres, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente), a resultar em equivocada absorção do primeiro (suposto delito-meio) pelo segundo (pretenso delito-fim), sendo de rigor o seu afastamento.

Cumpre observar que os tipos penais em epígrafe tutelam bens jurídicos distintos (o primeiro, a fé pública; o segundo, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, destacadamente, a fauna silvestre), além de decorrerem de condutas diversas e autônomas, razão pela qual não se vislumbra, na presente hipótese, a incidência do princípio da consunção (g.n.):

Artigo 296, § 1º, do Código Penal
Falsificação do selo ou sinal público
Art. 296 - Falsificar, fabricando-os ou alterando-os:
I - selo público destinado a autenticar atos oficiais da União, de Estado ou de Município;
II - selo ou sinal atribuído por lei a entidade de direito público, ou a autoridade, ou sinal público de tabelião:
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.
§ 1º - Incorre nas mesmas penas:
I - quem faz uso do selo ou sinal falsificado;
II - quem utiliza indevidamente o selo ou sinal verdadeiro em prejuízo de outrem ou em proveito próprio ou alheio.
III - quem altera, falsifica ou faz uso indevido de marcas, logotipos, siglas ou quaisquer outros símbolos utilizados ou identificadores de órgãos ou entidades da Administração Pública.
Artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98
Dos crimes contra a fauna
Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:
Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa.
§ 1º Incorre nas mesmas penas:
I - quem impede a procriação da fauna, sem licença, autorização ou em desacordo com a obtida;
II - quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural;
III - quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente.

A respeito da inaplicabilidade do princípio da consunção em face das mesmas condutas delitivas ora imputadas, em concurso material, na presente denúncia, colaciono emblemático aresto deste E-TRF3 (g.n.):

PENAL. CRIMES AMBIENTAIS. FALSIDADE DE SELO OU SINAL PÚBLICO. CRIMES CONTRA A FAUNA. PASSÁROS SILVESTRES EM CATIVEIRO SEM A NECESSÁRIA LICENÇA E COM ANILHAS ADULTERADAS. PROVA DA MATERIALIDADE E AUTORIA. NULIDADE DA PERÍCIA TÉCNICA. INEXISTENTE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. DESCABIMENTO. DOLO CONFIGURADO. APELAÇÃO DO RÉU DESPROVIDA.
1. Policiais federais e agentes do IBAMA estiveram na residência do apelante e deram cumprimento a mandado de busca e apreensão, ali encontrando 12 pássaros da fauna silvestre nacional de diversas espécies com anilhas, em doze gaiolas, cinco das quais incompatíveis com as características dos pássaros que ali se encontravam. Além disso, encontraram um papagaio sem qualquer identificação.
2. No tocante a alegação de imprestabilidade da prova pericial, como bem ressalvado pelo eminente juízo de primeiro grau por ocasião da sentença, a acusação não é de falsificação das anilhas para identificação de aves, mas sim, do uso de anilhas falsificadas, e ainda, não obstante constar a ausência de lacre quando do recebimento do material a ser periciado, o fato é que não há divergência em relação às anilhas apreendidas na residência do réu.
3. De qualquer forma, a prova técnica se baseou na elaboração de laudo documentoscópico e foi objeto de impugnação posterior pela defesa do apelante no curso da ação penal, sendo que durante o exercício regular do contraditório nenhuma prova foi capaz de elidi-la, sendo descabida a pretensão recursal neste tópico.
4. O apelante detinha licença da autoridade competente para a guarda de aves, porém, tal licença expirou em 31 de julho de 2008, ou seja, mais de um ano antes da data dos fatos. Todas as aves, portanto, estavam em situação irregular. A autoria é inconteste, sendo certo que os pássaros foram encontrados na residência do réu, configurando situação de flagrante delito, e o apelante não logrou êxito em provar que os pássaros apreendidos já foram adquiridos com as respectivas anilhas. Observo que o ora apelante é criador de pássaros e possuía familiaridade com os trâmites e procedimentos para a regularização da guarda das aves perante o IBAMA, não restando dúvida quanto à sua responsabilização, restando devidamente demonstrado o elemento subjetivo do tipo (dolo).
5. O apelante invoca em seu favor a aplicação do princípio da consunção, sob o argumento de que o delito previsto no artigo 296, § 1º, inciso III, do CP, constitui meio para a consecução do crime previsto no artigo 29, § 1º, inciso III, da Lei nº 9.605/98. Contudo, não há que se falar em absorção de um delito por outro. Os crimes pelos quais o apelante foi condenado tutelam bens jurídicos diversos e decorrem de ações diversas. A adulteração de anilhas não é crime de passagem para a consumação do delito de guarda ilegal de pássaros. As condutas são autônomas, sendo, portanto, inaplicável o princípio da consunção ao caso concreto em exame.
6. Apelação do réu desprovida.
(ACR 0009303-19.2009.4.03.6106, 2ª Turma - TRF3, Rel. Juiz Convocado Fernão Pompêo, e-DJF3 Judicial 1 18/12/2013, g.n.)

Portanto, fica devidamente afastada a aplicabilidade do princípio da consunção no caso em apreço.


II - DA MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS

Diversamente do sustentado pela defesa, os elementos de cognição demonstram que o criador amador SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO (CTF n. 1020319), de forma livre e consciente, mantinha, irregularmente, em cativeiro domiciliar, 03 (três) pássaros silvestres, consistentes em 01 (um) canário-da-terra (Sicalis flaveola brasiliensis), 01 (um) tempera-viola (Saltator maximus) e 01 (um) azulão-verdadeiro (Passerina brissonii), espécie esta considerada ameaçada de extinção, sem estarem devidamente anilhados (seja pela ausência de qualquer anilha de identificação, seja pelo visível alargamento dos diâmetros internos de suas anilhas "IBAMA 3,5 060827" e "SOSP 013 25 99 6"), inclusive portando relação de passeriformes desatualizada no endereço de seu plantel, em nítido desacordo com eventual licença, permissão ou autorização obtida junto ao órgão ambiental competente, nos termos do artigo 32, incisos II e III, da Instrução Normativa IBAMA n. 10/2011, os quais vieram a ser apreendidos por policiais militares ambientais, em 10/05/2014, durante a operação "Jubileu de Prata", na própria residência do acusado, no "Sítio Irmãos Visicato", no Município de Monte Aprazível/SP, além de incorrer, também de maneira livre e consciente, no uso indevido de 01 (uma) anilha, em tese, originalmente cadastrada pelo IBAMA e posteriormente adulterada/alargada (de diâmetro interno bastante superior ao normativamente permitido), mantida aposta pelo acusado no tarso do aludido tempera-viola ("IBAMA 3,5 060827"), no mesmo local e ocasião: Boletim de Ocorrência Ambiental n. 140418 (fls. 04/07) e respectivo relatório de fiscalização e aferição de anilhas (fl. 15); Auto de Infração Ambiental n. 300963 (fl. 08); Termo de Apreensão (fl. 09); Laudo Biológico (fl. 10); registro fotográfico das aves apreendidas durante a fiscalização (fl. 16); Auto de Apreensão das anilhas (fl. 19); Ofício n. 02027.000073/2015-13/ESREG/SP/IBAMA (fls. 39/40) com histórico SISPASS da anilha "IBAMA 04/05 3,5 060827" (fl. 41); Laudo Pericial n. 078/2015 referente às anilhas (fls. 45/50); Termo de Guarda para o Depósito das anilhas "IBAMA 04/05 060827" e "SOSP 013 26 99 6" (fl. 51), envelopadas à fl. 59; depoimentos das testemunhas em juízo (fls. 104-mídia/106); interrogatórios do réu em sede policial (fl. 30) e em juízo (fls. 104-mídia e 107).

Segundo apontado pelo Boletim de Ocorrência Ambiental n. 140418 (fls. 04/07) e respectivo relatório de fiscalização e aferição de anilhas (fl. 15), o acusado portava na ocasião "uma relação não atualizada de passeriformes" no endereço do plantel, sendo que "o azulão-verdadeiro e o tempera-viola apresentavam anilhas com bitolas maiores que as permitidas, que saíram do tarso das aves no momento da fiscalização, evidenciando possível falsificação ou adulteração", ao passo que "o canário-da-terra estava sem anilha de identificação" alguma, portanto, em nítido desacordo com o disposto no artigo 32, incisos II e III, da Instrução Normativa IBAMA n. 10, de 20/09/2011:

Art. 32 - Todos os Criadores Amadores e Comerciais de Passeriformes deverão: [...]
II - Manter todos os pássaros do seu plantel devidamente anilhados com anilhas invioláveis, não adulteradas, fornecidas pelo IBAMA ou fábricas credenciadas ou, ainda, por federações, clubes ou associações até o ano de 2001 ou por criadores comerciais autorizados.
III - Portar relação de passeriformes atualizada no endereço do plantel, conforme modelo do Anexo III.

Consoante o Ofício n. 02027.000073/2015-13/ESREG/SP/IBAMA (fls. 39/41), não foi encontrado qualquer registro no SISPASS relativamente à anilha "SOSP 26-06-2001 013", mas tão somente da anilha "IBAMA 04/05 3,5 060827", a qual, embora possa ter sido originalmente cadastrada pelo IBAMA, veio a ser, posteriormente, adulterada, em sintonia com o Laudo de Exame Pericial n. 078/2015 acostado às fls. 45/50 ("as medidas de diâmetros e altura eram incompatíveis tratando-se, portanto, de documento adulterado").

Ouvidos em juízo (fls. 104-mídia/106), os policiais militares ambientais e testemunhas comuns Jean Carlos Ambrosio e Rodrigo Victor Devechi confirmaram a fiscalização realizada, em 10/05/2014, no Sítio "Irmãos Visicato", onde foram recebidos pelo próprio acusado que lhes franqueara a entrada no local e colaborara com a diligência, tendo lhes apresentado, na ocasião, a sua relação de passeriformes, notadamente, desatualizada. A propósito, destacaram que, antes mesmo da aferição das bitolas das anilhas com o auxílio de um paquímetro, já haviam notado que as anilhas do tempera-viola e do azulão-verdadeiro (este último ameaçado de extinção), de tão alargadas (fl. 59), teriam saído, com facilidade, de seus respectivos tarsos nas mãos dos próprios agentes de fiscalização durante a vistoria, evidenciando, desde logo, sua possível adulteração por alargamento, que, de fato, restou constatada à fl. 15. Além disso, asseveraram que o "canário-da-terra" apreendido no mesmo local encontrava-se, na data dos fatos, desprovido de qualquer anilha de identificação.

No mais, o policial militar ambiental Jean Carlos Ambrosio recordou-se ainda que, anteriormente à vistoria de 10/05/2014 (uns cinco anos antes), em outra fiscalização realizada na residência do réu, mas na ausência deste, chegara a lavrar termo circunstanciado em nome de sua esposa, em razão de lá haver apreendido outras aves também desprovidas de anilhas na ocasião.

Interrogado em sede policial (fl. 35), o réu admitiu que há cerca de quinze anos é criador amador de passeriformes cadastrado no IBAMA e que, em maio de 2014, policiais ambientais lograram apreender em sua residência três pássaros silvestres, a saber, um "azulão", um "trinca-ferro" (sic, tempera-viola) e um "canário-da-terra". O "azulão" e o pretenso "trinca-ferro" teriam sido por ele adquiridos, já anilhados, em datas distintas, há cerca de dez anos, de um criador de São José do Rio Preto/SP, cujo nome afirma não se recordar. Já o "canário-da-terra" teria sido por ele capturado há poucos dias quando a referida ave veio a entrar no viveiro de outros pássaros seus, supostamente, à procura de comida.

Em seu interrogatório judicial (fls. 104-mídia e 107), o acusado veio a alterar sua versão inicialmente prestada em sede policial à fl. 35, passando a informar que, em verdade, teria "ganho" o "azulão" de sua própria filha, ao passo que o "tempera-viola" teria sido "comprado" de um amigo seu de Votuporanga/SP, cujo nome afirma igualmente não se recordar, ambos há mais de dez anos. Na sequência, passa a declarar, contraditoriamente, que nunca teria vendido ou comprado passeriformes, apenas os teria ganhado. Em relação ao "canário-da-terra", o qual, segundo ele, teria entrado na gaiola "por acidente" havia alguns dias (atrás de comida posta pelo acusado), admitiu, todavia, estar ciente de que não poderia mantê-lo em cativeiro desprovido de qualquer anilha (até mesmo em razão de outra apreensão anteriormente realizada em sua residência há uns dez anos, também por ausência de anilha em seus passeriformes), caindo, por terra, a frágil tese da defesa de que o acusado, supostamente, desconheceria as normas referentes ao anilhamento de aves silvestres, não obstante sua larga experiência enquanto criador amador de passeriformes, admitidamente, há mais de quinze anos, inclusive com cadastro no IBAMA, à míngua de eventual erro sobre a ilicitude dos fatos.

Destarte, restam incontestes a materialidade e autoria delitivas, assim como o dolo do réu, em relação à prática dos delitos previstos no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal, e no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da Lei 9.605/98, em concurso material, não se olvidando da natureza diversa dos bens jurídicos penalmente tutelados em cada um dos tipos penais em comento, respectivamente, a fé pública e a proteção ao meio ambiente (destacadamente, a fauna silvestre), nem havendo de cogitar, na hipótese, eventual erro sobre a ilicitude do fato ou mesmo sobre os elementos do tipo.



III - DA DOSIMETRIA

Em relação ao delito do artigo 296, § 1º, III, do Código Penal, fixo as penas-base no patamar mínimo legal, qual seja, 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, em consonância com o artigo 59 do mesmo diploma legal. A culpabilidade, as circunstâncias, os motivos e as consequências do delito mostraram-se normais à espécie delitiva. Além disso, não vislumbro nos autos elementos concretos acerca da personalidade e da conduta social do acusado, tampouco que sirvam como "maus antecedentes".

Ainda que se reconheça a atenuante prevista no artigo 65, inciso I, parte final, do Código Penal (o réu, de fato, tinha mais de setenta anos na data da sentença, tal como, acertadamente, observado pela defesa às fls. 165/166), a Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça adverte que "a incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal", como poderia, em tese, ser cogitado, razão pela qual preservo as sanções intermediárias em 02 (dois) anos de reclusão, e 10 (dez) dias-multa, relativamente ao delito em comento, à míngua de eventuais agravantes.

Na ausência de quaisquer causas de aumento ou diminuição, fixo definitivamente a pena privativa de liberdade de "SEBASTIÃO" em 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos (compatível à situação econômica do réu acostada às fls. 104-mídia e 107), pela prática do delito contra a fé pública capitulado no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal, nos moldes dos artigos 49, § 1º, e 68, do mesmo diploma legal.

No que se refere ao crime ambiental previsto no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98, mantenho as penas-base no patamar mínimo legal, qual seja, 06 (seis) meses de detenção, e 10 (dez) dias-multa, em consonância com o artigo 59 do mesmo diploma legal e ainda com o artigo 6º da Lei 9.605/98, nos termos da r. sentença. A culpabilidade, as circunstâncias, os motivos e as consequências do delito para a saúde pública e para o meio ambiente mostraram-se normais à espécie delitiva. Além disso, não vislumbro nos autos elementos concretos acerca da personalidade e da conduta social do acusado, tampouco que sirvam como "maus antecedentes".

A despeito do pugnado pela acusação à fl. 152 de suas razões recursais, não vislumbro na hipótese a ocorrência da agravante do artigo 15, inciso II, "q", da Lei 9.605/98, em razão de ter o agente cometido a infração atingindo espécie ameaçada de extinção (a saber, um azulão-verdadeiro), uma vez que tal circunstância, em verdade, qualifica o delito tipificado no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da Lei 9.605/98, sob a forma de causa de aumento especial, tal como, acertadamente, considerado na r. sentença:

Art. 15. São circunstâncias que agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: [...]
II - ter o agente cometido a infração: [...]
q) atingindo espécies ameaçadas, listadas em relatórios oficiais das autoridades competentes; [...]
Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:
Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa. [...]
III - quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente. [...]
§ 4º A pena é aumentada de metade, se o crime é praticado:
I - contra espécie rara ou considerada ameaçada de extinção, ainda que somente no local da infração; [g.n.]

Ademais, ainda que se reconheçam as atenuantes previstas no artigo 65, inciso I, parte final, do Código Penal (o réu, de fato, tinha mais de setenta anos na data da defesa, tal como, acertadamente, observado pela defesa às fls. 165/166), e no artigo 14, incisos I e IV, da Lei 9.605/98 (seja pelo baixo grau de instrução do acusado, seja por sua colaboração com os agentes encarregados da vigilância e controle ambiental, ora vislumbradas ex officio), a Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça adverte que "a incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal", como poderia, em tese, ser cogitado, razão pela qual preservo as sanções intermediárias em 06 (seis) meses de detenção, e 10 (dez) dias-multa, relativamente ao delito do artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98, à míngua de eventuais agravantes.

Na terceira fase da dosimetria de pena, mantenho, de resto, a incidência da causa de aumento especial prevista no artigo 29, § 4º, inciso I, da Lei 9.605/98 (ficando as penas intermediárias ora fixadas aumentadas de metade), em razão de o referido delito ambiental ter sido praticado, inclusive, contra espécie considerada ameaçada de extinção, a saber, 01 (um) azulão-verdadeiro (Passerina brissonii), nos termos do Anexo I do Decreto Estadual 56.031, de 20 de julho de 2010, em sintonia com o Laudo Biológico acostado à fl. 10.

Dessa forma, fixo definitivamente a pena privativa de liberdade de "SEBASTIÃO" em 09 (nove) meses de detenção, em regime inicial aberto, e 15 (quinze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, pela prática do delito capitulado no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da Lei 9.605/98, nos mesmos termos da r. sentença.

A propósito, não há de se cogitar o reconhecimento de prescrição antecipada ou virtual da pretensão punitiva, em consonância com a Súmula 438 do Superior Tribunal de Justiça ("É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal"), antes de eventual trânsito em julgado do presente acórdão para acusação.

Tampouco vislumbro nos autos a ocorrência de eventual prescrição de suas pretensões punitivas tendo em conta o máximo das penas privativas de liberdade abstratamente cominadas aos delitos previstos no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da Lei 9.605/98 (um ano e meio de detenção), e no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal (seis anos de reclusão), assim como o benefício etário a que o réu, de fato, faz jus em razão de dispor de mais de setenta anos de idade na data da sentença (fls. 36, 131 e 147), na forma dos artigos 109, III e V, 115, parte final, 117, e 119, todos do Código Penal.

Com efeito, as penas corporais definitivas dos delitos em comento devem ser somadas, em concurso material, à vista do artigo 69 do Código Penal, perfazendo o total de 02 (dois) anos e 09 (nove) meses de reclusão/detenção (executando-se primeiro a pena de reclusão).

Nos termos do artigo 33, §2º, "c", e §3º, do Código Penal, fixo o regime prisional inicial aberto.

A propósito, observo que, no concurso de crimes, as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente, na forma do artigo 72 do Código Penal.

Ademais, na forma do artigo 44, § 2º, segunda parte, do Código Penal, e do artigo 8º da Lei 9.605/98, substituo a soma das penas privativas de liberdade impostas a "SEBASTIÃO" por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo mesmo prazo da soma das penas substituídas, e prestação pecuniária no valor de 01 (um) salário-mínimo, destinada à União Federal.


IV - DA EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA

Em sessão de julgamento de 05 de outubro de 2016, o Plenário do Supremo Tribunal Federal entendeu que o artigo 283 do Código de Processo Penal não veda o início do cumprimento da pena após esgotadas as instâncias ordinárias, e indeferiu liminares pleiteadas nas Ações Declaratórias de Constitucionalidade 43 e 44.

Desse modo, curvo-me ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, que reinterpretou o princípio da presunção de inocência no julgamento do HC 126.292-SP, reconhecendo que "A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal".

Diante desse cenário, independentemente da pena cominada, deve ser determinada a execução provisória da pena decorrente de acórdão penal condenatório, proferido em grau de apelação.

Destarte, exauridos os recursos nesta Corte e interpostos recursos dirigidos às Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), expeça-se Carta de Sentença, bem como comunique-se ao Juízo de Origem para o início da execução da pena imposta ao réu, sendo dispensadas tais providências em caso de trânsito em julgado, hipótese em que terá início a execução definitiva da pena.


Ante o exposto, dou parcial provimento aos apelos da acusação e da defesa, apenas para: (i) condenar SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO em 02 (dois) anos de reclusão, e 10 (dez) dias-multa no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, também pela prática do delito contra a fé pública capitulado no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal, nos moldes dos artigos 49, § 1º, e 68, do mesmo diploma legal, afastando-se a incidência do princípio da consunção no caso concreto; (ii) reconhecer ao réu a atenuantes previstas no artigo 65, I, parte final, do Código Penal (relativamente a ambos os delitos imputados e atendendo nesse ponto ao pleito subsidiário da defesa), assim como no artigo 14, incisos I e IV, da Lei 9.605/98 (ora vislumbradas ex officio, no tocante ao delito ambiental), em que pese suas respectivas penas-base já houvessem sido fixadas no mínimo patamar legal, à míngua de quaisquer agravantes e nos limites da Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça, sem prejuízo da subsequente aplicação da causa especial de aumento de pena prevista no artigo 29, § 4º, I, da Lei 9.605/98, no que se refere ao crime ambiental; (iii) tendo em vista o concurso material entre os tipos penais descritos no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da Lei 9.605/98, e no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal, calculo a soma de suas penas corporais em 02 (dois) anos e 09 (nove) meses de reclusão/detenção, em regime inicial aberto, que ficam substituídas por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo mesmo prazo da soma das penas substituídas, e prestação pecuniária no valor de 01 (um) salário-mínimo, destinada à União Federal.

Comunique-se ao Juízo de Execução Criminal.


JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): JOSE MARCOS LUNARDELLI:10064
Nº de Série do Certificado: 71D062F09822A461
Data e Hora: 15/03/2017 15:32:05