D.E. Publicado em 11/09/2017 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação de Manoel da Silva Marques e à remessa oficial, tida por submetida, nos termos do voto do relator e, por maioria, dar provimento à apelação do Ministério Público Federal, nos termos do voto do Desembargador Federal Nelton dos Santos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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DECLARAÇÃO DE VOTO
Observo, de pronto, que a divergência que guardo em relação ao voto do e. relator é apenas parcial.
Com efeito, dissinto de Sua Excelência somente no que tange ao pedido de condenação do réu Manoel da Silva Marques ao pagamento de indenização pecuniária, que acolho sem prejuízo das demais obrigações reconhecidas pelo e. relator.
Para tanto, adoto como razões de decidir aquelas expendidas pelo e. Desembargador Federal Antonio Cedenho no feito n. 0007718-74.2010.4.03.6112/SP, por esta Turma julgado em 4 de agosto de 2016, verbis:
Ante o exposto, dou provimento à apelação do Ministério Público Federal para, sem prejuízo das demais obrigações já reconhecidas pelo e. relator, condenar o réu Manoel da Silva Marques também ao pagamento de indenização pecuniária, em valor a ser apurado em liquidação por arbitramento e a ser revertido em prol do Fundo Nacional do Meio Ambiente - FNMA.
É como voto.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelações e remessa oficial, tida por submetida, em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face de MANOEL DA SILVA MARQUES, objetivando combater e reparar dano ambiental causado nas margens do Rio Paraná - em local considerado de preservação permanente (APP), em razão de construção na área.
A sentença julgou parcialmente procedente a ação, para condenar o réu a: (a) demolir a construção edificada em área de preservação permanente, na Região do Porto Caiuá, Município de Naviraí/MS, descrito na inicial, com a remoção do entulho para local adequado; (b) apresentar projeto de recuperação das áreas degradadas - PRADE, sujeito à aprovação do IBAMA; e (c) proceder à recuperação da área da APP, às suas expensas, conforme PRADE e respectivo cronograma com eventuais adequações feitas pelo IBAMA, assinalando prazo de 90 (noventa) dias, a contar da intimação após o trânsito em julgado da sentença, para execução dos itens 'a' e 'b', restando o prazo de execução do item 'c', condicionado ao cronograma PRADE a ser apresentado. Em caso de descumprimento dos prazos fixados, deverá o réu arcar com multa de R$100,00 (cem reais) por dia. Não houve condenação em honorários advocatícios.
Apelou o réu, alegando: (1) a antropização e construção de origem do imóvel em data anterior à legislação ambiental; (2) o bem de raiz, originalmente de madeira, construído por volta das décadas de 1950/60, sofreu reforma por volta de 13 anos atrás, para a troca da madeira por alvenaria; (3) houve a urbanização de fato do local onde se situa o imóvel; (4) à luz dos princípios da proporcionalidade, da isonomia, da razoabilidade, da irretroatividade, da legalidade, da dignidade da pessoa humana (moradia e lazer) e da segurança jurídica seria lícito manter construção em área de preservação permanente, quando antropizada e já consolidada a sua construção original ao longo do tempo em época que não havia empecilho legal para construção em beira de rios; (5) o Código Florestal de 1934 não previa delimitação da faixa de proteção nas margens de rios ou cursos d'água; (6) o art. 61-A, caput e §12, da Lei 12.651/2012 autorizam a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008; e (7) não obstante ter sido recentemente criado o distrito urbano do Porto Cauiá, através da Lei Municipal 1.603/2011, fato incontroverso é que referido povoado já servia como área antropizada e urbana consolidada de fato, desde há muito tempo (décadas de 1940/50), quando não se tinha qualquer limitação administrativa, motivo pelo qual merece ser reformada a sentença para julgar improcedente a presente ação, afastando a demolição do imóvel do réu e demais ônus.
Por sua vez, apelou o MPF, alegando que: (1) a Lei 6.938/1981 admite a cumulação da condenação do poluidor ao pagamento de prestação pecuniária devida a título de indenização pelo dano causado ao meio ambiente e da obrigação de reparar o dano; (2) as formas de reparação do dano ambiental - restauração natural e prestação pecuniária - não possuem o mesmo objeto, enquanto a primeira tem por objeto reparar o dano direto e imediato, a segunda tem natureza diversa, seu objetivo é reparar aqueles danos indiretos, reflexos, que fogem da linha direta de ação provocada pela degradação, mas que, igualmente, ocasionam lesões ao meio ambiente; (3) no presente caso, foi constatada a existência junto à edificação de fossa negra para coleta de esgoto, a qual reduziu a qualidade das águas em razão da infiltração dos dejetos, concluindo o perito pela existência de poluição do solo; (4) o apelado ainda fez uso de recurso hídrico que não lhe pertence, mediante a instalação e utilização de poço semi-artesiano para abastecimento da edificação; (5) o apelado se apropriou de um bem inapropriável, com a finalidade de utilizá-lo para lazer, e dele vem se utilizando há aproximadamente 13 anos, assim, durante todo esse período, a coletividade teve a área usurpada, uma vez que um bem que é de interesse de todos e protegido pela legislação ambiental, foi utilizado egoisticamente para lazer e veraneio de um reduzido grupo de pessoas; (6) a fixação de prestação pecuniária constituiria instrumento apto a reverter à coletividade (já que destinada a um Fundo) aquilo de que o particular indevidamente se apropriou, uma vez que o meio ambiente é bem de todos, sendo imprescindível a fixação de prestação pecuniária, em patamar não inferior a R$15.000,00 (quinze mil reais) a ser depositada em favor do Fundo Nacional do Meio Ambiente.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo provimento da apelação do MPF e desprovimento do recurso do réu.
Os autos vieram-me conclusos e foram recebidos fisicamente no Gabinete em 24/01/2017, com inclusão em pauta para julgamento na sessão de 19/04/2017.
É o relatório.
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VOTO
Senhores Desembargadores, a presente ação civil pública foi ajuizada buscando a reparação de dano ambiental causado pela existência e manutenção de imóvel em área de preservação ambiental.
Consta dos autos, o PA-MPF/MS 1.21.001.000306/2006-74, instaurado para apurar crime contra o meio ambiente perpetrado por Manoel da Silva Marques, advindo de construção irregular às margens do Rio Paraná, na região de Porto Caiuá, Município de Naviraí/MS apontados no auto de infração 433821, termo de embargo 342269 e relatório de fiscalização oriundos do procedimento de fiscalização efetuado pelo IBAMA no processo 02040.000112/05-15, que aplicou multa de R$15.000,00.
No curso do procedimento administrativo do MPF foi requerida a instauração de inquérito policial à Polícia Federal de Naviraí/MS, originando o IPL 132/2007 - DPF/NVI/MS.
Posteriormente, o MPF requereu ao Setor Técnico Científico da Polícia Federal de Naviraí/MS a realização de exame pericial ambiental nas construções irregulares em APP na região de Porto Caiuá, que resultou no Laudo de Exame de Meio Ambiente 511/08 - SETEC/SR/DPF/MS, com o seguinte relato: "O local examinado está na margem direita do Rio Paraná em área de Preservação Permanente, e está ocupado com uma edificação destinada a lazer, em local de baixa declividade, próxima à barranca do rio. (...) se trata de área destinada à moradia temporária (para fins de lazer). A área possui urbanização com rede elétrica. O imóvel se caracterizava por ser construção em alvenaria, com reboco sem pintura, com piso cimentado, telhas de barro, com aproximadamente 55m² e distante 10 metros da margem do rio. (...) a edificação impede permanentemente a regeneração natural da vegetação nativa devido à cobertura, compactação e impermeabilização do solo.(...) A edificação está em espaço físico originalmente ocupada pela flora, o que provoca redução nos locais de refúgio, passagem e alimentação da fauna, (...), o diagnóstico da degradação ambiental de uma área deve sempre se basear em uma ampla análise da região envolvida, bem como suas inter-relações. No caso presente, considerando-se uma análise global da região, observa-se mais de duas dezenas de casas construídas próximas da localidade de Porto Caiuá. (...) A lei de crimes ambientais em seu artigo 48 tipifica como crime impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação" (f. 156/62).
No curso da presente ação foi deferida a produção de prova pericial para identificar o período em que foi erguida a edificação objeto da demanda, a existência de reformas e ampliações posteriores, a distância entre a construção e a margem do rio Paraná, dentre outros quesitos.
No laudo pericial (f. 401/7) e sua complementação (f. 432/8) apurou-se que o imóvel possui cerca de 13 anos, não havendo indícios de construções anteriores, distante em torno de 32 metros da margem do rio Paraná, possuindo uma rampa de acesso de barcos e pessoas até a margem do rio, com área construída de aproximadamente 45 m², abastecimento de água feito por poço semi-artesiano, ligado à rede elétrica e com fossa negra para a coleta do esgoto. A perícia constatou que a largura do rio Paraná é variável entre 2.300 metros a 1.600 metros, aproximadamente, e que, de acordo com a Lei 12.651/2012, a área mínima de vegetação às margens do rio é de 100 metros para áreas consolidadas e de 500 metros para rios com largura maior que 600 metros para áreas não consolidadas. A edificação encontra-se no entorno de unidade de conservação denominada Parque Estadual da Várzea do Rio Ivinhema, tratando-se de área de zona de amortecimento e de corredor ecológico da biodiversidade entre os Parques Nacional da Ilha Grande e o Parque Estadual do Ivinhema. A construção de edificações acarretou a eliminação da vegetação nativa e do espaço físico disponível para a circulação dos animais, com a introdução de espécies exóticas da flora, ocasionando a instabilidade e a poluição dos solos e a redução da qualidade das águas pela infiltração dos dejetos na fossa negra.
A Constituição Federal em seu artigo 225, caput e § 2º, assim trata do meio ambiente:
Na época dos fatos, vigorava o Código Florestal de 1965 (Lei 4.771/1965), dispondo sobre a área marginal dos rios:
Posteriormente, a Resolução CONAMA 303/2002 assim dispôs:
O atual Código Florestal (Lei 12.651/2012) manteve o regramento previsto na Lei 4.771/1965, no tocante às áreas marginais de rios:
Na espécie, considerando a legislação aplicável e a constatação da situação fática específica de que o rio Paraná possui largura variável entre 1.600 metros a 2.300 metros, consoante perícia técnica realizada, a área de preservação permanente a ser considerada é de 500 metros a partir da respectiva margem.
Nesse sentido, os precedentes deste Tribunal:
Logo, o imóvel autuado insere-se, de fato e de pleno direito, em área de preservação permanente.
Ademais, não é caso de aplicabilidade das normas do novo Código Florestal ou de alterações supervenientes, pois consolidou o Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que o novo regramento material tem eficácia ex nunc e não alcança fatos pretéritos, quando implicar a redução do patamar de proteção do meio ambiente sem necessária compensação.
Confira-se, a propósito:
Sequer cabe cogitar de direito adquirido à permanência do imóvel no local, por transcurso do tempo, dada a existência de ilícito, representado por construção em local proibido, suprimindo e impedindo regeneração da vegetação em área de preservação permanente.
Nesse sentido:
Evidencia-se, assim, a necessidade de demolição da construção, já que, se mantida na área de preservação permanente, a degradação ambiental seria perpetuada.
No que tange ao pedido de fixação de indenização, constata-se não ser cabível, considerando as várias obrigações a que foi o réu condenado, cujas despesas correrão sob sua responsabilidade (demolição, retirada do entulho, elaboração e execução de projeto de recuperação ambiental), privilegiando-se o cunho reparatório da sanção aplicada pela degradação ambiental.
O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da possibilidade de cumulação das sanções decorrentes de dano ambiental, ressalvando, porém, não ser obrigatória a indenização quando possível a recomposição ou saneamento da área degradada, consoante precedentes ora colacionados:
Por fim, a Lei de Ação Civil Pública proíbe que os autores sejam condenados em verba de sucumbência, salvo caso de litigância de má-fé (artigos 17 e 18), aplicando-se tal previsão não apenas ao Ministério Público, como a quaisquer dos legitimados ativos para a ação especial.
Por simetria, a jurisprudência estabelece o mesmo tratamento para o caso de procedência da ação civil pública:
Ante o exposto, nego provimento às apelações e à remessa oficial, tida por submetida.
É o voto.
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Data e Hora: | 19/04/2017 15:26:57 |