D.E. Publicado em 17/04/2017 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, afastar a preliminar arguida em contrarrazões, negar provimento ao AGRAVO RETIDO, dar parcial provimento à APELAÇÃO do IBAMA, apenas para afastar a fundamentação original da sentença de procedência, e - nos termos do artigo 515, §1º, do Código de Processo Civil/1973 - manter a sentença de procedência por fundamento diverso, declarando a nulidade do auto de embargo/interdição nº 017784-C de ofício, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de APELAÇÃO interposta pelo INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS (IBAMA) contra a sentença de procedência da AÇÃO ORDINÁRIA ajuizada por ADELINO JOSÉ FRANCO objetivando (1) a anulação do auto de infração nº 032618-D no valor de R$ 30.000,00, lavrado em 30/3/2005, bem como o cancelamento da Dívida Ativa lançada em seu nome e a exclusão do CADIN/BACEN e de outros órgãos de proteção ao crédito; (2) alternativamente, a possibilidade de apresentação de Plano de Recuperação de Área Degrada (PRAD).
Consoante a inicial, ADELINO JOSÉ FRANCO, proprietário de imóvel na margem do Rio Sucuriú, em Três Lagoas/MS, foi autuado pelo IBAMA por intervenção desautorizada em Área de Preservação Permanente (APP), além de ter a propriedade embargada/interditada. Essa situação, entretanto, não condiz com a realidade, pois o imóvel está situado em área urbana, ensejando recolhimento de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU); especificamente no entorno do reservatório artificial da Usina Hidrelétrica Jupiá, que possui APP de 30 metros (Resolução CONAMA 303/2002). Ademais, o IBAMA agiu de forma ilegal, com abuso de direito, sem espaço para o exercício da ampla defesa e do contraditório; e a multa não foi precedida de advertência (72, 3º, I da Lei nº 9.605/98). Deu-se à causa o valor de R$ 30.000,00 (fls. 2/20).
Em 26/10/2010, o feito foi distribuído a 1ª Vara Federal de Três Lagoas/MS (fls. 117).
Em 15/12/2010, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi deferido:
(fls. 119).
Contra essa decisão, o IBAMA interpôs o AGRAVO DE INSTRUMENTO nº 2011.03.001642-8, distribuído nessa Corte à relatoria do Desembargador Federal Lazarano Neto, que converteu o recurso em AGRAVO RETIDO (fls. 126/134, 135).
O Juízo a quo manteve a decisão por seus próprios fundamentos (fls. 138).
Em 10/4/2012 foi proferida a sentença de procedência:
(fls. 171/172)
O IBAMA, nas razões de APELAÇÃO, requer a apreciação do AGRAVO RETIDO; a reforma da sentença e a manutenção dos atos administrativos lavrados no exercício do seu poder de polícia ambiental, uma vez que o imóvel do autor se situa em APP de 100 metros do Rio Sucuriú (artigos 60 e 70 da Lei nº 9.605/98, 2º, "a", 3, da Lei nº 4.771/65, 3º, I, "c", da Resolução CONAMA nº 303/2002); o auto de infração observou todos os requisitos legais; a multa questionada pode ser aplicada independentemente de advertência prévia (artigo 72 da Lei nº 9.605/98) e foi fixada consoante os parâmetros legais (artigos 27 e 44 do Decreto nº 3.179/99); a inscrição no CADIN e na Dívida Ativa são medidas previstas após os tramites legais, que foram integralmente observados; subsidiariamente, caso a sentença seja mantida, a revisão da condenação ao pagamento dos honorários, para minoração do valor (fls. 177/196).
Nas contrarrazões o autor pugnou pelo não conhecimento do recurso, por ofensa ao princípio da dialeticidade, e no mérito, pela manutenção da sentença (fls. 199/204).
Em 14/1/2013 o feito foi distribuído nessa Corte, a minha relatoria (fls. 205).
A lei processual aplicável à espécie é a encerrada no Código de Processo Civil/1973.
É o relatório
VOTO
Afasto a preliminar de suposta ofensa ao princípio da dialeticidade suscitada nas contrarrazões, considerando que o IBAMA indicou com suficiência os motivos de direito e de fato que o levam a requerer a reforma da decisão, em suas razões de apelação. Nesse sentido:
Conheço o AGRAVO RETIDO interposto pelo IBAMA, devidamente reiterado nas razões de apelação, conforme artigo 532 do Código de Processo Civil/1973.
No mérito, sabe-se que ADELINO JOSÉ FRANCO, desde 29/7/1996, é o proprietário do imóvel de matrícula nº 32.398, situado no loteamento Recanto do Tucunaré, nº 10, na margem direita do Rio Sucuriú em Três Lagoas/MS, com área de 6.492,50 metros quadrados (fls. 25).
De acordo com a documentação colacionada pelo próprio autor, cuida-se de imóvel destinado ao lazer, com duas edificações em alvenaria, uma a 100 metros e outra a 66,19 metros do Rio Sucuriú, além de mureta de contensão em concreto, com aproximadamente 40 centímetros de altura, próxima à margem para impedir o depósito de sedimentos no leito do rio e, consequentemente, a erosão e o assoreamento. O imóvel possui sistema de distribuição de água e de escoamento de água pluvial, fossa séptica periodicamente drenada por empresa especializada e se localiza em área considerada urbana pelo município de Três Lagoas/MS, que recolhe IPTU e disponibiliza serviços de coleta de lixo e de energia elétrica (fls. 100/111).
Ainda segundo o autor, o loteamento Recanto do Tucunaré deriva do desmembramento de área outrora voltada à pecuária, responsável pela supressão da vegetação original, que posteriormente foi impactada pela formação do lago da Usina Hidrelétrica Engenheiro Souza Dias/Jupiá, sob a responsabilidade da Companhia Energética de São Paulo (CESP) (fls. 100/111).
Em 30/3/2005 o IBAMA, em ação fiscalizatória no imóvel, lavrou em desfavor de ADELINO JOSÉ FRANCO o auto de infração nº 032618-D, no valor de R$ 30.000,00, com fulcro nos artigos 60 e 70 da Lei nº 9.605/98, 2º, II e VII, do Decreto nº 3.179/99; 2º, "a", 3º, da Lei nº 4.771/65 e 10 da Lei nº 6.938/81, por ...construir rancho de alvenaria em área de preservação permanente na margem direita do rio Sucuriú... Na mesma ocasião, lavrou auto de embargo/interdição nº 017784-C da propriedade (fls. 28/29).
ADELINO JOSÉ FRANCO impugnou administrativamente o auto de infração nº 032618-D, sem sucesso. O IBAMA, entretanto, facultou-lhe a apresentação de PRAD, o que possibilitaria a redução da multa, conforme artigo 60 do Decreto nº 3.179/99 (fls. 31/57, 75/76).
Como ADELINO JOSÉ FRANCO não pagou a multa e nem apresentou o PRAD, o débito foi inscrito em Dívida Ativa em 10/9/2007, no valor atualizado à época em R$ 38.949,00, e seu nome incluído no CADIN/BACEN (fls. 80/84).
A discussão das partes prosseguiu em sede judicial, nesse feito, julgado procedente pelo Juízo Federal de primeiro grau, ao fundamento de que o auto de infração nº 032618-D é nulo por aplicar multa simples sem prévia advertência, nos termos do artigo 72 da Lei nº 69.605/98 - verbis:
Ocorre que essa premissa há muito foi afastada pela jurisprudência, que decidiu pela autonomia das penalidades previstas no artigo 72 da Lei nº 69.605/98 e pela inexistência de gradação e de condicionamento, de modo que a multa simples pode ser aplicada pela autoridade administrativa ambiental sem prévia imposição de advertência. A saber:
Diante desse quadro, assiste razão ao IBAMA, que na apelação refutou a tese adotada na sentença.
Não obstante, não se trata de caso de provimento integral do recurso do órgão ambiental nesse ponto, uma vez que o auto de infração nº 032618-D contém nulidade diversa, não observada pelo Juízo a quo, cuja análise realizo com fulcro no artigo 515 do Código de Processo Civil/1973.
Como já exposto, o auto de infração nº 032618-D impôs a multa de R$ 30.000,00 porque ADELINO JOSÉ FRANCO construiu rancho de alvenaria em APP na margem direita do Rio Sucuriú, com fulcro nos artigos 60 e 70 da Lei nº 9.605/98, 2º, II e VII, do Decreto nº 3.179/99; 2º, "a", 3º, da Lei nº 4.771/65 e 10 da Lei nº 6.938/81 (fls. 28/29).
A Lei nº 4.771/65, que encerrava o Código Florestal em vigor á época dos fatos, dispunha:
Assim, a fiscalização considerou que o imóvel do autor adentrava APP de 100 metros, ao teor do artigo 2º, "a", 3º, da Lei nº 4.771/65, sem identificar a distância das construções em relação ao Rio Sucuriú.
Mas a documentação que acompanha a inicial inclui um laudo técnico ambiental providenciado pelo próprio autor, que afirma que as edificações estão a 40 centímetros (muro contensão), 66,19 metros (casa sede) e 100 metros (casa do caseiro) da margem do rio, em trecho de represamento para formação do lago da Usina Hidrelétrica Engenheiro Souza Dias/Jupiá; que se trata de imóvel urbano, com recolhimento de IPTU pelo município de Três Lagoas/MS, conforme guia de pagamento (fls. 61, 100/111).
O IBAMA, na contestação, apenas reafirmou a informação contida no auto de infração nº 032618-D acerca da APP de 100 metros, sem refutar a alegação do autor de que a propriedade está na margem de lago artificial em área urbana consolidada, levando à incidência da regra do artigo 2º, "b", da Lei nº 4.771/65 e, consequentemente, da Resolução CONAMA nº 302/2002, que dispõe sobre os parâmetros, definições e limites de APP de reservatórios artificiais e regime de uso do entorno.
Esse fato chama a atenção porque na cópia do processo administrativo nº 02043.000260/0205-29/IBAMA/MMA, consta um parecer da Procuradoria Federal Especializada - IBAMA, de 22/12/2008, certificando que ADELINO JOSÉ FRANCO além de não ter quitado a multa, não apresentou recurso ou pedido de reconsideração nos prazos adequados, perdendo o direito a qualquer revisão processual na esfera administrativa, mesmo diante do entendimento do Grupo de Trabalho criado pela Portaria Conjunta IBAMA-IMASUL nº 3, de 22/12/2007, ...de que as autuações incidentes nas áreas urbanas localizadas totalmente fora da faixa de 30 metros sejam canceladas, e as parcialmente nessa faixa tenham o valor das multas adequado ao percentual da área impactada dentro da APP de 30 metros... (fls. 87).
Ou seja, subentende-se pelo referido documento que a alegação do autor de que a propriedade está na margem de lago artificial em área urbana consolidada não é absolutamente infundada e, também, que o IBAMA se esquivou de enfrentar tal questão nesses autos.
Com efeito, existindo diversas nuances nas normas de regência das APP, especialmente no que tange à metragem a ser respeitada, torna-se imperioso para a configuração do ilícito a exata localização das edificações autuadas, bem como a distância das mesmas em relação ao recurso hídrico devidamente especificado, o que não se verifica no auto de infração nº 032618-D, que imputou multa de R$ 30.000,00 por invasão de APP de 100 metros a ADELINO JOSÉ FRANCO mediante descrição absolutamente imprecisa - CONSTRUIR RANCHO DE ALVENARIA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NA MARGEM DIREITA DO RIO SUCURIÚ (fls. 28).
Desse modo, em razão da inexistência de aferição exata da localização do imóvel (perímetro urbano ou rural; margem do Rio Sucuriú propriamente dito ou do trecho de represamento para formação do lago da Usina Hidrelétrica Engenheiro Souza Dias/Jupiá) e da distancia das edificações em relação ao recurso hídrico, cai por terra o ímpeto punitivo do IBAMA.
Nesse sentido são os seguintes julgados dessa Corte:
Assim, sem reparo a sentença que manteve a decisão que antecipou os efeitos da tutela e declarou a nulidade do auto de infração nº 032618-D, no valor de R$ 30.000,00, lavrado em 30/3/2005 pelo IBAMA em desfavor de ADELINO JOSÉ FRANCO, mas por fundamento diverso - descrição incompleta do ilícito supostamente cometido.
E, de ofício, declaro a nulidade do auto de embargo/interdição nº 017784-C também lavrado em 30/3/2005 pelo IBAMA em desfavor de ADELINO JOSÉ FRANCO, em complemento ao auto de infração nº 032618-D.
No mais, fica mantida a condenação do IBAMA em honorários advocatícios de 10% do valor da causa, com fulcro no artigo 20 do Código de Processo Civil/1973, plenamente adequada à hipótese dos autos.
Por todo o exposto, voto para afastar a preliminar arguida em contrarrazões, negar provimento ao AGRAVO RETIDO, dar parcial provimento à APELAÇÃO do IBAMA, apenas para afastar a fundamentação original da sentença de procedência, e - nos termos do artigo 515, §1º, do Código de Processo Civil/1973 - manter a sentença de procedência por fundamento diverso, declarando a nulidade do auto de embargo/interdição nº 017784-C de ofício.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 31/03/2017 16:23:44 |