Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 03/05/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001851-17.2007.4.03.6109/SP
2007.61.09.001851-1/SP
RELATORA : Juíza Federal em Auxílio LOUISE FILGUEIRAS
APELANTE : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO : SP101797 MARIA ARMANDA MICOTTI e outro(a)
: SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
APELADO(A) : RAMIRA YJAZI TONIN PROGETTE
ADVOGADO : SP171728 MARCELO GONÇALVES ROSA e outro(a)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. CONSITUCIONAL. LICENÇA GESTANTE. SERVIDORA PÚBLICA NOMEADA CUJO FILHO NASCEU ANTES DA POSSE. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E PROTEÇÃO INTEGRAL À FAMÍLIA. INTERPRETAÇÃO CONFORME DO ARTIGO 227 DA LEI 8112/90.
1. Consta dos autos que a impetrante, Servidora Pública Federal, foi nomeada em 19/01/2007 para o cargo de técnico previdenciário e que em 22/01/2007 deu à luz seu filho, e teve os benefícios de salário maternidade e licença gestante negados em virtude de o nascimento ter sido anterior à posse, que se deu no dia 09/02/2007, tenho entrado em exercício na data de 23/02/2007.
2. A situação específica dos autos comporta o mesmo tratamento dado à servidora gestante durante ou depois da posse, pois a licença gestante é um direito assegurado à mulher em prol da saúde, bem estar e desenvolvimento da criança, principalmente, e não há lógica possível que autorize discriminar a situação em tela do ponto de vista da proteção à criança, escopo da norma, daquelas de servidoras que tomaram posse antes do nascimento de seus filhos.
3. A Constituição Federal prevê, expressamente, que a proteção à criança, ao adolescente e ao jovem é dever do Estado, da família e sociedade, com absoluta prioridade em termos de direitos fundamentais.
4. Cabe ao Judiciário interpretar a norma conforme a Constituição Federal, de modo que com ela não conflite, dentro do possível. Assim a expressão "servidora gestante" contida o artigo 207, "caput", da Lei 8.112/90 não pode ser impeditiva da concessão do direito na hipótese, e a melhor interpretação reza que se inclua no conceito legal a servidora que iniciou o processo de investidura no cargo ainda gestante, mesmo que aperfeiçoado o ato em momento ulterior ao nascimento da criança.
5. Apelação do INSS e remessa oficial às quais se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 24 de abril de 2017.
LOUISE FILGUEIRAS
Juíza Federal em Auxílio


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001851-17.2007.4.03.6109/SP
2007.61.09.001851-1/SP
RELATORA : Juíza Federal em Auxílio LOUISE FILGUEIRAS
APELANTE : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO : SP101797 MARIA ARMANDA MICOTTI e outro(a)
: SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
APELADO(A) : RAMIRA YJAZI TONIN PROGETTE
ADVOGADO : SP171728 MARCELO GONÇALVES ROSA e outro(a)

RELATÓRIO

Apelação e remessa oficial, tida por interposta, em mandado de segurança em face de sentença que deferiu a ordem para determinar que as autoridades impetradas concedessem à impetrante o benefício de licença gestante previsto no arts. 102 e 207 da Lei 8112/90, a partir da data de nascimento de seu filho (fls. 84/87).
Apela o INSS alegando que o benefício é indevido, pois na data em que tomou posse do cargo público a impetrante não era mais gestante, isto é, seu filho nasceu antes da posse, portanto não teria direito ao benefício.
Contrarrazões apresentadas, fls. 106/112.
Parecer do Ministério Público Federal pela concessão da segurança, fls. 116/117, verso.


VOTO

A sentença há que ser mantida.

Consta dos autos que a impetrante, servidora pública federal, foi nomeada em 19/01/2007 para o cargo de técnico previdenciário e que em 22/01/2007 deu à luz seu filho, e teve os benefícios de salário maternidade e licença gestante negados em virtude de o nascimento ter sido anterior à posse, que ocorreu no dia 09/02/2007, tendo entrado em exercício na data de 23/02/2007.

Como bem ressaltado pelo Ministério Público Federal em seu parecer (fls. 77/80):
"Muito embora a investidura em cargo público aperfeiçoe-se com a posse e exercício - efetivo desempenho das atribuições (art. 15, caput, da Lei nº 8.112/90) - sendo, pois, um processo iniciado com a nomeação do indivíduo aprovado em concurso público, não se pode olvidar que a finalização desse processo muitas vezes independe da vontade do indivíduo, que fica à mercê dos atos da Administração para a definição de local para a realização de exame médico e agendamento de data para a posse."

No caso dos autos, a impetrante prestou o concurso em 2004, mas só foi nomeada três dias antes do nascimento do seu filho, ainda gestante, portanto. O nascimento, porém, deu-se entre este ato e a posse, que foi apenas 18 dias depois do parto.

A situação específica dos autos comporta o mesmo tratamento dado à servidora que está gestante durante e/ou depois da posse, pois a licença gestante é um direito assegurado à mulher em prol da saúde, bem estar e desenvolvimento da criança, principalmente, e não há lógica possível que autorize discriminar a situação em tela do ponto de vista da proteção à criança, escopo da norma, daquelas de servidoras que tomaram posse antes do nascimento de seus filhos.

Isso porque o nascimento ocorreu durante o processo de investidura em cargo público, processo já deflagrado com o provimento do cargo pela nomeação.

Na lição de Hely Lopes Meirelles,

"Tratando-se de cargo público, após concurso, segue-se o provimento do cargo, através da nomeação do candidato aprovado. A nomeação é o ato de provimento de cargo que se completa com a posse e exercício" (Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, 42ª edição, pg. 546).

Seria evidente afronta ao princípio da isonomia negar o direito à impetrante e a seu filho, portanto, pois só autoriza discriminação diante de um fator de discrímen que guarde correlação lógica com a diferença de tratamento pretendida, na célebre lição de Celso Antônio Bandeira de Mello.

Além disso, não se pode esquecer que a Constituição Federal prevê, expressamente, que a proteção à criança, ao adolescente e ao jovem é dever do Estado, da família e sociedade, com absoluta prioridade em termos de direitos fundamentais, na forma seguinte:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)
§ 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes preceitos: (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)
I - aplicação de percentual dos recursos públicos destinados à saúde na assistência materno-infantil;
(...)
Portanto, a interpretação literal da lei, feita pela Administração não é a que decorre da análise sistemática do ordenamento jurídico, e das normas constitucionais protetivas aplicáveis à espécie. É certo que o legislador ordinário não pode prever todas as situações fáticas possíveis de ocorrer, por isso, necessária a edição de normas internas e regulamentos para situações específicas, dado o dever de ater-se ao quanto disposto na lei pela Administração. Porém, se instado a tanto, ao Judiciário cabe interpretar a norma conforme a Constituição Federal, de modo a preservá-la, sem que com a Lei Maior conflite em sua aplicação, dentro do possível.

Assim a expressão "servidora gestante" contida o artigo 207, "caput", da Lei 8.112/90 não pode ser impeditiva da concessão do direito na hipótese, e a melhor interpretação reza que se inclua no conceito legal a servidora que iniciou o processo de investidura com a nomeação, ainda gestante, mesmo que aperfeiçoado o ato em momento ulterior ao nascimento da criança.

Posto isso, nego provimento à apelação e à remessa oficial.

É como voto.


LOUISE FILGUEIRAS
Juíza Federal em Auxílio


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 24/04/2017 18:23:42