Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 05/06/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002510-07.2013.4.03.6112/SP
2013.61.12.002510-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal NELTON DOS SANTOS
APELANTE : EDUARDO OLIVO CINTRA e outros(as)
: ADAO ODORIZZI
: JOSE PAULO FLAUZINO
: JOSE ROBERTO GONZALEZ
ADVOGADO : SP159779 KARINA ALVES GONZALEZ SIMONETTI e outro(a)
APELANTE : Ministerio Publico Federal
PROCURADOR : LUIS ROBERTO GOMES e outro(a)
APELANTE : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 LUIZ CARLOS DE FREITAS
APELADO(A) : OS MESMOS
APELADO(A) : JOSE APARECIDO DURANTE
ADVOGADO : SP238633 FABIO LOPES DE ALMEIDA e outro(a)
APELADO(A) : MARCIO ROBERTO DE ALEXANDRE e outros(as)
: ONOFRE PANZARINI
: FLAVIO GARDIN
ADVOGADO : SP121613 VINICIUS DA SILVA RAMOS e outro(a)
APELADO(A) : JORGE CARLOS GALLEGO
ADVOGADO : SP238633 FABIO LOPES DE ALMEIDA e outro(a)
APELADO(A) : DARCI DE ALMEIDA
ADVOGADO : GO024304 CLAUDIMIR JUSTINO BORAZIO e outro(a)
No. ORIG. : 00025100720134036112 3 Vr PRESIDENTE PRUDENTE/SP

EMENTA

DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE PASSIVA DOS ATUAIS PROPRIETÁRIOS/POSSUIDORES DO IMÓVEL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURADA. DANO AMBIENTAL. EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. LEI N. 12.651/2012. RETIRADA DAS EDIFICAÇÕES EXISTENTES NA FAIXA PROTETIVA.
1. Trata-se de ação civil pública em que se busca a reparação do dano ambiental causado em área de preservação permanente (APP), às margens do Rio Paraná, consubstanciado na supressão e corte da vegetação, além do impedimento à regeneração natural, em razão da construção de rancho no local.
2. Submete-se ao duplo grau de jurisdição obrigatório a sentença que reconhecer a carência da ação ou julgar improcedente, no todo ou em parte, o pedido deduzido em sede de ação civil pública, por força da aplicação analógica da regra contida no artigo 19 da Lei n. 4.717/65.
3. Nos casos de reparação de danos ambientais causados em área de preservação permanente, a obrigação é propter rem, aderindo ao título de domínio ou posse, independente da efetiva autoria da degradação ambiental, de modo que a legitimidade passiva dos réus decorre da aquisição da propriedade em questão, sendo irrelevante para o deslinde da causa quem efetivamente edificou o imóvel.
4. No tocante à alegação de cerceamento de defesa, razão não assiste aos réus, pois a parte interessada deixou de recorrer oportunamente da decisão que indeferiu a produção de prova pericial, restando a questão preclusa.
5. Considera-se área de preservação permanente, relativamente ao Rio Paraná - o qual possui um leito de mais de 2.300 (dois mil e trezentos) metros de largura - a faixa marginal de largura mínima de 500 (quinhentos) metros desde a borda da calha do leito regular.
6. Tratando das áreas de preservação permanente, o artigo 61-A do novo Código Florestal, incluído pela Medida Provisória nº 571/2012, convertida na Lei nº 12.727/2012, autoriza "exclusivamente, a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008". Não é protegida, portanto, toda e qualquer intervenção consolidada até referida data, mas apenas a continuidade de certas atividades consolidadas até então.
7. In casu, mostra-se despropositada a afirmação de que seria possível equiparar a utilização do rancho às atividades de "ecoturismo" ou de "turismo rural". O ecoturismo pressupõe a cultura ou a difusão da ideia de proteção ao meio ambiente; e turismo rural simplesmente não existe em um imóvel caracterizado, basicamente, por uma casa.
8. Além disso, cumpre registrar que o reconhecimento por parte do Município de que um determinado local é área urbana ou consolidada não afasta a aplicação da legislação ambiental, até mesmo porque depende de prévia autorização do órgão ambiental competente, fundamentada em parecer técnico, para supressão da vegetação na área de preservação permanente, o que não ocorreu na hipótese em análise, pois houve a ocupação e construção clandestina, sem qualquer autorização do Poder Público.
9. E ainda que assim não fosse, o reconhecimento da área urbana consolidada ou da área rural consolidada depende da comprovação de que a área não ofereça risco à vida ou à integridade física das pessoas, nos termos dos artigos 61-A, § 12, e 65 da Lei n. 12.651/2012.
10. No entanto, no caso sub judice, a permanência dos réus no local coloca em risco sua própria segurança, tendo em vista que a construção ali existente adentra ao próprio leito do rio.
11. O E. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que é possível a cumulação das sanções decorrentes de dano ambiental, ressalvando, porém, não ser obrigatória a indenização quando possível a recomposição ou saneamento da área degradada.
12. No caso vertente, a indenização foi fixada no importe de R$ 1.000,00 (mil reais) e deve ser assim mantida, a uma, em razão da ausência de recurso acerca desta questão por parte dos réus, e a duas, para privilegiar o cunho reparatório da sanção aplicada pela degradação ambiental, até mesmo porque a perícia técnica atestou a viabilidade da regeneração da vegetação nativa, com a demolição da intervenção antrópica e implantação de plano de reflorestamento.
13. Uma vez evidenciado, portanto, o dano ambiental causado pela construção e consequente permanência em área de preservação permanente, de rigor a demolição do rancho em questão, em observância ao limite de 500 (quinhentos) metros do leito do Rio Paraná, mantendo-se as demais determinações constantes da sentença, exceto em relação à construção de fossa séptica, que resta prejudicada diante da demolição do imóvel.
14. Precedentes.
15. Apelação dos réus desprovida.
16. Apelação ministerial parcialmente provida.
17. Apelação da União e remessa necessária providas.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação dos réus, DAR PROVIMENTO PARCIAL à apelação ministerial e DAR PROVIMENTO à apelação da União e à remessa necessária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 24 de maio de 2017.
NELTON DOS SANTOS
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002510-07.2013.4.03.6112/SP
2013.61.12.002510-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal NELTON DOS SANTOS
APELANTE : EDUARDO OLIVO CINTRA e outros(as)
: ADAO ODORIZZI
: JOSE PAULO FLAUZINO
: JOSE ROBERTO GONZALEZ
ADVOGADO : SP159779 KARINA ALVES GONZALEZ SIMONETTI e outro(a)
APELANTE : Ministerio Publico Federal
PROCURADOR : LUIS ROBERTO GOMES e outro(a)
APELANTE : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 LUIZ CARLOS DE FREITAS
APELADO(A) : OS MESMOS
APELADO(A) : JOSE APARECIDO DURANTE
ADVOGADO : SP238633 FABIO LOPES DE ALMEIDA e outro(a)
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: ONOFRE PANZARINI
: FLAVIO GARDIN
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APELADO(A) : JORGE CARLOS GALLEGO
ADVOGADO : SP238633 FABIO LOPES DE ALMEIDA e outro(a)
APELADO(A) : DARCI DE ALMEIDA
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No. ORIG. : 00025100720134036112 3 Vr PRESIDENTE PRUDENTE/SP

RELATÓRIO

O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator): Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face de José Aparecido Durante e outros requerendo, em síntese, a reparação do dano ambiental causado em área de preservação permanente (APP), às margens do Rio Paraná, consubstanciado na supressão e corte da vegetação, além do impedimento à regeneração natural, em razão da construção de rancho no local.


O pedido de antecipação da tutela foi deferido para determinar aos réus que se abstenham de realizar qualquer nova construção em área de preservação permanente e/ou inseridas nos limites da APA das ilhas e várzeas do Rio Paraná, com a paralisação de todas as atividades antrópicas, principalmente no que diz respeito a iniciar, dar continuidade ou concluir qualquer obra ou edificação (banheiros, fossas sépticas, aparelhos de lazer), bem como o despejo, no solo ou nas águas, de qualquer espécie de lixo doméstico ou de demais materiais ou substâncias poluidoras; para que se abstenham de promover ou permitir a supressão de qualquer tipo de cobertura vegetal do referido imóvel, sem a autorização do órgão competente (CBRN, IBAMA e ICMBio); e para que não concedam o uso da área ocupada a qualquer interessado. Na oportunidade, o juízo a quo aplicou uma multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais) em caso de descumprimento da determinação (f. 49-50).


A União foi incluída no polo ativo da demanda, na qualidade de assistente litisconsorcial do MPF (f. 57).


Decretou-se a revelia dos réus Eduardo Olivo Cintra e José Paulo Flauzino, pois, devidamente citados, não apresentaram contestação (f. 467-469).


Ao final, o MM Juiz a quo julgou parcialmente procedente a ação, sob o fundamento de que se trata de rancho de pesca e lazer, consolidado como imóvel rural, conforme disposto no artigo 61-A, § 4º, inciso II, da Lei n. 12.651/2012. Nestes termos, condenou os réus Eduardo Olivo Cintra, José Paulo Flauzino, José Roberto Gonzalez e Darci de Almeida, atuais possuidores do imóvel: a) na obrigação de fazer consistente em demolir e remover todas as edificações (rampas, garagens, portões e etc), cercas, fossa negra, ou qualquer outra intervenção efetuada dentro da área de preservação permanente de 20 metros de largura (no mínimo), em projeção horizontal, medida a partir da borda da calha do leito regular do rio, no prazo máximo de 90 dias após sua intimação; b) na obrigação de não fazer consistente em não promover qualquer outra eventual intervenção em referida área; c) na obrigação de fazer consistente em reflorestar toda a área de preservação permanente degradada nos termos da alínea "a" - inclusive os locais onde se fez a limpeza da vegetação - sob a supervisão do IBAMA, CBRN ou CETESB, e de acordo com a legislação vigente, devendo: c.1) entregar ao órgão competente, no prazo de 60 (sessenta) dias, contado da intimação, projeto de recuperação ambiental, elaborado por técnico devidamente habilitado, onde deverá estar incluído o cronograma das obras e serviços; c.2) iniciar a implantação do projeto de recuperação ambiental da área de preservação permanente, no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data de sua aprovação pelo órgão competente, devendo obedecer todas as exigências e recomendações feitas pelo referido órgão, que forem compatíveis com a recuperação a ser realizada; d) na obrigação de fazer consistente em construir ou adaptar, caso já existente, fossa séptica de acordo com as orientações do IBAMA, CBRN ou CETESB, e de acordo com a legislação ambiental e sanitária vigente. Condenou os réus, ainda, a pagar indenização pelos danos ambientais causados, no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), na data da sentença, em favor do Fundo Constitucional de Interesses Difusos e Coletivos, e estabeleceu em R$ 500,00 (quinhentos reais) a multa diária em caso de descumprimento da sentença. Outrossim, deixou de fixar a condenação em honorários advocatícios, em razão da simetria (f. 552-559).


O réu Márcio Roberto de Alexandre opôs embargos de declaração (f. 562-563), os quais foram acolhidos para sanar a omissão apontada na sentença (f. 564).


O Ministério Público Federal apelou, sustentando, em síntese, que:


a) a faixa marginal a ser preservada no Rio Paraná é de 500 metros a partir da borda da calha do leito regular do rio, nos termos do artigo 4º, I, "e", da Lei n. 12.651/2012, razão pela qual o rancho em questão encontra-se totalmente inserido em APP;


b) o artigo 9º, § 2º, da Resolução CONAMA n. 369/06 veda a regularização de ocupações localizadas em áreas consideradas de risco de inundações, como no caso em comento, em que há inundações sazonais ocasionadas pelo aumento do nível do rio;


c) o fato de a construção ter sido edificada no passado não confere o direito de os proprietários continuarem interferindo em área de preservação permanente, pois inexiste direito adquirido quando se trata de direito ambiental;


d) a indenização fixada em R$ 1.000,00 (mil reais) não é suficiente para reparar a área degradada, sendo de rigor sua majoração.


A União interpôs apelação, aduzindo, em suma, que:


a) a APP, in casu, corresponde à faixa horizontal de 500 metros, inexistindo direito adquirido à degradação ambiental;


b) "admitir a preponderância de lei municipal sobre direito ambiental federal, implicaria autorizar os Municípios à redução da extensão de APP definida no Código Florestal, bem como legitimá-los a criar zonas administrativas de intervenção antrópica em área de preservação permanente, violando o próprio Código" (f. 606).


A apelação dos réus não foi recebida por ser intempestiva (f. 656).

O réu Eduardo Olivo Cintra e os demais proprietários do imóvel interpuseram recurso adesivo, alegando que:


a) à época em que adquiriram o terreno dos demais réus, no ano de 2013, as construções já existiam no local, o que os torna parte passiva ilegítima no feito, pelo fato de que não foram os causadores dos supostos danos ambientais na APP;


b) o indeferimento do pedido de realização de prova pericial configura cerceamento do direito de defesa, pois fere frontalmente o disposto no artigo 5º, X e XII, da CF/1988, tornando o processo nulo;


c) a sentença deve ser anulada diante da violação ao princípio da legalidade e da valoração incorreta da prova, pois tanto a APP quanto o tamanho da área construída foram definidos de forma equivocada e não condizentes com a realidade dos fatos;


d) a Sra. Geni Gomes Ramos de Oliveira foi a responsável pela construção do rancho, motivo pelo qual deve figurar no polo passivo da demanda;


e) o novo Código Florestal trouxe a possibilidade de regularização fundiária em área urbana consolidada, mesmo tratando-se de área de preservação permanente, o que desde já requer, pois a demolição das edificações trará mais prejuízos ao meio ambiente.


Com contrarrazões dos réus (f. 657-690), do Ministério Público Federal (f. 734-750) e da União (f. 752-757), vieram os autos a este Tribunal.


A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra da e. Dra. Laura Noeme dos Santos, opinou pelo provimento das apelações do Ministério Público Federal e da União (f. 759-763).


É o relatório.


NELTON DOS SANTOS
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002510-07.2013.4.03.6112/SP
2013.61.12.002510-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal NELTON DOS SANTOS
APELANTE : EDUARDO OLIVO CINTRA e outros(as)
: ADAO ODORIZZI
: JOSE PAULO FLAUZINO
: JOSE ROBERTO GONZALEZ
ADVOGADO : SP159779 KARINA ALVES GONZALEZ SIMONETTI e outro(a)
APELANTE : Ministerio Publico Federal
PROCURADOR : LUIS ROBERTO GOMES e outro(a)
APELANTE : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 LUIZ CARLOS DE FREITAS
APELADO(A) : OS MESMOS
APELADO(A) : JOSE APARECIDO DURANTE
ADVOGADO : SP238633 FABIO LOPES DE ALMEIDA e outro(a)
APELADO(A) : MARCIO ROBERTO DE ALEXANDRE e outros(as)
: ONOFRE PANZARINI
: FLAVIO GARDIN
ADVOGADO : SP121613 VINICIUS DA SILVA RAMOS e outro(a)
APELADO(A) : JORGE CARLOS GALLEGO
ADVOGADO : SP238633 FABIO LOPES DE ALMEIDA e outro(a)
APELADO(A) : DARCI DE ALMEIDA
ADVOGADO : GO024304 CLAUDIMIR JUSTINO BORAZIO e outro(a)
No. ORIG. : 00025100720134036112 3 Vr PRESIDENTE PRUDENTE/SP

VOTO

O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator): Submete-se ao duplo grau de jurisdição obrigatório a sentença que reconhecer a carência da ação ou julgar improcedente, no todo ou em parte, o pedido deduzido em sede de ação civil pública, por força da aplicação analógica da regra contida no artigo 19 da Lei n. 4.717/65. Realizo, pois, de ofício, o reexame necessário, nos termos do artigo 496 do Código de Processo Civil.


Analiso, inicialmente, as preliminares arguidas pela parte ré.


Cumpre asseverar que, nos casos de reparação de danos ambientais causados em área de preservação permanente, a obrigação é propter rem, aderindo ao título de domínio ou posse, independente da efetiva autoria da degradação ambiental, de modo que a legitimidade passiva dos réus decorre da aquisição da propriedade em questão, sendo irrelevante para o deslinde da causa quem efetivamente edificou o imóvel.


Nesse sentido, os precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça:


"ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA . ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. FORMAÇÃO DA ÁREA DE RESERVA LEGAL. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. SÚMULA 83/STJ. PREJUDICADA A ANÁLISE DA DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. SUPERVENIÊNCIA DA LEI 12.651/12. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO IMEDIATA. IRRETROATIVIDADE. PROTEÇÃO AOS ECOSSISTEMAS FRÁGEIS. INCUMBÊNCIA DO ESTADO. INDEFERIMENTO. 1. A jurisprudência desta Corte está firmada no sentido de que os deveres associados às APPs e à Reserva Legal têm natureza de obrigação propter rem, isto é, aderem ao título de domínio ou posse, independente do fato de ter sido ou não o proprietário o autor da degradação ambiental. Casos em que não há falar em culpa ou nexo causal como determinantes do dever de recuperar a área de preservação permanente. 2. Prejudicada a análise da divergência jurisprudencial apresentada, porquanto a negatória de seguimento do recurso pela alínea "a" do permissivo constitucional baseou-se em jurisprudência recente e consolidada desta Corte, aplicável ao caso dos autos. (...) Agravo regimental improvido." (AgRg no AREsp 327.687/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, DJe 26/08/2013). (grifei)
"AMBIENTAL. LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. FUNÇÃO ECOLÓGICA DA PROPRIEDADE. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. MÍNIMO ECOLÓGICO. DEVER DE REFLORESTAMENTO. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. ART. 18, § 1º, DO CÓDIGO FLORESTAL de 1965. REGRA DE TRANSIÇÃO. 1. Inexiste direito ilimitado ou absoluto de utilização das potencialidades econômicas de imóvel, pois antes até "da promulgação da Constituição vigente, o legislador já cuidava de impor algumas restrições ao uso da propriedade com o escopo de preservar o meio ambiente" (EREsp 628.588/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, Primeira Seção, DJe 9.2.2009), tarefa essa que, no regime constitucional de 1988, fundamenta-se na função ecológica do domínio e posse. (...) 3. "A obrigação de reparação dos danos ambientais é propter rem" (REsp 1.090.968/SP, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 3.8.2010), sem prejuízo da solidariedade entre os vários causadores do dano, descabendo falar em direito adquirido à degradação. O "novo proprietário assume o ônus de manter a preservação, tornando-se responsável pela reposição, mesmo que não tenha contribuído para o desmatamento. Precedentes" (REsp 926.750/MG, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, DJ 4.10.2007; em igual sentido, entre outros, REsp 343.741/PR, Rel. Min. Franciulli Netto, Segunda Turma, DJ 7.10.2002; REsp 843.036/PR, Rel. Min. José Delgado, Primeira Turma, DJ 9.11.2006; EDcl no Ag 1.224.056/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 6.8.2010; AgRg no REsp 1.206.484/SP, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 29.3.2011; AgRg nos EDcl no REsp 1.203.101/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Primeira Turma, DJe 18.2.2011). Logo, a obrigação de reflorestamento com espécies nativas pode "ser imediatamente exigível do proprietário atual, independentemente de qualquer indagação a respeito de boa-fé do adquirente ou de outro nexo causal que não o que se estabelece pela titularidade do domínio" (REsp 1.179.316/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 29.6.2010). (...) 5. Recurso Especial não provido". ..EMEN:(RESP 201100461496, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:11/09/2012 ..DTPB:.) (grifei)
"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ALÍNEA "A" DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 284 DO STF, POR ANALOGIA. CONCLUSÕES DA ORIGEM. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7 DESTA CORTE SUPERIOR. ALÍNEA "C" DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE DIVERGÊNCIA ATUAL. 1. Trata-se de ação em que se pretende a indenização em virtude de limitação administrativa perpetrada pelo art. 4º do Código Florestal, que veda a supressão de mata ciliar em área de preservação permanente. (...) 4. Quanto à aludida extinção da pretensão de reparação do dano ambiental, mediante recomposição da área, impõe-se notar que esta Corte já se sedimentou no sentido da imprescritibilidade desta. Precedentes. 5. No que tange à apontada divergência jurisprudencial, não há como se falar em divergência atual, o que torna possível aplicar ao caso a Súmula n. 83/STJ. Em verdade, o Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que a obrigação de recuperar a degradação ambiental ocorrida na faixa da reserva legal ou área de preservação permanente abrange aquele que é titular da propriedade do imóvel, mesmo que não seja de sua autoria a deflagração do dano, tendo em consideração a sua natureza propter rem. Precedentes. 6. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido." (REsp 1247140/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/11/2011, DJe 01/12/2011) (grifei)

Sendo assim, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva dos réus e de legitimidade passiva da proprietária anterior.

No tocante à alegação de cerceamento de defesa, razão não assiste aos réus, pois a parte interessada deixou de recorrer oportunamente da decisão que indeferiu a produção de prova pericial, restando a questão preclusa.


Insta salientar que os pedidos relacionados à violação ao princípio da legalidade e à valoração incorreta da prova se confundem com o mérito e naquele momento serão apreciados.


Superadas as preliminares, passo à apreciação do mérito.


A presente ação civil pública foi ajuizada inicialmente em face de José Aparecido Durante, Márcio Roberto Alexandre, Onofre Panzarini, Jorge Carlos Gallego e Flávio Gardin, os quais adquiriram o imóvel da Sra. Geni Gomes Ramos de Oliveira, no ano de 2005.


No curso da demanda, sobreveio a informação de que os réus venderam o rancho para Eduardo Olivo Cintra, Adão Odorizzi, José Paulo Flauzino e João Roberto Gonzalez, no ano de 2013, o que ensejou o aditamento da inicial para inclusão dos novos proprietários no polo passivo da lide. O réu Adão Odorizzi, por sua vez, afirmou ter doado sua parte do imóvel para Darci de Almeida, o qual confirmou o fato e também foi incluído no polo passivo.


Pois bem. O imóvel em questão situa-se no bairro Beira Rio, no Município de Rosana, às margens do Rio Paraná.


O ponto nodal da questão refere-se à natureza do local em que o rancho foi construído, se consistente em área de preservação permanente (APP), tal como defendido pelo MPF, em área urbana consolidada, conforme alegado pelos réus, ou em área rural consolidada (rancho de pesca e lazer), consoante reconhecido na sentença.


Especificamente acerca da área marginal dos rios, preconizava o artigo 2º da Lei nº 4.771/65, Código Florestal vigente à época da autuação dos réus:


"Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será: (Redação dada pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989)
(....)
5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros".

Sobreveio a Resolução CONAMA n. 303/2002, assim dispondo:


"Art. 2º Para os efeitos desta Resolução, são adotadas as seguintes definições:
(...)
XIII - área urbana consolidada: aquela que atende aos seguintes critérios:
a) definição legal pelo poder público;
b) existência de, no mínimo, quatro dos seguintes equipamentos de infra-estrutura
urbana:
1. malha viária com canalização de águas pluviais,
2. rede de abastecimento de água;
3. rede de esgoto;
4. distribuição de energia elétrica e iluminação pública;
5. recolhimento de resíduos sólidos urbanos;
6. tratamento de resíduos sólidos urbanos; e
c) densidade demográfica superior a cinco mil habitantes por km2.
Art. 3º Constitui Área de Preservação Permanente a área situada:
I - em faixa marginal, medida a partir do nível mais alto, em projeção horizontal, com largura mínima, de:
(...)
e) quinhentos metros, para o curso d'água com mais de seiscentos metros de largura";

O atual Código Florestal (Lei n. 12.651/2012) manteve as disposições da Lei nº 4.771/65, no que tange às áreas marginais de rios, conforme segue:


"Art. 4º  Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei:
I - as faixas marginais de qualquer curso d'água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de:      (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
(...)
e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros."

Do cotejo da legislação em comento com o caso concreto versado nos autos, conclui-se que se considera área de preservação permanente, relativamente ao Rio Paraná - o qual possui um leito de mais de 2.300 (dois mil e trezentos) metros de largura - a faixa marginal de largura mínima de 500 (quinhentos) metros desde a borda da calha do leito regular.


Muito embora não se saiba a época exata da construção do rancho, vê-se que a legislação, desde a entrada em vigor do primeiro Código Florestal, estabelecia uma faixa protetiva de 500 metros para os rios cuja largura fosse superior a 600 metros.


Ademais, tratando das áreas de preservação permanente, o artigo 61-A do novo Código Florestal, incluído pela Medida Provisória nº 571/2012, convertida na Lei nº 12.727/2012, autoriza "exclusivamente, a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008". Não é protegida, portanto, toda e qualquer intervenção consolidada até referida data, mas apenas a continuidade de certas atividades consolidadas até então.


Segundo o consagrado dicionário Houaiss, o vocábulo "turismo" pode ser compreendido como a "ação ou efeito de viajar, basicamente com fins de entretenimento e eventualmente com outras finalidades" ou como o "conjunto de atividades econômicas associadas a essa atividade e dependentes dos turistas". Nenhuma dessas acepções amolda-se à manutenção de rancho particular, com finalidade de lazer próprio.


No caso específico dos autos, chega a ser despropositada a afirmação de que se poderia equiparar a utilização do rancho às atividades de "ecoturismo" ou de "turismo rural". O ecoturismo pressupõe a cultura ou a difusão da ideia de proteção ao meio ambiente; e turismo rural simplesmente não existe em um imóvel caracterizado, basicamente, por uma casa.


Além disso, cumpre registrar que o reconhecimento por parte do Município de que um determinado local é área urbana ou consolidada não afasta a aplicação da legislação ambiental, até mesmo porque depende de prévia autorização do órgão ambiental competente, fundamentada em parecer técnico, para supressão da vegetação na área de preservação permanente, o que não ocorreu na hipótese em análise, pois houve a ocupação e construção clandestina, sem qualquer autorização do Poder Público.


E ainda que assim não fosse, o reconhecimento da área urbana consolidada ou da área rural consolidada depende da comprovação de que a área não ofereça risco à vida ou à integridade física das pessoas, nos termos dos artigos 61-A, § 12, e 65 da Lei n. 12.651/2012.


Segundo o Relatório Técnico de Vistoria, acostado às f. 87-99 dos autos em apenso, a largura do Rio Paraná no local é superior a 500 metros. Informa, ainda, a presença de fossa negra no bairro Beira Rio, o que leva invariavelmente à contaminação do solo e das águas subterrâneas, pois, com as constantes ocorrências de inundações na área, por ocasião das cheias, ocorre o contato direto dos resíduos presentes nas fossas negras (dejetos humanos) com as águas do rio. Por fim, afirma que "a medida inicial para recompor a APP é promover a retirada das construções e de qualquer outra intervenção resultante das atividades humanas no local" (f. 90).


De acordo com o Laudo de Perícia Criminal Federal Ambiental produzido pelo Núcleo de Criminalística da Polícia Federal, o bairro Beira Rio encontra-se totalmente inserido na faixa de proteção marginal de 500 metros e as edificações são simples, sobre palafitas, devido à ocorrência de enchentes sazonais. Os peritos verificaram a presença de energia elétrica no local e a ausência de malha viária com canalização de águas pluviais, de rede de abastecimento de água e de redes de esgoto e águas pluviais (utilização de fossas e/ou descarte diretamente no rio). O laudo apurou, ainda, que os danos observados são decorrentes da remoção da vegetação nativa, solo e implantações de áreas impermeabilizadas na APP das margens do Rio Paraná, e que a utilização antrópica do local impede o restabelecimento da vegetação, podendo trazer novos danos ambientais em razão do lançamento de efluentes (esgotos), ocupação irregular das margens e de áreas de várzeas alagáveis sem o competente licenciamento ambiental (f.123-152 dos autos em apenso).


Com efeito, colhe-se das declarações prestadas pelos réus Márcio Roberto Alexandre, Onofre Panzarini e Jorge Carlos Gallego que o imóvel foi construído a cerca de 5 metros da margem do rio, estando inserido, portanto, em APP.


Nota-se que a permanência dos réus no local coloca em risco sua própria segurança, tendo em vista que a construção ali existente adentra ao próprio leito do rio.


Dessa maneira, não há se falar em direito adquirido, porquanto desde 1965, ou seja, muito tempo antes da construção do rancho, a faixa marginal de 500 metros já era considerada como área de preservação permanente, o que comprova a irregularidade da edificação.


Uma vez evidenciado o dano ambiental causado pela construção e consequente permanência em área de preservação permanente, devem ser os proprietários ou possuidores condenados a reparar o meio ambiente, em cumprimento ao mandamento constitucional previsto no art. 225, §2º, da Constituição Federal).


Assim, de rigor a demolição do rancho denominado G-5, localizado no lote 13, no bairro Beira-Rio, em Rosana/SP, em observância ao limite de 500 (quinhentos) metros do leito do Rio Paraná, mantendo-se as demais determinações constantes da sentença, exceto em relação à construção de fossa séptica, que resta prejudicada diante da demolição do imóvel.


No que diz respeito à indenização, o E. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que é possível a cumulação das sanções decorrentes de dano ambiental, ressalvando, porém, não ser obrigatória a indenização quando possível a recomposição ou saneamento da área degradada. Veja-se:


"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. FUNDAMENTO GENÉRICO. SÚMULA 284/STF. CUMULAÇÃO DE AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM INDENIZAÇÃO. REPARAÇÃO TOTAL DA ÁREA DEGRADADA. PEDIDO INDENIZATÓRIO INDEFERIDO. REVER POSICIONAMENTO DO TRIBUNAL A QUO. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ.
1. A alegada ofensa ao art. 535 do CPC foi apresentada de forma genérica pelo recorrente, tendo em vista que não demonstrou, de maneira clara e específica, a ocorrência de omissão no julgado, atraindo, assim, o enunciado da Súmula 284 da Suprema Corte. 2. Este STJ entende que, em casos de danos ambientais, é perfeitamente possível a cumulação de indenização em conjunto com obrigação de fazer, entretanto isso não seria obrigatório, e estaria adstrito à possibilidade ou não de recuperação total da área degradada. 3. Uma vez entendido pelo Tribunal de origem que o referido dano pode ser integralmente reparado, a revisão dessas premissas fáticas de julgamento esbarra no óbice disposto na Súmula 7/STJ. 4. Agravo regimental a que se nega provimento". (AgRg no AREsp 628.911/SC, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/06/2015, DJe 01/07/2015) (grifei)
"PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL. VERIFICAÇÃO DO CUMPRIMENTO INTEGRAL DO PRAD. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7 DO STJ. DISSIDIO JURISPRUDENCIAL NÃO CARACTERIZADO. HIPÓTESE EM QUE HOUVE A REPARAÇÃO INTEGRAL DO DANO SEM PREJUÍZOS REMANESCENTES. CUMULAÇÃO DE AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM AÇÃO INDENIZATÓRIA. INOCORRÊNCIA DE DANO REMANESCENTE OU REFLEXO. REPARAÇÃO TOTAL DA ÁREA DEGRADADA. PEDIDO INDENIZATÓRIO INDEFERIDO. RECURSO ESPECIAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO NÃO CONHECIDO E RECURSO ESPECIAL DO IBAMA IMPROVIDO. 1. Recursos especiais nos quais se discute se o saneamento total do dano, bem como o cumprimento integral do Plano de Recuperação da Área Degradada - PRAD, ilidem a necessidade de indenização. 2. No caso dos autos, o Tribunal de origem indeferiu o pedido de indenização, por entender que a área em questão já havia sido completamente restaurada, nos termos do PRAD, não havendo existência de outros prejuízos. 3. O Superior Tribunal de Justiça tem externado o entendimento de que as ações de obrigação de fazer podem ser cumuladas com as indenizatórias; e que nem sempre a recomposição da área degradada ou o saneamento do dano provocado ilide a necessidade de indenização. Todavia, esse entendimento não implica a conclusão de que, sempre, será devida a indenização, pois, quando é possível a completa restauração, sem que se verifique ter havido dano remanescente ou reflexo, não há falar em indenização. (REsp 1198727/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/08/2012, DJe 09/05/2013). 4. Além do mais, concluir de forma diferente do que foi decidido pelo Tribunal de origem, com relação à indenização, demandaria a incursão em matéria fático-probatória, o que não é permitido, por óbice da Súmula 7 do STJ. (...) Recurso especial do Ministério Público não conhecido e recurso especial do IBAMA improvido." (REsp 1382999/SC, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/08/2014, DJe 18/09/2014) (grifei)

No caso vertente, a indenização foi fixada no importe de R$ 1.000,00 (mil reais) e deve ser assim mantida, a uma, em razão da ausência de recurso acerca desta questão por parte dos réus, e a duas, para privilegiar o cunho reparatório da sanção aplicada pela degradação ambiental, até porque a perícia técnica atestou a viabilidade da regeneração da vegetação nativa, com a demolição da intervenção antrópica e implantação de plano de reflorestamento.


Nesse sentido, os seguintes precedentes desta Corte Regional:

"PROCESSO CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EXPLORAÇÃO IRREGULAR DE ÁREAS DE VÁRZEA E DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. RANCHO DE LAZER EM LOTE À MARGEM DO RIO PARANÁ. DANOS DECORRENTES DE ATIVIDADE ANTRÓPICA. ABSTENÇÃO DE UTILIZAÇÃO OU EXPLORAÇÃO. DEMOLIÇÃO DAS CONSTRUÇÕES. REMOÇÃO DOS ENTULHOS. RECOMPOSIÇÃO DA COBERTURA VEGETAL. 1. Rejeita-se o alegado cerceamento de defesa ante o indeferimento das provas requeridas pelos réus. De fato, a par da robusta prova técnica carreada para os autos, tais como Informação Técnica do IBAMA, Laudo de Vistoria do Núcleo de Criminalística da Polícia Federal, do Instituto de Criminalística, e do Centro Técnico Regional V - Presidente Prudente, da Coordenadoria de Biodiversidade e Recursos Naturais, verifica-se que, facultada às partes a oportunidade para tanto, deferida a pericial, com a determinação de que fosse realizada pela CBRN - Coordenadoria de Biodiversidade e Recursos Naturais, decisão contra a qual não se insurgiram. 2. Trata-se de ação civil pública para fins de cessar exploração irregular de imóvel situado em áreas de várzea e de preservação permanente (rancho situado na Av. Erivelton Francisco de Oliveira, Estrada da Balsa, Bairro Beira-Rio, Município de Rosana/SP), com demolição e remoção dos entulhos, cumulada com recomposição e indenização dos danos causados ao meio ambiente, bem como pagamento de importância necessária à execução das medidas, em caso de eventual descumprimento. 3. Segundo relatório técnico de vistoria, da Coordenadoria de Biodiversidade e Recursos Naturais - Centro Técnico Regional de Presidente Prudente, trata-se de área à margem esquerda do Rio Paraná, considerada de preservação permanente - APP, nos termos do inciso 5, da alínea "a", do artigo 2°, da Lei Federal nº 4.771/65 (Código Florestal) e alínea "e", inciso I, do artigo 3°, da Resolução CONAMA nº 303/2002, ou seja, dentro da faixa marginal de 500 metros, em curso d'água com largura superior a 600 metros. (...) 13. A responsabilidade objetiva do poluidor pela reparação dos danos ambientais tem respaldo constitucional (artigo 225, §3º, Constituição Federal) e legal (artigo 14, §1º, Lei 6.938/1981). 14. A cumulação da reparação com indenização pelos danos ambientais, ainda que não se trate de compensação, somente é cabível quando estes não possam ser integral e imediatamente reparados, situação que não se verifica no caso dos autos, em que perícias técnicas na área degradada constataram a possibilidade de regeneração total da mata nativa, com a implantação das medidas de demolição das construções, remoção de entulhos e plantio de mudas. 15. Quanto ao pedido de condenação dos réus para que recolham valores destinados à execução das providências de demolição e recuperação da área degradada, na eventualidade de descumprimento da tutela específica, suficiente a cominação de multa diária de R$500,00, o que cumpre a função de compelir estes à prática das medidas determinadas, sem necessidade de se arbitrar outros valores, em caso de configuração desta hipótese. A multa, nos termos do artigo 13, caput, da Lei 7.347/85, reverterá ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD), que, no caso específico, "tem por finalidade a reparação dos danos causados ao meio ambiente" (Decreto Presidencial nº 1.306/94). 16. Precedente de minha relatoria: AC 0005289-37.2010.403.6112 (D.E. 19/05/2014). 17. Remessa oficial, tida por submetida, a que se dá parcial provimento e apelos do MPF, da UNIÃO e dos réus desprovidos." (TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AC 0003806-69.2010.4.03.6112, Rel. JUIZ CONVOCADO ROBERTO JEUKEN, julgado em 06/11/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/11/2014)
"AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL. RANCHO DE LAZER CONSTRUÍDO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (MARGEM ESQUERDA DO RIO PARANÁ, A 1,50 METROS DO CURSO D'ÁGUA), EM GLEBA LOTEADA CLANDESTINAMENTE. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. APELAÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E DOS RÉUS. RESPEITO A POSTURAS PROTETIVAS DO MEDIO AMBIENTE EDITADAS PELAS AUTORIDADES COMPETENTES: OBRIGAÇÃO PROPTER REM. O CONAMA É O ÓRGÃO COMPETENTE PARA DELIBERAR SOBRE O TEMA (APPs). MANTIDA A CONDENAÇÃO À REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL: DEMOLIÇÃO NECESSÁRIA PARA A RECOMPOSIÇÃO FLORESTAL (MATA ATLÂNTICA). A CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÕES DE FAZER, NÃO FAZER E INDENIZAR, EMBORA POSSÍVEL, NÃO É OBRIGATÓRIA (CASO EM QUE PODE SER DISPENSADA). REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA DESPROVIDA E RECURSOS VOLUNTÁRIOS DESPROVIDOS. 1. Apelações interpostas pelos réus, pelo Ministério Público Federal e pela União Federal contra a sentença que julgou parcialmente procedente a ação civil pública ambiental, com pedido de tutela antecipada ratificada. 2. Os réus são possuidores de um rancho de lazer construído em perímetro rural irregularmente loteado como área urbana, na margem esquerda do Rio Paraná, no município de Rosana/SP, considerado Área de Preservação Permanente/APP nos termos dos artigos 2º, V, a, da Lei nº 4.771/65 e 3º, I, e, da Resolução CONAMA nº 303/2002. 3. De acordo com a perícia realizada pela Secretaria do Meio Ambiente/Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais e com Relatório Técnico Ambiental do IBAMA, a edificação existente, situada a 1,50 metros da margem esquerda do Rio Paraná, impede a formação florestal da Mata Atlântica, cuja recomposição depende da total desocupação do local. (...) 7. Correta a condenação dos réus à reparação do dano ao meio ambiente, nos termos da sentença, o que inclui - em apertada síntese - a demolição da construção, com remoção do entulho para local apropriado; a recomposição da cobertura florestal, mediante plantio de vinte e cinco mudas de espécies nativas da região; a incidência de multa diária de R$ 500,00, em caso de descumprimento. 8. A ordem de demolição não é desproporcional e sem razoabilidade, mas necessária à reparação do dano ambiental causado pela construção desautorizada e ilegal em APP, decorrente do loteamento clandestino dessa faixa de terra. As fotografias juntadas aos autos retratam um barracão de alvenaria sem reboco, mal cuidado, na beirada desbarrancada do rio - o que foi corroborado nas perícias realizadas. Ademais, consoante o relatório do IBAMA, tudo indica que o rancho não possui fossa séptica e lança seus dejetos diretamente no rio, sem qualquer tipo de tratamento, por meio de uma tubulação fora dos padrões técnicos recomendados. 9. No que tange ao dever de indenizar, o STJ firmou entendimento, muito bem explicitado no julgamento do REsp 1198727/MG, de relatoria do Ministro HERMAN BENJAMIN, de que a condenação - cumulativa e simultânea - em obrigações de fazer, não fazer e indenizar, calcada nos princípios da reparação integral, do poluidor-pagador e do usuário-pagador, não configura bis in idem. 10. De outro lado, o STJ também sedimentou que a cumulação de obrigações de fazer, não fazer e indenizar embora possível, não é obrigatória, dependendo das especificidades de cada caso (STJ - REsp 1319039/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, julgado em 16/4/2013; TRF3 - AC 02035494619944036104, Rel. Des. Fed. REGINA COSTA, 7/12/2011) 11. Na hipótese dos autos, a perícia técnica quantificou a recuperação da área em R$ 3.622,00 e o dano ambiental em R$ 52,16, tendo em vista o tamanho do terreno - 170,4 metros quadrados. Diante desse contexto, o Juízo sentenciante privilegiou o dever de reparar, sintetizado na demolição da construção e no reflorestamento da área, com imposição de multa diária em caso de descumprimento, em detrimento do dever de indenizar, não pela impossibilidade de cumulação, mas por considerá-lo descabido, desnecessário, ante a situação fática. 12. Remessa oficial tida por interposta, nos termos do artigo 19 da Lei da Ação Civil Pública c/c artigo 475, I, do Código de Processo Civil, desprovida, assim como as apelações." (TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, AC 0007841-72.2010.4.03.6112, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, julgado em 12/12/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/01/2014) (grifei)

Ante o exposto, voto por NEGAR PROVIMENTO à apelação dos réus, DAR PROVIMENTO PARCIAL à apelação ministerial e DAR PROVIMENTO à apelação da União e à remessa necessária para reconhecer como área de preservação permanente a faixa de 500 metros de largura, em projeção horizontal, medida a partir da borda da calha do Rio Paraná, mantendo-se as demais determinações constantes da sentença, exceto em relação à construção de fossa séptica, que resta prejudicada diante da demolição do imóvel.


Proceda a Subsecretaria à renumeração dos autos a partir da f. 607.


NELTON DOS SANTOS
Desembargador Federal Relator


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