Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 18/12/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007747-87.2015.4.03.6100/SP
2015.61.00.007747-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : SARAIVA E SICILIANO S/A
ADVOGADO : SP359187 CLÓVIS GIMENES SILVA NETO e outro(a)
APELADO(A) : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : SP000003 JULIO CÉSAR CASARI E CLAUDIA AKEMI OWADA
No. ORIG. : 00077478720154036100 10 Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

CONSTITUCIONAL, PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. TEORIA DA CAUSA MADURA. ART. 515, § 3º, CPC/73. APLICAÇÃO DE ALÍQUOTA ZERO DO PIS E DA COFINS AOS LEITORES DE LIVROS DIGITAIS "LEV" IMPORTADOS PELA IMPETRANTE. ART. 28, VI, DA LEI 10.865/2004, C/C ART. 2º, PARÁGRAFO ÚNICO, II E VI, DA LEI 10.753/2003. TESE ANÁLOGA À DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DO ART. 150, VI, "D", DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRECEDENTE DO STF EM REPERCUSSÃO GERAL (RE 330817/RJ). EQUIPAMENTO QUE SE ENQUADRA NO CONCEITO DE EXCLUSIVIDADE DE USO. INTERPRETAÇÃO FINALÍSTICA DA NORMA. PRECEDENTE DESTA CORTE REGIONAL. DIREITO LÍQUIDO E CERTO EVIDENCIADO. SEGURANÇA CONCEDIDA. RECURSO PROVIDO.
1 - Inicialmente, tenho que aplicável o art. 515, § 3º, do Código de Processo Civil de 1973 à espécie, em conformidade com a teoria da causa madura, considerando-se a data de prolação da sentença bem assim que o feito encontra-se devidamente instruído com prova pré-constituída, de modo a amparar o direito dito líquido e certo da impetrante, dispensando-se a dilação probatória.
2 - Pretende a impetrante, via do presente mandado de segurança, a aplicação de alíquota zero referente ao PIS e à COFINS incidentes sobre os leitores eletrônicos de livros digitais "LEV" por ela importados, nos termos em que dispõe o art. 28, VI, da Lei 10.865/2004, c/c art. 2º, parágrafo único, II e VI, da Lei 10.753/2003, sob o argumento de que referido dispositivo eletrônico tem por única finalidade proporcionar a leitura de livros em formato digital.
3 - Hipótese análoga à questão posta nos autos foi recentemente debatida quando do julgamento do RE 330.817/RJ, submetido ao regime de repercussão geral, em sessão de julgamento realizada em 08 de março deste ano, ocasião em que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em decisão unânime e nos termos do voto do relator, fixou a seguinte tese: "A imunidade tributária constante do art. 150, VI, d, da CF/88 aplica-se ao livro eletrônico (e-book), inclusive aos suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo".
4 - Desta feita, a recente decisão do Supremo Tribunal Federal estendeu a imunidade tributária conferida ao livro impresso em papel ao livro digital, bem como ao suporte utilizado para sua fixação. Esse suporte, no caso dos autos, caracteriza-se por ser um dispositivo eletrônico (leitor de livros digitais ou e-reader) que permite a leitura de livros digitais (e-book). O fato do leitor de livro eletrônico apresentar outras funcionalidades acessórias, desde que rudimentares, não descaracteriza sua função principal que é a de servir de instrumento para a leitura do livro digital. Mutatis mutandis, aplica-se à hipótese em tela a mesma linha de raciocínio, não obstante tratar-se aqui de aplicação de alíquota zero de tributo, tendo em vista a coincidência da fundamentação a embasar a concessão do benefício tributário pleiteado.
5 - Da análise dos autos, verifica-se que o leitor eletrônico de livros digitais "LEV" importado pela impetrante possui funções acessórias à leitura de livros digitais, tais como armazenamento de documentos e imagens e a possibilidade de baixar livros digitais da loja virtual "Saraiva", bem como de arquivos de textos e imagens por intermédio de um computador, com transferência para o "LEV" via cabo USB. Tais funções, contudo, em nada descaracterizam sua finalidade principal, que é justamente a de proporcionar a leitura de livros em formato digital.
6 - Ressalte-se ainda que não é possível realizar chamadas telefônicas, tirar fotos ou realizar filmagens por meio do referido dispositivo e que seu acesso à Internet limita-se à loja virtual de livros "Saraiva", por meio da qual se pode adquirir títulos de obras literárias diversas em formato digital. Com efeito, não é possível acessar quaisquer outros sites da Internet por meio do "LEV", conforme se infere da declaração de seu fabricante e da ata notarial lavrada pelo 26º Tabelionato de Notas de São Paulo, de forma que este aparelho eletrônico guarda grande diferença de um tablet ou de um smartphone.
7 - Impõe-se, assim, a partir da tese fixada pelo Supremo Tribunal em relação à matéria, e no contexto de uma interpretação finalística da imunidade tributária descrita no art. 150, VI, "d", da Constituição Federal, estabelecer critérios para fim de discernimento em relação ao que se poderia definir como funcionalidades acessórias ou rudimentares dos leitores de livros digitais ou e-readers. É certo que referidos aparelhos eletrônicos não são e não se propõem a terem as mesmas funcionalidades dos denominados tablets, esses sim, aparelhos eletrônicos mais complexos e que se destinam ao acesso amplo e irrestrito à Internet; à produção de fotografias e vídeos; à prática de jogos eletrônicos ou games, elaborados especificamente para tais aparelhos; à organização de tarefas pessoais do usuário por meio de agendas eletrônicas sofisticadas, além de conterem GPS, em alguns casos, dentre outras funcionalidades que vão muito além daquelas oferecidas pelos leitores de livros digitais. Estes últimos, por seu turno, têm por finalidade essencial a leitura de publicações eletrônicas, e, como já aqui ressaltado, a presença de algumas funcionalidades acessórias - simplórias se comparadas às de um tablet - em nada desnatura seu propósito específico de servir à popularização da cultura digital por meio da praticidade que este tipo de leitura proporciona, razão pela qual fazem jus à imunidade tributária conferida ao papel destinado à impressão de livros, bem assim à importação sob alíquota zero de PIS e COFINS, de modo que possam ser oferecidos por um preço mais atrativo aos consumidores.
8 - Demonstrado o enquadramento do e-reader "LEV" importado pela impetrante no conceito de suporte destinado exclusivamente à leitura de livros digitais, tal como definido na recente tese firmada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, resta caracterizado o direito líquido e certo alegado pela impetrante, de forma a justificar a aplicação de alíquota zero referente ao PIS e à COFINS incidentes sobre os leitores eletrônicos de livros digitais por ela importados, nos termos em que dispõe o art. 28, VI, da Lei 10.865/2004, c/c art. 2º, parágrafo único, II e VI, da Lei 10.753/2003.
9 - Precedente desta Corte Regional (TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AMS - APELAÇÃO CÍVEL - 363729 - 0007993-60.2014.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, julgado em 23/08/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/08/2017)
10 - Apelação provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que fazem parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 06 de dezembro de 2017.
ANTONIO CEDENHO
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 06/12/2017 19:27:25



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007747-87.2015.4.03.6100/SP
2015.61.00.007747-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : SARAIVA E SICILIANO S/A
ADVOGADO : SP359187 CLÓVIS GIMENES SILVA NETO e outro(a)
APELADO(A) : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : SP000003 JULIO CÉSAR CASARI E CLAUDIA AKEMI OWADA
No. ORIG. : 00077478720154036100 10 Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelação em mandado de segurança impetrado por SARAIVA E SICILIANO S.A. visando à aplicação de alíquota zero referente ao PIS e à COFINS sobre a mercadoria por ela importada (28.800 leitores eletrônicos de livros digitais "LEV", conforme faturas comerciais e conhecimentos de transporte juntados à inicial), nos termos em que dispõe o art. 28, VI, da Lei 10.865/2004, c/c art. 2º, parágrafo único, II e VI, da Lei 10.753/2003, sob o argumento de que referido dispositivo tem por única finalidade proporcionar a leitura de livros em formato digital.


Indeferida a liminar (fls. 157/160), sobreveio sentença que extinguiu o feito sem julgamento de mérito, nos termos do art. 267, VI, do Código de Processo Civil de 1973, por entender inadequada a via processual eleita (fls. 257/259).


Em suas razões recursais, a impetrante sustenta a desnecessidade de dilação probatória no feito em apreço, visto que apresentou prova pré-constituída suficiente para demonstrar seu direito dito líquido e certo, de modo a possibilitar o exame da matéria por esta E. Corte nos termos do art. 515, § 3º, do Código de Processo Civil de 1973. No mais, reitera os argumentos expendidos na inicial, e pugna pela reversão do julgado.


Oferecidas as contrarrazões (fls. 299/305), vieram os autos a esta Corte Regional.


O Ministério Público Federal declinou de seu parecer de mérito, por entender não caracterizado o interesse público que autorize sua intervenção, nos termos do art. 178, do Código de Processo Civil de 2015.


É o relatório.


ANTONIO CEDENHO
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 06/12/2017 19:27:22



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007747-87.2015.4.03.6100/SP
2015.61.00.007747-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : SARAIVA E SICILIANO S/A
ADVOGADO : SP359187 CLÓVIS GIMENES SILVA NETO e outro(a)
APELADO(A) : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : SP000003 JULIO CÉSAR CASARI E CLAUDIA AKEMI OWADA
No. ORIG. : 00077478720154036100 10 Vr SAO PAULO/SP

VOTO

Inicialmente, tenho que aplicável o art. 515, § 3º, do Código de Processo Civil de 1973 à espécie, em conformidade com a teoria da causa madura, considerando-se a data de prolação da sentença bem assim que o feito encontra-se devidamente instruído com prova pré-constituída, de modo a amparar o direito dito líquido e certo da impetrante, dispensando-se a dilação probatória.


Na hipótese em apreço, pretende a impetrante, via do presente mandado de segurança, a aplicação de alíquota zero referente ao PIS e à COFINS incidentes sobre os leitores eletrônicos de livros digitais "LEV" por ela importados, nos termos em que dispõe o art. 28, VI, da Lei 10.865/2004, c/c art. 2º, parágrafo único, II e VI, da Lei 10.753/2003, sob o argumento de que referido dispositivo tem por única finalidade proporcionar a leitura de livros em formato digital.


Dispõem os referidos diplomas legais:


Lei 10.865, de 30 de abril de 2004:

Art. 28. Ficam reduzidas a 0 (zero) as alíquotas da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS incidentes sobre a receita bruta decorrente da venda, no mercado interno, de:
(...)
VI - livros, conforme definido no art. 2º da Lei nº 10.753, de 30 de outubro de 2003;

Lei 10.753, de 30 de outubro de 2003:

Art. 2º. Considera-se livro, para efeitos desta Lei, a publicação de textos escritos em fichas ou folhas, não periódica, grampeada, colada ou costurada, em volume cartonado, encadernado ou em brochura, em capas avulsas, em qualquer formato e acabamento.
Parágrafo único. São equiparados a livro:
II - materiais avulsos relacionados com o livro, impressos em papel ou em material similar;
(...)
VI - textos derivados de livro ou originais, produzidos por editores, mediante contrato de edição celebrado com o autor, com a utilização de qualquer suporte;

Ressalte-se que hipótese análoga à questão posta nos autos foi recentemente debatida quando do julgamento do RE 330817/RJ, submetido ao regime de repercussão geral, em sessão de julgamento realizada em 08 de março deste ano, ocasião em que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em decisão unânime e nos termos do voto do relator, fixou a seguinte tese:


"A imunidade tributária constante do art. 150, VI, d, da CF/88 aplica-se ao livro eletrônico (e-book), inclusive aos suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo"

A propósito, a ementa do referido acórdão:


EMENTA Recurso extraordinário. Repercussão geral. Tributário. Imunidade objetiva constante do art. 150, VI, d, da CF/88. Teleologia multifacetada. Aplicabilidade. Livro eletrônico ou digital. Suportes. Interpretação evolutiva. Avanços tecnológicos, sociais e culturais. Projeção. Aparelhos leitores de livros eletrônicos (ou e-readers). 1. A teleologia da imunidade contida no art. 150, VI, d, da Constituição, aponta para a proteção de valores, princípios e ideias de elevada importância, tais como a liberdade de expressão, voltada à democratização e à difusão da cultura; a formação cultural do povo indene de manipulações; a neutralidade, de modo a não fazer distinção entre grupos economicamente fortes e fracos, entre grupos políticos etc; a liberdade de informar e de ser informado; o barateamento do custo de produção dos livros, jornais e periódicos, de modo a facilitar e estimular a divulgação de ideias, conhecimentos e informações etc. Ao se invocar a interpretação finalística, se o livro não constituir veículo de ideias, de transmissão de pensamentos, ainda que formalmente possa ser considerado como tal, será descabida a aplicação da imunidade. 2. A imunidade dos livros, jornais e periódicos e do papel destinado a sua impressão não deve ser interpretada em seus extremos, sob pena de se subtrair da salvaguarda toda a racionalidade que inspira seu alcance prático, ou de transformar a imunidade em subjetiva, na medida em que acabaria por desonerar de todo a pessoa do contribuinte, numa imunidade a que a Constituição atribui desenganada feição objetiva. A delimitação negativa da competência tributária apenas abrange os impostos incidentes sobre materialidades próprias das operações com livros, jornais, periódicos e com o papel destinado a sua impressão. 3. A interpretação das imunidades tributárias deve se projetar no futuro e levar em conta os novos fenômenos sociais, culturais e tecnológicos. Com isso, evita-se o esvaziamento das normas imunizantes por mero lapso temporal, além de se propiciar a constante atualização do alcance de seus preceitos. 4. O art. 150, VI, d, da Constituição não se refere apenas ao método gutenberguiano de produção de livros, jornais e periódicos. O vocábulo "papel" não é, do mesmo modo, essencial ao conceito desses bens finais. O suporte das publicações é apenas o continente (corpus mechanicum) que abrange o conteúdo (corpus misticum) das obras. O corpo mecânico não é o essencial ou o condicionante para o gozo da imunidade, pois a variedade de tipos de suporte (tangível ou intangível) que um livro pode ter aponta para a direção de que ele só pode ser considerado como elemento acidental no conceito de livro. A imunidade de que trata o art. 150, VI, d, da Constituição, portanto, alcança o livro digital (e-book). 5. É dispensável para o enquadramento do livro na imunidade em questão que seu destinatário (consumidor) tenha necessariamente que passar sua visão pelo texto e decifrar os signos da escrita. Quero dizer que a imunidade alcança o denominado "audio book", ou audiolivro (livros gravados em áudio, seja no suporte CD-Rom, seja em qualquer outro). 6. A teleologia da regra de imunidade igualmente alcança os aparelhos leitores de livros eletrônicos (ou e-readers) confeccionados exclusivamente para esse fim, ainda que, eventualmente, estejam equipados com funcionalidades acessórias ou rudimentares que auxiliam a leitura digital, tais como dicionário de sinônimos, marcadores, escolha do tipo e do tamanho da fonte etc. Esse entendimento não é aplicável aos aparelhos multifuncionais, como tablets, smartphone e laptops, os quais vão muito além de meros equipamentos utilizados para a leitura de livros digitais. 7. O CD-Rom é apenas um corpo mecânico ou suporte. Aquilo que está nele fixado (seu conteúdo textual) é o livro. Tanto o suporte (o CD-Rom) quanto o livro (conteúdo) estão abarcados pela imunidade da alínea d do inciso VI do art. 150 da Constituição Federal. 8. Recurso extraordinário a que se nega provimento. TESE DA REPERCUSSÃO GERAL: 9. Em relação ao tema nº 593 da Gestão por Temas da Repercussão Geral do portal do STF na internet, foi aprovada a seguinte tese: "A imunidade tributária constante do art. 150, VI, d, da CF/88 aplica-se ao livro eletrônico (e-book), inclusive aos suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo."
(RE 330817, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 08/03/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-195 DIVULG 30-08-2017 PUBLIC 31-08-2017)

Desta feita, a recente decisão do Supremo Tribunal Federal estendeu a imunidade tributária conferida ao livro impresso em papel ao livro digital, bem como ao suporte utilizado para sua fixação. Esse suporte, no caso dos autos, caracteriza-se por ser um dispositivo eletrônico (leitor de livros digitais ou e-reader) que permite a leitura de livros digitais (e-book). O fato do leitor de livro eletrônico apresentar outras funcionalidades acessórias, desde que rudimentares, não descaracteriza sua função principal que é a de servir de instrumento para a leitura do livro digital. Mutatis mutandis, aplica-se à hipótese em tela a mesma linha de raciocínio, não obstante tratar-se aqui de aplicação de alíquota zero de tributo, tendo em vista a coincidência da fundamentação a embasar a concessão do benefício tributário pleiteado.


Da análise dos autos, verifica-se que o leitor eletrônico de livros digitais "LEV" importado pela impetrante possui funções acessórias à leitura de livros digitais, tais como armazenamento de documentos e imagens e a possibilidade de baixar livros digitais da loja virtual "Saraiva", bem como de arquivos de textos e imagens por intermédio de um computador, com transferência para o "LEV" via cabo USB. Tais funções, contudo, em nada descaracterizam sua finalidade principal, que é justamente a de proporcionar a leitura de livros em formato digital.


Ressalte-se ainda que não é possível realizar chamadas telefônicas, tirar fotos ou realizar filmagens por meio do referido dispositivo e que seu acesso à Internet limita-se à loja virtual de livros "Saraiva", por meio da qual se pode adquirir títulos de obras literárias diversas em formato digital. Com efeito, não é possível acessar quaisquer outros sites por meio do "LEV", conforme se infere da declaração de seu fabricante (fls. 127/129) e da ata notarial lavrada pelo 26º Tabelionato de Notas de São Paulo (fls. 131/138), de forma que este aparelho eletrônico guarda grande diferença de um tablet ou um smartphone.


Transcrevo, por oportuno, trecho do voto proferido pelo Ministro Dias Toffoli, relator do RE 330.817/RJ:


O avanço na cultura escrita tem apontado, outrossim, para o advento de novas tecnologias relativas ao suporte dos livros, como o papel eletrônico (e-paper) e o aparelho eletrônico (como o e-reader) especializados na leitura de obras digitais, cujas intenções são justamente imitar a leitura em papel físico. No meu entendimento, elas igualmente estão abrangidas pela imunidade em tela, já que equiparam-se aos tradicionais corpos mecânicos dos livros físicos, mesmo que estejam acompanhadas de funcionalidades acessórias ou rudimentares, como acesso à Internet para o download de livros digitais, dicionários, possibilidade de alterar o tipo e o tamanho da fonte, marcadores, espaçamento de texto, iluminação do texto, etc. (destaquei)

Impõe-se, assim, a partir da tese fixada pelo Supremo Tribunal em relação à matéria, e no contexto de uma interpretação finalística da imunidade tributária descrita no art. 150, VI, "d", da Constituição Federal, estabelecer critérios para fim de discernimento em relação ao que se poderia definir como funcionalidades acessórias ou rudimentares dos leitores de livros digitais ou e-readers. É certo que referidos aparelhos eletrônicos não são e não se propõem a terem as mesmas funcionalidades dos denominados tablets, esses sim, aparelhos eletrônicos mais complexos e que se destinam ao acesso amplo e irrestrito à Internet; à produção de fotografias e vídeos; à prática de jogos eletrônicos ou games, elaborados especificamente para tais aparelhos; à organização de tarefas pessoais do usuário por meio de agendas eletrônicas sofisticadas, além de conterem GPS, em alguns casos, dentre outras funcionalidades que vão muito além daquelas oferecidas pelos leitores de livros digitais. Estes últimos, por seu turno, têm por finalidade essencial a leitura de publicações eletrônicas, e, como já aqui ressaltado, a presença de algumas funcionalidades acessórias - simplórias se comparadas às de um tablet - em nada desnatura seu propósito específico de servir à popularização da cultura digital por meio da praticidade que este tipo de leitura proporciona, razão pela qual fazem jus à imunidade tributária conferida ao papel destinado à impressão de livros, bem assim à importação sob alíquota zero de PIS e COFINS, de modo que possam ser oferecidos por um preço mais atrativo aos consumidores.


Apenas a título de referência, transcrevo abaixo trechos exemplificativos sobre os conceitos de tablet e leitor de livros digitais (e-reader) extraídos da Wikipédia, enciclopédia digital de amplo conhecimento popular e que pode ser acessada pelo endereço eletrônico https://pt.wikipedia.org.

"Um tablet, também conhecido como tablet PC ou simplesmente tablete, ou ainda, no Brasil, como táblete, é um dispositivo pessoal em formato de prancheta que pode ser usado para acesso à Internet, organização pessoal, visualização de fotos, vídeos, leitura de livros, jornais e revistas e para entretenimento com jogos. Apresenta uma tela sensível ao toque (touchscreen) que é o dispositivo de entrada principal. A ponta dos dedos ou uma caneta aciona suas funcionalidades. É um novo conceito: não deve ser igualado a um computador completo ou um smartphone, embora possua funcionalidades de ambos" (WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Tablet, página da web [https://pt.wikipedia.org/wiki/Tablet]. Acesso em: 18/08/2017) .

"Leitor de livros digitais (e-Reader, em inglês) é um pequeno aparelho que tem como função principal mostrar em uma tela, para leitura, o conteúdo de livros digitais (e-books) e outros tipos de mídia digital. Ao utilizar a tecnologia de tinta eletrônica, também chamada de papel eletrônico, nas telas desses leitores, isso os aproximou muito da sensação de se ler um livro convencional, por não utilizar iluminação, como as telas de cristal líquido (LCD), o que tem impulsionado a venda desses aparelhos em todo o mundo (...)" (WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Leitor de livros digitais, página da web [https://pt.wikipedia.org/wiki/Leitor_de_livros_digitais]. Acesso em: 18/08/2017).

Nesse sentido, assim decidiu esta Terceira Turma, em recente julgado acerca da aplicabilidade da imunidade tributária sobre os leitores eletrônicos de livros digitais da mesma marca daqueles importados pela impetrante e dotados da mesma configuração técnica:


CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE DO ART. 150, VI, "D", DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMPORTAÇÃO DE LEITORES DE LIVROS DIGITAIS "LEV". APLICAÇÃO DA TESE FIXADA PELO STF NO JULGAMENTO DO RE 330817/RJ. EQUIPAMENTO QUE SE ENQUADRA NO CONCEITO DE EXCLUSIVIDADE DE USO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO EVIDENCIADO. AFASTAMENTO DA INCIDÊNCIA DO IPI E DO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. CLASSIFICAÇÃO TARIFÁRIA MANTIDA. APELAÇÕES E REMESSAO OFICIAL IMPROVIDAS.
1 - Pretende a impetrante, via do presente mandado de segurança, a obtenção de imunidade tributária sobre os leitores eletrônicos de livros digitais "LEV" por ela importados, nos termos em que dispõe o art. 150, VI, "d", da Constituição Federal, de modo a afastar a incidência do IPI e do Imposto de Importação, ao fundamento de que referido dispositivo tem por única finalidade proporcionar a leitura de livros em formato digital.
2 - A questão foi recentemente debatida quando do julgamento do RE 330817/RJ, submetido ao regime de repercussão geral, em sessão de julgamento realizada em 08 de março deste ano, ocasião em que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em decisão unânime e nos termos do voto do relator, fixou a seguinte tese: "A imunidade tributária constante do art. 150, VI, d, da CF/88 aplica-se ao livro eletrônico (e-book), inclusive aos suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo".
3 - Desta feita, a recente decisão do Supremo Tribunal Federal estendeu a imunidade tributária conferida ao livro impresso em papel ao livro digital, bem como ao suporte utilizado para sua fixação. Esse suporte, no caso dos autos, caracteriza-se por ser um dispositivo eletrônico (leitor de livros digitais ou e-reader) que permite a leitura de livros digitais (e-book). O fato do leitor de livro eletrônico apresentar outras funcionalidades acessórias, desde que rudimentares, não descaracteriza sua função principal que é a de servir de instrumento para a leitura do livro digital.
3 - Da análise dos autos, verifica-se que o leitor eletrônico de livros digitais "LEV" importado pela impetrante possui funções acessórias à leitura de livros digitais, tais como armazenamento de documentos e imagens e a possibilidade de baixar livros digitais da loja virtual "Saraiva", bem como de baixar arquivos de textos e imagens por intermédio de um computador, com transferência para o "LEV" via cabo USB. Tais funções, contudo, em nada descaracterizam sua finalidade principal, que é justamente a de proporcionar a leitura de livros em formato digital.
4 - Ressalte-se ainda que não é possível realizar chamadas telefônicas, tirar fotos ou realizar filmagens por meio do referido dispositivo e que seu acesso à Internet limita-se à loja virtual de livros "Saraiva", por meio da qual se pode adquirir títulos de obras literárias diversas em formato digital. Com efeito, não é possível acessar quaisquer outros sites da Internet por meio do "LEV", conforme se infere da declaração de seu fabricante e da ata notarial lavrada pelo 26º Tabelionato de Notas de São Paulo, de forma que este aparelho eletrônico guarda grande diferença de um tablet ou de um smartphone.
5 - Demonstrado o enquadramento do e-reader "LEV" importado pela impetrante no conceito de suporte destinado exclusivamente à leitura de livros digitais, tal como definido na recente tese firmada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, resta caracterizado o direito líquido e certo alegado pela impetrante, de forma a justificar a concessão da imunidade pleiteada, afastando-se a incidência do IPI e do Imposto de Importação na espécie.
6 - No que se refere ao pedido de reclassificação tarifária da mercadoria importada, para efeito de cumprimento de obrigação tributária acessória, tenho que não merece acolhida, visto que a classificação pretendida pela impetrante é a NCM 4901, a qual se refere a livros, jornais, gravuras e outros produtos das indústrias gráficas; textos manuscritos ou datilografados, planos e plantas, e que, portanto, não se coaduna com o "LEV", visto tratar-se de um aparelho eletrônico. Caberá ao legislador, oportunamente, a criação de novas classificações tarifárias que melhor reflitam a realidade das mercadorias importadas sob o contexto da inovação tecnológica.
7 - Apelações e remessa oficial improvidas.
(TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AMS - APELAÇÃO CÍVEL - 363729 - 0007993-60.2014.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, julgado em 23/08/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/08/2017 )

Logo, demonstrado o enquadramento do e-reader "LEV" importado pela impetrante no conceito de suporte destinado exclusivamente à leitura de livros digitais, tal como definido na recente tese firmada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, resta caracterizado o direito líquido e certo alegado pela impetrante, de forma a justificar a aplicação de alíquota zero referente ao PIS e à COFINS incidentes sobre os leitores eletrônicos de livros digitais por ela importados, nos termos em que dispõe o art. 28, VI, da Lei 10.865/2004, c/c art. 2º, parágrafo único, II e VI, da Lei 10.753/2003.


Ante o exposto, dou provimento à apelação, na forma acima fundamentada.


É como voto.


ANTONIO CEDENHO
Desembargador Federal


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Data e Hora: 06/12/2017 19:27:29