D.E. Publicado em 06/12/2017 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação à sentença que extinguiu o processo sem resolução do mérito, por ilegitimidade ativa, revogando antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida, em ação ajuizada pela União Federal em face de Google Brasil Internet Ltda, com o objetivo de retirar vídeo divulgado pelo site "Youtube", que considera ofensivo aos Servidores da Receita Federal, à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal, bem como o fornecimento dos dados cadastrais e endereços de IP do usuário responsável pela divulgação do vídeo.
Alegou a União: (1) preliminarmente, nulidade da sentença por ofensa ao artigo 10, CPC e vedação ao 'fundamento-surpresa'; (2) legitimidade ativa da União, por ofensa às instituições envolvidas e (3) a Lei 12.965/2014 prevê a possibilidade de retirada de conteúdo da internet por meio de decisão judicial.
Com contrarrazões subiram os autos.
Os autos vieram conclusos e foram recebidos fisicamente no Gabinete em 27/04/2017, com inclusão em pauta para julgamento na sessão de 30/11/2017.
É o relatório.
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VOTO
Senhores Desembargadores, a sentença apelada reconheceu, de ofício, a ilegitimidade ativa ad causam, entendendo que "pela análise do quanto narrado na petição inicial e da cópia do vídeo divulgado no site 'Youtube', fica claro que a Autora pleiteia, em nome próprio, direito alheio. As críticas veiculadas são destinadas a agentes públicos nomeados pelo narrador do vídeo. Não se pode admitir que declarações questionando a conduta de determinados agentes públicos sejam estendidas como ofensas à própria instituição", extinguindo o processo sem resolução do mérito e revogando a antecipação dos efeitos da tutela concedida (f. 158-vº).
Inicialmente, não procede a preliminar de nulidade por violação ao 'fundamento-surpresa', nos termos do art. 10, CPC.
De fato, a despeito da natureza da questão, encontra-se provado nos autos que o tema da ilegitimidade foi discutido no agravo de instrumento que foi interposto pela ré (f. 133/4), e do qual teve ciência à apelante, por deliberação do próprio Juízo (f. 152), a demonstrar, portanto, que teve oportunidade o órgão de defesa judicial da União de discutir a legitimidade ativa, o que não ocorreu (f. 153). A sentença apenas confirmou um dos fundamentos adotados na Corte para prover, por unanimidade, o agravo de instrumento, pelo que inexistente nulidade a ser decretada.
No mérito, a questão sub judice foi enfrentada no julgamento do AI 002828386.2015.4.03.0000, a que se deu provimento, cassando a decisão que suspendeu a veiculação do vídeo. Na oportunidade, a discussão da ilegitimidade ativa, imbricada com a do próprio mérito, levou à decisão unânime prolatada. Na hipótese, embora reconhecida a carência de ação, não deixa de ser relacionada e pertinente a abordagem mais ampla, para conferir consistência à solução que se encontrou na instância de origem, a partir da reprodução do quanto assinalado na Corte.
No vídeo, quando ainda estava disponível para acesso na internet, o autor, devidamente identificado, não trata de questões relativas à intimidade ou vida privada, mas de supostos ilícitos praticados no âmbito da Administração Pública, principalmente na Receita Federal do Brasil, com indicação de nome de servidores, envolvendo ações e práticas que também são objeto de investigação pelo Departamento de Polícia Federal, na Operação Zelotes. O autor do vídeo, ex-fiscal da Receita Federal, tentou associar a sua demissão do cargo público a perseguições em razão de críticas e oposição a práticas ilícitas verificadas, denunciadas tanto à própria Receita Federal, como Polícia Federal e Ministério Público Federal, que teriam se omitido, deixando de investigar e apurar os fatos narrados.
Com efeito, como já exposto, tais narrativas, imputações, qualificações e acusações, naquilo que forem lesivas à honra e imagem de servidores públicos e membros do Ministério Público Federal, devem ser objeto de discussão e providências em via própria. A veiculação do vídeo, enquanto ato de manifestação de pensamento, expressão e crítica, não pode ser passível de censura, uma vez que a identidade do autor do vídeo foi registrada tanto de forma escrita como verbal na divulgação do conteúdo, descrevendo nomes e situações relativas a fatos funcionais, não cabendo, aqui, formular qualquer juízo de reprovabilidade civil ou penal.
A liberdade de expressão e manifestação do pensamento, que independe de censura ou licença, inexistindo anonimato, não pode ser coibida judicialmente, sem prejuízo do direito à indenização a partir do momento em que do exercício de tal liberdade resulte a violação da honra e da imagem das pessoas. A partir do momento em que veiculada, por vídeo na internet, as narrativas, imputações, qualificações e acusações, o autor responde pela conduta praticada na esfera civil e penal, dentro do sistema, adotado pela Constituição de 1988, baseado na liberdade com responsabilidade.
Evidente que a União não possui legitimidade ativa para a defesa da honra e imagem das pessoas que foram nominadas no vídeo, ainda que relativas a atos funcionais praticados. Em relação à honra e imagem das instituições, o Ministério Público tem personalidade jurídica própria para atuar em sua defesa institucional.
Como aduzido, a prática da censura, que se pretende viabilizar, além de inconstitucional, tem efeito colateral grave, na medida em que amplia, promove e impulsiona a publicidade e a curiosidade pública sobre o material, de sorte a atrair atenção e repercussão muito além do que verificado até então.
A jurisprudência admite a exclusão da veiculação do conteúdo apenas quando possam suscitar algum perigo social ou à ordem pública (por exemplo, divulgação de mensagens de ódio racial ou de gênero), sendo criteriosa e seletiva na limitação do exercício da liberdade de expressão e manifestação do pensamento e informação.
Embora a liberdade de manifestação e expressão do pensamento e da informação não permita a censura preconizada, evidente que eventual dano que decorra da divulgação pode gerar discussão judicial em torno de responsabilidade civil extensível à apelada, uma vez que o risco do negócio é de quem o explora e continua a explorá-lo ainda depois de advertido, por via judicial, de eventual dano à honra ou imagem alheia.
Em termos de responsabilidade civil, decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
Assim, cabe nova advertência para que, posteriormente, não se alegue que pelo fato de ter sido mantida a divulgação, por decisão judicial, haveria o impedimento da discussão de qualquer responsabilidade civil. Como dito, trata-se de liberdade que fica preservada, ainda que prejudique honra e imagem de terceiros, porém o exercício de tal liberdade não elimina a responsabilidade e o dever de indenizar por danos eventualmente causados.
Ante o exposto, nego provimento à apelação.
É como voto.
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