D.E. Publicado em 22/08/2017 |
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EMENTA
1 - As preliminares arguidas não merecem prosperar. Com efeito, o pedido formulado pela impetrante em sua inicial é específico no sentido de afastar a retenção do Imposto de Renda sobre as remessas destinadas ao exterior a título de pagamento pelos serviços prestados por empresas estrangeiras localizadas em diversos países, tendo por fundamento as normas contidas em tratados internacionais. Nessa mesma linha, não há falar em inadequação da via eleita ou impugnação de lei em tese, visto que o ato coator, neste caso, resta caracterizado pela retenção do IRRF nos contratos de câmbio firmados pela impetrante e comprovada nos autos por meio de prova pré-constituída, a qual inclui a descrição dos serviços prestados, acompanhados de tradução juramentada.
2 - A alegação de que os valores remetidos ao exterior pela impetrante se enquadrariam no conceito de royalties, e, portanto, poderiam ser tributados no Brasil, conforme previsto no art. 12 da Convenção Modelo da OCDE, não merece acolhida. Com efeito, os serviços técnicos e de assistência técnica prestados pela impetrante não implicam em transferência de tecnologia, razão pela qual os respectivos contratos não necessitam de averbação junto ao INPI, nos termos do art. 211 da Lei 9.279/96, e tampouco se encontram registrados no Banco Central do Brasil, conforme Portaria MF nº 287/72.
3 - Resta consolidado o entendimento no sentido de que tratados internacionais sobre normas infraconstitucionais, regularmente incorporados ao direito nacional, não têm superioridade hierárquica sobre o direito interno. Assim a definição da norma a prevalecer, em caso de antinomia, se sujeita à verificação da efetiva revogação, ou não, da anterior pela posterior. De acordo com o artigo 7º da Lei nº 9.779/99, estão sujeitas à retenção do IRRF, à alíquota de 25%, os rendimentos da prestação de serviços pagos a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior, cabendo à fonte pagadora brasileira a responsabilidade pelo recolhimento do imposto. No entanto, a impetrante refere-se à interpretação que deve ser dada ao conceito de lucros empresarias nas normativas nacionais e ao constante nos tratados internacionais com o fim de evitar a dupla tributação da renda.
4 - Não houve revogação dos tratados internacionais pelo artigo 7º da Lei nº 9.779/1999, pois o tratamento tributário genérico, dado pela lei nacional às remessas à prestadores de serviços domiciliados no exterior, qualquer que seja o país em questão, não exclui o específico, contemplado em lei convencional, por acordos bilaterais. Embora a lei posterior possa revogar a anterior (lex posterior derogat priori), o princípio da especialidade (lex specialis derogat generalis) faz prevalecer a lei especial sobre a geral, ainda que esta seja posterior, como ocorreu com a Lei nº 9.779/1999.
5 - Acordos internacionais valem entre os respectivos subscritores e possuem caráter de lei específica, que não é revogada por lei geral posterior. Esta interpretação privilegia o entendimento de que, embora não haja hierarquia entre tratado e lei interna, não se pode revogar lei específica anterior com lei geral posterior. Ademais, estando circunscritos os efeitos de tratados às respectivas partes contratantes, possível e viável o convívio normativo da lei convencional com a lei geral, esta para todos os que não estejam atingidos pelos tratados, firmados com o objetivo de evitar a dupla tributação.
6 - A remessa de valores para o exterior para pagamento de serviços prestados por empresa estrangeira constitui despesa para a empresa remetente e não rendimento. Já o rendimento obtido pela empresa estrangeira com a prestação de serviços à contratante brasileira, examinado à luz da legislação pátria, compõe o lucro daquela, respeitada a sistemática específica de apuração prevista em lei. A Convenção Internacional refere-se a lucro, que abrange toda receita ou rendimento que o integra, e não ao lucro real ou similar calculado. Assim, a receita operacional, de que é parte o valor recebido em pagamento pela prestação de serviços, integra o lucro. Portanto, resta evidente que a receita obtida pelo serviço prestado integra o lucro, devendo ser assim considerada nos termos do art. 7º das Convenções Internacionais.
7 - Os tratados referem-se a "lucros", expressão esta que remete, tecnicamente, ao conceito que, na legislação interna, equivale a rendimento ou receita. Tanto assim que as normas convencionais estipulam que "No cálculo dos lucros de um estabelecimento permanente, é permitido deduzir as despesas que tiverem sido feitas para a consecução dos objetivos do estabelecimento permanente, incluindo as despesas de direção e os encargos gerais de administração assim realizados".
8 - Para evitar a dupla incidência, o que o tratado excluiu da tributação, no Estado pagador que contratou a prestação de serviços no exterior, não é tão-somente o lucro, até porque o respectivo valor não poderia ser avaliado por quem apenas faz a remessa do pagamento global, mas sim o rendimento auferido com a prestação do serviço para que, no Estado onde se deu sua prestação, seja promovida a tributação, garantida ali, conforme a lei respectiva, a dedução de despesas e encargos, revelando, portanto, que não existe espaço válido para a prevalência da aplicação da lei interna, que prevê tributação, pela fonte pagadora no Brasil, de pagamentos, com remessa de valores a prestadoras de serviços exclusivamente domiciliadas no exterior.
9 - As normas prescritas em acordos internacionais para evitar a dupla tributação prevalecem, no que concerne aos Estados contratantes, uma vez que é regra específica (critério da especialidade), diferente da lei ordinária que regula a matéria de maneira genérica (art. 98, do CTN). Demonstrada a existência de contrato firmado com pessoa jurídica situada no exterior relativo à prestação de serviço, não se pode compelir o contribuinte à dupla tributação, devendo haver incidência do imposto sobre a renda somente no país de destino. Assim, é possível concluir que os valores remetidos pela impetrante às empresas estabelecidas no exterior, em razão de prestação de serviços sem transferência de tecnologia, não sofrem a incidência do IRRF.
10 - Apelação e remessa oficial improvidas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares, e, no mérito, negar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que fazem parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação e remessa oficial em mandado de segurança impetrado por SGS DO BRASIL LTDA. contra ato praticado pelo Delegado da Receita Federal do Brasil em Barueri, tendo em vista a exigência do Imposto de Renda Retido na Fonte - IRRF sobre valores remetidos a empresas sediadas no exterior, a título de pagamento pelos serviços diversos que não envolvem transferência de tecnologia, com base nos artigos 708 e 710 do Regulamento do Imposto de Renda instituído pelo Decreto 3.000/99.
Busca a impetrante a concessão de segurança com o fim de afastar o recolhimento da referida exação, sob o argumento de que as remessas de valores destinam-se a países com os quais o Brasil celebrou tratados internacionais, cabendo àqueles países exercerem a tributação dos serviços prestados, considerando-se a prevalência dos tratados internacionais sobre as leis ordinárias internas.
Indeferida a liminar, sobreveio sentença concessiva da segurança, para determinar o afastamento da incidência do IRRF sobre os valores remetidos pela impetrante às empresas sediadas no exterior, à execeção daquelas situadas na Alemanha, em razão de não mais existir acordo internacional firmado com aquele país visando ao afastamento de bitributação.
Submetida a decisão ao reexame necessário, nos termos do art. 14, § 1º, da Lei 12.016/09.
Em suas razões recursais, a União Federal, sustenta, em preliminar, ausência de interesse processual ante a formulação de pedido genérico; a inadequação da via eleita, tendo em vista a ausência de prova pré-constituída; a inadmissibilidade de impetração contra lei em tese, em razão da inexistência de ato coator concreto na espécie.
No mérito, alega que as remessas destinadas ao exterior pela impetrante equiparam-se a royalties, sendo assim passíveis de tributação, nos termos dos protocolos anexos aos tratados internacionais celebrados com os países estrangeiros em questão, à exceção de Austria, Finlândia, França, Japão e Suécia. Requer, por fim, a reversão do julgado.
Oferecidas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte Regional.
O Ministério Público Federal opinou pela manutenção da r. sentença.
É o Relatório.
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VOTO
Inicialmente, tenho que as preliminares arguidas não merecem prosperar. Com efeito, o pedido formulado pela impetrante em sua inicial é específico no sentido de afastar a retenção do Imposto de Renda sobre as remessas destinadas ao exterior a título de pagamento pelos serviços prestados por empresas estrangeiras localizadas em diversos países, tendo por fundamento as normas contidas em tratados internacionais. Nessa mesma linha, não há falar em inadequação da via eleita ou impugnação de lei em tese, visto que o ato coator, neste caso, resta caracterizado pela retenção do IRRF nos contratos de câmbio firmados pela impetrante e comprovada nos autos por meio de prova pré-constituída, a qual inclui a descrição dos serviços prestados, acompanhados de tradução juramentada (fls. 38/106).
Passo à análise do mérito da questão posta.
Com o intuito de evitar a dupla tributação do imposto de renda, o Brasil celebrou diversas convenções internacionais com outros países, dentre eles Argentina, África do Sul, Áustria, Bélgica, Canadá, Chile, China, Coréia, Dinamarca, Equador, Espanha, Filipinas, Finlândia, França, Hungria, Holanda, Índia, Israel, Itália, Japão, Luxemburgo, México, Noruega, Peru, Portugal, República Eslovaca, República Tcheca, Suécia e Ucrânica, convenções estas incorporadas ao ordenamento jurídico por meio de decretos.
Resta consolidado o entendimento no sentido de que tratados internacionais sobre normas infraconstitucionais, regularmente incorporados ao direito nacional, não têm superioridade hierárquica sobre o direito interno. Assim, a definição da norma a prevalecer, em caso de antinomia, sujeita-se à verificação da efetiva revogação, ou não, da anterior pela posterior.
A propósito:
De acordo com o artigo 7º da Lei nº 9.779/99, estão sujeitas à retenção do IRRF, à alíquota de 25%, os rendimentos da prestação de serviços pagos a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior, cabendo à fonte pagadora brasileira a responsabilidade pelo recolhimento do imposto.
No entanto, a impetrante refere-se à interpretação que deve ser dada ao conceito de lucros empresarias nas normativas nacionais e o constante nos tratados internacionais visando a evitar a dupla tributação da renda. Sucede, contudo, que não houve revogação dos tratados internacionais pelo artigo 7º da Lei nº 9.779/1999, pois o tratamento tributário genérico, dado pela lei nacional, às remessas à prestadores de serviços domiciliados no exterior, qualquer que seja o país em questão, não exclui o específico, contemplado em lei convencional, por acordos bilaterais. Embora a lei posterior possa revogar a anterior (lex posterior derogat priori), o princípio da especialidade (lex specialis derogat generalis) faz prevalecer a lei especial sobre a geral, ainda que esta seja posterior, como ocorreu com a Lei nº 9.779/1999.
Acordos internacionais valem entre os respectivos subscritores e possuem caráter de lei específica, que não é revogada por lei geral posterior. Esta interpretação privilegia o entendimento de que, embora não haja hierarquia entre tratado e lei interna, não se pode revogar lei específica anterior com lei geral posterior. Ademais, estando circunscritos os efeitos de tratados às respectivas partes contratantes, possível e viável o convívio normativo da lei convencional com a lei geral, esta para todos os que não estejam atingidos pelos tratados, firmados com o objetivo de evitar a dupla tributação.
A remessa de valores para o exterior para pagamento de serviços prestados por empresa estrangeira constitui despesa para a empresa remetente e não rendimento. Já o rendimento obtido pela empresa estrangeira com a prestação de serviços à contratante brasileira, examinado à luz da legislação pátria, compõe o lucro daquela, respeitada a sistemática específica de apuração prevista em lei. A Convenção Internacional refere-se a lucro, que abrange toda receita ou rendimento que o integra, e não ao lucro real ou similar calculado. Assim, a receita operacional, de que é parte o valor recebido em pagamento pela prestação de serviços, integra o lucro, devendo ser assim considerada nos termos do art. 7º das Convenções Internacionais.
Os tratados referem-se a "lucros", ideia essa que remete, tecnicamente, ao conceito que, na legislação interna, equivale a rendimento ou receita. Tanto assim que as normas convencionais estipulam que "No cálculo dos lucros de um estabelecimento permanente, é permitido deduzir as despesas que tiverem sido feitas para a consecução dos objetivos do estabelecimento permanente, incluindo as despesas de direção e os encargos gerais de administração assim realizados".
Para evitar a dupla incidência, o que o tratado excluiu da tributação, no Estado pagador que contratou a prestação de serviços no exterior, não é tão-somente o lucro, até porque o respectivo valor não poderia ser avaliado por quem apenas faz a remessa do pagamento global, mas sim o rendimento auferido com a prestação do serviço para que, no Estado de prestação, ou seja, no exterior, seja promovida a sua tributação, garantida ali, conforme a lei respectiva, a dedução de despesas e encargos, revelando, portanto, que não existe espaço válido para a prevalência da aplicação da lei interna, que prevê tributação, pela fonte pagadora no Brasil, de pagamentos, com remessa de valores a prestadoras de serviços, exclusivamente domiciliadas no exterior.
De outra via, a alegação de que os valores remetidos ao exterior pela impetrante se enquadrariam no conceito de royalties, e, portanto, poderiam ser tributados no Brasil, conforme previsto no art. 12 da Convenção Modelo da OCDE, não merece acolhida. Com efeito, os serviços prestados pela impetrante não implicam em transferência de tecnologia, razão pela qual os respectivos contratos não necessitam de averbação junto ao INPI, nos termos do art. 211 da Lei 9.279/96, e tampouco se encontram registrados no Banco Central do Brasil, conforme Portaria MF nº 287/72.
A propósito, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
No mesmo sentido, o entendimento desta E. Corte:
As normas prescritas em acordos internacionais para evitar a dupla tributação prevalecem, no que concerne aos Estados contratantes, uma vez que é regra específica (critério da especialidade), diferente da lei ordinária que regula a matéria de maneira geral (art. 98, do CTN). Demonstrada a existência de contrato firmado com pessoa jurídica situada no exterior relativo à prestação de serviço, não se pode compelir o contribuinte à dupla tributação, devendo haver incidência do imposto sobre a renda somente no país de destino.
Desse modo, é possível concluir-se, que os valores remetidos ao exterior pela impetrante às empresas situadas no exterior, em razão de prestação de serviços sem transferência de tecnologia, devem ser transferidos sem a incidência na fonte do imposto de renda, à exceção daquelas sediadas na Alemanha, como bem ressalvado pelo M.M. Juízo a quo, em razão da inexistência atual de acordo celebrado com aquele país visando ao afastamento da bitributação.
Ante o exposto, rejeito a preliminar, e, no mérito, nego provimento à apelação e à remessa oficial.
É como voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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