D.E. Publicado em 18/09/2017 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso e, de ofício, reconhecer a circunstância do artigo 65, III, "d", do Código Penal, o que resulta na pena definitiva de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DR. HÉLIO NOGUEIRA (Relator):
Trata-se de Apelação Criminal interposta por OSVALDO GRACILIANO VALENTE, contra a sentença de fls. 357/365-v, proferida pelo Juízo da 5ª Vara Criminal Federal de Santos/SP, que o condenou à pena de 03 (três) anos e 10 (dez) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto e pagamento de 18 (dezoito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, pela prática do delito previsto no artigo 168-A , §1º, I, c.c artigo 71, ambos do Código Penal e absolveu DORACY DOS SANTOS com fulcro no artigo 386, V, do Código de Processo Penal.
A pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas pelo tempo equivalente à pena privativa de liberdade e prestação pecuniária de 15 (quinze) salários-mínimos a ser pago em favor do INSS, em condições a serem especificadas pelo Juízo da Execução.
Narra a denúncia que (fls. 02/03):
A denúncia foi recebida em 15/08/2007 (fls. 162/163) e a sentença condenatória, publicada em 09/03/2011 (fl. 366).
Nas razões de fls. 376/386, a defesa de OSVALDO GRACILIANO VALENTE sustenta:
a) ausência de instauração de inquérito para apuração da prática do delito;
b) insuficiência do conjunto probatório;
c) atipicidade material da conduta por ser indispensável à caracterização do delito a retenção de valores, o que não se deu no caso concreto;
d) excludente de ilicitude por inexigibilidade de conduta diversa decorrente de dificuldades financeiras;
e) não demonstração do animus rem sib habendi;
f) ser injustificada a fixação da pena-base acima do mínimo legal, devendo ser fixada no seu respectivo piso;
Contrarrazões pelo Ministério Público Federal às fls. 383/390.
Em parecer de fls. 396/404-v, a Procuradoria Regional da República, por sua ilustre representante Dra. Elaine Cristina de Sá Proença, opinou pelo não provimento do recurso do réu.
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DR. HÉLIO NOGUEIRA (Relator):
OSVALDO GRACILIANO VALENTE foi denunciado, juntamente com DORACY DOS SANTOS, como incurso nas sanções do artigo 168-A , § 1º, I c.c artigo 71, pois, na qualidade de sócio e responsável legal da pessoa jurídica "BAR E RESTAURANTE JOCA DE GUARUJÁ LTDA.", deixou de repassar à Previdência Social as contribuições descontadas dos salários dos empregados, no prazo e forma legais nos períodos de 10/2000 a 01/2007, causando prejuízo no valor total (incluído juros e multa) de, respectivamente, R$ 172.378,83 (cento e setenta e dois mil e trezentos e setenta e oito reais e oitenta e três centavos), apurado em março de 2007, conforme NFLD n. 37.073.384-3.
Após regular instrução, sobreveio sentença, publicada em 09/03/2011 (fl. 366), o que ensejou a interposição do presente recurso defensivo.
Passo à matéria devolvida.
Inicialmente, afasto a aventada necessidade de instauração de inquérito policial para apuração da prática do delito em questão.
Como consabido, o inquérito policial, como peça informativa, é dispensável na formação da opinio delicti, que no caso em comento, baseou-se no procedimento administrativo fiscal conduzido pelo Instituto Nacional de Seguro Social.
Nesse sentido:
Portanto, não há qualquer vício a ser reconhecido.
Prossigo.
A materialidade delitiva restou demonstrada na Representação Fiscal para Fins Penais n. 35432.000441/2007-91 (fls. 08/157), da qual consta a NFLD n. 37.073.384-3 (fl. 14), referente ao não repasse das contribuições descontadas dos empregados contribuintes, correspondente às competências de 10/2000 a 01/2007, cujo valor principal do crédito tributário, constituído definitivamente em 16/07/2007 (fl. 411), excluídos juros e multa, somou o valor de R$ 105.374,15 (cento e cinco mil, trezentos e setenta e quatro reais e quinze centavos).
Nesta seara, anoto que o procedimento fiscal, além de revelar o ilícito administrativo, possui, também, ao contrário do quanto alegado pela defesa, aptidão para demonstrar a materialidade do tipo penal em questão.
Cumpre consignar, ainda, conforme acertadamente pontuou o magistrado de primeira instância, ser infundada a tese defensiva acerca da atipicidade material da conduta pela inexistência de descontos nos salários dos empregados, visto que a fiscalização constatou o efetivo não repasse "dos valores constantes dos documentos contábeis da sociedade como originários das contribuições descontadas dos empregados", o que, aliás, constou expressamente do relatório de fls. 09/10 ("Descrição dos Fatos") da Delegacia da Previdência Social.
Ademais, os recibos acostados às fls. 206/222 e 237/243, juntados pela defesa na tentativa de demonstrar que não houve o desconto nos salários dos funcionários não se referem ao período descrito na denúncia (10/2000 a 01/2007), mas ao ano de 2008.
Portanto, irrefutável a materialidade delitiva.
A autoria do delito, ao que se depreende do conjunto probatório, restou devidamente comprovada, conforme se extrai dos Instrumentos de Alterações do Contrato Social (fls. 145/153), da prova oral coligida e do interrogatório do próprio réu OSVALDO GRACILIANO VALENTE (fls. 171/172), ao qual, à época dos fatos, cabia exclusivamente a administração do restaurante e, assim, a responsabilidade pelo recolhimento dos tributos. Confira-se:
Quanto ao dolo, registro que o E. Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento que, para o delito de apropriação indébita previdenciária, prescindível é a demonstração do dolo específico.
Para o delito previsto no artigo 168-A do Código Penal, o dolo exigido, portanto, é a vontade livre e consciente de deixar de recolher, no prazo legal, contribuição descontada de pagamentos efetuados a segurados, dispensada a intenção de apropriar-se das importâncias descontadas, ou seja, não se exige o animus rem sibi habendi.
Neste sentido, cito precedente do Superior Tribunal de Justiça, v.g.:
Portanto, não há que se perquirir sobre a ocorrência de apropriação dos valores pelo réu, nem de responsabilidade objetiva do agente. O acusado confessou não ter recolhido as contribuições previdenciárias e atribuiu tal fato às dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa.
Nesta esteira, verifico que a alegada inexigibilidade de conduta diversa não restou demonstrada.
As dificuldades financeiras acarretadoras de estado de necessidade (excludente de antijuridicidade) ou de inexigibilidade de conduta diversa (excludente de culpabilidade) devem ser de tal monta que ponham em risco a própria sobrevivência da empresa e cabe ao acusado, segundo o disposto no art. 156 do Código de Processo Penal, a cabal demonstração de tal circunstância, trazendo aos autos elementos concretos de que a existência da empresa/sociedade estava comprometida, caso recolhesse as contribuições devidas, o que não se evidenciou in casu.
Assim, já decidiu esta E. Corte:
Na hipótese presente, as provas coligidas não são irrefragáveis, nem amplamente comprobatórias de graves e contundentes dificuldades financeiras supostamente experimentadas pela empresa, no período indicado na denúncia, não sendo admissível a tentativa de demonstrá-la apenas com as declarações de informante, irmã da corré (fls. 199/200).
A Defesa não trouxe aos autos, sendo possível fazê-lo, documentação que comprovasse a absoluta precariedade econômica da empresa no período em questão, a inviabilizar por completo o cumprimento das obrigações tributárias, o que somente se evidenciaria concretamente se tivessem sido encartados documentos que espelhassem, de maneira contundente, a situação econômica do estabelecimento ao longo do período em questão.
Remarque-se que meros percalços econômicos, a que todas as pessoas jurídicas estão comumente sujeitas, são contingências normais na vida empresarial e, se não forem gravíssimas, não podem servir como justificativa.
Impende destacar, também, que não houve involução patrimonial do réu no período, conforme demonstram as cópias das declarações de imposto de renda pessoa física acostadas às fls. 257/277, obtidas conforme quebra de sigilo fiscal deferida às fls. 245/247.
Logo, comprovadas autoria e materialidade delitivas e afastada a excludente de culpabilidade, é de rigor a manutenção do decreto condenatório.
Passo à dosimetria da pena.
Pretende a defesa a diminuição da pena base ao mínimo legal, sob o argumento de que não há justificativa para a fixação acima do piso, tendo em vista ser o réu meramente um devedor civil.
Vejamos.
Na primeira fase de fixação da pena, o magistrado fixou a pena-base acima do mínimo legal, em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, considerando as graves consequências do delito representadas pelo valor do crédito tributário.
Entendo que o valor principal do débito em questão, R$ 105.374,15 (cento e cinco mil, trezentos e setenta e quatro reais e quinze centavos), atualizado em dezembro de 2008 para R$ 193.863,97 (cento e noventa e três mil, oitocentos e sessenta e três reais e noventa e sete centavos) perfaz montante suficiente para ensejar o recrudescimento da pena-base. Assim, mantenho-a tal qual fixada na r. sentença. Nesta senda:
Na segunda fase, reconheço, de ofício, a presença da circunstância atenuante da confissão (art. 65, III, "d" do Código Penal - Súmula 545 do Superior Tribunal de Justiça), uma vez que o acusado, em Juízo, admitiu a prática do delito, a par de suscitar versão exculpante, razão pela qual torno a pena ao piso legal, 02 (dois) anos de reclusão.
Na terceira fase, o MM Juiz a quo aumentou, "ex vi" do art. 71 do CP, a pena em 2/3 (dois terços), em razão do não repasse ter se estendido por mais de cinco anos (2000 a 2007), o que fica mantido, pois em consonância com os precedentes desta 1ª Turma, resultando na pena definitiva de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão.
Com relação à pena de multa no crime continuado, assinalo que a sua fixação deve seguir o mesmo critério utilizado para o cálculo da pena privativa de liberdade, aplicando-se, também, o artigo 71 do Código Penal e não a norma do art. 72 do mesmo diploma legal (STJ - 6a Turma - AgRg no REsp 607929-PR - DJ 25.06.2007 p. 309)
Portanto, redimensiono a pena de multa para 16 (dezesseis) dias-multa.
Assim, a pena definitiva totaliza em 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa.
Do mesmo modo, irreparáveis o valor unitário do dia-multa, bem como a fixação do regime inicial de cumprimento de pena no aberto, pois em estrita observância ao artigo 33, §2º, "c", do Código Penal.
Mantenho, por fim, a substituição da pena corporal por penas restritivas de direito, nos termos do artigo 44 do Código Penal, tal qual determinada pelo magistrado de primeira instância e os demais termos da sentença.
Por estes fundamentos, nego provimento ao recurso e, de ofício, reconheço a circunstância do artigo 65, III, "d", do Código Penal, o que resulta na pena definitiva de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa.
Eventual ocorrência da prescrição da pretensão punitiva será declarada após o trânsito em julgado.
É o voto.
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