Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 09/11/2017
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002379-21.2012.4.03.6127/SP
2012.61.27.002379-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : FLAVIO JOSE LEGASPE MAMEDE
: FLAVIO JOSE LEGASPE MAMEDE -EPP
ADVOGADO : SP124916 ANTONIO AUGUSTO VENANCIO MARTINS e outro(a)
No. ORIG. : 00023792120124036127 1 Vr SAO JOAO DA BOA VISTA/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. CRIME DO ART. 2º DA LEI Nº 8.176/91 E DELITOS DOS ARTS. 38, 48 E 55 DA LEI Nº 9.605/98. MATERIALIDADE. AUTORIA. DOLO. DOSIMETRIA DA PENA. AGRAVANTES. ART. 15, INCISO II, LETRAS "A" E "O" DA LEI DOS CRIMES AMBIENTAIS. CONCURSO FORMAL DE DELITOS. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITO. APELAÇÃO PROVIDA.
1. Materialidade, autoria e dolo comprovados em relação ao réu Flávio José Legaspe Mamede pela prática dos crimes previstos no artigo 2º da Lei nº 8.176/91 e arts. 38, 48 e 55 da Lei nº 9.605/98, bem como da empresa corré Flávio José Legaspe Mamede - ME pelos delitos dos arts. 38, 48 e 55 da Lei dos Crimes Ambientais.
2. Dosimetria da pena.
3. Incidência da agravante relacionada à obtenção de vantagem pecuniária (art. 15, inciso II, letra "a", da Lei nº 9.605/98) em relação ao crime do art. 55 da Lei dos Crimes Ambientais, uma vez que a atividade de extração de recurso mineral visava a sua comercialização.
4. Aplicação da agravante prevista no art. 15, inciso II, letra "o", da Lei nº 9.605/98, tendo em vista que a empresa acusada era detentora de licença concedida pelo órgão ambiental, porém desrespeitou os limites nela estabelecidos e ocasionou danos ao meio ambiente.
5. Concurso formal de delitos reconhecido, já que o acusado, mediante uma só ação, praticou dois ou mais crimes, de acordo com o artigo 70 do Código Penal.
6. Para a fixação do regime prisional, devem ser observados os seguintes fatores: modalidade de pena de privativa de liberdade; quantidade de pena aplicada; caracterização ou não da reincidência e circunstâncias do artigo 59 do Código Penal.
7. Substituída a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, haja vista a presença dos requisitos legais.
8. Recurso da acusação provido. Sentença reformada.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso da acusação para reformar a sentença e condenar Flávio José Legaspe Mamede - ME pela prática dos delitos previstos nos arts. 38, 48 e 55 da Lei dos Crimes Ambientais, em concurso material, com imposição de pena de 33 (trinta e três) dias-multa, no valor unitário de ½ salário mínimo, bem como condenar Flávio José Legaspe Mamede como incurso nas penas dos crimes previstos no artigo 2º da Lei nº 8.176/91 e 55 da Lei nº 9.605/98, em concurso formal, bem como pelos delitos dos arts. 38 e 48 da Lei dos Crimes Ambientais, todos em concurso material, com imposição de pena privativa de liberdade definitiva em 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de detenção, em regime inicial aberto, e 31 (trinta e um) dias-multa no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos, com substituição da pena privativa de liberdade deste último por 2 (duas) penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços comunitários e prestação pecuniária de 01 (um) salário mínimo, ambas à entidade assistencial a ser definida pelo Juízo da Execução e, por fim, fixar a quantia de R$ 20.900,00 (vinte mil e novecentos reais - em abril de 2014) em desfavor dos réus, como valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração consumada contra o meio ambiente, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 25 de outubro de 2017.
MAURICIO KATO
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002379-21.2012.4.03.6127/SP
2012.61.27.002379-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : FLAVIO JOSE LEGASPE MAMEDE
: FLAVIO JOSE LEGASPE MAMEDE -EPP
ADVOGADO : SP124916 ANTONIO AUGUSTO VENANCIO MARTINS e outro(a)
No. ORIG. : 00023792120124036127 1 Vr SAO JOAO DA BOA VISTA/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pela acusação contra a sentença de fls. 360/362, que absolveu FLÁVIO JOSÉ LEGASPE MAMEDE da prática dos delitos previsto no artigo 2º da Lei nº 8.176/91 e arts. 38, 48 e 55 da Lei nº 9.605/98 e FLÁVIO JOSÉ LEGASPE - ME da imputação dos crimes dos arts. 38, 48 e 55 da Lei dos Crimes Ambientais, com fundamento no art. 386, inciso II, do Código de Processo Penal.

Em razões de recurso de fls. 365/369, a acusação pleiteia a reforma da sentença, ao fundamento de que o conjunto probatório comprova a materialidade e autoria delitiva. Alega, ainda, que o local de lavra indicado pela letra "A" está abarcado pelo processo nº 821.013/2010 do DNPM, para qual o réu não tem autorização de extração.

A defesa apresentou contrarrazões de recurso às fls. 375/385.

A Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento do recurso da acusação (fls. 387/389).

É o relatório.

Sem revisão, nos termos regimentais.



VOTO

Extrai-se dos autos que Flávio José Legaspe Mamede foi denunciado pela prática dos delitos previstos no artigo 2º da Lei nº 8.176/91 e arts. 38, 48 e 55 da Lei nº 9.605/98, ao passo que a empresa de sua propriedade foi acusada dos crimes delineados nos arts. 38, 48 e 55 da Lei nº 9.605/98, porque extraíram matéria-prima pertencente à União sem autorização legal, executaram a lavra sem a competente licença, destruíram floresta considerada de preservação permanente e impediram a regeneração natural de vegetação.

Narra a peça acusatória que, no Sítio "Santa Madalena", Município de Aguaí/SP, policiais federais constataram a lavra de argila por parte de Flávio José Legaspe Mamede, no âmbito da atividade de sua empresa Flávio José Legaspe Mamede - ME, dentro da área poligonal a que se refere o processo nº 821.013/2010 do DNPM, bem como a existência de uma estrada aberta em meio à floresta estacional semidecidual ribeirinha, em área de preservação permanente, com marcas recentes de supressão vegetal e impedindo a regeneração natural.

Consta ainda da denúncia que a extração da argila não estava amparada nem por licença ambiental e tampouco por autorização do DNPM, assim como o fato de que a materialidade delitiva em relação a lavra e a destruição e impedimento da regeneração natural da floresta estão comprovadas pelo laudo pericial.

Segundo a narrativa acusatória, também há indícios de autoria suficientes para embasar a acusação do réu e da pessoa jurídica da qual é proprietário (fls. 181/182).

O Juízo de primeiro grau absolveu os acusados com base no art. 386, inciso II, do CPP, por concluir pela existência de razoável dúvida acerca da ocorrência do crime (fls. 360/362).

Em apelação, a acusação pleiteia, em síntese, a reforma da sentença, com a condenação dos réus nos termos descritos na denúncia.

Passo a apreciar a matéria devolvida.

A produção de bens ou exploração ilegal de matéria-prima pertencente à União, na modalidade de usurpação, constitui crime contra o patrimônio público, de natureza formal e perigo abstrato, consumando-se no momento em que o agente dá início às atividades extrativas sem a devida autorização dos órgãos competentes ou em desacordo com as obrigações impostas pelo título autorizativo.

Por sua vez, o delito de "destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção" (art. 38 da Lei nº 9.605/98) é de natureza material e de perigo abstrato, já que se presume o dano ao meio ambiente caso a conduta do tipo seja praticada pelo agente.

A infração penal descrita no art. 48 da Lei dos Crimes Ambientais visa punir aquele que "impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação", possui natureza igualmente material, uma vez que exige um resultado distinto da atividade do agente a ele ligado pela relação de causalidade.

Por fim, o crime de "executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida" (art. 55 da Lei nº 9.605/98) configura delito formal (na modalidade extração) e de perigo abstrato, o qual independe de prova da efetiva lesão ao meio ambiente e cuja consumação se dá com a retirada dos recursos minerais.

No particular, do conjunto probatório denota-se que os réus incidiram na prática delituosa na forma como descrita na denúncia.

Ao contrário do aduzido pelo juízo de primeiro grau, verifico que a materialidade delitiva das infrações restou devidamente comprovada pelos seguintes documentos:

a) Boletim de Ocorrência de fls. 03/06, em que as autoridades policiais narram a descoberta da extração irregular de minérios no "Sítio Santa Madalena", de propriedade de Flávio José Legaspe Mamede, na data de 02/06/2010, assim como a existência de uma draga a mais no leito do rio Jaguari-Mirim e tubulações de sucção com polegadas diferentes das estabelecidas nas licenças ambientais;

b) Informação da Secretaria de Estado do Meio Ambiente - Centro Técnico Regional de Campinas, na qual há menção de que em vistoria realizada no Sítio Santa Madalena foi constatada que a área objeto de degradação encontra-se em APP, assim como a existência de uma draga na margem do Rio Jaguari Mirim, ligada a uma tubulação que vai em direção às instalações presentes na área de depósito de areia e também que as areias depositadas estão espalhadas e recobrindo o solo, impedindo a regeneração natural de vegetação (fl. 34/35);

c) Relatório Técnico de Vistoria, emitido em março de 2011, o qual embasou as informações antes mencionadas (fls. 36/43);

d) Laudo de Perícia Criminal Federal de fls. 120/129 e 153/154, com data de 09.04.2014, em que os peritos concluíram pela "extração de argila de áreas de várzea, uma dentro do Processo DNPM nº 821.417/2001 e outra dentro do Processo DNPM 821.013/2010", sendo esta última irregular por ser realizada em área autorizada a outra empresa, assim como "uma estrada aberta em meio a Floresta Estacional Semidecidual Ribeirinha, em Área de Preservação Permanente, onde há marcas recentes de supressão vegetal e impedimento de regeneração natural" (referido dano se deu em APP de aproximadamente 1.500 m²), com valor do dano ambiental mínimo para a área analisada em R$ 20.900,00;

e) Informação Técnica de fls. 282/289, em que os peritos complementaram o laudo pericial, haja vista as impugnações dos réus em relação a real localização da área de extração (apontada pela letra "A" nos mapas), e concluíram que "o polígono de extração mineral identificado com a letra A no Laudo Pericial 118/2014-NUTEC/DPF/CAS/SP encontra-se, sem qualquer sombra de dúvida, dentro do polígono do Processo DNPM nº 821.013/2010";

f) Informação encaminhada pelo DNPM, em que os técnicos do mencionado órgão afirmam que, conquanto o Laudo nº 118/2014 da Polícia Federal não tenha apontado o memorial descritivo da "Área A", o que impossibilita a checagem das coordenadas, "está claro que os peritos da Polícia Federal utilizaram, com rigor técnico, os dados georreferenciados coletados em campo, o seu tratamento em software GIS e a seleção do respectivo datum (SIRGAS 2000)" e que "conclui-se que a 'Área A' está de fato localizada fora dos limites da poligonal do processo do DNPM nº 821.417/01";

g) Licenças de Operação emitida pela CETESB em favor de Flávio José Legaspe Mamede - ME no lapso de 17.06.2009 a 17.06.2012 e 01.08.2013 a 01.08.2015, ambas referentes a área da poligonal do processo do DNPM nº 821.417/2001 (fls. 12/14 e 138/141);

h) Ofícios do DNPM com informação de que a empresa de propriedade do acusado possuía autorização de exploração de areia e argila nas áreas relacionadas aos processos nº 820.511/1995 e 821.417/2001, esta última com concessão de lavra publicada em 05.02.2009 (fls. 92/93 e 133/137) e

i) Informação do DNPM com indicação de que o processo nº 821.013/2010 se refere a alvará de pesquisa concedido a empresa Engeminas Mineração Ltda. (fls. 142/145).

A autoria delitiva é igualmente inconteste.

No termo de declaração prestado em sede de inquérito policial, o réu declarou ter obtido licença ambiental junto à CETESB em 2009, com vencimento em 2012. Afirmou, ainda, que na licença há menção do uso de um cano de quatro polegadas para operação de suas atividades, mas que descobriu ser este insuficiente, o que o fez substituí-lo por outro de seis polegadas. Também disse que não existe irregularidade em relação a extração, já que esta ocorre em apenas um ponto, para o qual está autorizado (fls. 10/11).

No interrogatório judicial, Flávio negou as acusações, pois afirmou que estava extraindo a matéria-prima dentro da sua poligonal, da qual ele tinha autorização da CETESB e DNPM. Declarou que as fotos aéreas mostram que as dragas estavam dentro da sua poligonal e que, portanto, a extração se deu de forma regular. Em relação à área de preservação permanente, disse que quando comprou a propriedade já existia uma trilha no local que dava acesso ao rio e, por isso, a escolheu para auxiliá-lo na extração da areia, tudo com autorização da CETESB. Afirmou que necessitava de um caminho para colocar um encanamento e assim jogar a areia fora. Também esclareceu que o processo do DNPM do ano de 2010 não foi por ele pedido e tampouco faz a extração de material neste local. Confirmou ser o único proprietário da empresa e disse que tem um escritório de geologia que o orienta. Ainda afirmou que, conquanto a perícia tenha constatado que o local da extração era autorizado para a Engeminas, as fotos mostram que a exploração era na área de sua propriedade. Disse que talvez o depósito estivesse na outra poligonal, mas que a draga sempre esteve no mesmo local. Por derradeiro, declarou não ter qualquer relação com a Engeminas e que na estrada existente não passam veículos, só funcionários e o cano, que possui 8 polegadas (fl. 324).

Sua versão não encontra amparo nos demais elementos de prova.

A testemunha Rodrigo Alexandre Sbravatti Piromal afirmou que participou da perícia realizada na área. Disse que a extração era de areia e argila e que lhe chamou a atenção foi o fato de que uma das áreas de extração estava fora do polígono relacionado ao processo do DNPM do réu. Também destacou em seu depoimento a existência de uma estrada em área de preservação permanente e que a regeneração da floresta estava sendo impedida. Afirmou não se recordar do nome do proprietário da empresa, mas declarou que no momento da perícia havia um operador de máquina trabalhando na área que estava fora do polígono autorizado e que ele se identificou como sendo da empresa (fl. 242).

Lourival Campos Moreira, por sua vez, também declarou ter participado da perícia realizada no local. Mencionou que na área havia equipamentos normais da atividade, além de dois locais de extração de argila. Disse que a localização era na margem de um rio e que havia uma estrada improvisada, a qual deteriorava uma área de preservação permanente. Afirmou que existiam pessoas trabalhando no local e que, na ocasião, abordaram o operador de uma retroescavadeira que lhes apresentou duas licenças válidas (fl. 242).

O elemento normativo dos tipos penais resta patente, uma vez que as provas dos autos (com destaque para os laudos periciais) demonstram que a empresa ré praticava a exploração dos minerais fora dos limites previstos pelo órgão do DNPM, o que também ocasionava a extrapolação das licenças ambientais fornecidas, as quais estavam atreladas aos referidos processos do órgão regulador da produção mineral (fls. 12/14, 92/93 e 133/145).

Ademais, verifica-se que não constam das licenças ambientais qualquer autorização para supressão de floresta considerada de preservação permanente, ao contrário exigiu expressamente a demarcação e indicação da sua localização.

As fotos e mapas dos laudos periciais também não deixam dúvidas quanto à extração dos recursos minerais fora da poligonal autorizada e da supressão irregular de vegetação próximo à margem do Rio Jaguari Mirim para a construção de uma estrada, a qual estava impedindo a regeneração da floresta (fls. 121/127).

Por fim, os tipos penais em questão não exigem dolo específico para sua configuração, sendo suficiente o dolo genérico, consistente na vontade livre e consciente de destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção (art. 38 da Lei nº 9.605/98), impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação (art. 48 da Lei dos Crimes Ambientais), extrair recurso mineral sem a competente licença (art. 55 da Lei nº 9.605/98) e de explorar matéria-prima pertencente à União, sem autorização legal (art. 2º da Lei nº 8.176/91).

Todos restaram comprovados, já que o réu Flávio José Legaspe Mamede sabia da ilicitude de sua conduta, uma vez que ele não nega a exploração do recurso mineral e tampouco a abertura da estrada em APP para o desenvolvimento de sua atividade, mas restringe-se a questionar a localização exata da área de extração irregular apontada pelos peritos, bem como afirmar que quando adquiriu o imóvel já havia uma trilha no local, o que o levou a construir a estrada com os canos no mesmo caminho.

Mesmo no tocante ao conhecimento da área de preservação permanente, não há como negar o seu desconhecimento, já que as licenças ambientais mencionam a existência delas, assim como exigem a sua demarcação (fls. 12/14 e 138/141).

Em relação à pessoa jurídica, destaco que a titularidade e direção da empresa foram admitidas pelo próprio acusado Flávio, conforme interrogatório policial e judicial (fls. 10/11 e 324), o que é corroborado pela ficha cadastral simplificada de fl. 173. Da mesma forma, não há como afastar o fato de que as ações criminosas que culminaram na extração irregular do minério e o dano ambiental causado na área de preservação permanente beneficiaram a empresa acusada, já que todos os lucros decorrentes da atividade ilegal eram a ela direcionados.

Logo, restam preenchidos os requisitos exigidos para a responsabilização penal da pessoa jurídica, nos termos do art. 3º da Lei nº 9.605/98.

Portanto, provadas a materialidade, autoria delitiva e dolo, de rigor a condenação de Flávio José Legaspe Mamede como incurso nas penas dos crimes previstos no artigo 2º da Lei nº 8.176/91 e arts. 38, 48 e 55 da Lei nº 9.605/98, bem como da Flávio José Legaspe Mamede - ME pela prática dos delitos dos arts. 38, 48 e 55 da Lei dos Crimes Ambientais.

Passo a análise da dosimetria da pena.


Crime do art. 2º da Lei nº 8.176/91


Réu: Flávio José Legaspe Mamede


Na primeira fase, o artigo 59 do Código Penal estabelece as circunstâncias judiciais que devem ser consideradas na fixação da pena: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstâncias e consequências do crime e comportamento da vítima.

Neste ponto, destaco que o réu é tecnicamente primário, já que nas certidões de fls. 186/187, 216/217, 219/225, 332/334 e 337/379 não há informações de trânsito em julgado, motivo pelo qual não configuram maus antecedentes, conduta social desfavorável nem personalidade voltada para a prática de crime, inviabilizando assim o agravamento da pena-base, nos termos da Súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça.

Outrossim, destaco que as demais circunstâncias judiciais também não podem ser valoradas negativamente, pois não ultrapassam o grau de normalidade daquelas que se verificam habitualmente na infração analisada.

Portanto, fixo a pena-base em 1 (um) ano de detenção.

Na segunda e terceira fases, considerando a ausência de agravantes e atenuantes, bem como causas de aumento e diminuição de pena, fixo a pena definitiva em 01 (um) ano de detenção.

Em relação a pena de multa, ante a ausência de dados concretos relativos à situação econômica do réu nos presentes autos, fixo a pena pecuniária, em consonância com os artigos 49 e 60, ambos do Código Penal e proporcionalmente à pena corporal, em 10 (dez) dias-multa, cada qual no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.


Crime do art. 38º da Lei nº 9.605/98


Réu: Flávio José Legaspe Mamede


Na primeira fase, o artigo 59 do Código Penal estabelece as circunstâncias judiciais que devem ser consideradas na fixação da pena: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstâncias e consequências do crime e comportamento da vítima.

A Lei dos Crimes Ambientais, por sua vez, estipulou alguns critérios específicos para a individualização da pena, os quais estão previstos no art. 6º da Lei nº 9.605/98.

Conforme já referido, o acusado é tecnicamente primário, inclusive quanto ao cumprimento da legislação ambiental, o que impede o agravamento da pena-base, nos termos da Súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça.

As demais circunstâncias judiciais encontram-se dentro da normalidade e não podem ser valoradas negativamente.

Portanto, fixo a pena-base em 1 (um) ano de detenção.

Na segunda e terceira fases, considerando a ausência de agravantes e atenuantes, bem como causas de aumento e diminuição de pena, fixo a pena definitiva em 01 (um) ano de detenção.


Ré: Flávio José Legaspe Mamede - ME


Considerando as disposições do art. 21 da Lei dos Crimes Ambientais, aplico, neste caso, dentre as penas cominadas, a de multa.

De acordo com o artigo 18 da Lei nº 9.605/98 a multa deverá seguir os critérios do Código Penal. Assim, anoto que a doutrina e jurisprudência majoritárias orientam que no cômputo da pena de multa deve ser observado o mesmo critério utilizado para o cálculo de uma pena corporal (arts. 49 e 60 do Código Penal).

Portanto, fixo a pena de multa, na primeira fase da dosimetria, em 10 (dez) dias-multa, ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes e causas de aumento e diminuição de pena, resulta na pena de multa definitiva de 10 (dez) dias-multa.

No mais, ante a inexistência de dados concretos a respeito da situação econômica da ré nos presentes autos, mas considerando que se trata de microempresa, fixo a pena em 10 (dez) dias-multa, cada qual no valor de 1/2 (meio) salário mínimo vigente à época dos fatos.


Crime do art. 48 da Lei nº 9.605/98


Réu: Flávio José Legaspe Mamede


Na primeira fase, o artigo 59 do Código Penal estabelece as circunstâncias judiciais que devem ser consideradas na fixação da pena: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstâncias e consequências do crime e comportamento da vítima.

A Lei dos Crimes Ambientais, por sua vez, estipulou alguns critérios específicos para a individualização da pena, os quais estão previstos no art. 6º da Lei nº 9.605/98.

Conforme já referido, o acusado é tecnicamente primário, inclusive quanto ao cumprimento da legislação ambiental, o que impede o agravamento da pena-base.

As demais circunstâncias judiciais encontram-se dentro da normalidade e não podem ser valoradas negativamente.

Portanto, fixo a pena-base em 6 (seis) meses de detenção.

Na segunda e terceira fases, considerando a ausência de agravantes e atenuantes, bem como causas de aumento e diminuição de pena, fixo a pena definitiva em 06 (seis) meses de detenção.

Em relação a pena de multa, ante a ausência de dados concretos relativos à situação econômica do réu nos presentes autos, fixo a pena pecuniária, em consonância com os artigos 49 e 60, ambos do Código Penal e proporcionalmente à pena corporal, em 10 (dez) dias-multa, cada qual no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.


Ré: Flávio José Legaspe Mamede - ME


Considerando as disposições do art. 21 da Lei dos Crimes Ambientais, aplico, neste caso, a pena de multa.

De acordo com o artigo 18 da Lei dos Crimes Ambientais, a multa deverá seguir os critérios do Código Penal. Anoto que a doutrina e jurisprudência majoritárias orientam no cômputo da pena de multa deve ser observado o mesmo critério utilizado para o cálculo da pena corporal (arts. 49 e 60 do Código Penal).

Assim, fixo a pena de multa, na primeira fase da dosimetria, em 10 (dez) dias-multa, ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes e causas de aumento e diminuição de pena, resulta na pena de multa definitiva de 10 (dez) dias-multa.

No mais, diante da inexistência de dados concretos a respeito da situação econômica da ré nos presentes autos, mas considerando que se trata de microempresa, fixo a pena pecuniária, em consonância com o artigo 18 da Lei dos Crimes Ambientais e arts. 49 e 60, ambos do Código Penal, em 10 (dez) dias-multa, cada qual no valor de 1/2 (meio) salário mínimo vigente à época dos fatos.


Crime do art. 55 da Lei nº 9.605/98


Réu: Flávio José Legaspe Mamede


Na primeira fase, o artigo 59 do Código Penal estabelece as circunstâncias judiciais que devem ser consideradas na fixação da pena: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstâncias e consequências do crime e comportamento da vítima.

A Lei dos Crimes Ambientais, por sua vez, estipulou alguns critérios específicos para a individualização da pena, os quais estão previstos no art. 6º da Lei nº 9.605/98.

Como visto, o acusado é primário, inclusive quanto ao cumprimento da legislação ambiental, o que impede o agravamento da pena-base.

As demais circunstâncias judiciais encontram-se dentro da normalidade e não podem ser valoradas negativamente.

Portanto, fixo a pena-base em 6 (seis) meses de detenção.

No tocante a segunda fase da dosimetria, verifico a incidência da agravante relacionada à obtenção de vantagem pecuniária (art. 15, inciso II, letra "a", da Lei nº 9.605/98), uma vez que a atividade de extração de recurso mineral visava a sua comercialização, conforme declarado pelo réu no interrogatório.

Desta feita, aplico o acréscimo de 1/6 sobre a pena-base, o que resulta em 07 (sete) meses de detenção.

Na terceira fase, não vislumbro causas de aumento ou de diminuição de pena, motivo pelo qual fixo a pena definitiva em 07 (sete) meses de detenção.

Em relação a pena de multa, ante a ausência de dados concretos relativos à situação econômica do réu nos presentes autos, fixo a pena pecuniária, em consonância com os artigos 49 e 60, ambos do Código Penal e proporcionalmente à pena corporal, em 11 (onze) dias-multa, cada qual no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.



Ré: Flávio José Legaspe Mamede - ME


Considerando as disposições do art. 21 da Lei dos Crimes Ambientais, aplico, neste caso, a pena de multa.

De acordo com o artigo 18 da Lei dos Crimes Ambientais, a pena de multa deverá ser aplicada conforme previsão do Código Penal (arts. 49 e 60).

Assim, fixo a pena de multa, na primeira fase da dosimetria, em 10 (dez) dias-multa.

Na segunda fase, penso que devam ser aplicadas duas agravantes específicas da Lei nº 9.605/98, quais sejam, aquela relacionada à obtenção de vantagem pecuniária e a que prevê a agravante por ter a acusada cometido o crime mediante abuso do direito de licença, permissão ou autorização (art. 15, inciso II, letras "a" e "o", da Lei nº 9.605/98).

Com efeito, não há dúvidas de que a autora do delito em questão o cometeu com obtenção de vantagem pecuniária, uma vez que buscava conseguir algum tipo de lucro com sua atividade. In casu, os recursos minerais extraídos seriam comercializados pela pessoa jurídica, ora ré.

Da mesma forma, houve patente abuso do direito de licença ambiental, tendo em vista que a acusada era detentora de licença concedida pelo órgão ambiental, porém desrespeitou os limites nela estabelecidos e ocasionou danos ao meio ambiente.

Diante desta situação, aplico o acréscimo de 1/6 na pena para cada agravante, no que resulta em 13 (treze) dias-multa.

No mais, ante a ausência de dados concretos a respeito da situação econômica da ré nos presentes autos, mas considerando que se trata de microempresa, fixo a pena pecuniária, em consonância com o artigo 18 da Lei dos Crimes Ambientais e arts. 49 e 60, ambos do Código Penal, em 13 (treze) dias-multa, cada qual no valor de 1/2 (meio) salário mínimo vigente à época dos fatos.



Concurso de Crimes


Por fim, reconheço o concurso formal entre os delitos do art. 55 da Lei nº 9.605/98 e art. 2º da Lei nº 8.176/91, já que o acusado, mediante uma só ação, praticou dois crimes, de acordo com o artigo 70 do Código Penal, devendo ser aplicada a maior pena cominada em concreto para cada um deles, com acréscimo de 1/6 (um sexto) a 1/2 (metade).

Dessa forma, determino o acréscimo de 1/6 (um sexto) sobre a pena mais grave (1 ano de detenção), do que resulta a pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de detenção para o acusado Flávio José Legaspe Mamede.

Em relação aos demais delitos para o qual foi condenado (arts. 38 e 48 da Lei nº 9.605/98), verifico a existência de concurso material, pelo que resulta a soma definitiva de todos os crimes em 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de detenção para o acusado Flávio José Legaspe Mamede.


Na hipótese de concurso de crimes, as penas de multa devem ser somadas, nos termos do art. 72 do Código Penal, no que contabiliza o pagamento de 31 (trinta e um) dias-multa, de 1/30 do salário mínimo para o réu Flávio José Legaspe Mamede.


Em relação à pessoa jurídica, conforme previsão do art. 72 do Código Penal e art. 18 da Lei dos Crimes Ambientais, a pena de multa imposta a Flávio José Legaspe Mamede - ME resulta em 33 (trinta e três) dias-multa, de ½ salário mínimo por dia.


No tocante ao regime prisional, devem ser observados os seguintes fatores: a) modalidade de pena de privativa de liberdade, ou seja, reclusão ou detenção (art. 33, caput, CP); b) quantidade de pena aplicada (art. 33, §2º, alíneas a, b e c, CP); caracterização ou não da reincidência (art. 33, §2º, alíneas b e c, CP) e d) circunstâncias do artigo 59 do Código Penal (art. 33, §3º, do CP).

No particular, a pena concretamente aplicada (2 anos e 8 meses de detenção) e as circunstâncias judiciais favoráveis, em sua maioria, autorizam a fixação do regime aberto, nos termos do artigo 33, §2º, b, do Código Penal.


Cabível, ainda, a substituição da pena privativa de liberdade, nos termos do artigo 44, incisos I e III, do Código Penal, por 2 (duas) penas restritivas de direito, uma de prestação de serviços comunitários e outra de prestação pecuniária que fixo no valor de 1 (um) salário mínimo, haja vista a atual situação financeira do réu, ambas à entidade assistencial a ser definida pelo Juízo da Execução.


Por derradeiro, ante a existência de pedido expresso e da regra prevista no art. 387, inciso IV, do CPP, fixo em desfavor dos réus FLÁVIO JOSÉ LEGASPE E FLÁVIO JOSÉ LEGASPE - ME, a quantia de R$ 20.900,00 (em abril de 2014) como valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração consumada contra o meio ambiente (fls. 120/129).


Diante do exposto, dou provimento ao recurso da acusação para reformar a sentença e condenar Flávio José Legaspe Mamede - ME pela prática dos delitos previstos nos arts. 38, 48 e 55 da Lei dos Crimes Ambientais, em concurso material, com imposição de pena de 33 (trinta e três) dias-multa, no valor unitário de ½ salário mínimo, bem como condenar Flávio José Legaspe Mamede como incurso nas penas dos crimes previstos no artigo 2º da Lei nº 8.176/91 e 55 da Lei nº 9.605/98, em concurso formal, bem como pelos delitos dos arts. 38 e 48 da Lei dos Crimes Ambientais, todos em concurso material, com imposição de pena privativa de liberdade definitiva em 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de detenção, em regime inicial aberto, e 31 (trinta e um) dias-multa no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos. Substituo a pena privativa de liberdade deste último por 2 (duas) penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços comunitários e prestação pecuniária de 01 (um) salário mínimo, ambas à entidade assistencial a ser definida pelo Juízo da Execução. Fixo em desfavor dos réus a quantia de R$ 20.900,00 (vinte mil e novecentos reais - em abril de 2014) como valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração consumada contra o meio ambiente.

É como voto.



MAURICIO KATO
Desembargador Federal


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