Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 19/10/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001745-10.2016.4.03.9999/SP
2016.03.99.001745-4/SP
RELATORA : Desembargadora Federal ANA PEZARINI
APELANTE : DANIELLA ARAUJO DOS SANTOS
ADVOGADO : SP262598 CLAUDIO MARCIO DE ARAUJO
APELADO(A) : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR : SP135087 SERGIO MASTELLINI
ADVOGADO : SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
No. ORIG. : 14.00.00169-6 1 Vr TEODORO SAMPAIO/SP

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. PROVA TESTEMUNHAL, IMPRESCINDIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. OCORRÊNCIA. SENTENÇA ANULADA. APELAÇÃO PROVIDA.
- A r. sentença julgou improcedente o pedido sob fundamento da inexistência de prova documental do exercício de atividade rural pela demandante. Tal fato, a princípio, seria suficiente para manutenção do julgado.
- Ocorre que, comprovada a maternidade da parte autora pela certidão de nascimento de seu filho, Evandro Vinícius dos Santos Araújo, ocorrido em 10/01/2013 (fl. 17), impendendo-lhe demonstrar atividade campestre, ainda que de forma descontínua, a requerente apresentou certidão de residência e atividade rural do ITESP de 06/2013, com informação de que ela é trabalhadora rural e agregada/neta do titular do assentamento, desde o ano de 1994 até os dias atuais, fazendo parte da força de trabalho (fls. 23), bem como notas fiscais de produtor, em nome de seu avô, de 2012/2014 (fls. 24/26).
- Em razão da natureza da demanda em que se busca a concessão de salário-maternidade de trabalhadora rural, a realização da prova testemunhal é imprescindível para o julgamento da lide, ante a possibilidade de comprovação da atividade rural mediante princípio de prova documental, ratificado por testemunhos idôneos, independentemente de contribuição.
- Durante a instrução processual, o magistrado sentenciante, com a finalidade de redução da pauta de audiências, facultou à requerente carrear aos autos, sob pena de preclusão, "declarações com firma reconhecida de ao menos duas testemunhas".
- A dispensa da designação de audiência cerceou, contudo, o direito da vindicante de produzir prova testemunhal em audiência, devidamente requerida na inicial, malferindo os princípios do contraditório e da ampla defesa, assegurados pelo artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal.
- Frustrada a concretização do conjunto probatório, em decorrência da ausência de produção de prova oral, a anulação do processo, a partir da contestação, é medida que se impõe, a fim de que, oportunizada a prova, seja prolatada nova sentença.
- Provida a apelação da parte autora, a fim de anular a sentença, determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem, para regular prosseguimento do feito.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, a fim de anular a sentença, determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem, para regular prosseguimento do feito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 02 de outubro de 2017.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal Relatora


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001745-10.2016.4.03.9999/SP
2016.03.99.001745-4/SP
RELATORA : Desembargadora Federal ANA PEZARINI
APELANTE : DANIELLA ARAUJO DOS SANTOS
ADVOGADO : SP262598 CLAUDIO MARCIO DE ARAUJO
APELADO(A) : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR : SP135087 SERGIO MASTELLINI
ADVOGADO : SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
No. ORIG. : 14.00.00169-6 1 Vr TEODORO SAMPAIO/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelação autoral tirada de sentença que julgou improcedente ação de concessão de salário-maternidade e condenou a vencida no pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$ 300,00, observada a concessão da justiça gratuita (fls. 43/44).

Durante a instrução processual, foi dispensada a designação de audiência, pelo Juízo de origem, facultando-se, à proponente, que carreasse aos autos, sob pena de preclusão, declarações com firma reconhecida de, ao menos, duas testemunhas, indicando os períodos e locais em que aquela teria trabalhado, atividades exercidas, bem assim outras informações pertinentes (fls. 33 e 38). A autora, sem cumprimento do quanto determinado, requereu a extinção do feito (fl. 40), com o que não concordou o INSS (fl. 41), sobrevindo a sentença.

Desta feita, pretende a parte autora em seu recurso, seja reformada a decisão. Subsidiariamente, pugna pela anulação da sentença, diante do cerceamento de defesa decorrente da ausência de oitiva de testemunhas, com o regular prosseguimento do feito (fls. 47/56).

Em contrarrazões de fls. 59/63, o INSS alega conexão de feitos, pugnando pela reunião destes autos com o processo nº 0001746-92.2016.4.03.999 (processo de origem nº 0001976-19.2014.826.0627 da Comarca de Teodoro Sampaio).


VOTO

Cuida-se de ação em que se busca a concessão de salário-maternidade.

Comprovada a maternidade da parte autora pela certidão de nascimento de seu filho, Evandro Vinícius dos Santos Araújo, ocorrido em 10/01/2013 (fl. 17), impendia-lhe demonstrar atividade campestre, ainda que de forma descontínua.

A r. sentença julgou improcedente o pedido, sob fundamento da inexistência de prova documental da condição de trabalhadora rural da demandante. Tal fato, a princípio, seria suficiente para manutenção do julgado.

Ocorre que a autora juntou aos autos certidão de residência e atividade rural do ITESP de 06/2013, com informação de que ela é trabalhadora rural e agregada/neta do titular do assentamento, desde o ano de 1994 até os dias atuais, fazendo parte da força de trabalho (fls. 23), bem como notas fiscais de produtor, em nome de seu avô, de 2012/2014 (fls. 24/26).

Quanto à aceitabilidade do início probatório amealhado, cumpre esclarecer que referida entidade, vinculada à Secretaria de Estado da Justiça e da Defesa da Cidadania, tem por fito a promoção da democratização do acesso à terra, em prol de trabalhadores rurais sem-terra, quilombolas e posseiros, planejando e executando políticas agrária e fundiária do Estado de São Paulo, incluído o reconhecimento de comunidades de quilombos.

Dessa forma, resta evidenciada a presença, in casu, de princípio de prova documental do labor rural, contemporâneo à nascença.

Em razão da natureza da demanda, a realização da prova testemunhal é imprescindível para o julgamento da lide, ante a possibilidade de comprovação da atividade rural mediante princípio de prova documental, ratificado por testemunhos idôneos, independentemente de contribuição.

Ocorre que, durante a instrução processual, o magistrado sentenciante, com a finalidade de redução da pauta de audiências da comarca de origem, facultou, à requerente, nos termos do art. 212, inciso III, c/c o art. 219, ambos do Código Civil, carrear aos autos, sob pena de preclusão, "declarações com firma reconhecida de ao menos duas testemunhas indicando o(s) período(s) e o(s) local(is) em que a parte trabalhou, respectivas atividades exercidas, como a testemunha teve conhecimento dessas informações (trabalhou junto, vizinho, etc.), bem como outras informações pertinentes, dispensando-se, assim, designação de audiência nos autos" (fls. 33).

Sem a apresentação das referidas declarações e, diante da discordância do INSS quanto ao pedido de extinção do feito formulado pela requerente (fls. 40/41), sobreveio a sentença de improcedência (fls. 43/44).

A dispensa da designação de audiência cerceou, contudo, o direito da vindicante de produzir prova testemunhal em audiência, devidamente requerida na inicial, malferindo os princípios do contraditório e da ampla defesa, assegurados pelo artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal.

Transcrevo, por oportuno, os seguintes julgados da Nona Turma deste E. Tribunal, proferidos em situações análogas:


"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL INDISPENSÁVEL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE RECONHECIDA DE OFÍCIO. SENTENÇA ANULADA. APELAÇÃO PREJUDICADA.

- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.

- No caso dos autos, a parte autora alega ter exercido atividades rurais até ser acometida de doença incapacitante que a impede de trabalhar. Como início de prova material do alegado trabalho rural , consta dos autos cópia de sua certidão de casamento e nascimento da filha, com a qualificação de lavrador.

- Nos casos em que se pleiteia a concessão de benefício previdenciário por incapacidade, em decorrência do exercício de atividade rural, a realização de prova testemunhal é imprescindível para se aferir a qualidade de segurado da parte autora.

- Havendo necessidade de colheita de determinada prova, o Juiz deve determinar, até mesmo de ofício, a sua produção, em homenagem ao princípio da verdade real. Precedentes do STJ.

- cerceamento de defesa configurado. Sentença anulada de ofício, com determinação de retorno dos autos à instância de origem para a realização de prova testemunhal e novo julgamento.

- Apelação prejudicada."

(AC 2016.03.99.031221-0, Relator Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias, D.E. 24/11/2016)


"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. PEDIDO IMPROCEDENTE POR AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ART. 285-A. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. NECESSIDADE. SENTENÇA ANULADA. APELAÇÃO PREJUDICADA.

- À concessão da aposentadoria por idade rural , exige-se: a comprovação da idade mínima (55 anos de idade para mulher e 60 anos para homem) e o desenvolvimento de atividade rural , pelo tempo correspondente à carência, no período imediatamente anterior ao requerimento, ressalvada a hipótese do direito adquirido.

- A atividade rural deve ser comprovada mediante início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea e robusta, independentemente de contribuição.

- A prova material em harmonia com a prova testemunhal é requisito imprescindível para o reconhecimento judicial do benefício de aposentadoria rural por idade.

- Desse modo, apesar de o documento apresentado constituir, em tese, início de prova material, faz-se necessária, no caso, a oitiva das testemunhas, que fora requerida pela parte autora, para que não fique configurado cerceamento de defesa.

- O artigo 285-A do Código de Processo Civil é aplicável quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, podendo ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.

- No caso em análise, contudo, verifica-se que a solução para o litígio depende de dilação probatória, posto que a controvérsia exige a produção de prova testemunhal , para esclarecimentos acerca do exercício de atividade rural pela parte autora durante o período de carência previsto na legislação previdenciária. A matéria controvertida, portanto, não é unicamente de direito, de modo que também se incorre em cerceamento de defesa.

- Sentença anulada para determinando o retorno dos autos à Vara de origem para que seja concluída a instrução probatória, com a oitiva de testemunhas.

- Apelação da parte autora prejudicada."

(AC 0027489-07.2016.4.03.9999, Relator Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias, D.E. 24/11/2016)


Especificamente, acerca da determinação de juntada, pela parte autora, de declarações de testemunhas com firma reconhecida, dispensando-se sua oitiva em juízo, trago o recente julgado da Oitava Turma desta C. Corte, reiterando posicionamento precedente:


"PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE DO DECISUM PARA REALIZAÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. I- Dispõe o art. 5º, inc. LV, da Constituição Federal que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes". II- Existe relevante matéria de fato que torna inafastável a realização de prova oral em audiência, absolutamente imprescindível para a plena constatação do direito da postulante. Com efeito, o reconhecimento do exercício de trabalho rural exige a presença de início razoável de prova material corroborada por prova testemunhal em audiência. No entanto, o MM. Juiz a quo, ao determinar a juntada pela parte autora de declarações de testemunhas com firma reconhecida, dispensando a oitiva das testemunhas em juízo, proferindo, desde logo, sentença, não deu o merecido realce às garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, deixando de contemplar, em toda a sua dimensão, o princípio do devido processo legal. III- Sentença anulada, de ofício. Apelação do INSS prejudicada." (destaquei)

(AC 00025298420164039999, Relator Desembargador Federal Newton De Lucca, e-DJF3 Judicial 03/11/2016)


Ademais, quanto às declarações unilaterais, mesmo que fossem apresentadas, é certo que não ostentam idoneidade probatória de trabalho rural, pois equivalem a depoimentos colhidos sem o crivo do contraditório.

Nessa esteira os seguintes julgados desta Corte:

"(...) Meras declarações não podem ser consideradas como início razoável de prova material, equivalendo, em vez disso, a simples depoimentos unilaterais reduzidos a termo e não submetidos, o que é pior, ao crivo do contraditório. Estão, portanto, em patamar inferior, no meu entender, à prova testemunhal colhida em juízo, por não garantir a bilateralidade de audiência. (...) Apelação e remessa oficial providas para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido. Recurso adesivo prejudicado." (Oitava Turma - APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO - 2005456 / SP, Rel. Des. Fed. Terezinha Cazerta, v.u., e-DJF 3 Judicial 1: 18/02/2015).
"(...) 3 - As declarações unilaterais juntadas não têm o condão de corroborar o início da prova documental produzida pela autora, porquanto não submetidas ao crivo do contraditório, não permitindo, assim, o enquadramento como segurada rural. Não têm força probante do trabalho, já que substancialmente não se diferem de depoimentos, com a agravante de serem pouco esclarecedoras e de idêntico teor - a indicar que certamente foram redigidas por terceiro para simples assinatura -, aplicando-se a regra do parágrafo único do art. 408 do CPC em vigor (art. 368, parágrafo único do antigo), segundo a qual o documento particular não prova o fato declarado senão somente a própria declaração, cabendo à parte interessada o ônus de provar esse fato. 4 - Imprescindível a oitiva da prova testemunhal para o fim de corroborar o início da prova documental juntada aos autos, devendo o feito retornar ao Juízo de origem para regular prosseguimento mediante produção de prova oral. 5 - Sentença anulada. Prejudicada análise do mérito da apelação." (Sétima Turma - AC - APELAÇÃOCÍVEL - 2092091/SP, Rel. Juiz Convocado Claudio Santos, v.u., e-DFJ3 Judicial 1: 21/10/2016).

Frustrada, portanto, a concretização do conjunto probatório, em decorrência da ausência de produção de prova oral, impõe-se a anulação da sentença, a fim de que seja realizada audiência para produção da prova testemunhal, vez que imprescindível ao julgamento da lide.

Ainda, fica prejudicado o pedido formulado pela autarquia federal em contrarrazões de fls. 59/63, voltado à reunião deste processo ao feito nº 0001746-92.2016.4.03.999 (processo de origem nº 0001976-19.2014.826.0627 da Comarca de Teodoro Sampaio), tendo em vista a baixa definitiva daqueles autos, conforme consulta que segue anexa.

Ante o exposto, dou provimento à apelação da parte autora, a fim de anular a sentença, determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem, para regular prosseguimento do feito.


É como voto.







ANA PEZARINI
Desembargadora Federal Relatora


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): ANA LUCIA JORDAO PEZARINI:10074
Nº de Série do Certificado: 3826AEADF05E125A
Data e Hora: 03/10/2017 15:17:07