Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 30/05/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000261-76.2014.4.03.6103/SP
2014.61.03.000261-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES
APELANTE : WILLIANS VIEIRA DE MELO KIWAMEN e outro(a)
: LILIAN KIWAMEN
ADVOGADO : SP174648 ANDRÉ LUIZ DE LIMA CITRO e outro(a)
APELADO(A) : Caixa Economica Federal - CEF
ADVOGADO : SP184538 ITALO SERGIO PINTO e outro(a)
No. ORIG. : 00002617620144036103 1 Vr SAO JOSE DOS CAMPOS/SP

EMENTA

APELAÇÃO - PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO JURÍDICO - ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - LEI Nº 9.514/97 - CONSTITUCIONALIDADE - CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE - LEILÃO - NOTIFICAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR - NECESSIDADE - VÍCIO NO PROCEDIMENTO - REFORMA DA SENTENÇA.
I - O contrato firmado entre as partes possui cláusula de alienação fiduciária em garantia, na forma do artigo 38 da Lei nº 9.514/97, cujo regime de satisfação da obrigação difere dos mútuos firmados com garantia hipotecária, posto que na hipótese de descumprimento contratual e decorrido o prazo para a purgação da mora, ocasiona a consolidação da propriedade do imóvel em nome da credora fiduciária.
II - O procedimento de execução do mútuo com alienação fiduciária em garantia, não ofende a ordem constitucional vigente, sendo passível de apreciação pelo Poder Judiciário, caso o devedor assim considerar necessário. Precedentes desta E. Corte.
III - O MM. Juiz a quo entendeu que: "(...) Uma vez consolidada a propriedade em favor da CEF, ocorreu a extinção da dívida, nos termos do artigo 27, 5º, da Lei nº 9.514/97. A partir de então, considerando que o imóvel passou a integrar o patrimônio da instituição financeira, ela poderá promover leilão para a alienação do imóvel, nos termos da lei.".
IV - Conforme posicionamento da Corte Superior de Justiça nos contratos de alienação fiduciária de coisa imóvel a extinção do contrato de mútuo não ocorreria por ocasião da consolidação da propriedade do bem a favor do agente fiduciário.
IV - Ademais, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da necessidade de intimação pessoal do devedor fiduciante da data da realização do leilão extrajudicial, com base no art. 39, II, da Lei 9.514/97 "aplicando-se as disposições dos artigos 29 a 41 do Decreto-Lei n.º 70/66 às operações de financiamento imobiliário em geral a que se refere a Lei nº 9.514/97".
IV - A CEF não trouxe aos autos nenhum documento capaz de comprovar que houve a intimação do autor quanto à data da realização do leilão. Inteligência do art. 373, II, do CPC/2015.
V - Importante frisar que a parte autora demonstra que há interesse em exercer o direito de purgar a mora com recursos do FGTS.
VI - Ad argumentandum tantum, a jurisprudência pátria vem admitindo saque para pagamento de prestações de financiamento para a aquisição de casa própria, ainda que à margem do Sistema Financeiro de Habitação e mesmo que tais parcelas estejam em atraso.
VII - Reconhecida a nulidade da execução extrajudicial diante da necessidade de intimação pessoal dos devedores acerca da data da realização do leilão.
VIII - Apelação provida. Sentença reformada.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo-se no julgamento, nos termos do artigo 942 do Código de Processo Civil e do artigo 260, §1º, do Regimento Interno do Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região, a Segunda Turma, por maioria, decidiu dar provimento à apelação para reformar a r. sentença, invertendo-se o ônus da sucumbência, nos termos do voto do Senhor Desembargador Federal Relator, acompanhado pelo voto do Senhor Desembargador Federal Souza Ribeiro e do Senhor Desembargador Federal Hélio Nogueira; vencidos o Senhor Desembargador Federal Peixoto Junior e o Senhor Juiz Federal Convocado Renato Becho, que lhe negavam provimento.


São Paulo, 01 de fevereiro de 2018.
COTRIM GUIMARÃES
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000261-76.2014.4.03.6103/SP
2014.61.03.000261-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES
APELANTE : WILLIANS VIEIRA DE MELO KIWAMEN e outro(a)
: LILIAN KIWAMEN
ADVOGADO : SP174648 ANDRÉ LUIZ DE LIMA CITRO e outro(a)
APELADO(A) : Caixa Economica Federal - CEF
ADVOGADO : SP184538 ITALO SERGIO PINTO e outro(a)
No. ORIG. : 00002617620144036103 1 Vr SAO JOSE DOS CAMPOS/SP

DECLARAÇÃO DE VOTO

Divergindo no julgamento efetuado e ficando vencido procedo à declaração de voto.

No tocante à questão da necessidade ou não de intimação pessoal dos devedores da data de realização dos leilões consigno inexistir na legislação especial que rege a matéria, na redação vigente à época da designação dos leilões, previsão da pretendida exigência.

Neste sentido, julgado desta E. Corte:


PROCESSO CIVIL - SFH - REVISÃO CONTRATUAL - CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE - SENTENÇA SEM MÉRITO - FALTA DE INTERESSE DE AGIR - EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL - LEI 9.514/97 - CONSTITUCIONALIDADE - INTIMAÇÃO PESSOAL DAS DATAS DOS LEILÕES - FALTA DE PREVISÃO LEGAL.
1 - Em razão da extinção da ação, sem resolução do mérito, em relação ao pedido de revisão contratual, não há necessidade de se apreciar os fundamentos jurídicos do pedido, como aplicação do Código de Defesa do Consumidor.
2 - O interesse de agir por parte do mutuário na ação revisional não persiste após a adjudicação do bem em sede executiva, quando ocorrida esta antes do ajuizamento da ação.
3 - O procedimento de execução extrajudicial estabelecido na Lei nº 9.514/97 harmoniza-se com o disposto no artigo 5º, LIV, da Constituição Federal. A referida lei deu prevalência à satisfação do crédito, não conferindo à defesa do executado condição impeditiva da execução. Eventual lesão individual não fica excluída da apreciação do Poder Judiciário, vez que há previsão de uma fase de controle judicial antes da perda da posse do imóvel, desde que reprimida pelos meios processuais próprios, havendo nos autos prova documental robusta da observância pela instituição financeira dos requisitos ali previstos para a execução extrajudicial do bem imóvel.
4 - O artigo 27, da Lei nº 9.514/97 não estabelece a necessidade de intimação pessoal do devedor das datas dos leilões.
5 - Apelação da parte autora desprovida.
(AC 00459105720114036301, DESEMBARGADOR FEDERAL MAURICIO KATO, TRF3 - QUINTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/02/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
O entendimento de inexigibilidade da providência de intimação fundada na ausência de previsão legal ampara-se em exegese da redação original da Lei 9.514/97 que não encerra disposição nesse sentido, não se olvidando a existência de precedentes da Turma concluindo pela necessidade de notificação pessoal com indicação de julgado do STJ (AgRg no REsp 1367704/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/08/2015, DJe 13/08/2015), o qual, por sua vez, faz referência a outro da Corte Superior (REsp 1447687/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/08/2014, DJe 08/09/2014), mas não se trata de entendimento sistematicamente reafirmado na jurisprudência da Corte Superior.
Observo, ainda, que em 11 de julho de 2017 foi editada a Lei 13.465, que inseriu o §2º-A ao artigo 27 da Lei 9.514/97, verbis:

Art. 27. Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da data do registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel.
§ 1o Se no primeiro leilão público o maior lance oferecido for inferior ao valor do imóvel, estipulado na forma do inciso VI e do parágrafo único do art. 24 desta Lei, será realizado o segundo leilão nos quinze dias seguintes. (Redação dada pela Lei nº 13.465, de 2017)
§ 2º No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que igual ou superior ao valor da dívida, das despesas, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais.
§ 2o-A. Para os fins do disposto nos §§ 1o e 2o deste artigo, as datas, horários e locais dos leilões serão comunicados ao devedor mediante correspondência dirigida aos endereços constantes do contrato, inclusive ao endereço eletrônico. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
(...)

Destarte, a meu juízo somente a partir da entrada em vigor da Lei 13.465, de 11 de julho de 2017, há se falar em exigência de comunicação do devedor, e não por notificação pessoal mas mediante correspondência, acerca das datas, horários e locais dos leilões.
No caso dos autos, o que se observa é que o leilão foi designado e realizado antes do advento da Lei 13.465/17, pelo que avulta inexigível a providência.
Estas as razões de meu voto negando provimento ao recurso.
É o voto declarado.

Peixoto Junior
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000261-76.2014.4.03.6103/SP
2014.61.03.000261-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES
APELANTE : WILLIANS VIEIRA DE MELO KIWAMEN e outro(a)
: LILIAN KIWAMEN
ADVOGADO : SP174648 ANDRÉ LUIZ DE LIMA CITRO e outro(a)
APELADO(A) : Caixa Economica Federal - CEF
ADVOGADO : SP184538 ITALO SERGIO PINTO e outro(a)
No. ORIG. : 00002617620144036103 1 Vr SAO JOSE DOS CAMPOS/SP

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator): Trata-se de recurso de apelação interposto por WILLIANS VIEIRA DE MELO KIWAMEN e outro(a) contra a sentença de fls. 243 e ss. que, nos autos da ação anulatória de ato jurídico, ajuizada em face da Caixa Econômica Federal, pretendendo a declaração de nulidade do procedimento extrajudicial que culminou com a consolidação da propriedade do imóvel, julgou improcedente o pedido, nos termos do art. 487, I, do NCPC.


Condenou a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atribuído à causa, ficando sua execução suspensa na forma do art. 98, §3º, do CPC/2015.


Em suas razões, os apelantes aduzem que a sentença deve ser reformada pelos seguintes motivos: a) que após a celebração contratual os mutuários passaram por problemas financeiros, ocasionando o atraso das prestações; b) que tentaram a utilização dos valores depositados nas contas vinculadas do FGTS do requerente, que conforme anexos extratos, somam valor suficiente para quitar as parcelas vencidas; c) que a requerida deu início à execução extrajudicial, levando o bem em comento à leilão, sem proceder sequer o aviso de que o faria; d) que o referido Fundo foi criado para salvaguardar o trabalhador, pois o fim almejado pelo Estado Democrático de Direito, encontra-se disciplinado pelo art. 1º, incisos II, III e IV da Constituição Federal, quais sejam, a cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho; e) que o procedimento executório previsto na Lei nº 9.514/97 ofende a garantias constitucionais (fls. 84 e ss.).


Devidamente processado o recurso, vieram os autos a esta E. Corte.


É o relatório.



VOTO

O Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator): Anoto, de início, que o presente contrato possui cláusula de alienação fiduciária em garantia, na forma do artigo 38 da Lei nº 9.514/97, cujo regime de satisfação da obrigação difere dos mútuos firmados com garantia hipotecária, posto que na hipótese de descumprimento contratual e decorrido o prazo para a purgação da mora, ocasiona a consolidação da propriedade do imóvel em nome da credora fiduciária.


Além disso, o procedimento de execução do mútuo com alienação fiduciária em garantia, não ofende a ordem constitucional vigente, sendo passível de apreciação pelo Poder Judiciário, caso o devedor assim considerar necessário.


Confiram-se, a propósito, recentes julgados desta E. Corte:

PROCESSO CIVIL - SFH - ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - LEI 9.514/97 - CONSTITUCIONALIDADE. 1 - O procedimento de execução extrajudicial estabelecido na Lei nº 9.514/97 harmoniza-se com o disposto no artigo 5º, LIV, da Constituição Federal. A referida lei deu prevalência à satisfação do crédito, não conferindo à defesa do executado condição impeditiva da execução. Eventual lesão individual não fica excluída da apreciação do Poder Judiciário, vez que há previsão de uma fase de controle judicial antes da perda da posse do imóvel, desde que reprimida pelos meios processuais próprios. 2 - Apelação desprovida.
(AC 00117882720114036104, DESEMBARGADOR FEDERAL MAURICIO KATO, TRF3 - QUINTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/12/2015 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
CONSTITUCIONAL E CIVIL. AGRAVO LEGAL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA . CONSTITUCIONALIDADE DA EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL PREVISTA PELA LEI N. 9.514/97. INADIMPLEMENTO. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE EM NOME DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RECURSO IMPROVIDO.(...) 3. Afasta-se de plano a inconstitucionalidade da execução extrajudicial prevista pela Lei n. 9.514/97, a semelhança do que ocorre com a execução extrajudicial de que trata o Decreto-lei n. 70/66 de há muito declarada constitucional pelo STF. (...) 5. Inexistindo fundamentos hábeis a alterar a decisão monocrática, o agravo legal deve ser improvido.
(AC 00096348420124036109, DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/12/2015 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
PROCESSO CIVIL: AGRAVO LEGAL. ARTIGO 557 DO CPC. DECISÃO TERMINATIVA. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ATO JURÍDICO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CONSTITUCIONALIDADE DA LEI Nº 9.514/97. AGRAVO IMPROVIDO. (...)5 - Ressalte-se que não há que se confundir a execução extrajudicial do Decreto-lei nº 70/66 com a alienação fiduciária de coisa imóvel, como contratado pelas partes, nos termos dos artigos 26 e 27 da Lei nº 9514/97, não constando, portanto, nos autos, qualquer ilegalidade ou nulidade nos atos de consolidação da propriedade do imóvel pela instituição financeira fiduciária. 6 - A simples alegação dos agravantes, com respeito à possível inconstitucionalidade da Lei nº 9.514/97, não se traduz em causa bastante a ensejar a suspensão ou anulação dos efeitos da execução extrajudicial do imóvel. 7 - Os recorrentes não trouxeram nenhum elemento capaz de ensejar a reforma da decisão guerreada, limitando-se a mera reiteração do quanto já expendido nos autos. Na verdade, os agravantes buscam reabrir discussão sobre a questão de mérito, não atacando os fundamentos da decisão, lastreada em jurisprudência dominante. 8 - Agravo improvido.
(AC 00137751320114036100, DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO, TRF3 - DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/09/2015 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

No caso dos autos, o Magistrado de primeiro grau entendeu que:

"(...) não é possível inferir pela ocorrência de nulidade do procedimento extrajudicial, sob o argumento de descumprimento ao devido processo legal.
Uma vez consolidada a propriedade em favor da CEF, ocorreu a extinção da dívida, nos termos do artigo 27, 5º, da Lei nº 9.514/97. A partir de então, considerando que o imóvel passou a integrar o patrimônio da instituição financeira, ela poderá promover leilão para a alienação do imóvel, nos termos da lei.
Resta claro, portanto, que o agente fiduciário respeitou a legislação de regência, inexistindo razão para decretação da nulidade do procedimento extrajudicial que culminou com a consolidação da propriedade do imóvel em nome da CEF." - grifo nosso.

A premissa adotada pela nossa Corte Superior de Justiça foi a de que os contratos de alienação fiduciária de coisa imóvel são compostos de duas fases: a fase da consolidação da propriedade e a fase da alienação do bem a terceiros, mediante leilão. Assim, a extinção do contrato de mútuo não ocorreria por ocasião da consolidação da propriedade do bem a favor do agente fiduciário, fato este que apenas daria início a uma nova fase do procedimento de execução contratual, o que permitiria a purgação da mora até a assinatura do auto de arrematação decorrente da venda do bem.


Nesse sentido:

..EMEN: RECURSO ESPECIAL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE COISA IMÓVEL. LEI N. 9.514/1997. QUITAÇÃO DO DÉBITO APÓS A CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE EM NOME DO CREDOR FIDUCIÁRIO. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO DECRETO-LEI N. 70/1966. PROTEÇÃO DO DEVEDOR. ABUSO DE DIREITO. EXERCÍCIO EM MANIFESTO DESCOMPASSO COM A FINALIDADE. 1. É possível a quitação de débito decorrente de contrato de alienação fiduciária de bem imóvel (Lei nº 9.514/1997), após a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário. Precedentes. 2. No âmbito da alienação fiduciária de imóveis em garantia, o contrato não se extingue por força da consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, mas, sim, pela alienação em leilão público do bem objeto da alienação fiduciária, após a lavratura do auto de arrematação. 3. A garantia do direito de quitação do débito antes da assinatura do auto de arrematação protege o devedor da onerosidade do meio executivo e garante ao credor a realização de sua legítima expectativa - recebimento do débito contratado. 4. Todavia, caracterizada a utilização abusiva do direito, diante da utilização da inadimplência contratual de forma consciente para ao final cumprir o contrato por forma diversa daquela contratada, frustrando intencionalmente as expectativas do agente financeiro contratante e do terceiro de boa-fé, que arrematou o imóvel, afasta-se a incidência dos dispositivos legais mencionados. 5. A propositura de ação de consignação, sem prévia recusa do recebimento, inviabilizou o oportuno conhecimento da pretensão de pagamento pelo credor, ensejando o prosseguimento da alienação do imóvel ao arrematante de boa-fé. 6. Recurso especial não provido. ..EMEN:(RESP 201500450851, MARCO AURÉLIO BELLIZZE, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:20/05/2015 ..DTPB:.)
..EMEN: RECURSO ESPECIAL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE COISA IMÓVEL. LEI Nº 9.514/1997. PURGAÇÃO DA MORA APÓS A CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE EM NOME DO CREDOR FIDUCIÁRIO. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO DECRETO-LEI Nº 70/1966. 1.Cinge-se a controvérsia a examinar se é possível a purga da mora em contrato de alienação fiduciária de bem imóvel (Lei nº 9.514/1997) quando já consolidada a propriedade em nome do credor fiduciário. 2.No âmbito da alienação fiduciária de imóveis em garantia, o contrato não se extingue por força da consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, mas, sim, pela alienação em leilão público do bem objeto da alienação fiduciária, após a lavratura do auto de arrematação. 3. Considerando-se que o credor fiduciário, nos termos do art. 27 da Lei nº 9.514/1997, não incorpora o bem alienado em seu patrimônio, que o contrato de mútuo não se extingue com a consolidação da propriedade em nome do fiduciário, que a principal finalidade da alienação fiduciária é o adimplemento da dívida e a ausência de prejuízo para o credor, a purgação da mora até a arrematação não encontra nenhum entrave procedimental, desde que cumpridas todas as exigências previstas no art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966. 4. O devedor pode purgar a mora em 15 (quinze) dias após a intimação prevista no art. 26, § 1º, da Lei nº 9.514/1997, ou a qualquer momento, até a assinatura do auto de arrematação (art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966). Aplicação subsidiária do Decreto-Lei nº 70/1966 às operações de financiamento imobiliário a que se refere a Lei nº 9.514/1997. 5. Recurso especial provido. ..EMEN:(RESP 201401495110, RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:25/11/2014 ..DTPB:.)
..EMEN: HABITACIONAL. SISTEMA FINANCEIRO IMOBILIÁRIO. PURGAÇÃO DA MORA. DATA LIMITE. ASSINATURA DO AUTO DE ARREMATAÇÃO. DISPOSITIVOS LEGAIS ANALISADOS: ARTS. 26, § 1º, E 39, II, DA LEI Nº 9.514/97; 34 DO DL Nº 70/66; E 620 DO CPC. 1. Ação ajuizada em 01.06.2011. Recurso especial concluso ao gabinete da Relatora em 07.02.2014. 2. Recurso especial em que se discute até que momento o mutuário pode efetuar a purgação da mora nos financiamentos vinculados ao Sistema Financeiro Imobiliário. 3. Constitui regra basilar de hermenêutica jurídica que, onde o legislador não distingue, não cabe ao intérprete fazê-lo, sobretudo quando resultar em exegese que limita o exercício de direitos, se postando contrariamente ao espírito da própria norma interpretada. 4. Havendo previsão legal de aplicação do art. 34 do DL nº 70/99 à Lei nº 9.514/97 e não dispondo esta sobre a data limite para purgação da mora do mutuário, conclui-se pela incidência irrestrita daquele dispositivo legal aos contratos celebrados com base na Lei nº 9.514/97, admitindo-se a purgação da mora até a assinatura do auto de arrematação. 5. Como a Lei nº 9.514/97 promove o financiamento imobiliário, ou seja, objetiva a consecução do direito social e constitucional à moradia, a interpretação que melhor reflete o espírito da norma é aquela que, sem impor prejuízo à satisfação do crédito do agente financeiro, maximiza as chances de o imóvel permanecer com o mutuário, em respeito, inclusive, ao princípio da menor onerosidade contido no art. 620 do CPC, que assegura seja a execução realizada pelo modo menos gravoso ao devedor. 6. Considerando que a purgação pressupõe o pagamento integral do débito, inclusive dos encargos legais e contratuais, nos termos do art. 26, § 1º, da Lei nº 9.514/97, sua concretização antes da assinatura do auto de arrematação não induz nenhum prejuízo ao credor. Em contrapartida, assegura ao mutuário, enquanto não perfectibilizada a arrematação, o direito de recuperar o imóvel financiado, cumprindo, assim, com os desígnios e anseios não apenas da Lei nº 9.514/97, mas do nosso ordenamento jurídico como um todo, em especial da Constituição Federal. 7. Recurso especial provido. ..EMEN:(RESP 201303992632, NANCY ANDRIGHI, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:18/06/2014 ..DTPB:.)

Ademais, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da necessidade de intimação pessoal do devedor fiduciante da data da realização do leilão extrajudicial, com base no art. 39, II, da Lei 9.514/97 "aplicando-se as disposições dos artigos 29 a 41 do Decreto-Lei n.º 70/66 às operações de financiamento imobiliário em geral a que se refere à Lei nº 9.514/97".


Confira-se, a propósito, o seguinte julgado:


AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ANULATÓRIA DE LEILÃO EXTRAJUDICIAL. LEI Nº 9.514 /97. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE COISA IMÓVEL. NOTIFICAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR FIDUCIANTE. NECESSIDADE. PRECEDENTE ESPECÍFICO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.
1. "No âmbito do Decreto-Lei nº 70/66, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça há muito se encontra consolidada no sentido da necessidade de intimação pessoal do devedor acerca da data da realização do leilão extrajudicial, entendimento que se aplica aos contratos regidos pela Lei nº 9.514 /97" (REsp 1447687/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/08/2014, DJe 08/09/2014).
2. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
(AgRg no REsp 1367704/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/08/2015, DJe 13/08/2015)

Assim já decidiu recentemente a 2ª Turma desta E. Corte, por oportunidade de caso análogo:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA ANTECIPADA. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. LEI 9.514/97. LEILÃO. NOTIFICAÇÃO. 1 - Não há inconstitucionalidade na execução extrajudicial, prevista pela Lei n. 9.514/97, a qual não ofende a ordem a constitucional, a semelhança do que ocorre com a execução extrajudicial de que trata o Decreto-lei 70/66, nada impedindo que o fiduciante submeta a apreciação do Poder Judiciário o descumprimento de cláusulas contratuais. 2 - O devedor pode purgar a mora em 15 (quinze) dias após a intimação prevista no art. 26, § 1º, da Lei nº 9.514/1997, ou a qualquer momento, até a assinatura do auto de arrematação, aplicando subsidiariamente o art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966. Por conseguinte, há necessidade de intimação pessoal do devedor da data da realização do leilão extrajudicial, aplicando-se as disposições dos artigos 29 a 41 do Decreto-Lei n.º 70/66 às operações de financiamento imobiliário em geral a que se refere a Lei nº 9.514/97. Precedentes do STJ. 4 - Agravo de instrumento provido. - grifei.
(AI 00084955220164030000, DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA RIBEIRO, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/09/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

Conforme se verifica, a CEF não trouxe aos autos nenhum documento capaz de comprovar que houve a intimação do autor quanto à data da realização do leilão. Tal observação é fundamental uma vez que a questão referente à ausência de notificação pessoal do devedor da data da realização do leilão é nitidamente de fato, envolvendo prova documental que deveria ter sido juntada a contento pela ré, ora apelada, a quem incumbe o ônus da prova, nos moldes do quanto disposto pelo art. 373, inciso II, do Código de Processo Civil de 2015, in verbis:

"Art. 373. O ônus da prova incumbe:
(...)
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor."

Importante frisar que a parte autora demonstra que há interesse em exercer o direito de purgar a mora com recursos do FGTS.


Ad argumentandum tantum, o artigo 20, incisos V ao VII, da Lei nº 8.036/90, bem como seu regulamento (artigo 35, V, VI e VII, Decreto 99.684/90) têm como finalidade possibilitar ao trabalhador a aquisição da casa própria.


A jurisprudência pátria vem admitindo saque para pagamento de prestações de financiamento para a aquisição de casa própria, ainda que à margem do Sistema Financeiro de Habitação e mesmo que tais parcelas estejam em atraso. Precedentes do C. STJ e desta E. Corte: STJ , 2ª Turma, RESP 711100/RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 21/11/2006, DJ DATA:06/02/2007; STJ , 2ª Turma, REsp 1004478/DF, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 17/09/2009, DJe 30/09/2009 e TRF3, 5ª Turma, AG 2004.03.00.042352-2, Rel. Des. Fed. André Nabarrete, DJU DATA: 17/01/2006.


Sendo assim, com o reconhecimento da necessidade de intimação pessoal dos devedores acerca da data da realização do leilão, merece reparos a r. sentença para julgar procedente o pleito inicial, invertendo-se ônus da sucumbência.


Diante do exposto, dou provimento ao recurso de apelação.


É como voto.


COTRIM GUIMARÃES
Desembargador Federal


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