Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 09/12/2022
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013848-82.1993.4.03.6110/SP
2006.03.99.009136-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : CERAMICA CASTELO BRANCO LTDA
ADVOGADO : SP007056 MARIO DOTTA e outro(a)
APELANTE : ANTONIO BRESSAN FILHO e outro(a)
: SOLANGE TERESA GALLETI
ADVOGADO : SP116806 OLGA DE ARAUJO CARNIMEO
APELADO(A) : OS MESMOS
PARTE RÉ : CODEISA CIA DE DESENVOLVIMENTO DE ITU
ADVOGADO : SP039162 VERA NUNES DE OLIVEIRA e outro(a)
PARTE RÉ : Caixa Economica Federal - CEF
No. ORIG. : 93.00.13848-0 1 Vr SOROCABA/SP

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REIVINDICATÓRIA. CITAÇÃO. NOTA DE CIÊNCIA. RECEBIMENTO CONTRAFÉ. ARTIGO 10, §1º, I E ARTIGO 226 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. NULIDADE.
1. O direito ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa, garantias constitucionais insculpidas no artigo 5º, incisos LIV e LV da Constituição Federal deve prevalecer em face de eventual presunção da validade da citação.
2. Apelação da denunciada provida. Recursos da autora e do denunciado prejudicados.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da denunciada Solange Teresa Galetti Bressan para anular a sua citação e os atos processuais posteriores, inclusive a sentença, bem como determino a remessa dos autos à vara de origem para regular processamento do feito e, finalmente, julgar prejudicado o exame das apelações da autora Cerâmica Castelo Branco LTDA. e do denunciado Antonio Bressan Filho, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 28 de novembro de 2022.
MAURICIO KATO
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013848-82.1993.4.03.6110/SP
2006.03.99.009136-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : CERAMICA CASTELO BRANCO LTDA
ADVOGADO : SP007056 MARIO DOTTA e outro(a)
APELANTE : ANTONIO BRESSAN FILHO e outro(a)
: SOLANGE TERESA GALLETI
ADVOGADO : SP116806 OLGA DE ARAUJO CARNIMEO
APELADO(A) : OS MESMOS
PARTE RÉ : CODEISA CIA DE DESENVOLVIMENTO DE ITU
ADVOGADO : SP039162 VERA NUNES DE OLIVEIRA e outro(a)
PARTE RÉ : Caixa Economica Federal - CEF
No. ORIG. : 93.00.13848-0 1 Vr SOROCABA/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelações cíveis interpostas por Cerâmica Castelo Branco LTDA. (fls. 379/387), Antônio Bressan Filho (fls. 411/416) e Solange Tereza Galetti (fls. 407/409) em face da sentença de 1º grau que julgou improcedente o pedido inicial que objetiva a restituição de imóvel matriculado sob nº 23.531 no Cartório de Registro de Imóveis de Itu/SP e condenação da CIA. de Desenvolvimento de Itu - CODEISA no pagamento de perdas e danos, bem como condenou a primeira apelante no pagamento de honorários advocatícios à ré e também à Caixa Econômica Federal - CEF (quantia de R$ 3.000,00) e periciais e reembolso de custas processuais e os demais recorrentes por montante decorrente da evicção e também de honorários advocatícios (10% do valor da condenação).

Registro que a Caixa Econômica Federal - CEF integra a lide na condição de assistente da parte ré CODEISA e os ora apelantes Antônio Bressan Filho e Solange Tereza Galetti foram denunciados à lide, nos termos do artigo 70, I do Código de Processo Civil de 1973 (fls. 130, 139 e 141).

Em suas razões recursais (fls. 379/387), a autora Cerâmica Castelo Branco LTDA. afirma que a ação discriminatória tem como finalidade demarcar terras devolutas do Estado e que caberia a ação demarcatória para solucionar conflitos divisórios entre particulares. Alega que sua gleba não fez parte da demanda discriminatória promovida pelo Estado, logo não poderia ser atingida pelos efeitos da sentença. Aduz, ainda, que a decisão proferida na ação discriminatória não foi averbada no Cartório de Registro de Imóveis, o que viola o princípio da continuidade registral.

Já a apelante-denunciada Solange Tereza Galleti requer a nulidade do feito a contar da juntada aos autos da carta precatória, haja vista a inexistência de citação (fls. 407/409).

Igualmente inconformado, o apelante-denunciado Antonio Bressan Filho (falecido), ora habilitadas suas herdeiras Laís Carmen Bressan e Ana Paula Bressan, pleiteia a reforma da sentença, ao fundamento de que agiu com boa-fé na venda do imóvel à empresa Cerâmica Castelo Branco LTDA. e que eventual responsabilidade pela incorreção da área compete ao Cartório de Registro de Imóveis de Itu/SP que procedeu a sobreposição de uma gleba sobre a outra (fls. 411/416).

As apeladas, devidamente intimadas (fls. 418 e 422), não apresentaram contrarrazões e os autos vieram a esta Corte Regional.

O feito foi relacionado para julgamento na sessão designada para 05.03.2018 e adiado por indicação deste relator (fls. 491) e suspenso o curso do processo em 20.03.2019, com fundamento no artigo 313, I do Código de Processo Civil (fls. 502).

Regularizado o feito com a habilitação das herdeiras do falecido couautor Antônio Bressan Filho - Sras. Laís Carmen Bressan, por sua curadora e Ana Paula Bressan - e demonstrada a inexistência de inventário (fls. 531/538).

É o relatório.

Dispensada a revisão, nos termos regimentais.

VOTO

Narra a parte autora que é proprietária do imóvel denominado "Sítio Castelo Branco", objeto da matrícula nº 23.531 do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Itu/SP, com área de 96.800 m².

Afirma que, embora seu domínio, o imóvel pertencente à ré, recebido por doação feita pelo Estado de São Paulo, objeto da matrícula nº 34.951 do mesmo Cartório de Imóveis (originária da transcrição nº 9.715 por compra e venda feita a José Venturini e sua mulher Luiza Craici Venturini), sofreu uma alteração em suas dimensões com invasão nas terras vizinhas (inclusive no seu imóvel objeto da matrícula nº 23.531), sem o conhecimento dos confrontantes, a qual só foi descoberta com o início da construção de casas populares no local.

Aduz que a requerida se recusa a reconhecer a sua propriedade sobre a gleba, pois afirma também ser proprietária de título que lhe confere o domínio sobre a área em questão.

Por fim, pede a restituição da gleba, com a denunciação da lide aqueles que lhe alienaram o imóvel e a notificação da Caixa Econômica Federal em decorrência da garantia hipotecária existente sobre o bem objeto da matrícula nº 34.951.

O juízo a quo julgou improcedente o pedido formulado em face da CODEISA e procedente o pleito da denunciação da lide, ao fundamento de que a ação de discriminação de terras promovida pela Procuradoria de Terras vinculou a parte autora e tornou definitiva a cadeia dominial dos imóveis. Confira-se:


"Em 1937, a Procuradoria de Terras do Estado de São Paulo ajuizou, na comarca de Itu, ação destinada a demarcar as terras do PRIMEIRO PERÍMETRO DA COMARCA DE ITU (fls. 53-6). Pediu a citação de todos os ocupantes das terras envolvidas na demanda. JOSÉ VENTURINI e FRANCISCO DIAS foram arrolados como ocupantes (fl. 55).
Como resultado da mencionada ação, as terras de JOSÉ VENTURINI (como as demais) foram, por certo, delimitadas e se concluiu que a área total de sua propriedade correspondia a 27,31 alqueires (isto é: a denominada área indefinida era de 12,81 alqueires = 27,31 menos os 14,5 já conhecidos).
JOSÉ VENTUTINI, e sua mulher, proprietários daquela área, alienaram-na, por compra e venda, ao Estado de São Paulo, em 14 de maio de 1946 (fls. 29 e 30 - transcrição n. 9.715).
O Estado de São Paulo, em 21 de fevereiro de 1991, doou o imóvel à CODEISA (fls. 27-8 - matrícula n. 34.951).
A área reclamada pela demandante, os 4 alqueires descritos na matrícula n. 23.531, na época da ação intentada pela Procuradoria de terras, em 1937, era supostamente de FRANCISCO DIAS (fls. 252-3), mas, por conta do desfecho da demanda, com a definição das terras envolvidas, verificou-se que pertencia a JOSÉ VENTURINI e sua esposa.
Não tendo havido qualquer comprovação de vício que poderia macular, em relação a FRANCISCO DIAS, incluído na demanda, segundo a legislação processual da época, a ação promovida pela Procuradoria de Terras, a decisão ali proferida, vinculando-o, põe em xeque a cadeia dominial do imóvel relacionado na matrícula n. 23.531.
Destarte, considerando que existe, consoante apurado no trabalho técnico, sobreposição das terras 'pertencentes' ao demandante e à CODEISA, é de se decidir, em razão do exposto, em benefício da demandada" (fls. 357/359).

Em suas razões recursais, a autora-apelante Cerâmica Castelo Branco LTDA. pede a reforma da sentença, com a procedência do pedido inicial, ao passo que a denunciada Solange Teresa Galetti suscita a nulidade do feito por ausência de sua citação e, finalmente, o denunciado Antonio Bressan Filho pede o afastamento da sua responsabilidade pela evicção.

Passo a apreciar as matérias devolvidas.

Assiste razão à denunciada Solange Teresa Galetti quanto ao reconhecimento da nulidade de todos os atos processuais efetivados após a sua citação, a qual efetivamente não ocorreu.

Com efeito, verifica-se às fls. 130 a expedição de carta precatória para citação dos denunciados, Antonio Bressan Filho e sua esposa Solange Teresa Galetti Bressan.

Ainda, extrai-se que o oficial de justiça certificou às fls. 133 que não encontrou os requeridos em 31/07/1992. No entanto, às fls. 139 certificou que, no dia 23/11/1992: me dirigi à Rua Pedro de Godoy, 284 - v. Prudente, onde citei Antonio Bressan Filho e sua mulher, Solange Galetti Bressan, na forma da lei".

Ocorre que, no verso da carta precatória (fls. 130) consta a assinatura apenas do denunciado Antonio Bressan Filho e não de sua esposa Solange Teresa Galetti Bressan.

Dispunha o artigo 226 do Código de Processo Civil de 1973, vigente à época dos fatos que, in verbis:


Incumbe ao oficial de justiça procurar o réu e, onde o encontrar, citá-lo:
I - lendo-lhe o mandado e entregando-lhe a contrafé;
II - portando por fé se recebeu ou recusou a contrafé;
III - obtendo a nota de ciente, ou certificando que o réu não a apôs no mandado.

No caso em apreço, verificou que o oficial de justiça não mencionou em sua certidão se a apelante-denunciada Solange Teresa Galetti Bressan recebeu ou não a contrafé e tampouco se ela se recusou a colocar sua assinatura no documento. Logo, sem a assinatura da denunciada ou de certidão que ateste a negativa de ciência não se pode presumir que a citação, conforme exigência do artigo 10, § 1º, I, do Código de Processo Civil de 1973.

Ora, o direito ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa, garantias constitucionais insculpidas no artigo 5º, incisos LIV e LV da Constituição Federal deve prevalecer em face de eventual presunção da validade da citação. Isso porque a concretização da citação é condição primordial de existência do processo, conforme previsão do artigo 214 do Código de Processo Civil de 1973.

Portanto, de rigor o reconhecimento da nulidade da citação da denunciada Solange Teresa Galetti Bressan e dos atos processuais posteriores a ela.

Ante o exposto, dou provimento à apelação da denunciada Solange Teresa Galetti Bressan para anular a sua citação e os atos processuais posteriores, inclusive a sentença, bem como determino a remessa dos autos à vara de origem para regular processamento do feito e, finalmente, julgo prejudicado o exame das apelações da autora Cerâmica Castelo Branco LTDA. e do denunciado Antonio Bressan Filho.

É o voto.


MAURICIO KATO
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): MAURICIO YUKIKAZU KATO:100075
Nº de Série do Certificado: 0905D79B8E4DD264D90291EB6B22489C
Data e Hora: 30/11/2022 07:43:59