D.E. Publicado em 07/12/2017 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e, de ofício, estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo, no mais, íntegra a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
Data e Hora: | 28/11/2017 11:52:10 |
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RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Vistos em Autoinspeção.
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada pela parte autora, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A r. sentença, de fls. 211/215-verso, julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de aposentadoria por invalidez, com início em 02/04/2008 (data do requerimento administrativo). Fixou a correção monetária nos termos da Resolução 561/2007 do Conselho da Justiça Federal. Determinou os juros de mora no patamar de 1% (um por cento) ao mês, desde a data da citação, conforme artigos 406, CC, e 161, §1º, CTN. Condenado o INSS, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações em atraso, contabilizadas até a data de sua prolação.
Em razões recursais de fls. 219/224, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que a parte autora não preenche os requisitos para a concessão dos benefícios ora vindicados.
Contrarrazões da parte autora, às fls. 227/243.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
Parecer do Ministério Público Federal (fls. 250/257), no sentido do desprovimento do recurso do ente autárquico.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei, a saber:
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo supra prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal lapso de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Por fim, saliente-se que havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo, com base em exame pericial de fls. 179/183, relatou:
"Pericianda com quadro compatível com transtorno afetivo bipolar (CID-10 F31), uma 'doença mental', nas lides juspsiquiátricas.
Diagnóstico diferencial, no presente caso, com transtorno mental orgânico.
Da análise da psicofarmacoterapia ora empregada, verifica-se a necessidade de reavaliação da mesma, para que a pericianda possa almejar qualquer melhora em seu quadro. Observe-se, à guisa de esclarecimento, que a pericianda não faz uso sequer de medicação estabilizadora de humor, conduta principal no quadro que apresenta.
(...)
Em função do exame empreendido e das informações colhidas, verifica-se que a pericianda não apresenta, nos dias atuais, qualquer capacidade para o desempenho de atividades laborativas, inclusive as anteriormente efetuadas.
Tal incapacidade é, a principio, de natureza potencialmente temporária, com duração de até seis meses, condicionada tal duração aos fatores acima apontados (adequação da psicofarmacoterapia, adesão da pericianda ao tratamento, inexistência de patologias orgânicas)" (sic).
Não fixou a data de início da incapacidade (DII).
Apesar de ter concluído pelo caráter temporário desta, tenho que a autora, em realidade, está incapacitada, de forma permanente, para o exercício de atividade remunerada que lhe provenha o sustento.
Com efeito, se me afigura pouco crível que, quem sempre trabalhou na roça, em regime de economia familiar, desempenhando atividades braçais, e que conta, atualmente, com mais de 59 (cinquenta e nove) anos de idade, após ter sido submetida a diversas internações psiquiátricas, vá conseguir, após reabilitação, capacitação e treinamento, recolocação profissional em outras funções.
Aliás, a autora acostou aos autos comprovantes de estadia no HOSPITAL DR. ADOLFO BEZERRA DE MENEZES, por mais de 20 (vinte) dias, em duas oportunidades, em 1996 (fl. 42) e 1997 (fl. 51). Difícil acreditar, portanto, que a autora conseguirá se restabelecer, visto que, após mais de 10 (dez) anos das referidas internações, apresentou-se ao perito com quadro severo de comprometimento psíquico.
Nessa senda, cumpre transcrever o enunciado da Súmula 47, da TNU - Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais:
Corroborado pela jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça:
Dessa forma, tenho que a demandante é incapaz e totalmente insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência, sobretudo, em virtude do seu contexto socioeconômico, histórico laboral e das moléstias das quais é portadora, ensejando a concessão de aposentadoria por invalidez.
Por sua vez, a requerente também demonstrou sua filiação ao RGPS, eis que se encontrava na situação de segurada especial, quando inequívoca a existência de incapacidade para o labor, isto é, na data da primeira internação, em meados do ano de 1996, já que não há a fixação da DII pelo expert.
A autora acostou sua certidão de casamento com SANTO SEBASTIÃO PINTO, na qual este se encontra qualificado como "lavrador" (fl. 16).
Acostou, ainda, diversos contratos de parceria agrícola, firmados por seu esposo, referente ao imóvel FAZENDA SANTA MARIA, na qual este se comprometia a explorar 4.000 (quatro mil) pés de café, com sua família. Os contratos abrangem os seguintes períodos: de 01º/10/1984 a 01º/10/1987 (fls. 17/20); de 01º/10/1992 a 30/09/1995 (fls. 21/24); de 01º/10/1996 a 01º/10/1999 (fls. 25/30); e, por fim, de 01º/10/1999 a 01º/10/2002 (fls. 31/36).
Impende ressaltar que cláusula comum nas avenças determina que "o conjunto familiar auxiliará nos trabalhos da parceria agrícola sem qualquer vínculo empregatício com o outorgante (...)", denotando o regime de economia familiar do empreendimento.
Também foram juntadas aos autos notas fiscais, relativas à venda de sacas de café, registradas em nome do cônjuge da requerente, abrangendo o período de 1979 a 2005 (fls. 85/115).
Por outro lado, conforme depoimento do seu esposo (fl. 172), analisado na sequência, a propriedade rural tinha em sua totalidade 50.000 (cinquenta mil) pés de café, o que indica, a princípio, que a autora e seu cônjuge detinham a posse de apenas 8% (oito por cento) do imóvel. Nessa senda, haja vista que a FAZENDA MARIA possuía no total 143 ha² (fls. 37/38), e que o módulo fiscal do Município de Cedral/SP, localidade da área rural, é de 20 ha² (consulta ao sítio eletrônico do INCRA), inegável que a parte pertencente à demandante era inferior a 4 (quatro) módulos fiscais para os fins do disposto no art. 11, VII, a), 1, c), e §1º, da Lei 8.213/91.
A autora preenche todos os requisitos previstos no referido dispositivo. Com efeito, à época do surgimento da incapacidade, era cônjuge de parceiro/meeiro, o qual explorava atividade agropecuária em área rural de até 4 (quatro) módulos fiscais, na qual o trabalho dos membros da família era indispensável à subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar.
Realizada audiência de instrução e julgamento, em 20/11/2008 (fls. 171/177), foram colhidos os depoimentos do seu curador (esposo) e de testemunhas por ela arroladas, os quais vieram a corroborar os documentos acostada aos autos, senão vejamos:
SANTO SEBASTIÃO PINTO afirmou que "a autora parou de trabalhar em 1994 porque ficou doente. A autora trabalhava na roça com o depoente. Nem a autora nem o depoente trabalharam em atividades urbanas. Até 2006 o depoente e a autora moraram na fazenda Santa Maria de Gentil Carlos Polachini, depois mudaram-se para a cidade de Guapiaçu e o depoente passou a trabalhar na lavoura de cana-de-açúcar da Usina Guarani. O depoente e a autora moraram na fazenda Santa Maria de 1986 a 2006. O depoente era parceiro na lavoura de café e a autora ajudava o depoente até a época em que parou de trabalhar". Questionado pelo procurador do INSS, disse que "a fazenda Santa Maria tem aproximadamente 154 alqueires e há cerca de cinquenta mil pés de café plantados. O depoente era parceiro em quatro mil pés de café e nunca contratou ninguém para auxiliar, 'se for pagar não compensa'" (fl. 172).
A testemunha SEBASTIÃO MANCIR DOS SANTOS relatou que "conhece a autora desde 1990 quando ela morava na fazenda Santa Maria de Gentil Carlos Polanchini. A referida fazenda fica na região das Palmeiras em Cedral. A autora morava com seu marido e ambos tinha parceira de café na fazenda Santa Maria. A autora e seu marido cuidavam de quatro mil pés de café e não eram auxiliados por mais ninguém. A autora e seu marido saíram da fazenda Santa Maria em 2006. Ao que se recorda, depois que conheceu a autora ela trabalhou por mais uns dois anos e começou a ficar doente, sendo internada em 1994, depois em 1996, 1997 e 2002. O depoente foi empregado na fazenda Santa Maria e ainda trabalha lá" (sic). Questionado pelos patronos de ambas as partes, respondeu que "quatro mil pés de café são plantados em cerca de dois alqueires de terra" e "depois que a autora parou de trabalhar em 1994 seu marido continuou trabalhando sozinho" (fls. 173/174).
PAULO PEDRO CRIPPA afirmou que "conhece a autora desde 1969. Sabe que a autora trabalhou em lavoura de café desde os onze anos de idade. Atualmente a autora não trabalha porque ficou doente. Não sabe quando a autora parou de trabalhar. Conheceu a autora quando ela se mudou com sua família para a fazenda Boa Esperança no município de Cedral. Em 1978 a autora se casou com o Sr. Santo e mudou-se para outro sítio. Sabe que depois a autora e seu marido mudaram-se para a fazenda Santa Marina de Gentil Polachini onde ficaram 'mais anos'. Sabe que a autora trabalhou na fazenda Santa Marina porque o depoente conversava com seus pais. Algumas vezes o depoente viu a autora trabalhando na lavoura de café da fazenda Santa Marina porque passava por lá. Sabe que em 1994 a autora ficou doente e já não trabalhou mais" (fls. 175/176).
GENTIL CARLOS POLACHINI disse que "conhece a autora e seu marido porque moraram na propriedade rural do depoente. A autora e seu marido moraram na fazenda do depoente por quinze ou vinte anos e trabalharam na lavoura de café em regime de parceria. A autora e seu marido moraram e trabalharam na fazenda do depoente até 2005 ou 2006. Cuidavam de quatro mil pés de café e não precisavam do auxilio de outras pessoas. A autora trabalhava ajudando seu marido, levando comida e ajudando a carpir. A partir de 1994 quando a autora começou a ficar doente, parou de trabalhar e o marido continua trabalhando sozinha" (fl. 177).
Cumpre lembrar, para que não restem dúvidas quanto à qualidade de segurada especial da autora, quando do surgimento da incapacidade, o fato de que os males dos quais é portadora são de caráter degenerativo, e a diferença entre o fim de um contrato de parceria agrícola em 30/10/1995 (fl. 21) e a data da primeira internação psiquiátrica, adotada por este Juízo como DII (16/04/1996) é muito pequena, não podendo ser tomada em termos matemáticos exatos, exigindo a necessária temperança decorrente dos fatos da vida que, no dia dia, ordinariamente acontecem (art. 335 do CPC/1973, reproduzido no art. 375 do CPC/2015).
Assim, tem-se que a incapacidade surgiu quando da vigência do referido contrato de parceria agrícola, o qual vigorou entre outubro de 1992 e setembro de 1995 (fls. 21/24), sendo certo, aliás, que todas as testemunhas asseveraram que a situação psíquica da autora se agravou em 1994.
Em suma, demonstrado o surgimento da incapacidade total e permanente, quando a autora era segurada da Previdência Social, de rigor a concessão da aposentadoria por invalidez, nos exatos termos do art. 42 da Lei 8.213/91.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS e, de ofício, estabeleço que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo, no mais, íntegra a r. sentença de 1º grau de jurisdição.
É como voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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