Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 02/03/2018
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005907-18.2000.4.03.6181/SP
2000.61.81.005907-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS
APELANTE : CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA
ADVOGADO : SP068870 FRANCISCO LACERDA DE ALMEIDA e outro(a)
: SP096543 JOSE CARLOS VIANA
: SP176675 DAVID DE SOUZA CAMPOS MARTINS FIGUEIREDO
APELANTE : LUIZ HENRIQUE DIDIER
ADVOGADO : SP080843 SONIA COCHRANE RAO
: SP271055 MAIRA BEAUCHAMP SALOMI
APELANTE : Justica Publica
CO-REU : MARCOS JOSE DOS SANTOS
: JOSE ANTONIO PINHEIRO
: JOAO BATISTA PINHEIRO
: MARGARETE DEJAVITE
: OTAVIO PINHEIRO
APELADO(A) : OS MESMOS

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. PRELIMINARES. INÉPCIA DA DENÚNCIA. REJEITADA. CERCEAMENTO DE DEFESA. NEGADA. NULIDADE DA SENTENÇA. REJEITADA. ABSOLVIÇÃO CRIME ART. 16, DA LEI Nº 7.492/86. EMPRESA POSSUÍA AUTORIZAÇÃO PARA OPERAR NO RAMO FINANCEIRO. MATERIALIDADE E AUTORIA DO DELITO DO ART. 4º, CAPUT, LEI Nº 7.492/86 COMPROVADAS. ERRO DE PROIBIÇÃO. AFASTADO. DOSIMETRIA.
1. Com relação à preliminar de inépcia da denúncia, não há que se falar em ausência de descrição das condutas praticadas pelos acusados, vez que o Parquet descreveu os fatos criminosos, com todas as suas circunstâncias, inclusive detalhando a maneira que as empresas atuavam, bem como o funcionamento das operações. Como é sabido, a denúncia é uma peça técnica que deve ser simples e objetiva, atribuindo a responsabilidade por um fato, com a indicação da conduta ilícita imputada, de modo a propiciar o pleno exercício do direito de defesa. Nos crimes caracterizados pela autoria coletiva, a exigência de descer a minúcias acerca da conduta de cada réu, levaria a total impossibilidade de se proceder à persecução criminal dos envolvidos, tendo em vista a difícil apuração de fatos desta natureza.
2. Com relação à preliminar de cerceamento de defesa, como vem decidindo esta Egrégia Corte, o indeferimento de produção de perícia contábil não implica em cerceamento de defesa, por não ser esta prova imprescindível. Além disso, na decisão de fls. 3862, o MM. Juiz a quo indeferiu o pedido da defesa de que os autos retornassem aos peritos para análise de quesito não respondido, por não ter a defesa se manifestado no prazo estipulado para formulação dos quesitos, permanecendo a defesa de LUIZ HENRIQUE inerte.
3. Pese embora a sentença faça alusão ao inquérito administrativo nº 16/97 da CVM, no qual foram apuradas as fraudes cometidas pelos acusados, é pacífico o entendimento nos Tribunais Superiores de que é possível a fundamentação per relationem ou por referência, não se cogitando em nulidade ou ofensa ao artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. Neste caso, o MM. Juiz fundamentou a sua sentença, transcrevendo as partes do relatório da CVM que interessavam ao Processo, onde há extensa prova da materialidade delitiva, os quais se encontram nos autos deste processo, bem como em laudos periciais realizados no curso das investigações. Resta claro que a decisão recorrida não viola o disposto no artigo 93, IX, da Constituição Federal, estando devidamente fundamentada, pelo que não há que se falar em nulidade.
4. Depreende-se do tipo penal que, como elemento normativo, há a exigência de autorização para que uma instituição financeira opere no ramo. Desse modo, para que haja tipicidade, é necessário que o autor do delito constitua uma instituição financeira e a faça operar sem que tenha a devida autorização ou mediante autorização falsa.
5. Como analisado pelo MM. Juiz a quo, está evidenciado que os réus fizeram operar a instituição financeira DIDIER CCTVM, com operações formalmente realizadas e relatadas no inquérito administrativo nº 16/97 produzido pela Comissão de Valores Mobiliários. Entretanto, demonstrado está que a empresa DIDIER CCTVM possuía autorização para operar como instituição financeira, o que desqualifica o crime descrito no artigo 16, da referida Lei.
6. O tipo penal pune a conduta daqueles que administram instituições financeiras por meio de condutas fraudulentas, aptas a enganar terceiros, induzindo-os a erro. Trata-se de crime de perigo que se consuma com a simples realização da conduta típica, independentemente de qualquer resultado ou causação de efetivo prejuízo às vítimas. No caso dos autos, ficou demonstrado que a empresa DIDIER CCTVM foi gerida de maneira fraudulenta, cabendo destacar a utilização de interpostas pessoas para a realização de operações em bolsa de valores.
7. Conforme já decidiu esta Egrégia Corte: "A figura do erro de proibição consiste no desconhecimento quanto à qualificação jurídica da conduta como ilícito penal. Não se trata, convém esclarecer desde logo, de desconhecimento da lei em abstrato, mas de desconhecimento a respeito da "contrariedade do fato em relação à legislação" (Cézar Roberto Bittencourt, Código Penal Comentado. Saraiva: 2012, p. 148), é dizer, da ausência de conhecimento, pelo agente, a respeito de que aquela conduta concreta (a conduta típica por ele praticada) constituir fato amoldado ao texto de um tipo penal. O caso dos autos não se amolda à figura do erro de proibição Dizer que o réu não teria potencial conhecimento da ilicitude, ou seja, que nem sequer poderia conhecer a natureza jurídica delitiva de sua conduta seria partir de pressuposição incompatível com os fatos do caso, e mesmo com a realidade fática em geral (cujo exame é necessário para que se estabeleça o conhecimento potencial da ilicitude, requisito para a aferição da culpabilidade do agente)" (TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 63688 - 0000128-34.2005.4.03.6108, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, julgado em 08/03/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/03/2016 )
8. O acusado era sócio proprietário da empresa MERCAP, a qual firmou contrato de prestação de serviços com a empresa DIDIER CCTVM para atuar no mercado de capitais. Assim, não há como acolher a tese de que o acusado acreditava que todos os seus atos eram lícitos, pois proprietário de empresa prestadora de serviços financeiros.
9. Dosimetria da pena analisada de maneira individualizada para cada acusado.
10. Apelação de Carlos Arnaldo Borges de Souza parcialmente provida. Apelação de Luiz Henrique Didier não provida. Apelação ministerial parcialmente provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, após o voto-vista do Des. Fed. Wilson Zauhy, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação de Carlos Arnaldo Borges de Souza para reduzir a pena a ele aplicada para 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em regime semiaberto, e pagamento de 15 (quinze) dias-multa, no valor unitário de 02 (dois) salários mínimos vigentes à época dos fatos, atualizada monetariamente, como incurso no artigo 4º, caput, da Lei nº 7.492/86 e, por maioria, negar provimento à apelação de Luiz Henrique Didier; dar parcial provimento à apelação ministerial, para aumentar a pena de Luiz Henrique Didier para 03 (três) anos e 09 (nove) meses de reclusão, em regime aberto, e 12 (doze) dias-multa, no valor unitário de 02 (dois) salários mínimos vigentes à época dos fatos, atualizada monetariamente, como incurso no artigo 4º, caput, da Lei nº 7.492/86. A pena privativa de liberdade deve ser substituída por 02 (duas) penas restritivas de direitos, quais sejam prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública e prestação pecuniária de 100 (cem) salários mínimos, destinada à entidade pública ou privada com destinação social, nos termos do voto do relator, acompanhado pela Juíza Fed. Conv. Giselle França, vencido o Des. Fed. Wilson Zauhy que negava provimento à apelação ministerial e dava provimento à apelação de Luiz Henrique Didier para absolvê-lo quanto ao crime do artigo 4º da Lei nº 7.492/1986, com fulcro no artigo 386, V, do Código de Processo Penal. Por maioria, determinar a imediata expedição de mandado de prisão em desfavor de Carlos Arnaldo Borges de Souza, nos termos do voto do relator, acompanhado pela Juíza Fed. Conv. Giselle França, vencido o Des. Fed. Wilson Zauhy que entende deva ser determinada a expedição do mandado de prisão somente após a certificação de esgotamento dos recursos ordinários no caso concreto.



São Paulo, 06 de fevereiro de 2018.
VALDECI DOS SANTOS
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005907-18.2000.4.03.6181/SP
2000.61.81.005907-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS
APELANTE : CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA
ADVOGADO : SP068870 FRANCISCO LACERDA DE ALMEIDA e outro(a)
: SP096543 JOSE CARLOS VIANA
: SP176675 DAVID DE SOUZA CAMPOS MARTINS FIGUEIREDO
: SP123723 RONALDO AUGUSTO BRETAS MARZAGAO
: SP185070 RODRIGO OTÁVIO BRETAS MARZAGÃO
: SP207169 LUÍS FELIPE BRETAS MARZAGÃO
APELANTE : LUIZ HENRIQUE DIDIER
ADVOGADO : SP080843 SONIA COCHRANE RAO
: SP271055 MAIRA BEAUCHAMP SALOMI
APELANTE : Justica Publica
CO-REU : MARCOS JOSE DOS SANTOS
: JOSE ANTONIO PINHEIRO
: JOAO BATISTA PINHEIRO
: MARGARETE DEJAVITE
: OTAVIO PINHEIRO
APELADO(A) : OS MESMOS

VOTO-VISTA

Pedi vista dos autos para melhor analisar as questões suscitadas durante o julgamento, sobretudo quanto à prova de autoria delitiva em relação ao acusado LUIZ HENRIQUE DIDIER.

Em relação a este tema, o voto do E. Relator restou assim fundamentado:

"Primeiramente, vale destacar que o acusado, sócio da DIDIER CCTVM, terceirizou as operações de sua corretora em favor da MERCAP, empresa de CARLOS ARNALDO, o que ensejou a gestão fraudulenta de sua empresa.
Ademais, os lucros obtidos nas operações de day-trade foram revertidos em favor da própria DIDIER CCTVM, dos quais se beneficiou o acusado, que tinha pleno conhecimento das irregularidades praticadas.
E, por ser experiente operador do mercado de capitais, não é verossímil acreditar que o réu terceirizasse totalmente as operações na Bolsa de Valores à MERCAP, confiando totalmente na gestão por ela realizada. Era seu dever fiscalizar a gestão da empresa DIDIER CCTVM, por ser sócio e proprietário."

Entretanto, tais elementos são insuficientes para comprovar a participação do acusado LUIZ HENRIQUE DIDIER nas operações realizadas pela MERCAP.

O fato de a Corretora Didier ter firmado um contrato de terceirização com a MERCAP, e esta última ter feito uso indevido da licença obtida para realizar operações financeiras ilícitas, não é prova contundente da ciência do réu LUIZ HENRIQUE DIDIER a respeito dos atos de gestão fraudulenta. Ao contrário, da análise do contrato de fls. 560/562, observa-se que a atuação no mercado de capitais era atribuição exclusiva da MERCAP, que deveria fazer uso de seus funcionários para tanto, evidenciando uma separação entre as atividades de câmbio realizadas pela Corretora Didier e a de mercado de capitais. Ademais, os cheques utilizados como elementos de prova foram emitidos somente por CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA, denotando a não-participação de LUIZ HENRIQUE no atos de gerência referentes às operações no mercado de ações.

Por fim, a prova testemunhal é coerente e harmônica quanto à grande experiência do réu LUIZ HENRIQUE DIDIER na lide do mercado de câmbio e não no mercado de capitais, conforme constou na sentença, tornando crível a versão apresentada pelo acusado.

Destarte, a acusação não se desincumbiu satisfatoriamente do ônus que lhe impõe o artigo 156 do Código de Processo Penal, não havendo elementos suficientes para condenação do acusado LUIZ HENRIQUE pela participação nos atos de gestão fraudulenta, portanto, sua absolvição é medida de rigor.

Acompanho o E. Relator para manter a condenação do acusado CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA, reduzindo-se a pena para 04 anos e 06 meses de reclusão, em regime semiaberto, e pagamento de 15 dias-multa, no valor unitário de 02 (dois) salários mínimos vigentes à época dos fatos.

Ante o exposto, acompanho o E. Relator para dar parcial provimento à apelação de CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA, e divirjo do E. Relator para negar provimento à apelação ministerial e para dar provimento à apelação de LUIZ HENRIQUE DIDIER para absolvê-lo quanto ao crime do artigo 4º da Lei nº 7.492/1986, com fulcro no artigo 386, V do Código de Processo Penal.

Por fim, em relação ao mandado de prisão em desfavor do acusado CARLOS ARNALDO, o C. STJ tem firmado posicionamento de que os embargos de declaração em matéria penal têm efeito suspensivo e obstam o início da execução provisória da pena, consoante decidido pela Eg. Quinta Turma no bojo do HC nº 343.302, de Relatoria do Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 05/04/2016, bem como pela Eg. Sexta Turma em sede de HC nº 353.997 de Relatoria da Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 21/06/2016. Nessa mesma toada, foi concedida liminar, em sede do HC nº 377.458 de relatoria do Min. Jorge Mussi, para suspender a ordem de prisão em desfavor do paciente, réu da apelação criminal nº 0000576-69.2011.4.03.6181, julgada por esta E. Primeira Turma, enquanto pendente o julgamento de embargos de declaração. Destaque-se que no julgamento do ARE nº 964.246, o Plenário do Supremo Tribunal Federal reafirmou a ausência de efeito suspensivo somente para recursos especial e extraordinário, logo, não se infere desse julgado a possibilidade de imediato início do cumprimento de pena, em ação penal ainda pendente de recurso em instância ordinária. Destarte, entendo que, após a certificação de esgotamento dos recursos ordinários no caso concreto, deva ser comunicado o Juízo de origem para que adote as providências necessárias quanto ao início da execução provisória da pena.

É o voto.


WILSON ZAUHY
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005907-18.2000.4.03.6181/SP
2000.61.81.005907-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS
APELANTE : CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA
ADVOGADO : SP068870 FRANCISCO LACERDA DE ALMEIDA e outro(a)
: SP096543 JOSE CARLOS VIANA
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APELANTE : LUIZ HENRIQUE DIDIER
ADVOGADO : SP080843 SONIA COCHRANE RAO
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CO-REU : MARCOS JOSE DOS SANTOS
: JOSE ANTONIO PINHEIRO
: JOAO BATISTA PINHEIRO
: MARGARETE DEJAVITE
: OTAVIO PINHEIRO
APELADO(A) : OS MESMOS

RELATÓRIO

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS:

O Ministério Público Federal denunciou CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA e LUIZ HENRIQUE DIDIER como incursos no artigo 4º, caput e parágrafo único, artigo 16, c/c artigo 25, todos da Lei nº 7.492/86, e no artigo 288, do Código Penal, em concurso material.

Denunciou também MARCOS JOSÉ DOS SANTOS como incurso no artigo 4º, caput, artigo 16, c/c artigo 25, todos da Lei nº 7.492/86, e no artigo 288, do Código Penal, em concurso material, além de JOSÉ ANTÔNIO PINHEIRO, JOÃO BATISTA PINHEIRO, MARGARETE DEJAVITE e OTÁVIO PINHEIRO como incursos no artigo 4º, caput, c/c artigo 25, todos da Lei nº 7.492/86, e no artigo 288, do Código Penal, em concurso material.

Consta da denúncia que a empresa DIDIER CCTVM, por meio de seu sócio LUIZ HENRIQUE DIDIER, e a empresa MERCAP - serviços financeiros e processamento Ltda., representada pelo sócio-gerente CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA, celebraram contrato particular de prestação de serviços, no qual a MERCAP prestaria serviços de suporte técnico e operacional nas áreas de ações, renda fixa, commodities e fundos.

Consta, ainda, que no período entre novembro de 1992 a setembro de 1995 todas as operações da DIDIER relacionada à Bolsa de Valores foram executadas por CARLOS ARNALDO, sócio da MERCAP, a qual não é integrante do sistema de distribuição de valores mobiliários, com autorização de LUIZ HENRIQUE. Tais atividades, conforme consta no Inquérito Administrativo da Comissão de Valores Mobiliários - CVM nº 16/97, são privativas de integrantes do referido sistema.

Ademais, no período entre 01 de abril de 1994 e 31 de maio de 1994 a empresa DIDIER intermediou operações de day-trade interpraça e diversas operações de day-trade na Bovespa em nome de JOSÉ ANTÔNIO PINHEIRO, JOÃO BATISTA PINHEIRO e OTÁVIO PINHEIRO, o que proporcionou um lucro equivalente a 79.313,61 URV.

Apurou-se também operações de compra de papéis e sua posterior venda a investidores institucionais efetuadas em nome de JOSÉ ANTÔNIO PINHEIRO, JOÃO BATISTA PINHEIRO, OTÁVIO PINHEIRO e MARGARETE DEJAVITE, com lucro bruto de 83.357,89 URV.

Das investigações, verificou-se que os cheques emitidos pela DIDIER para pagamento das operações acima mencionadas eram destinados a CARLOS ARNALDO, à MERCAP ou à própria DIDIER.

Houve aditamento da denúncia a fls. 3372/3391, para excluir o nome de OTÁVIO PINHEIRO em virtude de seu falecimento, pelo que foi declarada extinta a sua punibilidade (certidão de óbito a fls. 3395).

O aditamento da denúncia foi recebido em 05/03/2001 (fls. 3396/3397).

Após regular instrução, sobreveio sentença proferida pelo MM Juiz Federal da 5ª Vara Federal Criminal de São Paulo/SP, para absolver JOSÉ ANTÔNIO PINHEIRO, JOÃO BATISTA PINHEIRO e MARGARETE DEJAVITE dos crimes previstos no artigo 4º, caput, da Lei nº 7.492/86, e artigo 288, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal.

Absolveu também CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA e LUIZ HENRIQUE DIDIER dos crimes previstos no artigo 4º, parágrafo único, e artigo 16, ambos da Lei nº 7.492/86, e artigo 288, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal, além de absolver MARCOS JOSÉ DOS SANTOS dos delitos tipificados no artigo 4º, caput, e artigo 16, ambos da Lei nº 7.492/86, e no artigo 288, do Código Penal.

Por outro lado, condenou CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA à pena de 05 (cinco) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 150 (cento e cinquenta) dias-multa, no valor unitário de 02 (dois) salários mínimos, atualizado monetariamente; e LUIZ HENRIQUE DIDIER à pena de 03 (três) de reclusão, no regime inicial aberto, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, ambos pela prática do crime tipificado no artigo 4º, caput, da Lei nº 7.492/86.

A pena privativa de liberdade de LUIZ HENRIQUE DIDIER foi substituída por 02 (duas) penas restritivas de direitos, quais sejam, prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas pelo mesmo prazo da pena corporal, e prestação pecuniária no equivalente a 100 (cem) salários mínimos, destinada a entidade pública ou privada com destinação social.
Sentença publicada em 20/06/2006 (fls. 4005).

Inconformado, o Ministério Público Federal apela (fls. 4007 e 4021/4034), pleiteando a condenação de CARLOS ARNALDO e LUIZ HENRIQUE pelo crime tipificado no artigo 16, da Lei nº 7.492/86; e majoração das penas dos condenados pelo crime do artigo 4º, também da Lei nº 7.492/86.

LUIZ HENRIQUE apela (fls. 4075/4104) alegando, preliminarmente, inépcia da denúncia. No mérito pleiteia a absolvição por ausência de provas da autoria; reconhecimento do cerceamento de defesa, vez que os peritos não analisaram os quesitos por ele formulados e, subsidiariamente, redução da pena aplicada.

Por sua vez, CARLOS ARNALDO apela (fls. 4106/4149) argumentando pela nulidade da sentença, por falta de fundamentação; ausência de provas da autoria e da materialidade delitivas; ausência do elemento normativo relativo à fraude; erro de proibição e, subsidiariamente, redução da pena aplicada.

Contrarrazões das defesas em prol do desprovimento do recurso ministerial (fls. 4039/4048 e 4049/4057).

Contrarrazões do Ministério Público Federal em prol do desprovimento dos recursos defensivos (fls. 4151/4175).

Parecer da Procuradoria Regional da República pelo não provimento das apelações defensivas e parcial provimento do apelo ministerial (fls. 4379/4385).

É o relatório.

À revisão.


VALDECI DOS SANTOS
Desembargador Federal Relator


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Data e Hora: 10/11/2017 13:31:56



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005907-18.2000.4.03.6181/SP
2000.61.81.005907-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS
APELANTE : CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA
ADVOGADO : SP068870 FRANCISCO LACERDA DE ALMEIDA e outro(a)
: SP096543 JOSE CARLOS VIANA
: SP176675 DAVID DE SOUZA CAMPOS MARTINS FIGUEIREDO
APELANTE : LUIZ HENRIQUE DIDIER
ADVOGADO : SP080843 SONIA COCHRANE RAO
: SP271055 MAIRA BEAUCHAMP SALOMI
APELANTE : Justica Publica
CO-REU : MARCOS JOSE DOS SANTOS
: JOSE ANTONIO PINHEIRO
: JOAO BATISTA PINHEIRO
: MARGARETE DEJAVITE
: OTAVIO PINHEIRO
APELADO(A) : OS MESMOS

VOTO

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS:

1. Das preliminares.

1.1. Da preliminar de inépcia da denúncia alegada pela defesa de LUIZ HENRIQUE.

Com relação à preliminar de inépcia da denúncia, não há que se falar em ausência de descrição das condutas praticadas pelos acusados, vez que o Parquet descreveu os fatos criminosos, com todas as suas circunstâncias, inclusive detalhando a maneira que as empresas atuavam, bem como o funcionamento das operações.

Como é sabido, a denúncia é uma peça técnica que deve ser simples e objetiva, atribuindo a responsabilidade por um fato, com a indicação da conduta ilícita imputada, de modo a propiciar o pleno exercício do direito de defesa. E mais, como asseverou a Ministra Carmen Lúcia em seu voto:

"Toda denúncia é uma proposta da demonstração de prática de um fato típico e antijurídico imputado a determinada pessoa, sujeita à efetiva comprovação e à contradita, e, como assentado na jurisprudência, apenas deve ser repelida de pronto quando não houver indícios da existência de crime ou, de início, seja possível reconhecer, indubitavelmente, a inocência do acusado ou, ainda, quando não houver, pelo menos, indícios de sua participação." (STF, RHC 96.433/RJ, Rel. Min. Carmen Lúcia, Primeira Turma, julgamento, 20/10/2009, publicação 20/11/2009).
Ademais, a instrução criminal tem como escopo esclarecer e pormenorizar de que forma o acusado participou do delito que lhe é imputado, permitindo ampla dilação dos fatos e das provas, tratando de oportunizar ao denunciado o levantamento de todos os aspectos que entender relevantes para sua defesa.

Se para fins de condenação criminal é exigida a perquirição minudente acerca da participação de cada denunciado na prática criminosa que lhe é imputada, o mesmo não ocorre para fins de instauração de ação penal pertinente a delitos societários, caso em que se admite a descrição mitigada da atuação de cada um dos participantes da empreitada criminosa, desde que estabelecido algum vínculo entre o fato delituoso e o denunciado.

Nos crimes caracterizados pela autoria coletiva, a exigência de descer a minúcias acerca da conduta de cada réu, levaria a total impossibilidade de se proceder à persecução criminal dos envolvidos, tendo em vista a difícil apuração de fatos desta natureza.

Não se ignora que a teor do artigo 41, do Código de Processo Penal, a inicial acusatória não pode ser vaga e genérica. Porém, em determinadas formas delituosas, entre as quais, os crimes societários, tal exigência se apresenta como relativa, diante da notória impossibilidade de se ter uma descrição pormenorizada da conduta incriminada.

Há muito o Supremo Tribunal Federal já havia se pronunciado nesse sentido:

"HABEAS CORPUS. CRIME SOCIETÁRIO. DENÚNCIA INEPTA. DESCRIÇÃO PORMENORIZADA DE CONDUTAS. ENTENDIMENTO DO STF.
O STF tem jurisprudência a dizer da tolerância que se impõe à denúncia - nos crimes societários - sobre a eventual impossibilidade de não se encontrar o parquet habilitado, desde o início, para individualizar culpas. Em feitos desta natureza, a impunidade estaria assegurada se se reclamasse do Ministério Público, no momento da denúncia, a individualização de condutas, dada a maneira de se tomarem as decisões de que resulta a ação delituosa. Ordem denegada." (STF, HC 73903/CE, 2ª Turma, Rel. Min. Francisco Rezek, DJU de 25.4.97)

E assim, também já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

"RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. CRIMES FALIMENTARES. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. DENÚNCIA GENÉRICA. CRIMES COLETIVOS. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. INOCORRÊNCIA.
1. Em faltando à Acusação Pública, no ensejo do oferecimento da denúncia, elementos bastantes ao rigoroso atendimento do seu estatuto formal (Código de Processo Penal, artigo 41), principalmente nos casos de crime coletivo ou societário, é válida a imputação genérica do fato-crime, sem a particularização das condutas dos agentes, co-autores e partícipes, admitindo, como admite, a lei processual penal que as omissões da acusatória inicial possam ser supridas a todo tempo, antes da sentença final (Código de Processo Penal, artigo 569).
2. Não é inepta a denúncia se nela se contém descrição do fato típico.
3. O remédio heroico do habeas corpus, precisamente por força da sua angusta via, hostil à dilação probatória, somente se presta ao deslinde de questões fáticas quando acompanhado de prova pré-constituída, não se destinando à análise aprofundada de prova, nem à declaração de inocência, antecipando julgamento a ser procedido pela autoridade competente.
4. Recurso improvido." (STJ-RHC 14891/SP, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, J. 20.4.2004, DJ 21.6.2004, p. 256)
"Habeas corpus. Processual Penal. Apropriação indébita previdenciária. Denúncia. Inépcia. Não ocorrência. Gestão compartilhada. Ausência de dolo. Inadequação da via eleita. Ordem denegada. 1. Tratando-se de crimes societários, não é inepta a denúncia em razão da mera ausência de indicação individualizada da conduta de cada indiciado. 2. Configura condição de admissibilidade da denúncia em crimes societários a indicação de que os acusados sejam de algum modo responsáveis pela condução da sociedade comercial sob a qual foram supostamente praticados os delitos. Precedentes. 3. O debate acerca da ausência de dolo, em sede de habeas corpus, é inadequado, pois demanda incursão no seio da prova, análise vedada na via estreita do writ. 4. Habeas corpus denegado." (STF, HC 101.286/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 24.08.2011)

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça também tem, nos crimes societários, a mitigação dos requisitos da inicial acusatória, não se impondo a narração pormenorizada da conduta de cada um dos agentes. In verbs:

"RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. SONEGAÇÃO FISCAL. ARGUIÇÃO DE INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. EXORDIAL ACUSATÓRIA QUE DESCREVE SATISFATORIAMENTE A CONDUTA, EM TESE, DELITUOSA. CRIME DE AUTORIA COLETIVA. DESNECESSIDADE DE INDIVIDUALIZAÇÃO MINUCIOSA DAS CONDUTAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. RECURSO DESPROVIDO. 1. Consoante entendimento pacífico na Jurisprudência dos Tribunais Pátrios, o trancamento da ação penal, bem assim do inquérito policial, é medida de exceção, possível somente quando inequívoca a ausência de justa causa, o que não ocorre na hipótese. 2. In casu, inexiste o alegado defeito da peça acusatória, pois ela descreve as condutas delituosas imputadas ao Recorrente, relatando, em linhas gerais, os elementos indispensáveis para a demonstração da existência do crime em tese praticado, bem assim os indícios suficientes para a deflagração da persecução penal. 3. Há indicação de que o denunciado tinha ingerência na administração da pessoa jurídica. E, segundo a orientação do Supremo Tribunal Federal "[a] denúncia, na hipótese de crime societário, não precisa conter descrição minuciosa e pormenorizada da conduta de cada acusado, sendo suficiente que, demonstrando o vínculo dos indiciados com a sociedade comercial, narre as condutas delituosas de forma a possibilitar o exercício da ampla defesa." (RHC 117.173, Primeira Turma, Rel. Ministro LUIZ FUX, DJe 07/03/2014.) 4. Recurso ordinário desprovido." (STJ, 5ª Turma, RHC 201201920387, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJE DATA:31/03/2014).

Assim, descritos na denúncia oferecida contra o apelante comportamentos típicos e presentes os indícios de autoria, não há que se falar em inépcia.

Ademais, o Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a inépcia da denúncia está coberta pela preclusão quando, como no caso em análise, arguida após a sentença penal condenatória. In verbs:

"RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS E ARMAS. COAÇÃO ILEGAL. ANÁLISE DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA: IMPOSSIBILIDADE. DENÚNCIA QUE DESCREVE COMPORTAMENTOS TÍPICOS ATRIBUÍDOS AO RECORRENTE: PRECLUSÃO DA ARGUIÇÃO DE INÉPCIA. PRESCINDIBILIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO COMPLEXA DA DECISÃO QUE RECEBE A DENÚNCIA. QUESTÕES SUSCITADAS EM DEFESA PRELIMINAR DEVIDAMENTE ANALISADAS NA SENTENÇA. DECISÃO FUNDAMENTADA QUE INDEFERE PROVAS REQUERIDAS PELO ACUSADO: AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA IMPERTINENTE E PRESCINDÍVEL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. É pacífica a jurisprudência no sentido de não ser competente o Supremo Tribunal Federal para examinar, no habeas corpus, provas colhidas na instrução criminal (HC 92.971, Rel. Min. Carlos Britto, DJe 29.8.2008). 2. Denúncia apresenta "a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias", com adequada indicação da conduta ilícita imputada ao recorrente, de modo a propiciar a ele o pleno exercício do direito de defesa (art. 41 do Código de Processo Penal). 3. Preclusão da arguição de inépcia da denúncia aventada após a sentença penal condenatória, o que só não ocorre quando a sentença é proferida na pendência de habeas corpus em curso. Precedentes. 4. Não há cerceamento de defesa quando as provas requeridas são indeferidas sob o fundamento de serem impertinentes e prescindíveis. 5. Recurso ordinário em habeas corpus ao qual se nega provimento." (STF, RHC 96.433/RJ, Rel. Min. Carmen Lúcia, Primeira Turma, julgamento, 20/10/2009, publicação 20/11/2009) - grifo nosso.

Preliminar rejeitada.

1.2. Da preliminar de cerceamento de defesa alegada por LUIZ HENRIQUE.

Com relação à preliminar de cerceamento de defesa, como vem decidindo esta Egrégia Corte, o indeferimento de produção de perícia contábil não implica em cerceamento de defesa, por não ser esta prova imprescindível.

"PENAL. CONSTITUCIONAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. NULIDADE. INDEFERIMENTO DE DILIGÊNCIA. INOCORRÊNCIA. LANÇAMENTO FISCAL COM BASE EM EXTRATOS BANCÁRIOS OBTIDOS MEDIANTE QUEBRA DO SIGILO BANCÁRIO. MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA OBTIDA DIRETAMENTE PELA RECEITA FEDERAL. LICITUDE DA PROVA. PROVA DA MATERIALIDADE E AUTORIA. DESTINAÇÃO DA PENA PECUNIÁRIA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Apelação da Defesa contra sentença que condenou o réu como incurso no artigo 1º, incisos I e II, Lei 8.137/1990, na forma do artigo 71 do Código Penal. 2. Em se tratando do crime de sonegação fiscal, a materialidade delitiva resta demonstrada na constituição definitiva do crédito tributário e na cópia do procedimento administrativo-fiscal. Para a constituição do crédito tributário, foram observadas as informações constantes dos extratos bancários do contribuinte, afastando-se os depósitos cuja origem foi comprovada pelo contribuinte, os cheques que foram devolvidos e os depósitos estornados, sendo mantida a autuação sobre os depósitos com origem não declarada, não havendo que se falar em presunção para a lavratura do auto de infração, de forma que se revela desnecessária a realização da perícia contábil nos moldes em que foi pretendida. 3. O indeferimento de prova não implica ilegalidade, na medida em que a aferição da necessidade da produção da prova é mister do juiz da causa, que tem ampla visão sobre o desenrolar da ação penal. O juiz é o destinatário das provas e tem o dever de indeferir as inúteis e meramente protelatórias. 4. Em recente julgamento, o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu pela constitucionalidade dos artigos 5º e 6º da LC 105/2001 à luz dos incisos X e XII do artigo 5º da CF, que permitem à Receita Federal receber dados bancários de contribuintes fornecidos diretamente pelos bancos, sem prévia autorização judicial, não restando configurado quebra de sigilo bancário, mas mera transferência de sigilo da órbita bancário para fiscal, ambas protegidas contra o acesso de terceiros. (STF, Pleno, ADI 2390, ADI 2386, ADI 2397, ADI 2859, RE 601314, j. 24/02/2016, Informativo STF nº 815). Decidiu ainda que a Lei nº 10.174/01 tem caráter de norma tributária de natureza procedimental, a teor do disposto no artigo 144, §1º, do Código Tributário Nacional, não atraindo a aplicação do princípio da irretroatividade das leis tributárias. 5. Materialidade delitiva comprovada pelo Procedimento Administrativo Fiscal, em especial pelo auto de infração, planilhas de depósitos e extrato de movimentação bancária, no qual se apurou a existência de diversos depósitos bancários de valores cuja origem não foi comprovada nos anos-calendário 1999 e 2000 (exercício 2000 e 2001), os quais não foram declarados como rendimentos tributáveis em sua declaração de Imposto de Renda Pessoa Física. O julgamento do recurso administrativo, o demonstrativo do crédito tributário e o termo de perempção dão conta da constituição definitiva do crédito tributário no valor de R$ 4.268.072,45, inscrito na dívida ativa. 6. Autoria comprovada nos autos. Os extratos bancários demonstram intensa movimentação bancária, não tendo o acusado comprovada a origem do recurso. O acusado foi intimado quando do início do procedimento administrativo fiscal para apresentar comprovar a origem do rendimento, não trazendo justificativa para os depósitos em conta, mas apenas cópia de alguns extratos bancários. Ao impugnar administrativamente o auto de infração, questionou a decadência, o critério de apuração do fato gerador, a legalidade do lançamento por arbitramento e os juros aplicados, mas deixou de justificar os inúmeros depósitos em conta. Em juízo, não produziu qualquer prova capaz de esclarecer a origem da movimentação financeira, tendo apenas afirmado em seu interrogatório que à época estava com problemas de saúde e problemas familiares. 7. O Código Tributário Nacional, em seu artigo 44, estabelece a base de cálculo do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza como sendo "o montante, real, arbitrado, ou presumido, da renda ou dos proventos tributáveis". A Lei 9.430/1996 prevê a possibilidade de a renda arbitrada fundar-se em depósitos bancários efetuados em conta do contribuinte, sem a demonstração da origem dos recursos. Assim, o lançamento por arbitramento é válido, tanto para fins tributários, como para fazer prova da materialidade do crime de sonegação fiscal. 8. Se a autoridade tributária verifica a incompatibilidade entre a movimentação financeira do contribuinte e a renda declarada, e promove o lançamento, apontado a omissão de renda, não é de se exigir que o Ministério Público Federal aponte qual a natureza da renda omitida. Não há como ter o lançamento como válido para fins tributários, mas não válido para fins penais, porque baseado em presunção legal. Seria demais excessivo e desproporcional exigir-se que a Acusação investigue e descubra a natureza da renda omitida pelo réu - se tais depósitos foram provenientes de operações de câmbio, ou de trabalho assalariado, de trabalho sem vínculo empregatício, de aluguéis ou de outros rendimentos de capitais. 9. É certo que o Juiz penal não está vinculado à autoridade administrativa e pode, diante de prova em sentido contrário, convencer-se de que a movimentação financeira do contribuinte não constitui renda e, portanto, não obstante estar o crédito tributário definitivamente constituído, entender que não houve sonegação. Contudo, tal prova cabe à Defesa, e não à Acusação (art. 156 do CPP). 10. Não se trata de transferência indevida do ônus da prova. A Acusação desincumbiu-se da prova que lhe competia: trouxe aos autos prova de que o réu movimentou valores de grande monta em suas contas correntes, e de que apresentou declarações de imposto de renda absolutamente incompatíveis com os valores da movimentação financeira. 11. Ao réu é que caberia provar que, não obstante a absoluta incompatibilidade entre a movimentação financeira e as declarações de rendimentos apresentadas ao Fisco, os valores depositados em conta corrente não constituem renda, afastando assim a presunção legal. E, no caso dos autos, o réu não trouxe qualquer prova firme, apta a abalar o lançamento efetuado. 12. O montante de tributos sonegados ultrapassava quatro milhões e meio de reais na época do oferecimento da denúncia, de modo que a consequência do delito perpetrado apresenta-se de grande monta, justificando a majoração da pena-base. Precedente. 13. A conduta delituosa foi cometida por dois anos subsequentes, com as mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução, caracterizando a continuidade delitiva do artigo 71, caput, do Código Penal. A ficção jurídica da continuidade delitiva é benéfica ao réu, pois considera os comportamentos delituosos subsequentes continuação do primeiro e não crimes autônomos. 14. A pena de prestação pecuniária, substitutiva da pena privativa de liberdade, deve ser revertida em favor da entidade lesada com a ação criminosa, nos termos do artigo 45, §1° do Código Penal, no caso, a União Federal. 15. Preliminares rejeitadas. Apelação desprovida. De ofício, alterada a destinação da pena pecuniária." (TRF3, ACR 0009269-98.2010.403.6109, Rel. Desembargador Federal, Primeira Turma, Hélio Nogueira, julgamento, 06/10/2016, publicação 28/10/2016)

Além disso, na decisão de fls. 3862, o MM. Juiz a quo indeferiu o pedido da defesa de que os autos retornassem aos peritos para análise de quesito não respondido, por não ter a defesa se manifestado no prazo estipulado para formulação dos quesitos, permanecendo a defesa de LUIZ HENRIQUE inerte. Vejamos:

"Verifica-se que a defesa do co-réu LUIZ HENRIQUE DIDIER foi intimada, juntamente com as demais, da deliberação de folhas 3602, na qual havia determinação para que as partes apresentassem os quesitos para a elaboração da perícia (folha 3613). Somente os defensores do co-réu CARLOS ARNALDO (folhas 3614/3624), juntamente com o Ministério Público Federal (folhas 3717/3718), formularam quesitos."

Sendo assim, deve ser rejeitada a preliminar de cerceamento de defesa.

1.3. Da nulidade da sentença alegada por CARLOS ARNALDO.

Alega a defesa do réu que a sentença não possui fundamentação, pelo que deve ser decretada a sua nulidade.

Pese embora a sentença faça alusão ao inquérito administrativo nº 16/97 da CVM, no qual foram apuradas as fraudes cometidas pelos acusados, é pacífico o entendimento nos Tribunais Superiores de que é possível a fundamentação per relationem ou por referência, não se cogitando em nulidade ou ofensa ao artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. In verbs:

"PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. POSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.
1. Não há falar em nulidade do acórdão recorrido, porquanto o Tribunal a quo explicitou os motivos pelos quais acolheu a fundamentação previamente existente, revelando-se válida a adoção dos fundamentos da sentença de primeiro grau - motivação per relationem -, como medida de simplicidade e economia processual.
2. Agravo regimental improvido." (AgRg no AREsp 954.408/RS, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 18/05/2017, DJe 05/06/2017)

Neste caso, o MM. Juiz fundamentou a sua sentença, transcrevendo as partes do relatório da CVM que interessavam ao Processo, onde há extensa prova da materialidade delitiva, os quais se encontram nos autos deste processo, bem como em laudos periciais realizados no curso das investigações.

Resta claro que a decisão recorrida não viola o disposto no artigo 93, IX, da Constituição Federal, estando devidamente fundamentada, pelo que não há que se falar em nulidade.

2. Do mérito.

2.1. Do pedido de condenação de LUIZ HENRIQUE e CARLOS ARNALDO pelo crime tipificado no artigo 16, da Lei nº 7.492/86.

Os acusados foram denunciados pelo artigo 16, da Lei nº 7.492/86, que assim dispõe:

"Art. 16. Fazer operar, sem a devida autorização, ou com autorização obtida mediante declaração (Vetado) falsa, instituição financeira, inclusive de distribuição de valores mobiliários ou de câmbio:
Pena - Reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa."- grifo nosso.

Depreende-se do tipo penal que, como elemento normativo, há a exigência de autorização para que uma instituição financeira opere no ramo.

Desse modo, para que haja tipicidade, é necessário que o autor do delito constitua uma instituição financeira e a faça operar sem que tenha a devida autorização ou mediante autorização falsa.

Como analisado pelo MM. Juiz a quo, está evidenciado que os réus fizeram operar a instituição financeira DIDIER CCTVM, com operações formalmente realizadas e relatadas no inquérito administrativo nº 16/97 produzido pela Comissão de Valores Mobiliários.

Entretanto, demonstrado está que a empresa DIDIER CCTVM possuía autorização para operar como instituição financeira, o que desqualifica o crime descrito no artigo 16, da referida Lei. E, como bem fundamentado pelo juiz sentenciante:

"Efetivamente, os documentos juntados nos autos comprovam que a instituição que operou na Bovespa foi a DIDIER CCTVM e não a MERCAP.
Se houve a chamada terceirização das atividades da DIDIER CTVM para a MERCAP, com o proprietário e funcionários desta operando para aquela, como decorre dos autos, temos que, ainda assim, não há tipicidade penal.
Isso porque a legislação não veda expressamente essa terceirização, ou seja, não há expressa proibição de delegação, por contrato, dos poderes inerentes à gestão da instituição financeira. Aliás, a CVM, no substancioso inquérito administrativo, não se referiu à existência de referida proibição.
O fundamento que afasta a tipicidade com maior veemência é o de que o tipo penal fala em 'fazer operar instituição financeira sem autorização' e não fazer operar instituição financeira da qual não seja sócio ou proprietário, ou operá-la por interposta pessoa" (fls. 3985).

Sendo assim, deve ser mantida a absolvição dos acusados em relação ao delito do artigo 16, da Lei nº 7.492/86.

2.2. Da prova da autoria e da materialidade delitiva relativa ao delito tipificado no artigo 4º, caput, da Lei nº 7.492/86.

Alega a defesa de LUIZ HENRIQUE que o acusado não participava das operações financeiras, as quais eram realizadas por CARLOS ARNALDO, com exclusividade.

No mesmo sentido, a defesa de CARLOS ARNALDO pleiteia a absolvição em virtude de a condenação ter utilizado a investigação realizada pela CVM, que não teria imparcialidade para apurar os fatos, além de não restar demonstrada fraude pela qual geriram a empresa e ausência de obtenção de lucros nas operações.

Os acusados foram condenados pela prática do delito tipificado no artigo 4º, da Lei nº 7.492/86, que assim dispõe:

 "Art. 4º Gerir fraudulentamente instituição financeira:
Pena - Reclusão, de 3 (três) a 12 (doze) anos, e multa.
Parágrafo único. Se a gestão é temerária:
Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa."

Assim, o tipo penal pune a conduta daqueles que administram instituições financeiras por meio de condutas fraudulentas, aptas a enganar terceiros, induzindo-os a erro.

Trata-se de crime de perigo que se consuma com a simples realização da conduta típica, independentemente de qualquer resultado ou causação de efetivo prejuízo às vítimas.

No caso dos autos, ficou demonstrado que a empresa DIDIER CCTVM foi gerida de maneira fraudulenta, cabendo destacar a utilização de interpostas pessoas para a realização de operações em bolsa de valores.

Do relatório do inquérito administrativo nº 16/97, elaborado pela CVM, depreende-se que os acusados utilizaram os nomes de José Antônio Pinheiro, João Batista Pinheiro e Margarete Dejavite para efetuar operações na Bolsa de Valores com o intuito de lucro, sem que tais pessoas tivessem conhecimento de quais foram os negócios realizados em seus nomes, bem como de quais foram os lucros gerados por essas operações.

No laudo pericial (fls. 3793/3827) constatou-se que os comitentes que operaram por meio da DIDIER CCTVM não foram os beneficiários dos lucros gerados, sendo que, do rastreamento dos cheques, verificou-se que a maioria dos recursos gerados pelas operações foram destinados, principalmente, à DIDIER CCTVM.

Constatou-se também que as operações realizadas com a Fundação CESP, foram feitas por meio de compras de ações sem elevada liquidez, as quais, em poucos dias, eram revendidas para a Fundação, resultando os lucros.

Tais operações só eram possíveis, pois os acusados tinham conhecimento prévio do interesse da Fundação em adquirir determinado lote de ações. Assim, os réus se antecipavam na compra dessas mesmas ações para que, posteriormente, fosse possível a revenda à Fundação CESP.

Ademais, em relação às operações de day-trade, concluíram os peritos que "não há dúvidas em relação à utilização, como 'laranjas', dos seguintes comitentes: José Antônio Pinheiro, João Batista Pinheiro e Otávio Pinheiro, os quais tiveram seus nomes usados nas operações em referência, cujos principais beneficiários foram Carlos Arnaldo Borges de Souza, controlador da MERCAP, e a própria corretora intermediante, DIDIER CCTVM".

E a corroborar tais afirmações, há os depoimentos das pessoas envolvidas.

José Antônio Pinheiro afirmou que em 1994 comprou umas ações, por intermédio de seu cunhado Carlos Arnaldo, o qual ficou responsável por fazer o investimento em seu nome.

Por sua vez, João Antônio Batista Pinheiro aduziu que investiu no mercado financeiro por meio da DIDIER, sendo que as verbas investidas eram repassadas para o senhor Carlos Arnaldo, que era responsável por aplicar o capital por meio da DIDIER. Afirmou, ainda, que fez um empréstimo junto à MERCAP para completar o valor investido.

Por fim, Margarete Dejvite confirmou que realizou investimentos por meio de seu cunhado Marcos José, que trabalhava na DIDIER, não se recordando se os investimentos foram lucrativos.

Dessa forma, como bem concluiu o MM. Juiz a quo:

"Constata-se, pela análise destes interrogatórios, que as pessoas que figuraram como comitentes nas operações referenciadas não tinham as condições normalmente exigidas para realiza-las. São pessoas de modesta escolaridade e que não auferem rendimentos compatíveis com os possuídos pelos investidores do mercado de ações.
Certamente por isso os três citados acusados não explicaram e muito menos comprovaram a origem do montante dos recursos supostamente investidos, o que não se coaduna com a tese defensiva de que eram investidores" (fls. 3992).

Assim, devidamente prova está a materialidade do delito.

Comprovada a materialidade delitiva, passa-se a análise da responsabilidade dos acusados.

Argumenta a defesa de CARLOS ARNALDO, a fim de afastar a sua responsabilidade, que não houve prejuízo a terceiros e que não houve lucro nas transações financeiras, bem como não há comprovação de fraude penal.

Contudo, para a configuração do crime de gestão fraudulenta, não é necessária a provocação de prejuízo a terceiros, pois o legislador visou tutelar a credibilidade do Sistema Financeiro Nacional, reconhecidamente sensível, protegendo-o de condutas fraudulentas que comprometam a sua confiabilidade.

Em relação a falta de prova da existência de fraude penal, como bem analisado pelo Juiz sentenciante, "o tipo penal não faz distinção entre a chamada fraude penal e a fraude civil. Na realidade, a fraude é uma só, consistindo na conduta do gestor da instituição financeira apta a ludibriar terceiros, pondo em risco a credibilidade do Sistema Financeiro Nacional" (fls. 3996).

Ficou demonstrado nos autos que o acusado era sócio e gerente da empresa MERCAP, a qual fora contratada pela empresa DIDIER para prestar serviços na área financeira.

Ademais, dos depoimentos testemunhais e do interrogatório do acusado LUIZ HENRIQUE depreende-se que o responsável por efetivar as transações na Bolsa de Valores era mesmo CARLOS ARNALDO.

Dessa forma, provada a autoria de CARLOS ARNALDO.

No mesmo sentido, bem demonstrada está a autoria de LUIZ HENRIQUE.

Primeiramente, vale destacar que o acusado, sócio da DIDIER CCTVM, terceirizou as operações de sua corretora em favor da MERCAP, empresa de CARLOS ARNALDO, o que ensejou a gestão fraudulenta de sua empresa.

Ademais, os lucros obtidos nas operações de day-trade foram revertidos em favor da própria DIDIER CCTVM, dos quais se beneficiou o acusado, que tinha pleno conhecimento das irregularidades praticadas.

E, por ser experiente operador do mercado de capitais, não é verossímil acreditar que o réu terceirizasse totalmente as operações na Bolsa de Valores à MERCAP, confiando totalmente na gestão por ela realizada. Era seu dever fiscalizar a gestão da empresa DIDIER CCTVM, por ser sócio e proprietário.

Deste modo, bem demonstrada a autoria de ambos os acusado e a materialidade delitiva, pelo que não há que se falar em absolvição.

2.3. Da alegação de erro de proibição feita por CARLOS ARNALDO.

Pleiteia a defesa de CARLOS ARNALDO o reconhecimento do erro de proibição, em virtude de que o acusado tinha plena convicção de que os atos por ele praticados eram lícitos.

Todavia, a tese não procede.

Conforme já decidiu esta Egrégia Corte:

"A figura do erro de proibição consiste no desconhecimento quanto à qualificação jurídica da conduta como ilícito penal. Não se trata, convém esclarecer desde logo, de desconhecimento da lei em abstrato, mas de desconhecimento a respeito da "contrariedade do fato em relação à legislação" (Cézar Roberto Bittencourt, Código Penal Comentado. Saraiva: 2012, p. 148), é dizer, da ausência de conhecimento, pelo agente, a respeito de que aquela conduta concreta (a conduta típica por ele praticada) constituir fato amoldado ao texto de um tipo penal. O caso dos autos não se amolda à figura do erro de proibição
Dizer que o réu não teria potencial conhecimento da ilicitude, ou seja, que nem sequer poderia conhecer a natureza jurídica delitiva de sua conduta seria partir de pressuposição incompatível com os fatos do caso, e mesmo com a realidade fática em geral (cujo exame é necessário para que se estabeleça o conhecimento potencial da ilicitude, requisito para a aferição da culpabilidade do agente)" (TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 63688 - 0000128-34.2005.4.03.6108, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, julgado em 08/03/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/03/2016 )

O acusado era sócio proprietário da empresa MERCAP, a qual firmou contrato de prestação de serviços com a empresa DIDIER CCTVM para atuar no mercado de capitais.

Assim, não há como acolher a tese de que o acusado acreditava que todos os seus atos eram lícitos, pois proprietário de empresa prestadora de serviços financeiros.

Em seu interrogatório, o réu afirmou que LUIZ HENRIQUE conferiu a ele total autonomia para exercer operações relacionadas à Bolsa de Valores, o que demonstra confiança nos conhecimentos que o acusado possuía na sua área de atuação. Ademais, ainda perante autoridade judicial, o réu explicou detalhadamente o funcionamento das operações, o que demonstra que tinha pleno conhecimento do modus operandi das operações financeiras (fls. 3475/3477).

Assim, resta claro que o acusado tinha condições de saber que as suas condutas eram ilícitas, pelo que não merece prosperar a alegação de erro de proibição.

3. Da dosimetria da pena.

Comprovadas a autoria e a materialidade delitiva, passo a análise da dosimetria da pena dos acusados.

3.1. Do acusado CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA.

Assim argumentou o MM. Juiz sentenciante:

"Atento às circunstâncias judiciais expressas no art. 59 do Código Penal, considero que a culpabilidade deste acusado superou a normalidade, na medida em que articulou sofisticado sistema de gestão fraudulenta da DIDIER/MERCAP, auferindo elevada vantagem econômica através das operações eivadas de fraude. As consequências do crime foram normais para o tipo. Quanto aos antecedentes, os do acusado não são maus. Não há informes negativos sobre sua personalidade e conduta social. As circunstâncias e motivos do crime são normais para o tipo" (fls. 4001).

Ademais, as consequências do delito praticado pelo acusado são nefastas, vez que abalam de maneira substancial a credibilidade do mercado financeiro brasileiro. E mais. Conforme se constata dos laudos periciais, as operações envolvendo a Fundação CESP causaram prejuízo de aproximadamente R$ 1.107.833,54 (um milhão, cento e sete mil, oitocentos e trinta e três reais e cinquenta e quatro centavos).

Dessa forma, considerando a culpabilidade elevada do acusado e as consequências do delito, deve a pena-base ser elevada em ½ (metade), o que resulta a pena de 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão.

Em relação a pena de multa, restou aplicada a pena de 150 (cento e cinquenta) dias-multa, no valor unitário de 02 (dois) salários mínimos vigentes à época dos fatos.

Entretanto, proporcionalmente ao quantum da pena privativa de liberdade, reduzo a pena pecuniária para 15 (quinze) dias-multa, à razão de 02 (dois) salários mínimos vigentes à época dos fatos, atualizada monetariamente.

Não há circunstâncias agravantes nem atenuantes a serem aplicadas, bem como não se vislumbra causas de aumento ou de diminuição de pena, restando definitiva a pena de 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão, e pagamento de 15 (quinze) dias-multa.

Com fundamento no artigo 33, §2º, alínea "b", do Código Penal, fixo o regime semiaberto para início do cumprimento de pena.

Em razão do quanto de pena aplicada, não cabe substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, do artigo 44, do Código Penal.

3.2. Do acusado LUIZ HENRIQUE DIDIER.

Como bem fundamentou o MM. Juiz sentenciante:

"Atento às circunstâncias judiciais expressas no art. 59 do Código Penal, considero que sua culpabilidade não superou a normalidade. As consequências do crime foram normais para o tipo. Quanto aos antecedentes, os do acusado não são maus. Não há informes negativos sobre sua personalidade e conduta social. As circunstâncias e motivos do crime são normais para o tipo" (fls. 4002/4003).

Entretanto, as consequências do delito praticado pelo acusado são nefastas, vez que abalam de maneira substancial a credibilidade do mercado financeiro brasileiro. E mais. Conforme se constata dos laudos periciais, as operações envolvendo a Fundação CESP causaram prejuízo de aproximadamente R$ 1.107.833,54 (um milhão, cento e sete mil, oitocentos e trinta e três reais e cinquenta e quatro centavos).

Dessa forma, deve ser elevada a pena-base do réu em ¼ (um quarto), o que resulta a pena de 03 (três) anos e 09 (nove) meses de reclusão, e 12 (doze) dias-multa.

Não há circunstâncias agravantes nem atenuantes a serem aplicadas, bem como não se vislumbra causas de aumento ou de diminuição de pena, restando definitiva a pena de 03 (três) anos e 09 (nove) meses de reclusão, e 12 (doze) dias-multa, à razão de 02 (dois) salários mínimos vigentes à época dos fatos, atualizada monetariamente.

Com fundamento no artigo 33, §2º, alínea "c", do Código Penal, mantenho o regime aberto para início do cumprimento de pena.

O réu preenche os requisitos do artigo 44, do Código Penal, de forma que deve ser a pena privativa de liberdade substituída por 02 (duas) penas restritivas de direitos, quais sejam prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública e prestação pecuniária de 100 (cem) salários mínimos, por ser o valor condizente com a situação econômica do réu, destinada à entidade pública ou privada com destinação social.

Ante o exposto, nego provimento à apelação de LUIZ HENRIQUE DIDIER; dou parcial provimento à apelação de CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA para reduzir a pena a ele aplicada para 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em regime semiaberto, e pagamento de 15 (quinze) dias-multa, no valor unitário de 02 (dois) salários mínimos vigentes à época dos fatos, atualizada monetariamente, como incurso no artigo 4º, caput, da Lei nº 7.492/86, e, por fim, dou parcial provimento à apelação ministerial, para aumentar a pena de LUIZ HENRIQUE DIDIER para 03 (três) anos e 09 (nove) meses de reclusão, em regime aberto, e 12 (doze) dias-multa, no valor unitário de 02 (dois) salários mínimos vigentes à época dos fatos, atualizada monetariamente, artigo 4º, caput, da Lei nº 7.492/86. A pena privativa de liberdade deve ser substituída por 02 (duas) penas restritivas de direitos, quais sejam prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública e prestação pecuniária de 100 (cem) salários mínimos, destinada à entidade pública ou privada com destinação social.

Expeça-se mandado de prisão, em desfavor de CARLOS ARNALDO BORGES DE SOUZA, com validade até 19/06/2018, para imediato cumprimento das penas, nos termos do entendimento do STF (HC 126.292, ADCs 43 e 44 e ARE 964.246).

É o voto.

VALDECI DOS SANTOS
Desembargador Federal


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