Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 22/02/2018
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0003877-30.2017.4.03.0000/SP
2017.03.00.003877-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal WILSON ZAUHY
AGRAVANTE : RAMOS COMPONENTES ELETRONICOS LTDA
ADVOGADO : SP273160 MARCELO APARECIDO DE SOUZA e outro(a)
AGRAVADO(A) : Caixa Economica Federal - CEF
ADVOGADO : SP230827 HELENA YUMY HASHIZUME
ORIGEM : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE MOGI DAS CRUZES > 33ªSSJ > SP
No. ORIG. : 00031581620164036133 1 Vr MOGI DAS CRUZES/SP

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO (SFH). EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. CONSTITUCIONALIDADE. SUSPENSÃO DO PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL DO IMÓVEL. NECESSIDADE DE DEPÓSITO DAS PARCELAS VENCIDAS DO CONTRATO DE MÚTUO (INCLUSIVE PRÊMIOS DE SEGURO, MULTAS CONTRATUAIS E CUSTOS ADVINDOS DA CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE). INOCORRÊNCIA. VIABILIDADE DE A RECORRENTE PROCEDER AO DEPÓSITO ATÉ A EVENTUAL ARREMATAÇÃO DO IMÓVEL POR TERCEUIROS. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO.
- No contrato de financiamento com garantia por alienação fiduciária, o devedor/fiduciante transfere a propriedade do imóvel à Caixa Econômica Federal (credora/ fiduciária) até que se implemente a condição resolutiva, que é o pagamento total da dívida. Registre-se, por necessário, que o procedimento previsto pela Lei nº 9.514/97 não se reveste de qualquer nódoa de ilegalidade ou de inconstitucionalidade.
- Quanto à viabilidade de purgação da mora, o Decreto-Lei nº 70/66 prevê expressamente esta possibilidade até a assinatura do auto de arrematação (art. 34). Ainda que o contrato objeto do feito originário tenha sido firmado sob as regras da Lei nº 9.514/97, como se verifica de seus termos, não se afasta a possibilidade da purgação até a assinatura do auto de arrematação (art. 39).
- O que se extrai da orientação do C. STJ é que a consolidação da propriedade em nome da mutuante não é óbice à purgação da mora, desde que esta ocorra antes da arrematação do bem por terceiros. Isso porque, entendeu a Corte, o real objetivo do credor é receber a dívida sem experimentar prejuízos e não alienar o imóvel a terceiros. A purgação da mora deve compreender o pagamento das parcelas vencidas do contrato de mútuo, inclusive dos prêmios de seguro, da multa contratual e de todos os custos advindos da consolidação da propriedade.
- Das razões recursais não se depreende a notícia de qualquer irregularidade contratual apontada pela agravante. Em verdade, esta apenas salienta suas dificuldades financeiras e a impossibilidade de cumprir com o que restou avençado pelas partes. Assim, não se vislumbrando qualquer irregularidade contratual, o negócio jurídico deve produzir os seus regulares efeitos jurídicos, cabendo à recorrente purgar a mora nos termos acima delineados. Em não se verificando a efetiva purgação da mora, a instituição financeira estará autorizada a dar prosseguimento ao procedimento de execução extrajudicial, na medida em que tal possibilidade foi prevista de forma válida pelo contrato entabulado pelas partes.
- Agravo de instrumento a que se dá parcial provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao agravo de instrumento interposto, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 06 de fevereiro de 2018.
WILSON ZAUHY
Desembargador Federal


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AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0003877-30.2017.4.03.0000/SP
2017.03.00.003877-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal WILSON ZAUHY
AGRAVANTE : RAMOS COMPONENTES ELETRONICOS LTDA
ADVOGADO : SP273160 MARCELO APARECIDO DE SOUZA e outro(a)
AGRAVADO(A) : Caixa Economica Federal - CEF
ADVOGADO : SP230827 HELENA YUMY HASHIZUME
ORIGEM : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE MOGI DAS CRUZES > 33ªSSJ > SP
No. ORIG. : 00031581620164036133 1 Vr MOGI DAS CRUZES/SP

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por RAMOS COMPONENTES ELETRÔNICOS LTDA. em face de decisão que, nos autos da ação pelo rito ordinário proposta na origem, revogou a antecipação de tutela deferida anteriormente, permitindo que a Caixa Econômica Federal desse sequência ao procedimento de execução extrajudicial do imóvel financiado.


Inconformada, a agravante sustenta que financiou imóvel pelo valor de R$ 2.100.000,00 em um total de 120 parcelas, local onde instalou a sede da sociedade empresária, que possui dezenas de funcionários trabalhando. Afirma que devido a grande crise em que o Brasil se encontra atualmente, e sobretudo aos problemas financeiros que enfrenta, acabou por atrasar algumas parcelas.


Defende que a possibilidade de leilão extrajudicial coloca em risco a própria existência da sociedade empresária. Aponta que se por um lado o direito do credor deve ser satisfeito, por outro deve-se assegurar ou facilitar a continuidade de sua atividade econômica, até como forma de atender os direitos de crédito da instituição financeira.


Nesta sede, o pedido de efeito suspensivo restou parcialmente deferido, para o fim único e exclusivo de autorizar a recorrente a purgar a mora até a eventual arrematação do bem imóvel por terceiros (fls. 146/148verso).


A agravada CAIXA ECONÔMICA FEDERAL apresentou sua contraminuta às fls. 150/152.


Neste ponto, vieram-me conclusos os autos.


É o relatório, dispensada a revisão, nos termos regimentais.


WILSON ZAUHY
Desembargador Federal Relator


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AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0003877-30.2017.4.03.0000/SP
2017.03.00.003877-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal WILSON ZAUHY
AGRAVANTE : RAMOS COMPONENTES ELETRONICOS LTDA
ADVOGADO : SP273160 MARCELO APARECIDO DE SOUZA e outro(a)
AGRAVADO(A) : Caixa Economica Federal - CEF
ADVOGADO : SP230827 HELENA YUMY HASHIZUME
ORIGEM : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE MOGI DAS CRUZES > 33ªSSJ > SP
No. ORIG. : 00031581620164036133 1 Vr MOGI DAS CRUZES/SP

VOTO

O contrato de alienação fiduciária, como este que se discute nos presentes autos, foi celebrado segundo as regras da Lei nº 9.514/97 (fl. 49), que assim dispõe:


Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.
(...)
Art. 23. Constitui-se a propriedade fiduciária de coisa imóvel mediante registro, no competente Registro de Imóveis, do contrato que lhe serve de título.
Parágrafo único. Com a constituição da propriedade fiduciária , dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel.
(...)
Art. 26. Vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante, consolidar-se-á, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário.

No contrato de financiamento com garantia por alienação fiduciária, o devedor/fiduciante transfere a propriedade do imóvel à Caixa Econômica Federal (credora/ fiduciária) até que se implemente a condição resolutiva, que é o pagamento total da dívida.


Liquidado o financiamento, o devedor retoma a propriedade plena do imóvel, ao passo que, havendo inadimplemento dos termos contratuais, a Caixa Econômica Federal, obedecidos os procedimentos previstos na lei, tem o direito de requerer ao Cartório a consolidação da propriedade do imóvel em seu nome, passando a exercer a propriedade plena do bem.


Registro, por necessário, que o procedimento previsto pela Lei nº 9.514/97 não se reveste de qualquer nódoa de ilegalidade ou de inconstitucionalidade. Neste sentido, transcrevo recente julgado proferido por esta Corte Regional:


"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO - SFH. LEI 9.514/1997. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. LEGALIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1 - A alienação fiduciária representa espécie de propriedade resolúvel, de modo que, conforme disposto pela própria Lei n. 9.514/97, inadimplida a obrigação pelo fiduciante a propriedade se consolida em mãos do credor fiduciário. 2 - Por ocasião do leilão de que trata o art. 27 da Lei n. 9.514/97 o imóvel não pertence mais ao patrimônio do devedor fiduciante, razão pela qual desnecessária qualquer notificação ao fiduciante quanto a sua realização. 3 - Do que há nos autos, não é possível aferir o fumus boni iuris na conduta da agravada. Afasta-se de plano a inconstitucionalidade da execução extrajudicial prevista pela Lei n. 9.514/97, a semelhança do que ocorre com a execução extrajudicial de que trata o Decreto-lei n. 70/66 de há muito declarada constitucional pelo STF. 4 - Os contratos de financiamento foram firmados nos moldes do artigo 38 da Lei n. 9.514/97, com alienação fiduciária em garantia, cujo regime de satisfação da obrigação (artigos 26 e seguintes) diverge dos mútuos firmados com garantia hipotecária. 5 - A impontualidade na obrigação do pagamento das prestações pelo mutuário acarreta o vencimento antecipado da dívida e a imediata consolidação da propriedade em nome da instituição financeira. 6 - Não consta, nos autos, evidências de que a instituição financeira não tenha tomado as devidas providências para tanto, nos termos do art. 26, da Lei 9.514/97. (...) 9 - O procedimento de execução do mútuo com alienação fiduciária em garantia não fere o direito de acesso ao Judiciário, porquanto não proíbe ao devedor, lesado em seu direito, levar a questão à análise judicial. (...) Outrossim, quanto a inscrição dos nomes dos devedores em cadastros de inadimplentes, a 2ª Seção do STJ dirimiu a divergência que pairava naquela Corte e firmou o entendimento de que a mera discussão da dívida não enseja a exclusão do nome do devedor dos cadastros de inadimplentes, cumprindo a ele demonstrar satisfatoriamente seu bom direito e a existência de jurisprudência consolidada do STJ ou do STF e, ainda, que a parte incontroversa seja depositada ou objeto de caução idônea: 13 - Agravo legal improvido." (negritei)
(TRF 3ª Região, Primeira Turma, AI 00157552020154030000, e-DJF3 04/02/2016)

Quanto à purgação da mora, o Decreto-Lei nº 70/66 prevê expressamente esta possibilidade até a assinatura do auto de arrematação, conforme se extrai da leitura do artigo 34:


Art 34. É lícito ao devedor, a qualquer momento, até a assinatura do auto de arrematação, purgar o débito, totalizado de acôrdo com o artigo 33, e acrescido ainda dos seguintes encargos:
I - se a purgação se efetuar conforme o parágrafo primeiro do artigo 31, o débito será acrescido das penalidades previstas no contrato de hipoteca, até 10% (dez por cento) do valor do mesmo débito, e da remuneração do agente fiduciário;
II - daí em diante, o débito, para os efeitos de purgação, abrangerá ainda os juros de mora e a correção monetária incidente até o momento da purgação.

Ainda que o contrato objeto do feito originário tenha sido firmado sob as regras da Lei nº 9.514/97, não se afasta a possibilidade da purgação até a assinatura do auto de arrematação, ante a previsão inserta em seu artigo 39:


Art. 39. Às operações de financiamento imobiliário em geral a que se refere esta Lei:
I - não se aplicam as disposições da Lei nº 4.380, de 21 de agosto de 1964, e as demais disposições legais referentes ao Sistema Financeiro da Habitação - SFH;
II - aplicam-se as disposições dos arts. 29 a 41 do Decreto-lei nº 70, de 21 de novembro de 1966.

Neste sentido, transcrevo julgado do C. STJ:


"RECURSO ESPECIAL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE COISA IMÓVEL. LEI Nº 9.514/1997. PURGAÇÃO DA MORA APÓS A CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE EM NOME DO CREDOR FIDUCIÁRIO. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO DECRETO-LEI Nº 70/1966. 1. Cinge-se a controvérsia a examinar se é possível a purga da mora em contrato de alienação fiduciária de bem imóvel (Lei nº 9.514/1997) quando já consolidada a propriedade em nome do credor fiduciário. 2. No âmbito da alienação fiduciária de imóveis em garantia, o contrato não se extingue por força da consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, mas, sim, pela alienação em leilão público do bem objeto da alienação fiduciária, após a lavratura do auto de arrematação. 3. Considerando-se que o credor fiduciário, nos termos do art. 27 da Lei nº 9.514/1997, não incorpora o bem alienado em seu patrimônio, que o contrato de mútuo não se extingue com a consolidação da propriedade em nome do fiduciário, que a principal finalidade da alienação fiduciária é o adimplemento da dívida e a ausência de prejuízo para o credor, a purgação da mora até a arrematação não encontra nenhum entrave procedimental, desde que cumpridas todas as exigências previstas no art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966. 4. O devedor pode purgar a mora em 15 (quinze) dias após a intimação prevista no art. 26, § 1º, da Lei nº 9.514/1997, ou a qualquer momento, até a assinatura do auto de arrematação (art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966). Aplicação subsidiária do Decreto-Lei nº 70/1966 às operações de financiamento imobiliário a que se refere a Lei nº 9.514/1997. 5. Recurso especial provido." (negritei)
(STJ, Terceira Turma, REsp 1462210/RS, Relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 25/11/2014)

O que se extrai da orientação do C. Superior Tribunal de Justiça é que a consolidação da propriedade em nome da Caixa não é óbice à purgação da mora, desde que esta ocorra antes da arrematação do bem por terceiros. Isso porque, entendeu a Corte, o real objetivo do credor é receber a dívida sem experimentar prejuízos e não alienar o imóvel a terceiros.


Entretanto, a purgação da mora deve compreender o pagamento das parcelas vencidas do contrato de mútuo, inclusive dos prêmios de seguro, da multa contratual e de todos os custos advindos da consolidação da propriedade.


Nesse sentido, das razões recursais não se depreende a notícia de qualquer irregularidade contratual apontada pela agravante. Em verdade, esta apenas salienta suas dificuldades financeiras e a impossibilidade de cumprir com o que restou avençado pelas partes. Assim, não se vislumbrando qualquer irregularidade contratual, o negócio jurídico deve produzir os seus regulares efeitos jurídicos, cabendo à recorrente purgar a mora nos termos acima delineados. Em não se verificando a efetiva purgação da mora, a instituição financeira estará autorizada a dar prosseguimento ao procedimento de execução extrajudicial, na medida em que tal possibilidade foi prevista de forma válida pelo contrato entabulado pelas partes.


Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao agravo de instrumento interposto, para o fim único e exclusivo de autorizar a agravante a purgar a mora até a eventual arrematação do bem imóvel por terceiros, purgação esta que deverá compreender as parcelas vencidas do contrato de mútuo e os consectários de estilo, nos termos da fundamentação supra.


É como voto.


WILSON ZAUHY
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): WILSON ZAUHY FILHO:10079
Nº de Série do Certificado: 11A21705314D3605
Data e Hora: 09/02/2018 14:48:46