D.E. Publicado em 08/03/2018 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer da apelação e lhe negar provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Nº de Série do Certificado: | 11A21709124EAE41 |
Data e Hora: | 26/02/2018 13:10:28 |
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RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Cuida-se de apelação interposta em face da r. sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de benefício por incapacidade laboral.
Nas razões de apelo, a parte autora alega, em síntese, possuir os requisitos legais para a concessão do benefício e exora a reforma do julgado.
Sem contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço do recurso, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
Discute-se nos autos o preenchimento dos requisitos para a concessão de benefício por incapacidade à parte autora.
A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do art. 42 da Lei n. 8.213/91, é devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
O auxílio-doença, benefício pago se a incapacidade for temporária, é disciplinado pelo art. 59 da Lei n. 8.213/91, e a aposentadoria por invalidez tem seus requisitos previstos no art. 42 da Lei 8.213/91.
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o trabalho.
São exigidos à concessão desses benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.
No caso dos autos, a perícia judicial, realizada em 18/5/2016, atestou que o autor, eletricista de autos, nascido em 1979, não apresenta incapacidade laboral (f. 63/70).
O perito esclareceu: "o reclamante de 37 anos de idade, apesar de ser etilista, o mesmo está controlado no momento, sem repercussões clínicas, sendo assim não é portador de lesão, dano ou doença que o impeça de exercer atividades laborativas onde a remuneração é necessária para sua substência".
E ainda: "concluímos que o autor faz jus ao ressarcimento por danos sofridos pelo tempo em que ficou internado por incapacidade temporária no período de convalescença, além das despesas médicas, hospitalares, medicamentos, etc comprovados".
Assim, não configurada a incapacidade laboral, não está patenteada a contingência necessária à concessão de benefício por incapacidade.
Atestados e exames particulares juntados não possuem o condão de alterarem a convicção formada pelas conclusões do laudo, esse produzido sob o pálio do contraditório.
Malgrado preocupado com os fins sociais do direito, não pode o juiz julgar com base em critérios subjetivos, quando patenteado no laudo a ausência de incapacidade para o trabalho.
O fato de o segurado sentir-se incapaz não equivale a estar incapaz, segundo análise objetiva do perito.
O fato de o segurado ter doenças não significa, por óbvio, que está incapaz.
O magistrado não está adstrito ao laudo. Contudo, o conjunto probatório dos autos não autoriza convicção em sentido diverso, devendo ser mantida a r. sentença.
É o que expressa a orientação jurisprudencial predominante:
Deve ser ressaltado ainda que, a peculiar condição de a parte ser considerada dependente químico ou alcoólatra não legitimaria o autor, só por só, ao recebimento de benefício previdenciário.
Evidente que alcoolismo e dependência de drogas podem ser tachadas de doenças, mas são fruto de atos conscientes dos segurados, afastando-se da própria noção de previdência social, um sistema de proteção social destinado a cobertura de eventos incertos.
Segundo a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10), o alcoolismo crônico ("transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool - síndrome de dependência" - F10.2) é "o conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos que se desenvolvem após repetido consumo de uma substância psicoativa, tipicamente associado ao desejo poderoso de tomar a droga, à dificuldade de controlar o consumo, à utilização persistente apesar das suas conseqüências nefastas, a uma maior prioridade dada ao uso da droga em detrimento de outras atividades e obrigações, a um aumento da tolerância pela droga e por vezes, a um estado de abstinência física".
Entrementes entendo que não se pode, só por só, considerar o dependente químico uma pessoa portadora de deficiência ou inválida, ou ainda um impotente perante sua doença.
Embora o vício possa causar dependência física e psicológica, reconhecido pela medicina como uma patologia incapacitante, de natureza crônica e progressiva, difícil de ser controlada, a determinação do indivíduo em submeter-se a tratamento para livrar-se do vício é de fundamental importância.
De mais a mais, a dependência de drogas (no caso, ilícitas) pode ser tachada de doença, mas a opção por experimentá-las constitui, antes de tudo, atos conscientes dos segurados, afastando-se esse contexto da própria cobertura trazida pela ideia da previdência social, um sistema de proteção social destinado a cobertura de eventos incertos (não voluntários), denominados contingências ou riscos sociais.
"O termo risco social é empregado para designar os eventos, isto é, os fatos ou acontecimentos que ocorrem na vida de todos os homens, com certeza ou probabilidade significativa, provocando um desajuste nas condições normais de vida, em especial a obtenção dos rendimentos decorrentes do trabalho, gerando necessidades a serem atendidas, pois nestes momentos críticos, normalmente não podem ser satisfeitas pelo indivíduo. Na terminologia do seguro, chamam-se tais eventos de 'riscos' e por dizerem respeito ao próprio funcionamento da sociedade, denominam-se 'riscos sociais'. Os regimes previdenciários são instituídos com a finalidade de garantir aos seus beneficiários a cobertura de determinadas contingências sociais. Em sua essência, as normas buscam amparar os trabalhadores e seus dependentes quando vitimados por eventos, reais ou presumidos, que venham a produzir perda integral ou parcial dos rendimentos familiares ou despertem outra necessidade considerada socialmente relevante.
Os riscos sociais cuja cobertura é suportada pelo regime geral são elencados no art. 1º desta Lei, excetuado expressamente no § 1º do art. 9º, o desemprego involuntário, que é objeto de lei específica (Lei 7.998/90, alterada pela Lei 8.900/94), para os trabalhadores em geral." (MACHADO DA ROCHA, Daniel; BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social, 9ª ed., Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009, p. 27-32) (g. n.)
Noutro passo, a embriaguez causada pelo álcool, voluntária ou culposamente, não exclui a imputabilidade penal (artigo 28, II, do Código Penal). Pelo contrário, o estado de embriaguez preordenada constitui circunstância agravante, para fins penais (artigo 61, II, "l", do CP).
É por isso que, a mim me parece, o custo dos atos autodestrutivos do indivíduo não deve, via de regra, ser simplesmente repassado aos demais contribuintes do sistema de previdência social, pois no caso a técnica de proteção adequada é a abstenção, o tratamento e o auxílio da família.
Sem falar que, em casos como tais, de dependência química (no caso, álcool), a quantia recebida a título de benefício por incapacidade poderá ser destinada à aquisição de mais substâncias, num círculo vicioso que não pode ser custeado pela previdência social.
Forçoso é concluir que, sob certa perspectiva, a concessão do benefício pode resultar em inversão de valores. Isso porque a concessão de benefício neste caso não prestigia o caráter civilizatório do direito, que deve premiar as boas ações e punir as más, sobretudo as ilícitas.
Ao Estado lhe cabe prestar o serviço da saúde (artigo 196 da Constituição Federal), porque direito de todos. Mas, a previdência social não é a técnica de proteção social adequada à espécie. Afinal, tal proteção social, baseada na solidariedade legal, não têm como finalidade cobrir eventos incapacitantes gerados pela própria conduta de risco do segurado.
A previdência social é destinada a cobrir eventos, contingências, riscos sociais advindos do acaso, das vicissitudes da vida, não dos atos autodestrutivos do indivíduo.
Há precedente desta egrégia Corte, inclusive, no sentido de que, em caso de dependente químico, a prestação devida é o tratamento de saúde pelo SUS, não o benefício previdenciário.
Nesse sentido:
Cabe, em caos que tais, à sociedade (solidariedade social) prestar na medida do possível assistência aos dependentes, a fim de que tenham alguma chance de recuperação, baseada, antes do mais, em seu esforço próprio.
O atestado de f. 24, datado em 6/4/2015, da Comunidade Terapêutica Recanto Renascer, informa que o autor esteve internado na clínica desde 18/10/2014, com CID F19.2.
Por ocasião da perícia, o autor apresentou declaração médica que esteve internado em centro de reabilitação em 2014, por abuso de álcool, por 9 (nove) meses (f. 72).
Ademais, o próprio perito concluiu que o autor não está incapacitado para o trabalho, ressaltando apenas que "faz jus ao ressarcimento por danos sofridos pelo tempo em que ficou internado" (f. 68).
Ora, não cabe à previdência social conceder benefício previdenciário com base em informações apresentadas por comunidade terapêutica, pois o próprio perito atestou que o autor não estava incapacitado para o trabalho.
A sugestão do afastamento por 9 (nove) meses, encampada pelo próprio perito, não tem mínima base científica.
Dessa forma, concluo pelo não preenchimento dos requisitos exigidos à concessão do benefício pretendido.
Ante o exposto, conheço da apelação do autor e lhe nego provimento.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 26/02/2018 13:10:25 |