Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 21/03/2018
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004699-49.2008.4.03.6106/SP
2008.61.06.004699-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal NINO TOLDO
APELANTE : ANTONIO PORFIRO GUIMARAES
ADVOGADO : SP104574 JOSE ALEXANDRE JUNCO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00046994920084036106 2 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

EMENTA

PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. PESCA ILEGAL. ART. 34 DA LEI Nº 9.605/1998. RIO INTERESTADUAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DEMONSTRADOS. DOSIMETRIA DA PENA INALTERADA.
1. Os rios que banham mais de um Estado da Federação constituem bens da União, a teor do disposto no art. 20, III, da Constituição Federal. Competência da Justiça Federal reconhecida.
2. Tratando-se de crime de perigo abstrato, o chamado princípio da insignificância não se aplica aos crimes ambientais, visto que o dano ao bem jurídico tutelado, qual seja, o meio ambiente, não pode ser mensurado. Entendimento desta Turma.
3. Configuração do delito previsto no art. 34 da Lei nº 9.605/1998. Materialidade, autoria e dolo demonstrados.
4. Condenação mantida. Dosimetria da pena inalterada.
5. Apelação não provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, vencido o relator, reconhecer a competência da Justiça Federal para julgar o presente feito e, no mérito, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação, nos termos do relatório e votos que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 06 de março de 2018.
NINO TOLDO
Desembargador Federal


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Data e Hora: 07/03/2018 17:57:54



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004699-49.2008.4.03.6106/SP
2008.61.06.004699-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal NINO TOLDO
APELANTE : ANTONIO PORFIRO GUIMARAES
ADVOGADO : SP104574 JOSE ALEXANDRE JUNCO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00046994920084036106 2 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

DECLARAÇÃO DE VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

Trata-se de apelação interposta por ANTÔNIO PORFIRO GUIMARÃES em face da sentença proferida pela 2ª Vara Federal da Subseção Judiciária de São José do Rio Preto/SP que o condenou, como incurso no art. 34, caput e parágrafo único, II, da Lei nº 9.605/98, à pena privativa de liberdade de 1 (um) ano de detenção, em regime inicial aberto, e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo, substituída por uma pena restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade em entidade a ser indicada pelo Juízo das Execuções Penais, pelo prazo da pena privativa de liberdade e em tempo não inferior a 8 (oito) horas semanais.


Narra a denúncia (fls. 42/43), recebida em 08.09.2008 (fls. 44):


No dia 03 de fevereiro de 2008, soldados da Polícia Militar Ambiental em serviço de fiscalização, visando coibir a pesca predatória na Represa de Marimbondo, município de Guaraci/SP, surpreenderam o denunciado, pescador amador, praticando atos de pesca durante a piracema (Instrução Normativa nº 49/07), com petrechos proibidos para a categoria amadora, conforme boletim de ocorrência e auto de infração de folhas 04/05.
No momento da abordagem, o denunciado foi encontrado com uma rede de nylon duro medindo 10 m de comprimento e malhas de 1,5 mm, infringindo o art. 5º, caput da Instrução Normativa nº 49/07 (fls. 04/vº), bem como com 6 kg de peixe das espécies "piau" e "piranha".

O e. relator declarava, de ofício, a incompetência absoluta da Justiça Federal para julgar o presente feito e, em razão disso, determinava a remessa dos autos à Justiça Estadual de São Paulo, nos termos de seu voto preliminar, juntado às fls. 212/213.

Com a devida vênia, divirjo do e. relator pelos motivos a seguir declinados.


O art. 34, inciso II, da Lei nº 9.605/98, assim dispõe:


Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente:
Pena - detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem: [...]
II - pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;

A controvérsia consiste em saber se a pesca predatória, mediante a utilização de petrechos não permitidos, porquanto perpetrada em rio interestadual atrairia, por si só, no caso concreto, a competência da Justiça Federal, independentemente da extensão de eventuais danos, nos moldes dos artigos 20, III, e 109, IV, ambos da Constituição Federal, ora transcritos (g.n.):


Art. 20. São bens da União: [...]
III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais; [...]
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: [...]
IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;

Com efeito, trata-se de crime formal e de perigo abstrato que se perfectibiliza com qualquer ato tendente a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes ictiológicos, consumando-se com a simples conduta capaz de produzir, potencialmente, o resultado danoso ao meio ambiente aquático e, em especial, à fauna ictiológica. Nesse sentido, os 06 (cinco) quilos efetivamente pescados das espécies "piau" e "piranha", a partir dos petrechos não permitidos para pescadores amadores ou equiparados, consistem em mero exaurimento do tipo penal descrito no artigo 34, parágrafo único, II, da Lei Federal 9.605/98.

Nos termos do artigo 36 da Lei Federal 9.605/98, considera-se "pesca", para seus efeitos legais, "todo ato tendente a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes dos grupos dos peixes, crustáceos, moluscos e vegetais hidróbios, suscetíveis ou não de aproveitamento econômico, ressalvadas as espécies ameaçadas de extinção, constantes nas listas oficiais da fauna e da flora" (g.n.).

Nesse sentido, colhe-se da doutrina:


O art. 36 considera pesca todo ato tendente a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar as espécies acima indicadas. Parece-nos, portanto, que o crime em análise é formal. Ressalvados os atos preparatórios, o crime se consuma com a prática de qualquer ato que objetive, inequivocamente, a apreensão dos espécimes mencionados, ainda que não ocorra efetivamente a apreensão e captura do animal aquático. Assim, v.g., estará o consumado o delito se pescadores amarrarem redes em locais de pesca proibida, ainda que não apanhem nenhum peixe.
Não é possível, portanto, tentativa deste crime. Assim também entende ROBERTO DELMANTO, ROBERTO DELMANTO JUNIOR e FÁBIO M. DE ALMEIDA DELMANTO.
(GOMES, Luiz Flávio; MACIEL, Silvio. Crimes ambientais: comentários à Lei 9.605/98. São Paulo: Ed. RT, 2011, p. 169)

Nessa linha, trago à colação os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça e também deste E-TRF3:


AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 34 DA LEI N.9.605/1998. CRIME FORMAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. PESCA EM PERÍODO DEFESO E USO DE REDEDE ARRASTO. POTENCIALIDADE DE RISCO A REPRODUÇÃO DAS ESPÉCIES DA FAUNA LOCAL. ATIPICIDADE DE CONDUTA. INOCORRÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. Inviável a aplicação do princípio da insignificância, a fim de afastar a tipicidade da conduta prevista no art. 34 da Lei n. 9.605/1988 - crime formal, de perigo abstrato, que prescinde, portanto, de qualquer resultado danoso para sua configuração - àquele que, agindo em desacordo com as exigências legais ou regulamentares, é flagrado pescando, com rede de arrasto e em período defeso, 3 kg de camarão, haja vista não apenas a época do ano em que foi realizado o flagrante mas também a forma como foi praticado o delito se mostrarem potencialmente capazes de colocar em risco a reprodução das espécies da fauna local.
2. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 665.254/SC, 6ª Turma - STJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, DJe 02/03/2017, g.n.)
PENAL. PROCESSO PENAL. PESCA COM PETRECHO PROIBIDO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. MEIO AMBIENTE. APLICAÇÃO RESTRITIVA. 1. Os crimes ambientais são, em princípio, de natureza formal: tutelam o meio ambiente enquanto tal, ainda que uma conduta isoladamente não o venha a prejudicar. Busca-se a preservação da natureza, coibindo-se, na medida do possível, ações humanas que a degenerem. Por isso que o princípio da insignificância deve ser aplicado com cautela a esses crimes. Ao se considerar indiferente uma conduta isolada, proibida em si mesma por sua gravidade, encoraja-se a perpetração de outras em igual escala, como se daí não resultasse a degeneração ambiental, que muitas vezes não pode ser revertida pela ação humana. 2. A jurisprudência tende a restringir a aplicação do princípio da insignificância quanto aos delitos contra o meio ambiente (STJ, HC n. 386.682-SP, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 03.02.05; TRF da 3ª Região, RSE n. 200561240008053-SP, Rel. Des. Fed. Luiz Stefanini, j. 17.06.08; RSE n. 200461240010018-SP, Rel. Des. Fed. Cotrim Guimarães, j. 18.03.08; RSE n. 200561240003882-SP, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 19.11.07). 3. Hipótese de pesca ilegal com petrecho proibido evidenciando atividade nociva ao meio ambiente. 4. Apelação provida para determinar o prosseguimento do feito
(ACR 00069134920134036102-SP, 5ª Turma - TRF3, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 20/10/2014, g.n.)
PENAL. CRIME AMBIENTAL. ATO DE PESCA EM LOCAL INTERDITADO. PERÍODO DA PIRACEMA. ART. 34, CAPUT, DA LEI 9.605/98. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. AUSÊNCIA DE CAPTURA DE PEIXES: IRRELEVÂNCIA. CRIME FORMAL E DE PERIGO. DOLO: GENÉRICO. OBJETIVIDADE JURÍDICA DA NORMA INFRINGIDA: EQUILÍBRIO ECOLÓGICO. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PRECAUÇÃO E PREVENÇÃO. ERRO DE TIPO: INOCORRÊNCIA. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA REFORMADA. CONDENAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. APELAÇÃO MINISTERIAL PROVIDA.
I - Réu denunciado como incurso no art. 34, caput, da Lei 9.605/98, por praticar atos de pesca amadora, no periodo de piracema, a menos de 200 metros a jusante da barragem de Água Vermelha, local proibido para pesca nos termos do art.4º, da Portaria SUDEPE nº 466/72.
II - A sentença o absolveu sob a fundamentação de insuficiência de provas, pela ausência de captura de peixes e de dolo específico
III - Materialidade comprovada nos autos por auto de infração ambiental , de apreensão da rede e laudo pericial que também constatou ser proibido, no local, qualquer tipo de pesca para qualquer modalidade de pescador a menos de duzentos metros da jusante da barragem de Água Vermelha, e que foi utilizado material proibido para pescador amador, nos termos da Lei 7679/88, art. 1º, IV, "c", c/c a Portaria 1583/89, arts. 3 e 4).
IV - Autoria inconteste. Confissão na fase inquisitorial e em Juízo e prova testemunhal.
V - Nos termos do art. 36, da lei 9605/98, consideram-se pesca os atos tendentes à retirada de peixes. É irrelevante, para a configuração do crime, o fato de nenhum peixe ter sido capturado. O crime imputado pune o ato de pesca em período proibido ou em lugares interditados por órgão competente. A efetiva apanha de peixes, seja em pequena ou grande quantidade, constitui-se em mero exaurimento do crime.
VI - Trata-se de crime formal e de perigo. Para sua configuração, não se exige o dolo específico de causar dano, ou a realização do resultado naturalístico pretendido. Caso em que a armação de rede de grandes proporções, no período da piracema, foi hábil a expor ao perigo a fauna ictiológica, pela inviabilidade de conclusão do ciclo natural de reprodução e renovação das espécies.
VII - A objetividade jurídica da Lei n.º 9.605/98 é o controle e a coibição de excessos comprometedores do equilíbrio ambiental. Em sede de direito ambiental o princípio primordial é o da precaução, que recomenda cuidados preventivos e não apenas corretivos aos prejuízos já causados.
VIII - Não se há de falar em desconhecimento da lei (art. 21, do CP). Ademais, o apelado já havia sido processado pelo mesmo crime.
IX - Sentença absolutória reformada. Condenação do apelado pela prática do crime previsto no artigo 34, caput, da Lei nº 9.605/98, à pena de um ano e dois meses de detenção. a ser cumprida em regime aberto.
X - Não se mostra recomendável a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, pela ausência de preenchimento dos requisitos subjetivos do art. 44, do CP, tendo em vista que o apelado, embora não reincidente, já foi processado pelo mesmo crime e, ainda assim, persevera na sua prática, além de ter confessado que não pagou a multa imposta administrativamente.
XI - Apelação provida.
(ACR 0000097-34.2003.4.03.6124, 2ª Turma - TRF3, Rel. Des. Fed. Henrique Herkenhoff, DJU 31/01/2008, g.n.)
PENAL. PROCESSUAL. DENÚNCIA: ART. 34, DA LEI 9605/98: PESCA EM LOCAL PROIBIDO: MATERIALIDADE DELITIVA COMPROVADA. INDÍCIOS DE AUTORIA. CRIME DE PERIGO E FORMAL: INEXIGÊNCIA DE RESULTADO: PESCA: DEFINIÇÃO: ART. 36 DA LEI 9605/98: "ATOS TENDENTES": EFETIVA RETIRADA DE PEIXES: MERO EXAURIMENTO DO DELITO. RECURSO PROVIDO.
1 - Denúncia, que imputou aos recorridos a prática do delito previsto no artigo 34 da Lei 9605/98, por prática de atos tendentes à retirada ou apanha de peixes em local proibido, rejeitada, por falta de comprovação da materialidade e atipicidade da conduta, em razão de não terem sido encontrados peixes em poder dos acusados, pois, tratando-se de crime material, exige resultado que se caracteriza pelo dano ao meio ambiente.
2 - Para o recebimento da denúncia basta a descrição dos atos que configuram o delito imputado. Aplicação do princípio in dubio pro societate.
3 - Materialidade e autoria configuradas.
4 - Nos termos dos arts. 34 e 36, da Lei nº 9.605/98, não só a pesca é punida mas, também, os atos tendentes à atividade típica. Ainda que o agente não apanhe quaisquer espécimes, a prova da materialidade não é prejudicada.
5 - Crime de perigo e formal, independentemente do resultado.
6 - Recurso provido. Remessa dos autos à vara de origem, para o regular processamento do feito.
(SER 0000022-38.2001.4.03.6003, 1ª Turma - TRF3, Rel. Des. Fed. Vesna Kolmar, DJU27/03/2007).

Assim sendo, a despeito da posição adotada pelo e Relator, em seu voto preliminar, tenho que não seria coerente condicionar a fixação da competência da Justiça Federal para processar e julgar a presente ação penal à exigência de prova de danos ou reflexos em âmbito regional ou nacional, com a pesca predatória perpetrada em rio interestadual, tendo em conta o disposto nos artigos 20, III, e 109, IV, ambos da Constituição Federal.

Longe de se encontrar pacificada a matéria tanto na doutrina quanto na jurisprudência, colaciono diversos arestos do STJ e também deste E-TRF3, aos quais me filio no sentido de que compete à Justiça Federal processar e julgar crime de pesca predatória praticado em rio interestadual (delito formal e de perigo abstrato), independentemente da análise da extensão de eventuais danos ambientais ocorridos ou não:


CRIMINAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PESCA PREDATÓRIA EM RIO INTERESTADUAL. POSSÍVEL CRIME AMBIENTAL. LESÃO À BENS, SERVIÇOS OU INTERESSES DA UNIÃO EVIDENCIADA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
- Compete, em regra, à Justiça Estadual, o processo e julgamento de feitos que visam à apuração de crimes ambientais.
- A competência da Justiça Federal é restrita aos crimes ambientais perpetrados em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou de suas autarquias ou empresas públicas.
- Tratando-se de possível pesca predatória em rio interestadual, que banha mais de um Estado da federação, evidencia-se situação indicativa da existência de eventual lesão a bens, serviços ou interesses da União, a ensejar a competência da Justiça Federal.
- Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo Federal da Segunda Vara de Uruguaiana/RS.
(CC 39.055/RS, 3ª Seção - STJ, Rel. Ministro Paulo Medina, DJ 11/04/2005, g.n.)
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PESCA PREDATÓRIA. RIO TAQUARI. UTILIZAÇÃO DE PETRECHOS NÃO PERMITIDOS. CRIME AMBIENTAL PRATICADO EM RIO INTERESTADUAL. INCIDÊNCIA DO ART. 109, INC. IV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, POR FORÇA DO DISPOSTO NO ART. 20, INC. III, DA CARTA DA REPÚBLICA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
1. No que tange aos crimes eventualmente cometidos contra o meio ambiente, existindo qualquer lesão a bens, serviços ou interesses diretos da União, a competência para o processamento e julgamento do feito é da Justiça Federal (CF, art. 109, inc. IV).
2. Consta expressamente na Constituição Federal que "São bens da União: os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais;" (CF, art. 20, inc. III).
3. No caso, o rio Taquari, palco do evento delituoso que se pretende apurar, nasce no Estado de Mato Grosso, passando por 2 (dois) municípios, até entrar pela região norte no Estado de Mato Grosso do Sul, razão pela qual indiscutível é a competência da Justiça Federal na hipótese em exame, por se tratar de rio interestadual.
4. Aliás, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu, reiteradas vezes, que, tratando-se de pesca predatória em rio interestadual - que banha mais de um Estado da federação -, a competência para o processamento e julgamento do feito é da Justiça Federal.
5. Conflito conhecido para declarar a competência, na hipótese, do Juízo Federal da 1ª Vara da Seção Judiciária do Estado do Mato Grosso do Sul, ora suscitante.
(CC 33.987/MS, 3ª Seção - STJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, DJ 17/12/2004, g.n.)
CRIMINAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PESCA PREDATÓRIA. LAGO PERTENCENTE À UNIÃO. POSSÍVEL CRIME AMBIENTAL. LESÃO A BENS, SERVIÇOS OU INTERESSES DA UNIÃO EVIDENCIADA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
De regra, compete à Justiça Estadual o processo e julgamento de feitos que visam à apuração de crimes ambientais.
A competência da Justiça Federal é restrita ao crimes ambientais perpetrados em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou de suas autarquias ou empresas públicas.
Tratando-se de possível pesca predatória no lago do reservatório da Usina Hidrelétrica Sérgio Motta, fornecido pelo Rio Paraná, interestadual, evidencia-se situação indicativa da existência de eventual lesão a bens, serviços ou interesses da União, a ensejar a competência da Justiça Federal.
Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo Federal da 2ª Vara de Presidente Prudente-SP, o Suscitante.
(CC 45.154/SP, 3ª Seção - STJ, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJ 11/10/2004, g.n.)
CRIMINAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PESCA PREDATÓRIA EM RIO INTERESTADUAL. POSSÍVEL CRIME AMBIENTAL. LESÃO A BENS, SERVIÇOS OU INTERESSES DA UNIÃO EVIDENCIADA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
De regra, compete à Justiça Estadual o processo e julgamento de feitos que visam à apuração de crimes ambientais.
A competência da Justiça Federal é restrita ao crimes ambientais perpetrados em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou de suas autarquias ou empresas públicas.
Tratando-se de possível pesca predatória em rio interestadual, que banha mais de um Estado da federação, evidencia-se situação indicativa da existência de eventual lesão a bens, serviços ou interesses da União, a ensejar a competência da Justiça Federal.
Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo Federal da 1ª Vara de Jales-SP, o Suscitado.
(CC 38.036/SP, 3ª Seção - STJ, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJ 22/04/2003, g.n.)
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CRIMES CONTRA A FAUNA. SÚMULA 91/STJ. INAPLICABILIDADE APÓS O ADVENTO DA LEI 9.605/98. CRIME DE PESCA MEDIANTE UTILIZAÇÃO DE PETRECHOS NÃO PERMITIDOS. RIO INTERESTADUAL (ARTIGO 20, INCISO III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). BEM DA UNIÃO.
EXISTÊNCIA DE LESÃO A BENS, SERVIÇOS OU INTERESSES DA UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
1. Em sendo a proteção ao meio ambiente matéria de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e inexistindo, quanto aos crimes ambientais, dispositivo constitucional ou legal expresso sobre qual a Justiça competente para o seu julgamento, tem-se que, em regra, o processo e julgamento dos crimes ambientais é de competência da Justiça Comum Estadual.
2. Inaplicabilidade da Súmula nº 91/STJ, após o advento da Lei nº 9.605, de fevereiro de 1998. Cancelamento da Súmula na Sessão de 8 de novembro de 2000.
3. "São bens da União: os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais;" (artigo 20, inciso III, da Constituição da República).
4. Compete à Justiça Federal processar e julgar crime de pesca mediante a utilização de petrechos não permitidos (artigo 34, parágrafo único, inciso III, da Lei nº 9.605/98) praticado em rio interestadual. Incidência do artigo 109, inciso IV, da Constituição da República.
5. Conflito conhecido para que seja declarada a competência do Juízo Federal da 1ª Vara de Araraquara - SJ/SP, o suscitante.
(CC 35.058/SP, 3ª Seção - STJ, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJ 19/12/2002, g.n.)
PENAL - PROCESSUAL PENAL - CRIME CONTRA A FAUNA - PESCA PERPETRADA MEDIANTE PETRECHOS IMPRÓPRIOS - ARTIGO 34, INCISO II, SEGUNDA PARTE DA LEI 9.605/98 - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL - ARTIGO 109, IV DA LEI MAIOR - INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO - AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS DEMONSTRADAS - ERRO DE TIPO E ERRO SOBRE A ILICITUDE DO FATO NÃO CARACTERIZADOS - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA INAPLICÁVEL - PRELIMINARES REJEITADAS - RECURSO IMPROVIDO.
1-Merece ser afastada a hipótese de incompetência da Justiça Federal, até mesmo porque o delito foi perpetrado em rio interestadual, que é bem público pertencente à União, por força do que estabelece nossa Carta Magna, em seu artigo 20, III, sendo, portanto, área de proteção ambiental pertencente ao referido ente federativo.
2-Não ocorreu a prescrição da pretensão punitiva estatal, sendo certo que, a teor do que dispõe expressamente o artigo 117 do Código Penal, somente a sentença condenatória tem o condão de interromper o prazo prescricional. Assim, é peremptório o Código em estabelecer que a sentença condenatória sempre interrompe aludido prazo, ainda que sujeita a uma decisão posterior que, julgando embargos de declaração, esclareça, integre ou modifique o que nela restou contido.
3-A materialidade e a autoria do delito estão suficientemente delineadas através do Auto de Infração Ambiental nº 139119 e do Boletim de Ocorrência nº 12078, bem como pelo depoimento da testemunha de acusação, prestado em Juízo.
4-O desconhecimento da lei é inescusável e, nos moldes do artigo 21 do Código Penal, não exclui o crime (culpabilidade).
5-Cabia ao réu demonstrar que estava em situação de erro de tipo.
6-O bem juridicamente tutelado pela norma não se resume na proteção às espécimes ictiológicas, mas ao ecossistema, como um todo, que está ligado, intimamente, à política de proteção ao meio ambiente, como direito fundamental do ser humano, direito de ter um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Na verdade, a lei cuida, não só da proteção do meio ambiente em prol de uma melhor qualidade de vida da sociedade hodierna, como também das futuras gerações, em obediência ao princípio da solidariedade em relação aos que estão por vir, previsto no artigo 225 da Carta Magna (direito fundamental de terceira geração).
7-Pela conjugação das normas dos artigos 34 e 36, ambos da Lei n° 9.605/98, verifica-se claramente a natureza formal do delito atribuído ao apelante, que se perfaz, assim, independentemente de eventual resultado naturalístico, o que implica na não incidência do princípio da insignificância.
8-A aplicação do chamado "princípio da insignificância" nos delitos ambientais, deve ocorrer somente em situações excepcionais, já que a repressão penal tem uma função preponderantemente preventiva e educativa, não sendo possível, ainda, quantificar ou precisar a extensão do dano ao equilíbrio ecológico apenas pelo número de espécies abatidas ou retiradas de seu habitat natural.
9-Preliminares rejeitadas. Recurso da defesa desprovido.
(ACR 0002897-38.2002.4.03.6102, 5ª Turma - TRF3, Rel. Des. Fed. Ramza Tartuce, e-DJF3 Judicial 1 29/01/2010, g.n.)
PROCESSO PENAL - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - CRIME CONTRA A FAUNA AQUÁTICA - ARTIGO 34, CAPUT DA LEI Nº 9.605/98 - PESCA EM RIO INTERESTADUAL - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL - RECURSO MINISTERIAL PROVIDO.
1. O crime contra a fauna aquática foi perpetrado no Reservatório de Porto Colômbia, formado por rio interestadual, por banhar dois Estados da Federação, e que pertence à União, ex vi do art. 20, inc. III da Constituição Federal, sendo competente, assim, a Justiça Federal para processual e julgar o delito ambiental, nos termos do art. 109, inc. IV da Lei Maior.Precedentes.
2. Recurso ministerial provido, para reconhecer a competência da 7ª Vara da Justiça Federal de Ribeirão Preto para o processamento do feito, inclusive apreciar o eventual cumprimento das condições da suspensão condicional do processo para declaração da extinção da punibilidade do acusado.
(RSE 0002905-15.2002.4.03.6102, 5ª Turma - TRF3, Rel. Juiz Convoc. Hélio Nogueira, DJU 14/08/2007, g.n.)
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. COMPETÊNCIA: ART. 34, DA LEI 9605/98. PESCA PROIBIDA EM RIO INTERESTADUAL (RIO GRANDE- UHE DE MARIMBONDO). INTERESSE DIRETO E ESPECÍFICO DA UNIÃO: ARTS. 20, III e 109, IV, DA CF. CÓDIGO DE ÁGUAS: DECRETO 24.643/34. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
1 - Juiz Federal de Ribeirão Preto declinou da competência para o julgamento do crime previsto no art. 34, da Lei 9.605/98, ao fundamento de que, não obstante o delito ter ocorrido em rio federal, o interesse da União é genérico ou indireto.
2 - No caso, cuida-se de infração ambiental ocorrida na UHE de Marimbondo, no Rio Grande, rio interestadual, que banha os Estados de Minas Gerais e de São Paulo.
3 - Tratando-se de rio interestadual inclui-se entre os bens da União, de acordo com o artigo 20, III da CF.
4. A competência da Justiça Federal se impõe sempre que houver interesse da União Federal, nos termos do artigo 109, inciso IV, da CF.
6 - Recurso provido, para determinar o regular processamento do feito perante a 7ª Vara Federal de Ribeirão Preto/SP.
(RSE 0016436-42.2000.4.03.6102, 1ª Turma - TRF3, Rel. Des. Fed. Vesna Kolmar, DJU 27/03/2007, g.n.)

Ante o exposto, divirjo, com a devida vênia, do e. Relator, para reconhecer a competência da Justiça Federal para o julgamento e processamento deste feito.

É como voto.


JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004699-49.2008.4.03.6106/SP
2008.61.06.004699-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal NINO TOLDO
APELANTE : ANTONIO PORFIRO GUIMARAES
ADVOGADO : SP104574 JOSE ALEXANDRE JUNCO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00046994920084036106 2 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

RELATÓRIO

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelação interposta por ANTÔNIO PORFIRO GUIMARÃES em face da sentença proferida pela 2ª Vara Federal da Subseção Judiciária de São José do Rio Preto/SP que o condenou, como incurso no art. 34, caput e parágrafo único, II, da Lei nº 9.605/98, à pena privativa de liberdade de 1 (um) ano de detenção, em regime inicial aberto, e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo, substituída por uma pena restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade em entidade a ser indicada pelo Juízo das Execuções Penais, pelo prazo da pena privativa de liberdade e em tempo não inferior a 8 (oito) horas semanais.


Narra a denúncia (fls. 42/43), recebida em 08.09.2008 (fls. 44):


No dia 03 de fevereiro de 2008, soldados da Polícia Militar Ambiental em serviço de fiscalização, visando coibir a pesca predatória na Represa de Marimbondo, município de Guaraci/SP, surpreenderam o denunciado, pescador amador, praticando atos de pesca durante a piracema (Instrução Normativa nº 49/07), com petrechos proibidos para a categoria amadora, conforme boletim de ocorrência e auto de infração de folhas 04/05.
No momento da abordagem, o denunciado foi encontrado com uma rede de nylon duro medindo 10 m de comprimento e malhas de 1,5 mm, infringindo o art. 5º, caput da Instrução Normativa nº 49/07 (fls. 04/vº), bem como com 6 kg de peixe das espécies "piau" e "piranha".

Houve suspensão condicional do processo (fls. 87), revogada em 25.05.2012 por descumprimento das condições impostas (fls. 97).


A revelia do réu foi decretada (fls. 122), nos termos do art. 367 do Código de Processo Penal.


A sentença (fls. 171/177) foi publicada em 28.10.2014 (fls. 178).


Em suas razões de apelação (fls. 181/185), a defesa pede a absolvição do apelante com a aplicação do princípio da insignificância, sob o argumento de que a pesca foi realizada com vara de bambu, o que é permitido em período de piracema, não havendo provas de que tenha sido utilizada a rede de pesca apreendida.


Contrarrazões a fls. 189/191v.


A Procuradoria Regional da República, em seu parecer (fls. 195/198v), opinou pelo provimento do apelo defensivo.


É o relatório.


Dispensada a revisão (art. 34, II, do RI-TRF 3ª Região).


NINO TOLDO
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004699-49.2008.4.03.6106/SP
2008.61.06.004699-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal NINO TOLDO
APELANTE : ANTONIO PORFIRO GUIMARAES
ADVOGADO : SP104574 JOSE ALEXANDRE JUNCO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00046994920084036106 2 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

VOTO

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Vencido na questão preliminar, passo ao exame do mérito do recurso.


Trata-se de apelação interposta por ANTÔNIO PORFIRO GUIMARÃES em face da sentença que o condenou pela prática de crime ambiental (pesca proibida).


Inicialmente, registro que não há que se falar em inocorrência de dano ao meio ambiente ou em pequena gravidade do delito, como argumenta o apelante.


Tratando-se de crime de perigo abstrato, o chamado princípio da insignificância não se aplica aos crimes ambientais, visto que o dano ao bem jurídico tutelado, qual seja, o meio ambiente, não pode ser mensurado. Esse é o entendimento desta Turma, conforme se verifica no seguinte precedente, de minha relatoria:


PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 299, CAPUT, CÓDIGO PENAL. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, II, DA LEI Nº 9.605/1998. PRESCRIÇÃO EM PERSPECTIVA. IMPOSSIBILIDADE. CRIME DE FALSIDADE. AUSÊNCIA DE PROVA DA EXISTÊNCIA DO FATO. CRIME AMBIENTAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. CIRCUNSTÂNCIAS E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. CONFISSÃO. VALOR DO DIA-MULTA. 1. Inocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal. A proibição da prescrição em perspectiva ou virtual já está pacificada pela jurisprudência, sendo, inclusive, sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça (Súmula 438). 2. Considerando que não houve trânsito em julgado da condenação para a acusação, os prazos prescricionais fixados pelo art. 109, III e IV, do Código Penal e as penas abstratamente fixadas nos tipos penais, não ocorreu a prescrição da pretensão punitiva. 3. Ainda que os elementos informativos colhidos em sede de inquérito policial indiquem que o acusado exercia outra atividade profissional à época do registro como pescador profissional, as provas produzidas durante a instrução criminal não foram capazes de comprovar que o acusado prestou declaração ideologicamente falsa para obter o referido registro. 4. A materialidade do crime de pesca proibida restou devidamente comprovada pelo Boletim de Ocorrência, pelos Autos de Infração Ambiental, pelo Termo de Destinação de Produtos e Subprodutos e pelo Laudo Pericial. 5. A conduta prevista no art. 34, parágrafo único, II, da Lei nº 9.605/98 é crime de perigo abstrato, em que a lesividade independe da quantidade de peixes apreendidos, bastando que o bem jurídico tutelado, qual seja, o ecossistema, seja colocado em risco pelo agente. Há incompatibilidade entre o tipo penal em tela e o princípio da insignificância. Precedente desta Corte. 6. A autoria decorre do Boletim de Ocorrência, do Auto de Infração e da prova oral. A versão apresentada pelo réu não encontra respaldo no conjunto probatório, sendo que a defesa não conseguiu apresentar elementos que a corroborassem ou ao menos que lançassem dúvida razoável acerca da autoria. 7. O dolo está comprovado pelo interrogatório do acusado. 8. A pesca com instrumento proibido e o fato de sua prática atingir a fauna e o equilíbrio ambiental são elementos inerentes ao cometimento do delito do art. 34, parágrafo único, II, da Lei nº 9.605/98, de modo que não podem fundamentar o incremento da pena concretamente aplicada. 9. Mesmo quando imbuída de teses defensivas, descriminantes ou exculpantes, a confissão deve ser considerada na graduação da pena. Posicionamento do STJ. 10. A incidência de circunstâncias atenuantes não autoriza a fixação da pena abaixo do mínimo legal. Súmula nº 231, STJ. 11. O principal critério para a fixação do valor do dia-multa é a situação econômica do réu (CP, art. 60). À luz das informações sobre a capacidade econômica do acusado, o valor do dia-multa deve ser fixado no mínimo legal. 13. Apelação do Ministério Público Federal desprovida e apelação da defesa parcialmente provida.
(ACR 0000390-33.2005.4.03.6124, Décima Primeira Turma, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 13.12.2016, e-DJF3 Judicial 1 10.01.2017; destaquei)

No mesmo sentido: RSE 0000795-54.2014.4.03.6124, Décima Primeira Turma, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 06.12.2016, e-DJF3 Judicial 1 12.12.2016; RSE 0004674-55.2016.4.03.6106, Décima Primeira Turma, Rel. Des. Federal Cecilia Mello, j. 14.03.2017, e-DJF3 Judicial 1 24.03.2017, RSE 0007284-93.2016.4.03.6106, Décima Primeira Turma, Rel. Des. Federal José Lunardelli, j. 28.03.2017, e-DJF3 Judicial 1 06.04.2017.


O recorrente aduz, ainda, que o crime não estaria configurado porque a pesca foi efetuada sem a utilização de rede ou qualquer outro petrecho não permitido, e sim com vara de bambu, e porque os peixes seriam para consumo próprio.


Sem razão, contudo. O caput do art. 34 da Lei 9.605/98 dispõe que constitui crime pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente. Não faz menção, portanto, a qualquer tipo de instrumento ou finalidade específica. Ademais, como bem asseverou o órgão ministerial em suas contrarrazões (fls. 190/190v), o conjunto probatório produzido nos autos é firme e coeso no sentido de que o réu foi encontrado logo após a prática dos atos de pesca, na posse dos petrechos proibidos (rede de nylon), e de cerca de 6 kg (seis quilos) de peixes nativos, o que não deixa dúvidas sobre a prática delitiva. Além disso, o réu não arrolou testemunhas nem apresentou outras provas que pudessem corroborar a tese de que não utilizou a rede encontrada pelos policiais, mas apenas a vara de bambu.


No mais, a materialidade e a autoria delitivas estão devidamente comprovadas pelo boletim de ocorrência (fls. 4), pelo auto de infração ambiental (fls. 5), pelo termo de destinação (fls. 6), e pela prova oral produzida em contraditório judicial (cf. depoimentos registrados em CD - fls. 156).


O delito imputado ao acusado contenta-se com o dolo genérico, suficientemente comprovado pelo conjunto fático-probatório, visto que o apelante promoveu atos de pesca com petrechos proibidos, com vontade livre e consciente de realizar a conduta.


Desse modo, deve ser mantida a condenação do apelante pela prática do crime previsto no art. 34, caput e parágrafo único, II, da Lei nº 9.605/98.


Passo ao reexame da dosimetria da pena.


Na primeira fase, o juízo a quo não verificou a presença de circunstâncias judiciais desfavoráveis (CP, art. 59 e art. 6º da Lei nº 9.605/98), que de fato não ocorreram. Por isso, confirmo a fixação da pena-base no patamar mínimo legal, qual seja, de 1 (um) ano de detenção e 10 (dez) dias-multa.


Na segunda fase, foi reconhecida a incidência da circunstância atenuante prevista no art. 14, I, da Lei nº 9.605/98. Embora não haja nos autos dados suficientes para comprovar o grau de escolaridade do apelante, não houve redução da pena em razão do disposto na Súmula nº 231 do STJ, pelo que mantenho a pena aplicada nesta fase.


Na terceira fase, não ocorreram causas de aumento ou de diminuição, de sorte que a pena definitiva do réu fica mantida em 1 (um) ano de detenção e 10 (dez) dias-multa.


Mantenho o regime aberto para início do cumprimento da pena privativa de liberdade, em consonância com o art. 33, § 2º, "c", do Código Penal, bem como a substituição dessa pena por uma pena restritiva de direito, consistente em prestação de serviços à comunidade em entidade a ser designada pelo Juízo das Execuções Penais.


Posto isso, NEGO PROVIMENTO à apelação.


Esgotados os recursos no âmbito desta Corte e não ocorrendo trânsito em julgado, expeça-se carta de sentença ao juízo a quo para as providências necessárias ao início da execução penal (STF, HC 126.292, ADC 43 e 44, ARE 964.246 RG), cabível também para o caso de regime aberto e substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, conforme já decidiu o STF (HC 141.978 AgR/SP).


É o voto.


NINO TOLDO
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004699-49.2008.4.03.6106/SP
2008.61.06.004699-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal NINO TOLDO
APELANTE : ANTONIO PORFIRO GUIMARAES
ADVOGADO : SP104574 JOSE ALEXANDRE JUNCO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00046994920084036106 2 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

VOTO PRELIMINAR

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Preliminarmente, cumpre apreciar a existência, ou não, de ofensa direta a bem da União na eventual prática do crime de pesca ilegal (Lei nº 9.605/1998, art. 34) em rio que banhe mais de um Estado da Federação.


É inegável que os rios que banham mais de um Estado da Federação constituem bens da União, a teor do disposto no art. 20, III, da Constituição Federal.


Contudo, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça tem decidido, em recentes julgados, que isso não é suficiente para, em casos como o dos autos, configurar lesão a bem ou interesse da União e, então, atrair a competência da Justiça Federal, nos termos do art. 109, IV, da Constituição Federal. A propósito, trago, exemplificativamente, as seguintes ementas de acórdão:


AGRAVO REGIMENTAL NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PESCA PREDATÓRIA. LESÃO RESTRITA AO LOCAL DA PESCA. LESÃO A BENS, SERVIÇOS OU INTERESSES DA UNIÃO NÃO DEMONSTRADA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Com o cancelamento da Súmula 91/STJ, a orientação desta Corte é no sentido de que, em crimes ambientais, a competência em regra é da jurisdição estadual, ressalvada a hipótese de configuração de lesão aos interesses, bens ou serviços da União, de suas entidades autárquicas ou empresas públicas.
2. Embora o delito tenha ocorrido em rio interestadual, na espécie, os danos ambientais decorrentes da prática da pesca predatória possuem apenas dimensão local, restringindo-se ao Município de Coromandel/MG, motivo pelo qual deve ser aplicada a regra da competência da jurisdição estadual.
3. Agravo regimental improvido.
(AgRg no CC 145.487/MG, Reg. nº 2016/0048526-4, Terceira Seção, v.u., Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. 28.09.2016, DJe 04.10.2016; destaquei)
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL X JUSTIÇA ESTADUAL. AÇÃO PENAL. PESCA, EM RIO INTERESTADUAL, DE ESPÉCIMES COM TAMANHOS INFERIORES AOS PERMITIDOS E COM A UTILIZAÇÃO DE PETRECHOS NÃO PERMITIDOS - ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, I E II, DA LEI 9.605/1998. PREJUÍZO LOCAL. AUSÊNCIA DE LESÃO A BENS, SERVIÇOS OU INTERESSES DA UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL.
1. A preservação do meio ambiente é matéria de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, nos termos do art. 23, incisos VI e VII, da Constituição Federal.
2. Com o cancelamento do enunciado n. 91 da Súmula STJ, após a edição da Lei n. 9.605/1998, esta Corte tem entendido que a competência federal para julgamento de crimes contra a fauna demanda demonstração de que a ofensa atingiu interesse direto e específico da União, de suas entidades autárquicas ou de empresas públicas federais. Precedentes.
3. Assim sendo, para atrair a competência da Justiça Federal, o dano decorrente de pesca proibida em rio interestadual deveria gerar reflexos em âmbito regional ou nacional, afetando trecho do rio que se alongasse por mais de um Estado da Federação, como ocorreria se ficasse demonstrado que a atividade pesqueira ilegal teria o condão de repercutir negativamente sobre parte significativa da população de peixes ao longo do rio, por exemplo, impedindo ou prejudicando seu período de reprodução sazonal.
4. Situação em que os danos ambientais afetaram apenas a parte do rio próxima ao Município em que a infração foi verificada, visto que a denúncia informa que apenas dois espécimes, dentre os 85 Kg (oitenta e cinco quilos) de peixes capturados, tinham tamanho inferior ao mínimo permitido e os apetrechos de pesca apresentavam irregularidades como falta de plaquetas de identificação, prejuízos que não chegam a atingir a esfera de interesses da União.
5. Conflito conhecido, para declarar a competência do Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Coromandel/MG, o suscitado.
(CC 146.373/MG, Reg. nº 2016/0111244-3, Terceira Seção, v.u., Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 11.05.2016, DJe 17.05.2016; destaquei)

Em igual sentido, as decisões monocráticas proferidas pelos Ministros integrantes da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça nos seguintes conflitos de competência: CC 152.205/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 23.05.2017; CC 150.926/SP; Rel. Min. Felix Fischer, DJe 20.02.2017; e CC 149.273/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, DJe 18.10.2016.


No caso em exame, considerando que não se observa efetiva ofensa a bem ou interesse da União, não há que se falar em competência da Justiça Federal.


Posto isso, declaro, de ofício, a incompetência absoluta da Justiça Federal para julgar o presente feito e, em razão disso, determino a remessa dos autos à Justiça Estadual de São Paulo, restando prejudicada a análise do recurso de apelação do réu.


É o voto.


NINO TOLDO
Desembargador Federal


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Data e Hora: 07/03/2018 17:58:04