D.E. Publicado em 18/06/2018 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, voto para afastar a matéria preliminar; dar parcial provimento às apelações de BENEDITO LUIZ SANTINI, ADEMAR PEDRO RANSOLIN e FERNANDO ROGÉRIO CAMARGO, e de CLAUDEMIR FRANCISCO BASSO, IRENE FORATTO NEVES, MELQUIADES FORATTO e GUILHERME DE CAMPOS FORATTO; negar provimento às apelações do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, da UNIÃO FEDERAL e ao reexame necessário tido por interposto, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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Data e Hora: | 08/06/2018 16:33:52 |
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RELATÓRIO
Trata-se de APELAÇÕES interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por BENEDITO LUIZ SANTINI, ADEMAR PEDRO RANSOLIN e FERNANDO ROGÉRIO CAMARGO, por CLAUDEMIR FRANCISCO BASSO, IRENE FORATTO NEVES, MELQUIADES FORATTO e GUILHERME DE CAMPOS FORATTO, pela UNIÃO FEDERAL, contra a sentença de parcial procedência da AÇÃO CIVIL PÚBLICA objetivando a reparação de dano ambiental.
Consoante a inicial,
Em decorrência, a PROCURADORIA DA REPÚBLICA em Presidente Prudente/SP ajuizou a presente ação civil pública, requerendo a condenação dos réus (1) à obrigação de não fazer, consistente na abstenção de utilizar/explorar o imóvel e de promover/permitir a supressão da cobertura vegetal sem autorização; (2) à obrigação de fazer, consistente na demolição de todas as construções não autorizadas, retirando o entulho no prazo de 30 dias; (3) à obrigação de fazer, consistente na recomposição da cobertura vegetal no prazo de 6 meses, com acompanhamento pelo período mínimo de 3 anos, em conformidade com projeto técnico apresentado em 30 dias à Coordenadoria de Biodiversidade e Recursos Naturais (CBRN) para aprovação; (4) a recolher judicialmente a quantia suficiente para a execução dessas obrigações; (5) ao pagamento de indenização pelos danos ambientais, quantificada em perícia e acrescida de correção monetária, ao Fundo Federal de Reparação de Interesses Difusos Lesados; (6) ao pagamento de multa diária de 1 salário mínimo ao Fundo Federal de Reparação de Interesses Difusos Lesados, em caso de descumprimento; (7) ao pagamento das custas, honorários periciais e despesas. Requereu, também, (8) o desligamento da energia elétrica pela concessionária e (9) a desocupação do imóvel. Deu-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (fls. 2/50).
Em 25/4/2013, o feito foi distribuído a 2ª Vara Federal de Presidente Prudente/SP (fls. 51).
Em 2/5/2013 foi deferida a medida liminar:
(fls. 55/57)
A UNIÃO FEDERAL foi incluída no polo ativo, na qualidade de assistente litisconsorcial (fls.77).
ALESSANDRO BRAZ GALDINO foi excluído do polo passivo (fls. 120).
O chamamento ao processo do município de Rosana/SP, requerido por JOSÉ HUMBERTO ZANCHETA e DEJAIR MENEZES DE ALMEIDA, foi indeferido (fls. 140/148, 430).
O MUNICÍPIO DE ROSANA/SP prestou informações sobre o bairro Entre Rios (fls. 470/471).
Foi realizada perícia técnica (fls. 521/569).
Em 13/10/2016 foi proferida a sentença de parcial procedência:
(fls. 612/621)
Os EMBARGOS DE DECLARAÇÃO opostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL foi provido para ...incluir na condenação imposta aos réus também o imóvel localizado no Lote nº 35-B, coordenadas geográficas 22º3722,7"S e 53º0536,8"W, Bairo Entre Rios, Estrada Pontalzinho, Município de Rosana/SP... (fls. 648/650, 652).
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, nas razões de apelação, pleiteia a condenação dos corréus ao pagamento de indenização pelos danos ambientais causados, no valor de R$ 50.000,00, destinada ao Fundo Federal de Reparação de Interesses Difusos Lesados (fls. 666/680).
BENEDITO LUIZ SANTINI, ADEMAR PEDRO RANSOLIN e FERNANDO ROGÉRIO CAMARGO, nas razões de apelação, preliminarmente suscitam a perda de objeto da lide ante o advento da Lei Complementar Municipal nº 45/2015, instituidora do Plano Diretor Participativo do Município de Rosana/SP, que define as áreas urbanas consolidadas e prevê a regularização ambiental e fundiária da APP; da Lei nº 13.240/2015, sobre a administração, a alienação, a transferência de gestão de imóveis da União e seu uso para a constituição de fundos; e da Medida Provisória nº 759/2016, sobre a regularização fundiária rural e urbana. No mérito, afirmam que a sentença desconsiderou o laudo pericial, que concluiu pela possibilidade da regularização fundiária do imóvel e pela inviabilidade da demolição das construções; e que o artigo 61-A da Lei nº 12.651/2012 é aplicável à espécie (fls. 687/740).
CLAUDEMIR FRANCISCO BASSO, IRENE FORATTO NEVES, MELQUIADES FORATTO e GUILHERME DE CAMPOS FORATTO, nas razões de apelação, preliminarmente arguem a nulidade da sentença, haja vista a Lei Complementar Municipal nº 45/2015, a Lei Complementar Municipal nº 22/2008 e a Lei nº 13.240/2015, e as conclusões do laudo pericial. No mérito, afirmam que a sentença desconsiderou o laudo pericial, que concluiu pela possibilidade da regularização fundiária do imóvel e pela inviabilidade da demolição das construções (fls. 747/774).
A UNIÃO FEDERAL, nas razões de apelação, também pleiteia a condenação dos corréus ao pagamento de indenização pelos danos ambientais causados, quantificada em perícia, destinada ao Fundo Federal de Reparação de Interesses Difusos Lesados ou a projetos ambientais na região (fls. 834/837).
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e a UNIÃO FEDERAL, nas contrarrazões, pugnam pelo desprovimento dos recursos dos corréus (fls. 801/821, 824/).
JOSÉ HUMBERTO ZANCHETA, DEJAIR MENEZES DE ALMEIDA, BENEDITO LUIZ SANTINI, ADEMAR PEDRO RANSOLIN, CLAUDEMIR FRANCISCO BASSO, IRENE FORATTO NEVES, FERNANDO ROGÉRIO CAMARGO, MELQUIADES FORATTO e GUILHERME DE CAMPOS FORATTO, nas contrarrazões, pedem o desprovimento do recurso do MPF (fls. 860/862).
Em 26/9/2017 o feito foi distribuído nessa Corte, a minha relatoria (fls. 864).
A PROCURADORIA REGIONAL DA REPÚBLICA, no parecer, opinou pelo provimento dos recursos do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e da UNIÃO FEDERAL e pelo desprovimento dos recursos dos corréus (fls. 865/869).
É o relatório.
VOTO
Dou por interposta a REMESSA OFICIAL, nos termos do artigo 19 da Lei da Ação Civil Pública, por se tratar de sentença de parcial procedência.
A matéria preliminar arguida pelos corréus e o mérito confundem-se, motivo pelo qual serão analisados conjuntamente.
Cuida-se de ação civil pública objetivando a reparação de dano ambiental em APP, definida no artigo 3º, II, da Lei nº 12.651/2012, que compila o novo Código Florestal, como a área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.
Conforme a Lei nº 12.651/2012, no seu artigo 4º, considera-se APP, em zonas rurais ou urbanas, as faixas marginais de qualquer curso d'água natural perene e intermitente; o entorno dos lagos, lagoas, reservatórios d'água artificiais, nascentes e olhos d'água; as encostas; as restingas; os manguezais; as bordas dos tabuleiros ou chapadas; o topo de morros, montes, montanhas e serras; as veredas.
O caso dos autos diz respeito à APP na faixa marginal esquerda do Rio Paraná, em Rosana/SP, inserida na Área de Preservação Ambiental (APA) das Ilhas e Várzeas do Rio Paraná, especificamente no bairro Entre Rios, no município de Rosana/SP, onde os corréus ocupam em condomínio um terreno com aproximadamente 2.581 metros quadrados, sendo 674 metros quadrados de área construída/impermeabilizada (fls. 153 - anexo).
De acordo com as informações coletadas em sede administrativa, dentro do terreno foram erguidos dois ranchos utilizados para lazer (lotes 35 C/D) e uma residência comum a ambos, destinada ao caseiro/zelador (lote 35 B).
JOSÉ HUMBERTO ZANCHETA e DEJAIR MENEZES DE ALMEIDA adquiriram os direitos sobre o Rancho Três do Rio (lote 35 D) em 15/11/2000 e em 25/1/2003, respectivamente, na proporção de 50% para cada um (fls. 96/97 - anexo).
MELQUIADES FORATTO, CLAUDEMIR FRANCISCO BASSO, FERNANDO ROGÉRIO CAMARGO, IRENE FORATTO NEVES, ADEMAR PEDRO RANSOLIN, BENEDITO LUIZ SANTINI e GUILHERME DE CAMPOS FORATTO são os possuidores dos direitos sobre o Rancho Paranavaí (lote 35C) (fls. 126/127, 227/244 - anexo).
Sendo os corréus os possuidores dos lotes 35 B/C/D e responsáveis diretos pela intervenção antrópica ali existente, estão legitimados a figurarem no polo passivo porque os deveres associados à APP têm natureza propter rem, aderindo ao título de domínio ou posse. Nesse sentido:
Prosseguindo, de acordo com as provas produzidas em sedes administrativa e judicial, o imóvel ocupado pelos réus deriva de loteamento clandestino e contém edificações, rampa de acesso ao Rio Paraná e fossa negra para lançamento de efluentes (fls. 521/569).
O bairro Entre Rios possui uma única via não pavimentada, a Estrada do Pontalzinho, distribuição de energia elétrica e coleta irregular de resíduos sólidos, não contando com redes de abastecimento de água e de esgoto (fls. 470/471, 521/569).
Em relação à cobertura vegetal, a perícia técnica certificou a presença de exemplares nativos e exóticos (árvores frutíferas) (fls. 521/569).
Nesse ponto, deve-se esclarecer que inexiste no processo qualquer documentação certificadora de que o bairro Entre Rios em Rosana/SP constitui área urbana consolidada passível de regularização fundiária, nos termos do artigo 65 da Lei nº 12.651/2012, atualmente modificado pela Lei nº 13.465/2017 (resultante da conversão da medida provisória nº 759/2016):
Também não se aplicam ao imóvel as disposições contidas no artigo 61-A do novo Código Florestal, que autoriza exclusivamente a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural nas APP de área rural consolidada:
Com efeito, o imóvel dos corréus não desenvolve atividade agrossilvipastoril, genericamente entendida como a reunião sustentável de agricultura, pecuária e floresta (www.embrapa.br/agrossilvipastoril).
Também não fomenta o ecoturismo, que se baseia na relação sustentável com a natureza, comprometida com a conservação e a educação ambiental; ou o turismo rural, focado nas práticas agrícolas e na promoção do patrimônio cultural e natural das comunidades rurícolas (www.turismo.gov.br).
Como exposto nos autos, os ranchos Três do Rio e Paranavaí destinam-se ao lazer familiar (veraneio), o que não se confunde com os conceitos de ecoturismo e turismo rural. Nesse sentido:
O imóvel ocupado pelos corréus, na verdade, está totalmente inserido na APP do Rio Paraná, que segundo o artigo 4º, I, e, da Lei nº 12.651/2012 é de 500 metros, em local periodicamente inundado - o que caracteriza área de risco, de modo que as intervenções antrópicas acima descritas obviamente provocam dano ambiental, especialmente no que diz respeito à regeneração da Mata Atlântica, que é o bioma natural das APA das Ilhas e Várzeas do Rio Paraná, e à manutenção do ecossistema equilibrado. Decerto, a presença humana em APP implica o agravamento do processo erosivo na margem do rio e o seu assoreamento, a alteração das condições climáticas, a diminuição da biodiversidade e a contaminação do solo e da água, inclusive a subterrânea (fls. 133/166 - anexo; 521/569).
Nesse cenário, a aprovação do Plano Diretor do Município de Rosana/SP (Lei Complementar Municipal nº 45/2015) é insuficiente para regularizar o imóvel ocupado pelos corréus, uma vez que não altera a situação fática dos autos, motivo pelo qual fica afastada a preliminar de nulidade da sentença/perda de objeto.
Nesse sentido é o recente julgado da Sexta Turma dessa Corte:
Consequentemente, não merece reparo a condenação dos corréus, dentre outras obrigações, à demolição das edificações existentes na faixa marginal de 500 metros do Rio Paraná, à remoção do entulho e à promoção da recomposição da cobertura florestal.
No mais, conforme destacado no laudo pericial e demais documentos produzidos na fase administrativa, a área onde se encontra o imóvel dos corréus é propícia à recuperação ambiental, por possuir alto potencial de regeneração natural da vegetação, motivo pela qual devem ser retiradas as construções e intervenções negativas e adotadas técnicas de enriquecimento e/ou adensamento com a inserção de mudas de essências nativas (fls. 133/166 - anexo; 521/569).
Assim, restando os corréus condenados a arcar com os custos da demolição das edificações realizadas na APP; da remoção do entulho; da elaboração, implantação e acompanhamento do projeto técnico para recomposição da cobertura vegetal - em prazos preestabelecidos, sob pena de multa diária em caso de descumprimento total ou parcial - entendo desnecessária a cominação de indenização pelos danos ambientais causados, pleiteada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e pela UNIÃO FEDERAL.
Nesse sentido é o entendimento jurisprudencial firmado pelo STJ:
Por todo o exposto, voto para afastar a matéria preliminar; dar parcial provimento às apelações de BENEDITO LUIZ SANTINI, ADEMAR PEDRO RANSOLIN e FERNANDO ROGÉRIO CAMARGO, e de CLAUDEMIR FRANCISCO BASSO, IRENE FORATTO NEVES, MELQUIADES FORATTO e GUILHERME DE CAMPOS FORATTO; negar provimento às apelações do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, da UNIÃO FEDERAL e ao reexame necessário tido por interposto.
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Data e Hora: | 08/06/2018 16:33:49 |