Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 20/06/2018
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004092-47.2015.4.03.6120/SP
2015.61.20.004092-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : ANDRE LUIZ BIRUEL
ADVOGADO : SP252379 SILVIO LUIZ MACIEL e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
EXCLUIDO(A) : MINERACAO PORTO BRANCO LTDA (desmembramento)
No. ORIG. : 00040924720154036120 2 Vr ARARAQUARA/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. CRIME DO ART. 2º DA LEI Nº 8.176/91 E DELITO DO ART. 55 DA LEI Nº 9.605/98. OBJETOS JURÍDICOS DISTINTOS. INEXISTÊNCIA DE REVOGAÇÃO. CONCURSO FORMAL. ELEMENTO NORMATIVO DOS TIPOS DEMONSTRADOS. DOLO. COMPROVADOS. DOSIMETRIA. PENA- BASE. CULPABILIDADE. CONSEQUÊNCIA. MOTIVO DO CRIME. AGRAVANTE DO ART. 61, II, "G", DO CP. BIS IN IDEM. ATENUANTE DA CONFISSÃO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. O crime do art. 2º da Lei nº 8.176/91 tutela a ordem econômica, em especial o patrimônio público. Já o art. 55 da Lei nº 9.605 /1998 visa à proteção do meio ambiente, cujo titular é a sociedade. Inexistência de conflito aparente de normas, mas sim de concurso formal de delitos.
2. A exploração dos recursos minerais da União se deu em desacordo com as obrigações impostas pelos títulos autorizativos do DNPM e CETESB.
3. Comprovado o dolo em relação aos crimes do art. 2º da Lei nº 8.176/91 e 55 da Lei nº 9.605/98.
4. A inobservância da licença expedida pelos órgãos competentes por parte daquele que deveria zelar pela boa administração da empresa denota uma maior reprovabilidade da conduta e justifica a majoração da pena.
5. O impacto ambiental constitui consequência normal dos tipos penais praticados pelo réu.
6. O beneficiamento pela prática criminosa sempre está presente na origem propulsora da vontade do agente.
7. A agravante do art. 61, inciso II, "g", do Código Penal constitui elementar tanto do delito do art. 55 da Lei nº 9.605/98 quanto do crime do art. 2º da Lei nº 8.176/91, motivo pelo qual ela deve ser afastada sob pena de bis in idem.

8. O réu faz jus à atenuação da pena por conta da confissão (art. 65, III, "d", do CP), já que admitiu ter realizado a extração dos recursos minerais fora da área permitida, bem como que os equipamentos encontrados no local não constavam da licença ambiental concedida.
9. Apelação da defesa parcialmente provida.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da defesa de André Luiz Biruel apenas para afastar a agravante do art. 61, inciso II, "g", do Código Penal e aplicar a atenuante prevista no art. 65, III, "d", do Código Penal sobre a dosimetria da pena dos dois crimes, do que resulta a pena definitiva de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de detenção e 20 (vinte) dias-multa no valor de 1/5 (um quinto) do salário mínimo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 11 de junho de 2018.
RAQUEL SILVEIRA
Juíza Federal Convocada


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004092-47.2015.4.03.6120/SP
2015.61.20.004092-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : ANDRE LUIZ BIRUEL
ADVOGADO : SP252379 SILVIO LUIZ MACIEL e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
EXCLUIDO(A) : MINERACAO PORTO BRANCO LTDA (desmembramento)
No. ORIG. : 00040924720154036120 2 Vr ARARAQUARA/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pela defesa de André Luiz Biruel contra a sentença de fls. 347/351, que o condenou pela prática dos delitos previstos no artigo 2º da Lei nº 8.176/91 e art. 55 da Lei nº 9.605/98, na forma do art. 70 do Código Penal, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos e 02 (dois) meses de detenção, além do pagamento de 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/5 (um quinto) do salário mínimo, em regime inicial aberto, substituída por duas penas restritivas de direito consistentes em prestação de serviço à comunidade ou entidade pública e prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários mínimos. Também condenou o réu a reparação dos danos causados ao meio ambiente, mediante o plantio de 625 mudas de essências florestais nativas, resultando no total de R$ 7.500,00 para efeitos de cobrança de título extrajudicial.

Em razões de recurso de fls. 365/384, a defesa pleiteia a reforma da sentença. Alega a ocorrência de bis in idem ou a derrogação do crime previsto no art. 2º da Lei nº 8.176/91 pelo delito especial do art. 55 da Lei dos Crimes Ambientais. Sustenta, ainda, a inexistência de crime, ao argumento de que não houve extração ilegal de turfa, uma vez que a empresa administrada pelo réu possuía autorização da CETESB para extração da referida substância mineral. Também afirma que os aparelhos encontrados no local não estavam em uso e que não houve dolo, haja vista a ocorrência de erro quanto à medição da poligonal, o que só foi descoberto depois da implantação do processo de georreferenciamento. Subsidiariamente, pede a fixação da pena-base no mínimo legal, assim como o afastamento da agravante do Código Penal diante da existência de lei especial ou, na hipótese de sua manutenção, requer o reconhecimento das atenuantes previstas no art. 65, inciso III, "b" e "d", do Código Penal e art. 14, inciso III, da Lei nº 9.605/98.

A acusação apresentou contrarrazões de recurso às fls. 386/391.

A Procuradoria Regional da República opinou pelo parcial provimento do recurso no que se refere à inaplicabilidade da agravante genérica do art. 61, inciso II, "g", do Código Penal e aplicabilidade da atenuante genérica do art. 65, inciso III, "d", do Código Penal (fls. 393/402).

É o relatório.

Sem revisão, nos termos regimentais.



VOTO

Extrai-se dos autos que André Luiz Biruel foi denunciado pela prática dos delitos do artigo 55, caput, da Lei nº 9.605/98 e art. 2º, caput, da Lei nº 8.176/91 c/c os arts. 70 e 71 do Código Penal, porque explorou matéria-prima pertencente à União, consistente em extração de areia e turfa, sem a competente autorização legal, bem como executou pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais em desacordo com a licença ambiental obtida, no período compreendido entre o ano de 2009 e a data de 22/02/2013, na Rodovia SP 255, KM 56, no Município de Santa Lúcia/SP.

Mineração Porto Branco Ltda., por seu turno, foi denunciada pelo crime do art. 55, caput, da Lei dos Crimes Ambientais c/c o art. 71 do Código Penal, porque executou pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais em desacordo com a licença ambiental obtida, no mesmo período e local.

Narra a peça acusatória que, em vistoria realizada no dia 22 de fevereiro de 2013, a polícia militar ambiental constatou que o denunciado extraiu areia e turfa em área não autorizada pelo processo de licenciamento da CETESB e fora da poligonal de exploração expedida pelo DNPM, bem como que ele utilizou equipamentos em desconformidade com a licença de operação da CETESB.

Consta ainda da denúncia que, no local vistoriado, foram encontrados diversos equipamentos em desconformidade com a licença de operação expedida pela CETESB, os quais provavelmente eram usados para extração de minérios.

Segundo a narrativa acusatória, o laudo pericial elaborado pela Unidade Técnico-Científico do Departamento de Polícia Federal de Ribeirão Preto confirmou a presença de equipamentos não autorizados pela licença de operação, além da extração de minério em área diversa daquela autorizada pelo órgão competente.

Por fim, menciona que o réu André Luiz Biruel era o responsável pela administração da empresa Mineração Porto Branco Ltda., a qual também deve ser responsabilizada, haja vista a presença dos requisitos previstos no art. 3º da Lei nº 9.605/98 (fls. 230/233).

Na decisão de fl. 285, foi declarada extinta a punibilidade dos acusados relativamente à imputação pela pratica do delito do art. 55 da Lei dos Crimes Ambientais quanto aos fatos ocorridos até 08.05.2011.

O Juízo de primeiro grau acolheu o pleito ministerial de desmembramento do feito em relação à Mineração Porto Branco Ltda., bem como condenou a réu André Luiz Biruel pelo cometimento dos delitos do art. 2º, caput, da Lei nº 8.176/91 em concurso formal com o crime do art. 55 da Lei nº 9.605/98, com imposição de pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos e 02 (dois) meses de detenção e 13 (treze) dias-multa no valor de 1/5 (um quinto) do salário mínimo, em regime inicial aberto, substituída por duas penas restritivas de direito (fls. 347/351).

Em apelação, o acusado pleiteia, em síntese, a reforma da sentença com sua consequente absolvição. Subsidiariamente, pede a modificação da pena.

Passo a apreciar a matéria devolvida.

Inicialmente, rejeito a alegação de que haveria bis in idem ou, ao menos, a derrogação do crime do art. 2º da Lei nº 8.176/91 pelo delito do art. 55 da Lei dos Crimes Ambientais.

Os objetos jurídicos protegidos pelos delitos são distintos. Com efeito, o crime de "produzir bens ou explorar matéria-prima pertencentes à União, sem autorização legal ou em desacordo com as obrigações impostas pelo título autorizativo", na modalidade usurpação, tutela a ordem econômica, em especial o patrimônio público, haja vista a propriedade da União sobre os recursos minerais, nos termos do art. 20, inciso IX, da Constituição Federal. Cuida-se de um crime de dano que tem como objetivo proteger o patrimônio da pessoa jurídica de direito público.

Já o art. 55 da Lei nº 9.605 /1998 visa à proteção do meio ambiente, cujo titular é a sociedade, tanto que sequer exige a apropriação do minério para sua configuração.

Logo, não há que se falar em derrogação, mas em concurso formal, uma vez que o agente pratica dois crimes e ofende bens jurídicos diversos mediante uma só ação.

No mais, a defesa ainda pleiteia a absolvição do réu, ao fundamento da inexistência de crime. Alega que a extração de turfa não foi ilegal, já que a empresa Mineração Porto Branco Ltda. possuía autorização da CETESB. Também afirma que os aparelhos encontrados no local não estavam em uso e que não houve dolo na conduta, haja vista a ocorrência de erro quanto à medição da poligonal.

Tais argumentos não merecem provimento.

A produção de bens ou exploração ilegal de matéria-prima pertencente à União, na modalidade de usurpação, constitui crime contra o patrimônio público, de natureza formal e perigo abstrato, consumando-se no momento em que o agente dá início às atividades extrativas sem a devida autorização dos órgãos competentes.

O crime de "executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida" (art. 55 da Lei nº 9.605/98), por sua vez, também configura delito formal (na modalidade extração) e de perigo abstrato, o qual independe de prova da efetiva lesão ao meio ambiente e cuja consumação se dá com a retirada dos recursos minerais.

Ao contrário do aduzido pela defesa o elemento normativo dos dois tipos penais resta patente.

Em relação ao crime do art. 2º da Lei 8.176/91, o ofício encaminhado pelo Departamento Nacional de Produção Mineral às fls. 80/82 revela que a empresa Mineração Porto Branco Ltda. possuía autorização para exploração de areia desde 18/07/2005, a qual foi sucessivamente renovada, tendo a última renovação validade de 09/11/2013. O mencionado documento ainda informa que a poligonal autorizada para a empresa possui 14 vértices e área de 43,8 hectares, com as coordenadas apontadas à fl. 81.

Conquanto a licença estivesse válida, o laudo pericial de fls. 90/101 e 127/128 aponta que a extração de areia e turfa se deu fora da poligonal autorizada, in verbis:


"A imagem mostra que áreas localizadas ao sul e a leste da área questionada, com aproximadamente 9 hectares, foram exploradas fora da poligonal do processo administrativo do DNPM nº 820.170/2005".

Portanto, não há dúvidas de que a exploração da matéria-prima da União deu-se em desacordo com as obrigações impostas pelo título autorizativo.

Tal fato também já é suficiente para demonstrar que a extração dos recursos minerais ocorreu em desacordo com a autorização do órgão ambiental, no caso a CETESB. Isso porque as licenças de operação de fls. 336/343, emitidas para a empresa administrada pelo réu, indicam que a área permitida para a extração dos recursos minerais estava incluída dentro da poligonal apontada pelo DNPM, logo qualquer extração fora deste âmbito igualmente configura crime ambiental.

Ademais, não obstante a empresa estivesse com sua licença válida durante a época dos fatos aqui apreciados (validade de 09.12.2009 a 10.11.2015 - ressalvado que houve a extinção da punibilidade em relação aos fatos ocorridos até 08.05.2011 pela decisão de fl. 285), conforme comprovam os documentos de fls. 338/340 e 341/343, a extração da areia e turfa não se deu da forma permitida pela CETESB.

Com efeito, as licenças demonstram que a empresa Mineração Porto Branco Ltda. poderia extrair areia e turfa em cava, porém deveria fazê-lo apenas com os equipamentos indicados no título, já que "alterações nas atuais atividades, processos ou equipamentos deverão ser precedidas de Licença Prévia e Licença de Instalação".

Consoante o Boletim de Ocorrência de fls. 24/28, lavrado em 20.02.2013, foram encontrados no pátio da empresa diversos equipamentos que não constavam da licença de operação emitida pela CETESB, dentre os quais se destacam: 01 tanque de hidratação de turfa, 01 elevador de turfa, 280 litros de turfa hidratada, 50 galões de turfa hidratada, 73 baldes de turfa hidratada, 02 esteiras de transporte de areia, 01 hidro ciclone, 01 amoenga e 01 ralador de turfa.

O Laudo Pericial de fls. 90/101 ainda consignou que "foram encontradas, no pátio da empresa, três pás mecânicas e três dragas, portanto uma unidade de cada além das autorizadas na Licença de Operação cuja cópia foi encaminhada ao Perito".

Desta feita, resta evidente que o réu desobedeceu aos termos consignados na licença de operação, uma vez que poderia manter no local somente os equipamentos permitidos pelo órgão ambiental.

Aliás, a alegação de que os aparelhos encontrados no local não estavam em uso, mas serviriam apenas como reserva, também deve ser rechaçada. Isso porque apenas os equipamentos listados na licença é que estão autorizados a permanecer no local. Caso o réu tivesse interesse ou necessidade de manter outros equipamentos na área licenciada deveria ter requerido ao órgão ambiental para que assim constasse do título autorizativo.

Ademais, a forma como os equipamentos foram encontrados também denotam que estavam em uso, em especial para extração e beneficiamento de turfa.

Igualmente sem razão a tese defensiva de inexistência de dolo na conduta, haja vista a ocorrência de erro quanto à medição da poligonal autorizada pelo DNPM.

Destaco que os tipos penais em questão não exigem dolo específico para sua configuração, sendo suficiente o dolo genérico, consistente na vontade livre e consciente de extrair recurso mineral sem a competente licença ou em desacordo com a obtida (art. 55 da Lei nº 9.605/98) e de explorar matéria-prima pertencente à União, sem autorização legal ou em desacordo com as obrigações impostas pelo título autorizativo (art. 2º da Lei nº 8.176/91).

Ora, o próprio réu afirmou em sede policial que "quando adquiriu a mineração já havia a demarcação e que não houve nenhuma checagem das medidas e demarcações, não sabendo precisar quem teria sido o topógrafo, em que teria realizado as demarcações" (fl. 108).

Em juízo reafirmou que a poligonal já estava demarcada quando comprou a empresa em 2001, época em que a demarcação era feita sem satélite e equipamento. Disse, ainda, que foi o erro no georreferenciamento que o fez realizar a extração de forma equivocada. Aduz que requereu a correção do erro logo que tomou conhecimento de sua existência e tratou de regularizá-lo junto à CETESB (fl. 296).

Das declarações do réu extrai-se a ocorrência de dolo eventual, já que ele assumiu o risco de desenvolver a atividade de extração mesmo sem confirmar a localização exata da poligonal junto aos órgãos competentes.

Ademais, os documentos de fls. 237/239 indicam que André Luiz Biruel já havia se envolvido com procedimentos criminais referentes aos delitos aqui denunciados, o que também afasta sua alegação de ausência de dolo.

Por fim, não há dúvida quanto à prova da materialidade (fls. 12/37, 80/82, 90/101, 120/123 e 127/128) e autoria delitiva (fl. 296), as quais não foram impugnadas especificamente pelas partes, razão pela qual mantenho a condenação de André Luiz Biruel pela prática dos crimes previstos no artigo 2º da Lei nº 8.176/91 e 55 da Lei nº 9.605/98.

Passo à análise da dosimetria da pena.

A defesa pleiteia a fixação da pena-base no mínimo legal, assim como o afastamento da agravante do Código Penal ou, caso mantida, o reconhecimento das atenuantes previstas no art. 65, inciso III, "b" e "d", do CP e art. 14, inciso III, da Lei nº 9.605/98.

Neste ponto, verifico que a r. sentença assim procedeu quanto à dosimetria da pena:


"(...)
Passo, então, a dosimetria da pena, na forma dos artigos 59 e 68 do CP.
Pois bem.
ANDRÉ (41 anos) é casado, tem dois filhos de 19 e 12 anos que moram com ele. A esposa não trabalha. É empresário e sempre trabalhou em mineração. Tem curso superior completo em Desenho Industrial, renda de cerca de R$ 5.000,00. Já teve outro processo ambiental.
Inicialmente, há que se observar que, de regra, só se pode considerar como maus antecedentes as condenações criminais com trânsito em julgado não aptas a gerar reincidência.
Assim, verifico que embora o acusado tenha algum registro na folha corrida criminal nenhuma das ocorrências lá mencionadas pode ser considerada um mau antecedente para fim de fixação da pena-base.
Ademais, cabe considerar a inexistência de elementos que indiquem ter o acusado má personalidade ou má conduta social.
Convém ressaltar, não obstante, a presença de significativo grau de reprovabilidade da conduta do acusado configurando sua culpabilidade dado que em sendo pessoa que sempre atuou na área de mineração, evidentemente deveria abster-se de promover tal atividade em desacordo com a licença do Departamento Nacional de Produção Mineral e da CETESB.
Há, também, grave consequência do crime eis que sua atividade é potencialmente poluidora e, como ressaltado no laudo pericial, a atividade de exploração mineral causa perturbações ambientais, porém tais impactos podem ser minimizados se as condições, restrições e meios de reparação de danos ambientais determinados pelos órgãos de licenciamento, de exploração e fiscalização forem observados (fls. 100/101).
A propósito, observo que embora no inquérito policial ANDRÉ tenha mencionado para a autoridade um termo de ajustamento que lhe obrigaria o plantio de um lote de oito mil mudas para a recuperação da área (fls. 108/109), de fato, o que já existe é um compromisso de recuperação ambiental de plantio de 625 mudas de essências florestais nativas expedido em 11/05/2015 (fl. 264).
Quanto aos motivos do crime, ainda que alegue erro, o fato é que o acusado e sua empresa se beneficiaram desse erro.
Sopesado isso, fixo a pena-base para o DELITO DE USURPAÇÃO em um ano e seis meses de detenção (art. 2º, Lei 8176), e para o DELITO AMBIENTAL, em sete meses de detenção (art. 55, Lei 9605).
No tocante às penas pecuniárias, considerando a situação econômica do acusado e as circunstâncias judiciais, fixo-as em 10 dias-multa, sendo cada dia-multa no valor de 1/5 do salário mínimo (CP, art. 49, c/c art. 60 e 18, da Lei 9.605/98) para cada um dos delitos.
Não há atenuantes agravantes a serem consideradas nos termos dos artigos 65, do CP, mas incide a agravante de os delitos terem sido cometidos com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão (art. 61, II, g, CP), pelo que elevo as duas penas em dois meses cada uma.
Em relação ao DELITO AMBIENTAL, ademais, incide a agravante de ter o agente comedido a infração para obter vantagem pecuniária (art. 15, II, a, da Lei 9.605/98) tendo em conta que a areia extraído fora dos limites da licença foi comercializada, pelo que elevo tal pena em mais um mês.
Assim, a pena do DELITO DE USURPAÇÃO passa a um ano e oito meses e a pena do DELITO AMBIENTAL passa a dez meses. Inexiste, causa de diminuição da pena.
Há, contudo, causa de aumento da pena prevista no artigo 70 do Código Penal em face do concurso formal já que o agente mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes aplicando-se a mais grave (USURPAÇÃO) aumentada em dois sextos de forma a tornar definitiva a pena de dois anos, dois meses e vinte dias de detenção e 13 dias-multa" (fl. 350).

Verifico que, na primeira fase, o magistrado apreciou de forma desfavorável ao réu as circunstâncias judiciais da culpabilidade, consequências e motivos dos dois crimes.

De fato, vislumbro uma maior culpabilidade da agente, já que se trata de empresário experiente na área de extração de minérios e que por isso tem a obrigação de saber as regras a serem observadas no desempenho de sua atividade. A inobservância da licença expedida pelos órgãos competentes por parte daquele que deveria zelar pela boa administração da empresa denota uma maior reprovabilidade da conduta e justifica a majoração da pena para os dois crimes.

No entanto, discordo da decisão recorrida quanto à análise negativa das consequências e motivo do crime.

No tocante à consequência, não vejo a possibilidade de majoração da pena de nenhum dos crimes, uma vez que a poluição e degradação ambientais são inerentes à prática de tais delitos. Em suma, o impacto ambiental constitui consequência normal dos tipos penais praticados pelo réu.

Também se mostra incabível a majoração da pena por conta do motivo do crime. Ora, o beneficiamento pela prática criminosa sempre está presente na origem propulsora da vontade do agente.

Portanto, diante da apreciação negativa da circunstância judicial da culpabilidade, majoro a pena-base dos delitos em 1/6 (um sexto), fração que considero razoável e proporcional, do que resulta a pena de 07 (sete) meses de detenção e 11 (onze) dias-multa no valor de 1/5 (um quinto) do salário mínimo (não impugnado) para o crime do art. 55 da Lei dos Crimes Ambientais e de 01 (um) ano e 02 (dois) meses de detenção e 11 (onze) dias-multa no valor de 1/5 (um quinto) do salário mínimo para o delito do art. 2º da Lei nº 8.176/91.

Na segunda fase da dosimetria, observo que o juízo a quo reconheceu a agravante do art. 61, inciso II, "g", do CP para os dois crimes, assim como aplicou a agravante do art. 15, II, "a", da Lei nº 9.065/98 na pena do crime ambiental.

A defesa pleiteia o afastamento da agravante do art. 61, II, "g", do Código Penal, sob a alegação de que as agravantes genéricas não se aplicam aos crimes ambientais por se tratar de lei especial.

Tal entendimento é equivocado.

O art. 12 do Código Penal prevê que as regras gerais somente se aplicam aos fatos incriminados por lei especial se esta não dispuser de forma diversa. No entanto, a incidência das agravantes do Código Penal não contraria as disposições da lei ambiental, em especial a agravante prevista no art. 61, inciso II, "g".

Ademais, a Lei nº 9.605/98 também prevê no art. 79 a aplicação subsidiária do Código Penal e Processo Penal. Logo, as agravantes especiais não afastam de imediato àquelas contidas na norma penal geral.

Entretanto, conforme bem observado pelo Parquet em seu parecer de fls. 393/402, neste caso a agravante do art. 61, inciso II, "g", do Código Penal constitui elementar tanto do delito do art. 55 da Lei nº 9.605/98 quanto do crime do art. 2º da Lei nº 8.176/91, motivo pelo qual ela deve ser afastada sob pena de bis in idem.

Mantida a agravante do art. 15, inciso II, "a", da Lei nº 9.605/98, na mesma fração usada na sentença (1/9) em relação ao delito ambiental, haja vista a inexistência de insurgência das partes.

Em relação a esta fase, a defesa também sustenta a incidência da regra do art. 14, inciso III, da Lei dos Crimes Ambientais e as atenuantes do art. 65, inciso III, "b" e "d", do CP.

A atenuante do art. 14, inciso III, da Lei nº 9.605/98 não se aplica ao caso dos autos, uma vez que não há nenhuma comprovação de que o réu comunicou previamente o órgão ambiental a respeito do perigo de iminente degradação ambiental.

Conquanto o acusado tenha dito em juízo que comunicou o erro em relação à extração mineral fora da área permitida e que inclusive protocolou seu pedido junto à CETESB (fl. 296), os documentos por ele indicados como provas desta medida (fls. 264 e 297/317) possuem datas de 11.05.2015 e 12.11.2015, ou seja, dois anos depois dos fatos denunciados.

O mesmo argumento serve para afastar o pleito de incidência da atenuante do art. 65, III, letra "b", pois não há provas nos autos de que o réu, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, procurou evitar ou minorar suas consequências ou ter reparado o dano antes do julgamento. Ressalte-se que os documentos de fls. 264 e 297/317 são insuficientes para tal desiderato, já que não apontam a relação com os fatos denunciados, nem espontaneidade e tampouco a integral reparação dos danos.

Contudo, assiste razão à defesa quanto ao reconhecimento da confissão, uma vez que tanto na esfera investigativa quanto em juízo, o réu admitiu ter realizado a extração dos recursos minerais fora da área permitida, bem como que os equipamentos encontrados no local não constavam da licença ambiental concedida (fls. 108/109 e 296). Além disso, a própria sentença se valeu deste argumento para condenar o acusado.

Por conseguinte, o réu faz jus à atenuação da pena por conta da confissão (art. 65, III, "d", do CP).

Assim, mantenho a agravante do art. 15, II, "a", da Lei nº 9.605/98 (na fração de 1/9) sobre a pena do crime ambiental, bem como aplico a atenuante da confissão (art. 65, III, "d" do Código Penal) para ambos os delitos, no patamar de 1/6 (um sexto), fração que considero adequada e proporcional, do que resulta na pena de 06 (seis) meses e 14 (catorze) dias de detenção e 10 (dez) dias-multa para o crime do art. 55 da Lei dos Crimes Ambientais e 1 (um) ano de detenção e 10 (dez) dias-multa em relação ao delito do art. 2º da Lei nº 8.176/91, haja vista a incidência da Súmula nº 231 do STJ.

Por fim, ausente impugnação das partes em relação à terceira fase da dosimetria, estabeleço a pena definitiva do réu em 06 (seis) meses e 14 (catorze) dias de detenção e 10 (dez) dias-multa para o crime do art. 55 da Lei dos Crimes Ambientais e 1 (um) ano de detenção e 10 (dez) dias-multa em relação ao delito do art. 2º da Lei nº 8.176/91.

Conforme visto no início do voto, aplica-se à hipótese vertente o concurso formal de delitos, já que o acusado, mediante uma só ação, praticou dois crimes, de acordo com o artigo 70 do Código Penal, devendo ser aplicada a maior pena cominada em concreto, com acréscimo de 1/6 (um sexto) a 1/2 (metade).

Dessa forma, conservo a fração de aumento de 2/6 (dois sextos), não impugnada, com incidência sobre a pena de 1 (um) ano de detenção (pena mais grave), do que resulta a pena definitiva de 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de detenção.

Insta salientar que a pena de multa, na hipótese de concurso formal, deve ser somada, nos termos do art. 72 do Código Penal, totalizando neste caso 20 (vinte) dias-multa no valor de 1/5 (um quinto) do salário mínimo.

Diante das alterações, restam preservados o regime prisional inicial e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito nos moldes estabelecidos pela decisão de primeiro grau.

Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação da defesa de André Luiz Biruel apenas para afastar a agravante do art. 61, inciso II, "g", do Código Penal e aplicar a atenuante prevista no art. 65, III, "d", do Código Penal sobre a dosimetria da pena dos dois crimes, do que resulta a pena definitiva de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de detenção e 20 (vinte) dias-multa no valor de 1/5 (um quinto) do salário mínimo.

É como voto.



RAQUEL SILVEIRA
Juíza Federal Convocada


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