D.E. Publicado em 13/07/2018 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar procedente o pedido deduzido na ação rescisória, para desconstituir o v. acórdão e, no juízo rescisório, extinguir o processo sem resolução de mérito, nos termos do relatório e votos que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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VOTO-VISTA
Adão Donizete Taffuri ajuizou a presente ação rescisória, com fulcro no artigo 485, incisos II, V, VII e IX, do Código de Processo Civil/1973, visando a desconstituição de acórdão proferido pela 8ª Turma desta Corte que, ao negar provimento ao agravo legal, manteve a improcedência do pedido de concessão de aposentadoria por invalidez rural.
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias, em seu brilhante voto de fls. 330/339, houve por bem julgar improcedente o pedido formulado na presente demanda, assinalando, inicialmente, que "...não há falar-se em incompetência do juízo da ação subjacente..", uma vez que "...a ação foi processada e julgada pelo juízo estadual da comarca de Atibaia-SP, local de residência informado pelo autor e no qual não havia vara da justiça federal instalada no momento do ajuizamento da ação subjacente (2005). Além disso, em grau de recurso o feito foi submetido à apreciação desta e. Corte..".
Prossegue o d. Relator consignando que "..a interpretação levada a efeito no acórdão rescindendo não implicou 'violação à literal disposição de lei', pois foi adotado entendimento no sentido de que "...os documentos apresentados apontavam a atividade rurícola e/ou a propriedade de imóvel rural apenas do pai do autor, e não houve demonstração de que o labor se desenvolvia em regime de economia familiar, de modo a possibilitar a extensão da condição de rurícola...". Acrescenta, outrossim, que não se verificou o alegado erro de fato, pois "...não houve admissão de um fato inexistente nem se considerou inexistente um fato efetivamente ocorrido...", ponderando, ainda, que os documentos tidos como novos, consistentes no "...atestado do Ministério da Defesa, datado de 20/8/2015, no qual consta que, por ocasião do alistamento militar em meados de 1983, o autor declarou sua profissão de lavrador.." e na "...certidão da Justiça Eleitoral, datada de 20/8/2015, na qual consta a ocupação de agricultor.." foram "...emitidos após o trânsito em julgado do acórdão rescindendo..', não garantindo resultado favorável à contenda.
Pedi vista dos autos apenas para melhor reflexão quanto à possibilidade da abertura da via rescisória com base nos fundamentos indicados pelo ora demandante.
De início, adiro ao entendimento esposado pelo d. Relator, no sentido da inocorrência da hipótese prevista no inciso II do art. 485 do CPC/1973, dado que a ação subjacente foi considerada como de matéria previdenciária, e não decorrente de acidente de trabalho, como quer fazer crer a parte autora, tendo a sentença sido proferida por Juízo Estadual, por força de competência delegada prevista no §3º do art. 109 da CR/1988, e o recurso de apelação então interposto pelo INSS sido apreciado por esta Corte.
Da mesma forma, compartilho com a posição do i. Relator no tocante à inexistência de erro de fato, posto que a r. decisão rescindenda apreciou o conjunto probatório em sua inteireza, valorando os documentos que foram carreados aos autos subjacentes, concluindo pela não comprovação do alegado labor rural sob o regime de economia familiar em período imediatamente anterior ao acidente sofrido pelo autor em 10/1999 (atropelamento), que lhe teria acarretado a incapacidade para o trabalho.
Não vislumbro, igualmente, a ocorrência de violação a dispositivo de lei, dado que a interpretação adotada pela r. decisão rescindenda, ao não reputar, como início de prova material, documentos referentes ao seu genitor, notadamente ITR's, mostra-se, ao menos, controversa, a incidir o óbice da Súmula n. 343 do e. STF.
Todavia, no que tange à apresentação de documento novo, divirjo do i. Relator, pelas razões a seguir aduzidas.
Com efeito, em relação à certidão expedida pela 27ª Zona Eleitoral de Bragança Paulista/SP, datada de 20.08.2015 (fl. 21), não obstante faça referência aos assentamentos do Cadastro Eleitoral, não especifica o momento em que tais registros ocorreram, e considerando que a emissão do documento em comento foi posterior ao trânsito em julgado da r. decisão rescindenda, não há como qualificá-lo como novo.
Por outro lado, o Atestado emitido pelo Ministério da Defesa do Exército Brasileiro - 14ª Circunscrição de Serviço Militar, que reproduz os termos do assento de seu alistamento, realizado em meados de 1983, dando conta de que naquela ocasião o autor se declarou lavrador, poderia ser admitido como novo, conforme pacífica jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, conforme se constata dos julgados que a seguir transcrevo:
De outra parte, não obstante a emissão da certidão acima mencionada tenha se dado em 20.08.2015, ou seja, após a data do trânsito em julgado da r. sentença rescindenda (27.05.2010), os dados ali lançados foram extraídos de registros pretéritos, que abrangiam a profissão declarada pelo autor.
Outrossim, trata-se de documento em nome próprio, em que ostenta a profissão de lavrador, de forma a dispensar os documentos pertinentes a seu genitor.
Insta consignar, ainda, que malgrado a ausência de início de prova material do labor rural no período imediatamente anterior à eclosão da incapacidade laborativa (10/1999), consoante atesta o laudo pericial (fl. 151), é assente a jurisprudência no sentido de que não há necessidade de que o início de prova material do labor rural abranja todo o período que se quer comprovar, bastando que a prova testemunhal complemente o tempo não abrangido. Nessa linha, é o julgado do E. STJ, proferido em sede de recurso repetitivo (art. 543-C do CPC/1973), que abaixo reproduzo:
Em síntese, penso que no caso vertente configura-se a ocorrência da hipótese prevista no inciso VII do art. 485 do CPC/1973, atualizado para o art. 966, inciso VII, do CPC/2015, a autorizar a abertura da via rescisória.
Por outro lado, é consabido que a hipótese de rescisão do julgado com base em documento novo se configura se este for capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável, sendo que, no caso vertente, o documento ora apresentado, que consubstancia início de prova material, necessitaria de confirmação por depoimentos testemunhais, para plena comprovação do labor rural e a consequente demonstração do cumprimento da carência e da qualidade de segurado (segurado especial).
Anoto, contudo, que não foi realizada a prova oral no feito subjacente. Todavia, mesmo nessa situação, vislumbra-se o alcance do pronunciamento favorável, não pela consecução do bem da vida almejado (a concessão do benefício previdenciário), mas pela prolação de decisão tendente a restaurar a instrução probatória, com a produção de prova oral, para que, com a devida valoração desta, possibilite o exame da existência ou não dos requisitos necessários para a concessão do benefício em tela.
Insta consignar, outrossim, que o autor, na ação subjacente, protestou pela produção de prova oral em sua inicial, com aposição do rol de testemunhas (fl. 27), contudo o Juízo de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Atibaia/SP acabou por julgar o pedido procedente prescindindo-se da oitiva de testemunhas.
Assim sendo, considerando que o autor, nos autos da ação subjacente, diligenciou no sentido de que fosse produzida a prova testemunhal, e não tendo oportunidade de requerê-la no âmbito da presente ação rescisória, como se infere do despacho de fl. 319, impõe-se sua realização em sede do juízo rescisório, para que esta Seção Julgadora possa apreciar o pedido formulado na ação subjacente.
DO DISPOSITIVO DA RESCISÓRIA
Diante do exposto, divirjo, data vênia, do i. Relator e julgo parcialmente procedente o pedido deduzido na presente ação rescisória, para desconstituir o v. acórdão proferido pela 8ª Turma desta Corte, com base no art. 485, inciso VII, do Código de Processo Civil/1973, atualizado para o art. 966, inciso VII, do CPC/2015 e, no juízo rescissorium, converto o julgamento em diligência, para que seja realizada a prova oral no âmbito da presente ação rescisória e, posteriormente, seja o pedido formulado na ação subjacente apreciado por esta Seção Julgadora
Expeça-se Carta de Ordem ao Juízo de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Atibaia/SP, para que proceda à realização da prova oral, com sua devolução no prazo máximo de 03 (três) meses, na forma prevista no art. 972 do CPC.
É como voto.
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VOTO RETIFICADOR
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: O ilustre Desembargador Federal, Sergio Nascimento, em seu brilhante voto-vista, apresentado em feito de minha relatoria, houve por bem julgar parcialmente procedente o pedido formulado na ação rescisória, para desconstituir o v. acórdão proferido pela 8ª Turma desta Corte, com base no art. 485, inciso VII, do Código de Processo Civil/1973, atualizado para o art. 966, inciso VII, do CPC/2015 e, no juízo rescissorium, converter o julgamento em diligência, para que seja realizada a prova oral no âmbito da presente ação rescisória e, posteriormente, seja o pedido formulado na ação subjacente apreciado por esta Seção Julgadora.
Após ponderar sobre os argumentos do eminente Desembargador Federal Sergio Nascimento, convenci-me de que a hipótese é mesmo de rescisão do julgado em razão da apresentação de documento novo, nos termos do disposto no artigo 485, VII, do CPC/1973. Todavia, em sede de juízo rescisório, penso que a extinção do feito subjacente, sem resolução de mérito, é mais adequada à hipótese que se apresenta.
Pois bem.
Ao prolatar meu voto, havia entendido que os documentos apresentados não poderiam ser considerados novos, sobretudo porque emitidos após o trânsito em julgado do acórdão rescindendo.
Entretanto, como bem fundamentado no voto-vista, o Atestado emitido pelo Ministério da Defesa - que reproduz os termos do assento de alistamento militar do autor, realizado em meados de 1983, dando conta de que naquela ocasião declarou-se lavrador - pode ser admitido como novo, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, baseada na solução pro misero, a qual acompanho com ressalva de entendimento pessoal.
Embora esse atestado tenha sido expedido após a data do trânsito em julgado do acórdão rescindendo, os dados ali lançados foram extraídos de registros pretéritos (1983), que abrangiam a profissão declarada pelo autor.
Ademais, trata-se de documento em nome próprio, o qual registra a profissão de lavrador do requerente, de forma a dispensar os documentos relativos a seu genitor.
Ressalto, ainda, que, apesar de perfilhar o entendimento de que documentos muito antigos não se prestam para respaldar a comprovação da atividade rural no período imediatamente anterior à eclosão da incapacidade laborativa (10/1999), no caso concreto somente com base na prova testemunhal produzida é que se pode aferir a viabilidade de aceitação ou não de determinada prova material.
E, na hipótese, não foi realizada a prova oral no feito subjacente.
Contudo, mesmo nessa situação vislumbra-se o alcance do pronunciamento favorável exigido pelo artigo 485, VII, do CPC/1973, não pela consecução do bem da vida almejado (a concessão do benefício previdenciário), mas pela prolação de decisão que afaste o impeditivo da coisa julgada e permita ao autor ingressar com nova ação previdenciária.
Neste novel ação poderá apresentar as provas materiais aptas a respaldar sua pretensão, reabrindo a possibilidade de produção de prova oral para comprovação do cumprimento da carência e da qualidade de segurado (rurícola).
Tal solução coaduna-se com o quanto decidido pelo e. Superior Tribunal de Justiça, sob o regime do artigo 543-C do CPC/1973, no Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.352.721 (julgado em 16.12.2015), no sentido de que: "A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
Diante do exposto, retifico parcialmente o meu voto, e, por conseguinte, julgo procedente o pedido formulado na ação rescisória, para desconstituir o v. acórdão rescindendo, com base no art. 485, inciso VII, do CPC/1973, (art. 966, inciso VII, do NCPC) e, no juízo rescisório, julgo extinto o processo subjacente, sem resolução de mérito, com fulcro no artigo 485, IV, do NCPC (art. 267, IV, do CPC/1973).
Condeno o INSS ao pagamento de honorários de advogado, aqui arbitrados em R$ 1.000,00 (um mil reais), na forma do artigo 85, § 8º, do CPC.
É o voto retificado.
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RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação rescisória proposta por Adão Donizete Taffuri, visando, com fundamento no artigo 485, incisos, II, V, VII e IX, do CPC/1973, à desconstituição do acórdão proferido pela Oitava Turma desta Corte que, ao negar provimento ao agravo legal, manteve a improcedência do pedido de concessão de aposentadoria por invalidez.
Alega a incompetência do juízo estadual para apreciar a causa subjacente. Sustenta que o acórdão rescindendo incorreu em erro de fato, pois teria concluído erroneamente, com base no boletim de ocorrência carreado aos autos subjacentes, que o autor residia em endereço urbano e trabalhava em um bar. Aduz ter obtido documentos novos que, a seu ver, constituem provas materiais aptas a comprovar sua atividade rural. Defende ter havido violação à disposição de lei, por não lhe ter sido oportunizada a produção das provas que reputava necessárias.
Pretende a rescisão do v. julgado e, em consequência, nova apreciação do pedido originário, a fim de que lhe seja concedido o benefício de aposentadoria por invalidez. Requer a concessão da justiça gratuita.
A inicial veio instruída com os documentos de f. 17/308.
Deferida a justiça gratuita, determinou-se a citação do réu.
Citado, o INSS apresentou contestação (f. 314/317), na qual refuta os argumentos do autor e frisa não restarem demonstradas as hipóteses do artigo 485 do CPC/1973, autorizadoras da abertura desta via excepcional. Pugna pela improcedência da actio rescisória.
Dispensada a dilação probatória, as partes foram instadas para apresentar razões finais e reiteraram os argumentos anteriormente expendidos.
O DD. Órgão do Ministério Público Federal opinou pela improcedência do pedido formulado na ação rescisória.
É o relatório.
Sem revisão, consoante o disposto no artigo 34 do Regimento Interno desta Corte, com a redação da Emenda Regimental nº 15/2016.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: A ação rescisória é o remédio processual do qual a parte dispõe para invalidar decisão de mérito transitada em julgado, dotada de autoridade imutável e indiscutível.
Nessas condições, o que ficou decidido vincula os litigantes. A ação rescisória autoriza as partes ao apontamento de imperfeições no julgado; seu objetivo é anular ato estatal com força de lei entre as partes.
Assinalo não ter sido superado o biênio imposto à propositura da ação, pois o ajuizamento desta rescisória deu-se em 7/3/2016 e o trânsito em julgado do decisum, em 31/7/2014 (f. 237).
Passo ao juízo rescindendo.
A solução da lide demanda análise das hipóteses de rescindibilidade dispostas nos incisos II, V, VII e IX do artigo 485 do CPC/1973, in verbis:
De plano, não se vislumbra a viabilidade de rescisão fundada no inciso II do artigo 485 do CPC/1973.
O artigo 109, § 3º, da Constituição Federal dispõe que:
Com efeito, o dispositivo facultou ao segurado o ajuizamento da ação no foro do seu domicílio, podendo ele optar por ajuizá-la em quaisquer dos demais foros competentes, se assim lhe convier, pois a prerrogativa foi instituída em seu benefício, e tem cunho social, com o objetivo de facilitar o seu acesso à Justiça. A propósito, entre outros: STF, Ministro Sepúlveda Pertence, RE n. 223.139-RS, DJU 18/9/98, p. 20; RTJ 171/1062; RE 117.707, Ministro Moreira Alves, DJU 5/8/94, p. 19.300; STF, RE 287.351-RS, Plenário, em 2/8/01, in: Theotonio Negrão, CPC, 35ª ed., Saraiva, p. 66, nota 27c ao art. 109 da CF.
O Constituinte, portanto, entendeu tão relevante assegurar a possibilidade de o segurado propor ação de natureza previdenciária em seu domicílio, à sua opção, que a admitiu mesmo quando não há sede de juízo federal na comarca, instituindo, com essa finalidade, competência federal delegada, com recurso cabível para o Tribunal Regional Federal na área de jurisdição do juízo de primeira instância (art. 109, § 4º, CF).
Na hipótese, a ação foi processada e julgada pelo juízo estadual da comarca de Atibaia-SP, local de residência informado pelo autor e no qual não havia vara da justiça federal instalada no momento do ajuizamento da ação subjacente (2005). Além disso, em grau de recurso o feito foi submetido à apreciação desta e. Corte.
Desse modo, não há falar-se em incompetência do juízo da ação subjacente.
Avançando na análise das demais hipóteses de rescisão aventadas, passo a um breve resumo.
Na ação subjacente, o autor formulou pedido de aposentadoria por invalidez, aduzindo sua incapacidade e sua condição de trabalhador rural.
Realizada a perícia judicial, o autor manifestou-se sobre o mesmo e pugnou pela designação de audiência de instrução e julgamento.
Não obstante, houve o julgamento antecipado da lide e a sentença julgou procedente o pedido sem maiores considerações sobre a qualidade de segurado do autor.
Interposta apelação pelo INSS, o ilustre Desembargador Federal relator, David Dantas, proferiu decisão terminativa, que deu provimento ao recurso para julgar improcedente o pedido de aposentadoria por invalidez, por entender não demonstrada a qualidade de segurado e o cumprimento do período de carência:
Dessa decisão recorreu o autor, por meio de agravo legal, sustentando que as provas testemunhais e documentais carreadas aos autos comprovavam sua condição de trabalhador rural.
Destaco, por oportuno, trechos desse recurso (f. 217/223):
Ao apreciar o agravo legal, a Egrégia Oitava Turma desta Corte, por unanimidade, negou provimento ao recurso.
Em face desse acórdão não foram interpostos recursos, certificando-se o trânsito em julgado.
Pois bem.
No que se refere à violação à literal disposição de lei, à luz do disposto no artigo 485, inciso V, do CPC/1973, a rescisão do julgado é viável quando este deixa de aplicar determinada lei ou a aplica de forma incorreta - induvidosamente errônea, dando-lhe interpretação de tal modo aberrante que viole, implícita ou explicitamente, o sentido e o propósito da norma.
Ensina Flávio Luiz Yarshell:
A jurisprudência também caminha no mesmo sentido:
A alegação é de que, por não ter sido oportunizada a produção das provas que reputava necessárias, o julgado teria incorrido em violação ao disposto no artigo 5º, LV, da CF (ampla defesa).
O acórdão rescindendo esposou o entendimento de que, diante da ausência de prova material, de nada adiantaria ser realizada audiência de instrução e julgamento, pois seria impossível a admissão de prova exclusivamente testemunhal, por força da Súmula nº 149 do STJ.
A mim me parece que a interpretação levada a efeito no acórdão rescindendo não implicou "violação à literal disposição de lei".
A demonstração da atividade rural é feita por meio de início de prova material, corroborado por prova testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, nos termos do disposto no art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91.
É pacífico o entendimento de que a prova testemunhal não basta, por si só, para comprovar a atividade rural, conforme assentado na Súmula nº 149 do STJ.
Nascido em 26/1/1964, o autor, aduzindo ter ficado paraplégico em razão de atropelamento ocorrido em 25/10/1999, objetivava demonstrar sua condição de trabalhador rural, a fim de lhe fosse concedida aposentadoria por invalidez.
Sobre sua condição de rurícola, aduziu ter trabalhado incialmente como volante/boia-fria, depois com registro em Carteira de Trabalho e Previdência Social e, a partir de 1998, no imóvel de seus pais, ajudando-os na lavoura.
Para demonstrar essas alegações, contudo, o autor apresentou apenas documentos em nome de seu genitor, quais sejam:
- certidão de casamento dos pais (1956), na qual seu genitor está qualificado como lavrador (f. 31);
- CTPS de seu pai, com vínculos empregatícios rurais registrados entre 1979 e 1985 (f. 32/34);
- declarações do ITR dos exercícios de 1998, 2001 e 2002, todas entregues à Receita Federal em 18/12/2002, cujo contribuinte é seu pai (f. 35/40).
Sopesado e analisado o conjunto probatório, o indeferimento do benefício, no acórdão rescindendo, baseou-se na ausência de início de prova material necessária à comprovação da qualidade de segurado.
Entendeu o julgado que os documentos apresentados apontavam a atividade rurícola e/ou a propriedade de imóvel rural apenas do pai do autor, e não houve demonstração de que o labor se desenvolvia em regime de economia familiar, de modo a possibilitar a extensão da condição de rurícola.
De fato, a documentação apresentada nada revela sobre a atividade do autor e não traz qualquer indicativo sobre possível trabalho deste nas terras de seu genitor.
Ademais, tendo por base o acidente ocorrido em 1999, verifica-se que todos os documentos são extemporâneos ao período em que o autor necessitava comprovar sua atividade rural.
Contudo, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar, na forma da súmula nº 34 da TNU.
O contrato na CTPS do pai foi rescindido em 1985, ou seja, 14 (quatorze) anos antes do acidente (1999). Sem falar que o vínculo empregatício é de caráter personalíssimo e não se estenderia do pai ao filho.
As declarações de ITR, por sua vez, embora relativas aos anos de 1998, 2001 e 2002, foram todas entregues à Receita Federal em 18/12/2002, ou seja, 3 (três) anos após o atropelamento (1999).
Não é crível que o autor, o qual contava mais de 40 (quarenta) anos de idade na data do ajuizamento da ação (2005), não dispusesse de um único documento em seu próprio nome indicativo da atividade laboral que alega ter exercido durante toda a vida.
Patente, assim, a ausência de prova material do alegado labor rural do autor.
Nem se alegue falta de oportunidade para apresentação de documentos aptos a respaldar a pretensão, haja vista que o momento oportuno para tanto é o ajuizamento da ação, juntamente com a petição inicial.
Nesse contexto, absolutamente razoável a dispensa da oitiva de testemunhas pelo acórdão rescindendo.
À luz da Súmula nº 149 do STJ, a prova testemunhal seria mesmo inócua, pois, independentemente do seu conteúdo, esta não teria o condão de suprir a ausência de prova material constatada e alterar o resultado do julgado.
Afinal, o magistrado é o destinatário da prova e somente a ele, no uso do seu poder instrutório, cumpre aferir a necessidade ou não de produção de determinada prova para a formação do seu convencimento.
Nesse sentido, vários são os julgados desta e. Corte:
Por outro lado, certo é que a parte tem o direito de opor-se ao indeferimento de produção de provas, mas, neste caso, ela teve a oportunidade e não o fez.
Nas razões do agravo legal interposto contra a decisão terminativa que se pronunciou sobre a desnecessidade de audiência de instrução, o autor não suscitou cerceamento de defesa e não requereu fosse realizada prova testemunhal.
Pelo contrário, o autor limitou-se a afirmar que as provas materiais e testemunhais (que nem sequer haviam sido produzidas) eram suficientes para comprovar sua atividade rural, pugnando pela procedência do pedido.
De fato, quando exercida a jurisdição monocrática na forma do artigo 557 do CPC/1973, dá-se à parte uma oportunidade a mais de recorrer, pois se pode, em tese, corrigir eventual erro do relator no julgamento da causa, submetendo a questão à turma.
Outrossim, há julgados de Tribunais Regionais Federais no sentido de que não há falar-se em cerceamento de defesa quando a parte, tendo tido oportunidade de requerer a produção de provas, permanece inerte e limita-se a postular a procedência do pedido:
Trago à colação, para além, precedente desta própria Terceira Seção, gerado em ação rescisória:
Enfim, à vista de tais considerações, entendo que não houve violação à literal disposição de lei, pois a interpretação dada no julgado não pode ser considerada aberrante ou despropositada, inserindo-se dentro das interpretações possíveis do fenômeno fático trazido a julgamento.
Em nome da segurança jurídica, não se pode simplesmente rescindir decisão acobertada pelo manto da coisa julgada por mero inconformismo das partes. A adoção da interpretação menos comum não constitui vício capaz de desconstituir o julgado.
Em outros dizeres, a ação rescisória não se presta a reparar eventual "injustiça" da sentença ou do acórdão, pois, do contrário, será transmudada em recurso ordinário com prazo de interposição de 2 (dois) anos.
Sobre o alegado erro de fato, este também não se verifica.
A viabilidade de rescisão com base no artigo 485, inciso IX, §§ 1º e 2º, do CPC/1973 pressupõe que o erro de fato - apurável independentemente da produção de novas provas e sobre o qual não tenha havido controvérsia nem pronunciamento judicial - seja a causa da conclusão do julgado rescindendo.
Nesse sentido preleciona a doutrina (g. n.):
Partindo da premissa de que as alegações lançadas na apelação do INSS "obviamente" repercutiram no convencimento do relator (f. 9), o autor aduziu que foi admitido um fato inexistente, ou seja, "que o autor supostamente residia e trabalhava na zona urbana de Atibaia, trabalhando num 'BAR', tudo em direto confronto com a verdade."
O argumento trazido pelo autor é absolutamente despropositado.
Em suas razões de apelação (f. 182/184), o INSS, de fato, sustentou que o Boletim de Ocorrência revelava que o autor residia e trabalhava na área urbana.
Essa alegação, contudo, é completamente inverídica. A simples leitura desse documento (f. 41) esclarece que os dados apontados pelo INSS referem-se ao indiciado e não ao autor, o qual consta como vítima e não teve qualquer dado sobre residência ou local de trabalho registrados no boletim.
O acórdão rescindendo, por sua vez, não está fundamentado na alegação inverídica de que o autor residia e exercia atividade no meio urbano. Esse fato não foi a causa da conclusão do julgado, o que, de pronto, afasta o aventado erro de fato.
Não houve admissão de um fato inexistente nem se considerou inexistente um fato ocorrido.
Indevida, assim, é a rescisão do julgado com base no artigo 485, inciso IX, do CPC/1973.
Prossigo com a análise da hipótese de documento novo, assim entendido, na lição de José Carlos Barbosa Moreira, como o que:
O documento novo (art. 485, VII, do CPC/1973) apto a autorizar o manejo da rescisória circunscreve-se àquele que, apesar de existente no curso da ação originária, era ignorado pela parte ou, sem culpa do interessado, não pôde ser usado no momento processual adequado, seja porque, por exemplo, havia sido furtado, seja porque estava em lugar inacessível. Igualmente, deve o documento referir-se a fatos que tenham sido alegados no processo original e estar apto a assegurar ao autor da rescisória um pronunciamento favorável.
É necessário, ainda, demonstrar a impossibilidade do aproveitamento dos documentos, agora tidos como novos, na época oportuna.
Os "documentos novos" trazidos para fundamentar o pleito desta ação consistem em:
- atestado do Ministério da Defesa, datado de 20/8/2015, no qual consta que, por ocasião do alistamento militar em meados de 1983, o autor declarou sua profissão de lavrador.
- certidão da Justiça Eleitoral, datada de 20/8/2015, na qual consta a ocupação de agricultor.
A mim não me parece que esses documentos possam ser considerados novos, sobretudo porque emitidos após o trânsito em julgado do acórdão rescindendo (31/7/2014).
Ora, repita-se que "o adjetivo 'novo' expressa o fato de só agora ser ele utilizado, não a ocasião em que veio a formar-se. Ao contrário: em princípio, para admitir-se a rescisória, é preciso que o documento já existisse ao tempo do processo em que se proferiu a sentença". (STJ, 1ª Turma, REsp n. 240.949-PR, rel. Ministro José Delgado, j. 15/2/2000, v.u., DJU de 13/3/2000)
Além disso, eles não garantiriam resultado favorável à contenta.
Isso porque a qualificação de lavrador / agricultor do autor, seja em 1983 seja em 2015, não é apta a assegurar que mantinha a qualidade de rurícola à época do acidente (1999).
Assim, incabível é a desconstituição do julgado rescindendo, com fundamento no inciso VII do artigo 485 do CPC/1973.
Esta Terceira Seção tem rejeitado pleitos em que os documentos tidos por novos em nada alteram a conclusão do julgado:
Diante do exposto, julgo improcedente o pedido formulado na ação rescisória.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado, os quais arbitro em R$ 1.000,00 (um mil reais), na forma do artigo 85, § 8º, do CPC, cuja exigibilidade fica suspensa, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser beneficiária da justiça gratuita.
É como voto.
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