D.E. Publicado em 22/06/2018 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar parcial provimento ao recurso da defesa, para absolver o réu da imputação do delito do art. 64 da Lei 9.605/98, com base no art. 386, VI do CPP e redimensionar a pena fixada em definitivo em 1 (um) ano de detenção em regime inicial aberto, substituída a pena privativa de liberdade aplicada por uma pena restritiva de direito consistente em prestação de serviços à comunidade ou a entidade públicas a ser indicada pelo Juízo da Execução Penal, de acordo com o art. 46 do CP. Mantida, no mais, a sentença recorrida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de APELAÇÃO CRIMINAL interposta por LUIZ ROBERTO SUZZIO contra sentença de fls. 264/268vº que o condenou pela prática dos delitos descritos nos arts. 39 e 64 da Lei 9.605/98 a pena de 1 (um) ano e 06 (seis) meses de detenção, em regime inicial aberto e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salario mínimo vigente à época dos fatos. Substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade em entidade a ser designada pelo Juízo da Execução Penal, à ordem de uma hora por dia de pena e prestação pecuniária de um salário mínimo também destinada a entidade assistencial designada pelo Juízo da Execução Penal.
Inconformado, apela o réu (fls. 274/286) e requer a absolvição, alegando que não incidiu nas condutas descritas nos arts. 39 e 64 da Lei 9.605/98, eis que não restou demonstrado ter sido ele o responsável pelo corte de madeira, bem como comprou o imóvel já com a construção, somente tendo restaurado a mesma, com tapumes de madeira rudimentar. Pugna, também, pela aplicação do principio da insignificância.
As contrarrazões foram apresentadas às fls. 293/295 .
Em parecer de lavra do Exmo. Procurador Regional da República, Dr. Marcio Barra Lima, manifestou-se o parquet pelo desprovimento do apelo.
É o relatório.
Dispensada a revisão, nos termos regimentais.
VOTO
Do caso dos autos.
LUIZ ROBERTO SUZZIO foi denunciado como incurso nos arts. 39, 48 e 64 da Lei 9.605/98.
Narra a inicial de fls. 141/144, o quanto segue:
Após regular instrução criminal, sobreveio sentença condenatória de fls. 264/268vº, que aplicou a absorção do art. 48 pelo art. 64 da Lei 9.605/98 e condenou o réu pela prática dos delitos descritos nos arts. 39 e 64 da Lei 9.605/98 a pena de 1 (um) ano e 06 (seis) meses de detenção, em regime inicial aberto e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salario mínimo vigente à época dos fatos. Substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade em entidade a ser designada pelo Juízo da Execução Penal, à ordem de uma hora por dia de pena e prestação pecuniária de um salário mínimo também destinada a entidade assistencial designada pelo Juízo da Execução Penal.
Da inaplicabilidade do princípio da insignificância
A defesa sustenta a aplicação, no presente caso, do princípio da intervenção mínima no Direito Penal, pela inexistência de desequilíbrio ecológico.
Nesta hipótese fática, não se pode aceitar tratar-se de caso a ser abrangido pela teoria do princípio da insignificância penal, sendo preciso consignar que o bem juridicamente tutelado abrange a proteção do ecossistema como um todo, que está ligado, intimamente, à política de proteção ao meio ambiente e como direito fundamental do ser humano o direito de ter um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Na verdade, a lei cuida não só da proteção do meio ambiente em prol de uma melhor qualidade de vida da sociedade hodierna, como também das futuras gerações, em obediência ao princípio da solidariedade em relação aos que estão por vir, previsto no artigo 225 da Carta Magna (direito fundamental de terceira geração).
Como ensina, de forma precisa, o professor Alexandre de Moraes:
A Excelsa Corte, perfilhando o mesmo entendimento, afirmou:
Nesse diapasão, chega-se à conclusão de que o direito ao meio ambiente equilibrado é assegurado pela Constituição Federal como direito fundamental de terceira geração, que está diretamente relacionado com o direito à vida das presentes e das futuras gerações. Não pode, portanto, o Judiciário violar a intenção do legislador, expressa na lei, que teve como substrato a obrigatoriedade da proteção ambiental estampado no artigo 225 da Constituição Federal, ao proclamar que o Poder Público e a coletividade devem assegurar a todos a efetividade do direito ao meio ambiente sadio e equilibrado.
Sendo assim, o corte de árvores e a edificação em área de preservação permanente, impedindo a regeneração natural da vegetação, não pode, em hipótese alguma, ser considerada irrelevante penalmente.
Logo, o princípio da insignificância não se aplica ao caso vertente.
Materialidade.
A materialidade não foi objeto de recurso e está devidamente demonstrada pelo termo circunstanciado e boletim de ocorrência ambiental (fls. 04/05) e laudo de vistoria do Instituto de Criminalística (fls. 61/74) que relata a construção em chapas de madeira aglomerada, popularmente conhecida como "maderit" medindo próximos 63 m2 e um barraco medindo próximos 19 m2, totalizando 82 m2. Para a confecção das construções foi realizada terraplanagem manual, gerando barranco com corte de talude para confecção de platô. Verificada a impossibilidade de regeneração da vegetação pela construção existente no local.
O laudo também demonstra o corte de árvores para utilização da madeira no fogão à lenha e árvores cortadas no entorno da escada de acesso à represa, sendo possível vislumbrar madeiras queimadas e carvão ao lado do barraco.
Autoria e dolo
Art. 64 da Lei 9.605/98
A autoria resta demostrada, pois o próprio réu admitiu que era o proprietário e responsável pela área em questão. Contudo não ficou comprovado o dolo, porquanto, mesmo sabendo que a área era protegida, não tinha a intenção de causar danos ao meio ambiente, nem assumiu os riscos de produzir o resultado.
Infere-se do depoimento do acusado que, quando comprou a área, já existia o piso impermeabilizado e que as paredes não sustentaram o telhado e acabaram ruindo e, assim, procedeu à reforma. Soube que não podia construir nada em alvenaria no local e por isso construiu com "maderit" sobre o piso impermeabilizado existente. Afirmou que não cortou nenhuma árvore, pois já sabia que não era permitido e acredita que se trata de material recolhido na limpeza dos escombros, como pedaços de madeira podres, possivelmente até queimadas e muito lixo, que foram separados. Respondeu que nunca usou herbicida. Adquiriu o imóvel para passar fim de semana com a família e o fogão à lenha já estava lá, usando gravetos encontrados para queimar. (fl. 253)
José de Godoy, anterior proprietário do imóvel, confirmou suas declarações no depoimento prestado perante a Polícia, que quando vendeu o imóvel, havia apenas um fogão à lenha no local, remanescente de uma casa de pau-a-pique que desabou. Afirmou que a base de concreto já existia quando o terreno foi vendido em 2011 e que a casa de madeira foi construída em cima dessa base de concreto e nada foi acrescentado após a venda do terreno. (fl. 253)
A testemunha Marcelo Rodrigues dos Santos, policial militar ambiental, participou da operação Pró Parque em Paraibuna, fazendo vistorias dentro do parque, a fim de verificar a existência de irregularidade. Quanto aos fatos, objeto do presente feito, disse recordar-se vagamente, em razão do tempo decorrido. Ao examinar as fotos anexadas ao laudo pericial, disse lembrar-se que no interior do barraco, o solo estava impermeabilizado. Para baixo existe um lago e que a área está dentro da "área de parque". Exibidas as fotos nº 06 e 18 de troncos queimados, disse não se recordar. (fl. 253)
O fato de já haver uma base de concreto e o réu afirmar que fora instruído a não construir nada em alvenaria no local e, por isso, construiu com "maderit" sobre o piso impermeabilizado já existente, descaracteriza o dolo consistente em edificar imóvel em solo não edificável, dificultando a regeneração natural da vegetação.
Erro de proibição é o que incide sobre a ilicitude de um comportamento. O agente supõe, por erro, ser lícita a sua conduta. O objeto do erro não é, pois, nem a lei nem o fato, mas a ilicitude, isto é, a contrariedade do fato em relação à lei. É necessário que o agente faça um juízo equivocado sobre aquilo que lhe é permitido fazer em sociedade. Evidentemente, não se exige de todas as pessoas que conheçam exatamente todos os dispositivos legais, mas o erro só é justificável quando o sujeito não tem condições de conhecer a ilicitude de seu comportamento. O erro de proibição exclui a potencial consciência da ilicitude e, por conseguinte, afasta a culpabilidade. Tem previsão no art. 21 do Código Penal, servindo como causa de isenção de pena na hipótese de ser escusável e como causa de diminuição se evitável.
O próprio laudo pericial de fls. 61/74 ressaltou que dentro da área de preservação do parque existem várias chácaras de lazer, pesca amadora, ecoturismo e de moradia, sendo que os proprietários são, em sua maioria, pessoas simples do meio rural que aproveitam as atividades de lazer proporcionadas pela represa próxima. De forma geral, explica que grande parte destes proprietários desconhecem a Legislação Ambiental (fl. 73).
Portanto, dos elementos probatórios produzidos nos autos, pode-se concluir que o réu LUIZ ROBERTO não tinha consciência da ilicitude de sua conduta, o que afasta sua culpabilidade, isentando-o de pena. Nesse sentido julgado desta e. Quinta Turma:
Desta sorte, mister a absolvição de LUIZ ROBERTO SUZZIO da prática do delito do art. 64 da Lei 9.605/98, com base no art. 386, VI do Código de Processo Penal.
Art. 39 da Lei 9.605/98
Dispõe o referido tipo penal:
Certo é que o local é de importância ambiental extremamente alta e de grande interesse de preservação, não cabendo regularização das intervenções, devendo prevalecer a regra mais restritiva da categoria denominada "parque", conforme Parecer do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (fls. 184/186).
O corte de árvores está suficientemente demonstrado por meio do laudo pericial de fls. 61/74.
Depreende-se do laudo que nas fotos nº 06 e 07 há troncos queimados demonstrando que árvores foram cortadas e queimadas, com detalhes da fogueira. Nas fotos nº 11, 12, 13, 14 e 17, constata-se fogão a lenha com fuligem e sujidade característica de uso recente, carvão jogado ao lado da casa, e ao lado do fogão, troncos de árvores da mata nativa estocados.
Apesar do réu ter negado ter cortado árvores, pois já sabia que não era permitido e afirmar se tratar de material recolhido na limpeza dos escombros, utilizando apenas gravetos no fogão a lenha, sua versão não encontra amparo no conjunto probatório. O próprio réu afirmou que usava o imóvel para lazer nos finais de semana, o que foi confirmado pela testemunha José de Godoy.
Como bem acentuou a sentença recorrida, "o aspecto recente do material queimado não deixa qualquer dúvida quanto à autoria deste fato por parte do réu".
Diante desse contexto, conclui-se que a prova acusatória é subsistente e hábil a comprovar a materialidade, a autoria e o dolo, devendo o réu ser condenado como incurso no art. 39 da Lei 9.605/98.
Dosimetria.
Afastada a condenação pelo art. 64 da Lei 9.605/98, cumpre analisar a dosimetria da pena no tocante ao art. 39 do mesmo diploma legal.
A pena definitiva restou fixada em 1 (um) ano de detenção, em regime inicial aberto, afastada a pena de multa, conforme o seguinte trecho transcrito:
Não havendo irresignação da defesa quanto à fixação da pena-base e com relação às demais fases de fixação da pena privativa de liberdade, tenho que a mesma deve ser mantida, nos termos em que lançada, posto que observada a jurisprudência atual e os preceitos legais atinentes à matéria, não havendo necessidade de reformá-la.
O regime inicial de cumprimento de pena deve ser o aberto, nos termos do art. 33, §2º, c do CP.
Preenchidos os requisitos do art. 44 do CP, substituo a pena privativa de liberdade aplicada por uma pena restritiva de direito consistente em prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública a ser indicada pelo Juízo da Execução Penal, de acordo com o art. 46 do CP.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso da defesa, para absolver o réu da imputação do delito do art. 64 da Lei 9.605/98, com base no art. 386, VI do CPP e redimensionar a pena fixada em definitivo em 1 (um) ano de detenção em regime inicial aberto, substituída a pena privativa de liberdade aplicada por uma pena restritiva de direito consistente em prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública a ser indicada pelo Juízo da Execução Penal, de acordo com o art. 46 do CP. Mantida, no mais, a sentença recorrida.
É como voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 20/04/2018 13:28:34 |