Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 20/08/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0024196-14.2001.4.03.6100/SP
2001.61.00.024196-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS
APELANTE : IDEC INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR e outros.
ADVOGADO : SP198282 PAULO FERREIRA PACINI
: SP113345 DULCE SOARES PONTES LIMA
APELADO(A) : OS MESMOS e outros.
APELADO(A) : IDEC INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR e outros.
ADVOGADO : SP198282 PAULO FERREIRA PACINI
: SP113345 DULCE SOARES PONTES LIMA
APELANTE : Caixa Economica Federal - CEF e outros(as)
ADVOGADO : SP012363 JOSE MANOEL DE ARRUDA ALVIM NETTO
: SP012363 JOSE MANOEL DE ARRUDA ALVIM NETTO

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. APELAÇÃO EM AÇÃO COLETIVA. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - SFH. TR. FCVS. PES. CES. CONSUMIDOR. CDC. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. ANATOCISMO. AMORTIZAÇÃO NEGATIVA. SISTEMAS DE AMORTIZAÇÃO. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS.
I - Em sede de questão preliminar, restam afastadas as razões aduzidas e confirmada a legitimidade ativa do IDEC - Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor.
II - Quanto à alegação de prescrição, a questão se confunde com o mérito e, como tal, será tratada.
III - A aplicação da TR não fere ato jurídico perfeito. Pactuada a correção monetária nos contratos do SFH pelo mesmo índice aplicável à caderneta de poupança, incide a taxa referencial (TR) a partir da vigência da Lei n. 8.177/1991 (Súmula 454 do STJ). REsp 969129/MG, julgado pelo artigo 543-C do CPC.
IV - A cobertura pelo FCVS não pode ser requerida se o mutuário está inadimplente em relação a prestações originalmente previstas em contrato e não relacionadas ao saldo residual.
V - O PES não é índice de correção monetária aplicável ao saldo devedor, o CES é um de seus instrumentos e sua cobrança é legítima mesmo antes da Lei 8.692/93, se prevista em contrato.
VI - As instituições financeiras, enquanto pessoas jurídicas que prestam serviços de natureza bancária, financeira e de crédito mediante remuneração no mercado de consumo, enquadram-se no conceito de fornecedor do artigo 3º, caput e § 2º do CDC. O CDC se aplica às instituições financeiras (Súmula 297 do STJ). Nestas condições, não há que se falar em ilegitimidade ativa do IDEC, já que não há contradição entre as suas finalidades estatutárias e a matéria discutida na presente ação. As cláusulas dos contratos do SFH observam legislação cogente imperando o princípio pacta sunt servanda. A teoria da imprevisão e o princípio rebus sic standibus requerem a demonstração de que não subsistem as circunstâncias fáticas que sustentavam o contrato, justificando o pedido de revisão contratual. Mesmo nos casos em que se verifica o prejuízo financeiro, a nulidade pressupõe a incidência dos termos do artigo 6º, V, artigo 51, IV e § 1º do CDC.
VII - Nos contratos vinculados ao SFH, a atualização do saldo devedor antecede sua amortização pelo pagamento da prestação (Súmula 450 do STJ).
VIII - A legislação sobre o anatocismo, ao mencionar "capitalização de juros" ou "juros sobre juros", não se refere a conceitos da matemática financeira, sendo de todo regular a utilização de taxa de juros efetiva com capitalização mensal, derivada de taxa de juros nominal com capitalização anual, ainda quando aquela seja ligeiramente superior a esta. Tampouco se refere a juros compostos ou a sistemas de amortização que deles se utilizem. Como conceito jurídico "capitalização de juros" pressupõe o inadimplemento e um montante de juros devidos, vencidos e não pagos e posteriormente incorporados ao capital para que incidam novos juros sobre ele. Não há no ordenamento jurídico brasileiro proibição absoluta de tal prática, sendo permitida mesmo pela Lei de Usura (artigo 4º do Decreto 22.626/33), com frequência anual, sendo este o critério de interpretação da Súmula 121 do STF.
IX - Na esteira da Súmula 596 do STF, desde a MP 1.963-17/00, atual MP 2.170-36/01, admite-se como regra geral para o sistema financeiro nacional a possibilidade de se pactuar capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano. Há na legislação especial do SFH autorização expressa para a capitalização mensal de juros desde a edição da Lei 11.977/09 que incluiu o Artigo 15-A na Lei 4.380/64. (REsp 973827/RS julgado pelo artigo 543-C do CPC). Ademais, a Súmula 539 do STJ reforçou a possibilidade de aplicação da capitalização de juros inferior a um ano para os contratos ligados ao SFH a partir da edição da MP 1.963-17/00, desde que expressamente pactuada.
X - Não existe vedação legal à utilização da Tabela Price (SFA), do SAC ou do Sacre, estes sistemas de amortização não provocam desequilíbrio econômico-financeiro no contrato, enriquecimento ilícito ou qualquer outra ilegalidade, cada um deles possui uma configuração própria de vantagens e desvantagens. Na ausência de nulidade na cláusula contratual que preveja a utilização de qualquer um destes sistemas, na ausência de óbices à prática de juros compostos, não se justifica a revisão do contrato para a adoção do Método Gauss.
XI - Se o reajuste da prestação pelo PES for sistematicamente inferior à correção do saldo devedor, configura-se a hipótese de amortização negativa, na qual o valor da prestação não é suficiente para pagar os juros mensais e amortizar o capital, com o potencial de majorar o saldo devedor de maneira insustentável. A amortização negativa se assemelha ao anatocismo em sentido estrito, já que valores devidos a título de juros remuneratórios "não pagos", apenas em decorrência do desequilíbrio exposto, são incorporados ao saldo devedor para nova incidência de juros.
XII - Nos contratos com cobertura do FCVS, a existência de um grande saldo residual decorrente das amortizações negativas não é relevante para o mutuário que paga regularmente as prestações do financiamento, já que a responsabilidade pela sua cobertura será do fundo. Neste caso, terá interesse em afastar a amortização negativa o mutuário que estiver inadimplente se, por exemplo, restar configurado o vencimento antecipado da dívida. Na ausência de cobertura pelo FCVS, porém, é nítido o interesse em afastar a possível sistemática amortização negativa no contrato.
XIII - Apenas com a verificação de ausência de autorização legislativa especial e de previsão contratual, poderá ser afastada a capitalização de juros devidos, vencidos e não pagos em prazo inferior a um ano. Nesta hipótese, em se verificando o inadimplemento de determinada prestação, a contabilização dos juros remuneratórios não pagos deve ser realizada em conta separada, sobre a qual incidirá apenas correção monetária, destinando-se os valores pagos nas prestações a amortizar primeiramente a conta principal. O mesmo procedimento, não condicionado a autorização legislativa ou contratual, poderá ser adotado em se verificando a configuração sistemática de amortizações negativas na gestão do contrato.
XIV - O Decreto-lei 70/66 é compatível com as normas constitucionais que tratam do devido processo legal. Não é negado ao devedor o direito de postular perante o Poder Judiciário a suspensão ou anulação de atos relativos ao procedimento de execução extrajudicial em virtude de irregularidades procedimentais. A mera existência de ação revisional não garante a suspensão da execução pelas regras do Decreto-lei 70/66. Para tanto a discussão deve se fundar em jurisprudência consolidada do STF ou STJ (fumus boni iuris). REsp 1067237, artigo 543-C do CPC.
XV - A proibição da inscrição/manutenção dos nomes dos mutuários em cadastro de inadimplentes deve se fundar em jurisprudência consolidada do STF ou STJ, sendo necessário, ainda, o depósito da parcela incontroversa ou de caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz. REsp 1067237, artigo 543-C do CPC.
XVI - A execução ficará suspensa, bem como a possibilidade de incluir o nome dos mutuários em cadastro de proteção ao crédito, se existir liminar nesse sentido, ou se houver sentença/acórdão, notadamente se constituir título executivo judicial, prevendo a revisão de cláusulas do contrato ou determinando a sua correta aplicação. A suspensão nessas condições tem o intuito de garantir a eficácia da decisão e proteger a coisa julgada.
XVII - Caso em que não se cogita que a sentença tenha sido proferida ultra petita, referente aos limites dos pedidos formulados, os quais, ademais, não poderiam antever minuciosamente os critérios a serem adotados pelo juízo a quo ao acolher parcialmente o pleito da parte Autora. No mérito, é de se destacar que houve a realização de perícia técnica contábil e ao se considerar o conjunto probatório constante nos autos, bem como os entendimentos anteriormente expostos, é de rigor reconhecer o pedido para que as dívidas dos mutuários ligados à parte Autora sejam revistas pela aplicação do PES, mediante requerimento do mutuário com a comprovação da categoria profissional a que pertence, sem prejuízo de outros meios que possam demonstrar sua evolução salarial a serem apresentados e avaliados administrativamente ou em sede de execução de sentença.
XVIII - Quanto aos demais pedidos, para os contratos firmados antes de 31/03/2000, ou para aqueles que foram firmados em data posterior, mas que não tem previsão de capitalização de juros em periodicidade inferior à anual, nos termos da Súmula 539 do STJ, a dívida dos mutuários deverá ser revista observando-se que a contabilização dos juros remuneratórios não pagos, em decorrência de inadimplemento ou de amortização negativa, deverá ser feita em conta separada, sobre a qual incidirá apenas correção monetária pelo período de um ano, destinando-se os valores pagos nas prestações a amortizar primeiramente a conta principal. Os juros de mora deverão incidir somente sobre a quantia referente à amortização do capital. A compensação do saldo devedor ou a eventual repetição do indébito deverá ser apurada em sede de execução de sentença. É válida a cláusula que prevê a execução pelo rito do Decreto-lei 70/66, sua eficácia, no entanto, ficará suspensa enquanto pendente a execução do julgado, considerando o parcial provimento dos pedidos apresentados.
XIX - Apelação da Transcontinental Empreendimentos, apelação da CEF e outros parcialmente provida para reconhecer a regularidade dos índices de atualização monetária previstos em contrato para a atualização da dívida, bem como a validade das cláusulas que preveem a execução pelo rito do Decreto-lei 70/66, suspensa sua eficácia enquanto pendente a execução do julgado.
XX - Apelação do IDEC parcialmente provida para alterar a forma de contabilização dos juros remuneratórios não pagos, em decorrência de inadimplemento ou de amortização negativa, garantida a revisão dos reajustes das prestações pela aplicação do PES.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às preliminares, dar parcial provimento à apelação da "Transcontinental Empreendimentos", dar parcial provimento à apelação da CEF e outros, dar parcial provimento à apelação da parte autora para alterar a forma de contabilização dos juros remuneratórios não pagos, em decorrência de inadimplemento ou de amortização negativa, garantida a revisão dos reajustes das prestações pela aplicação do PES, nos termos do voto do Relator Des. Fed. Valdeci dos Santos, acompanhado pelo Des. Fed. Hélio Nogueira e pela Des. Fed. Inês Virgínia.


São Paulo, 07 de agosto de 2018.
VALDECI DOS SANTOS
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 09/08/2018 17:47:56



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0024196-14.2001.4.03.6100/SP
2001.61.00.024196-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS
APELANTE : IDEC INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR e outros.
ADVOGADO : SP198282 PAULO FERREIRA PACINI
: SP113345 DULCE SOARES PONTES LIMA
APELADO(A) : OS MESMOS e outros.
APELADO(A) : IDEC INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR e outros.
ADVOGADO : SP198282 PAULO FERREIRA PACINI
: SP113345 DULCE SOARES PONTES LIMA
APELANTE : Caixa Economica Federal - CEF e outros(as)
ADVOGADO : SP012363 JOSE MANOEL DE ARRUDA ALVIM NETTO
: SP012363 JOSE MANOEL DE ARRUDA ALVIM NETTO

RELATÓRIO

O DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS: Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor - IDEC, apelação interposta pela Caixa Econômica Federal, Banco ABN Amro S/A, Banco América do Sul S/A, Banco Bradesco S/A, Banco BCN S/A, HSBC Bank Brasil S/A - Banco Múltiplo, Banco Itaú S/A, Banco Sudameris Brasil S/A, BankBoston Banco Múltiplo S/A, Banco do Estado de São Paulo S/A - Banespa, Banco Nossa Caixa S/A e Banco do Estado de Pernambuco S/A - Bandepe, além de apelação interposta pela Transcontinental Empreendimentos Imobiliários e Administração de Créditos Ltda contra sentença (fls. 3213/3234), proferida pelo então Juiz Federal Wilson Zauhy Filho, que, em sede de ação coletiva proposta pelo IDEC com o intuito de obter a revisão de dívida e cláusulas de contratos de financiamento imobiliário no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados, nos seguintes termos:


a) declarar a nulidade da cláusula contratual que prevê a execução extrajudicial em razão do vício de legalidade (CDC, art. 51);


b) declarar o direito dos mutuários representados em terem reajustados os valores das prestações e do saldo devedor segundo a evolução salarial da categoria profissional do mutuário principal e


b-1) com relação aos profissionais autônomos, o reajuste das prestações e do saldo devedor deverá observar os seguintes critérios: da data da assinatura do contrato até outubro de 1989, pela variação integral do IPC, de novembro de 1989 até fevereiro de 1991, pela variação do BTN e, a partir de então, pela variação do INPC;


c) a compensação dos valores eventualmente recolhidos a maior com as prestações vincendas e, na hipótese de existência de saldo remanescente, a sua restituição à parte autora e


d) limitar os efeitos dos itens b, b-1 e c aos contratos que consignem cláusula de reajuste atrelada ao PES.


A despeito da concessão de tutela antecipada em sentença, a mesma foi afastada em julgamento de embargos de declaração pelo juízo a quo (fls. 3305/3308). A decisão foi recebida com efeitos suspensivo e devolutivo, exceto quanto ao reconhecimento da nulidade da cláusula contratual que prevê a execução extrajudicial (fls. 3506/3507).


A sentença fixou, ainda, a condenação dos sucumbentes - parte autora e parte ré - ao pagamento de verba honorária, que fixou em 10% (dez por cento) sobre o valor apurado em liquidação, devidamente atualizado quando do efetivo pagamento, que se compensarão na modalidade do artigo 21 do CPC.


Em razões de apelação, Transcontinental Empreendimentos sustenta que as normas do CDC não podem ser aplicadas às controvérsias no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação que possui regramento próprio, razão pela qual nem mesmo a Súmula 297 do STJ justificaria a incidência das mesmas. Entende que a sentença é nula porque proferida ultra petita. Entende ser regular a utilização da TR como índice de atualização do saldo devedor. Aduz que a multa não pode ser aplicada sem a definição de um valor limite para tanto.


Em razões de apelação, o IDEC sustenta, em síntese, que os contratos firmados no âmbito do SFH a partir de 1985 não contam com a cobertura do FCVS, razão pela qual a subsistência de saldo devedor residual onera excessivamente os mutuários e impede a quitação da obrigação. Aduz que uma conjunção de fatores como o reajuste do valor das parcelas acima da evolução salarial dos mutuários, a utilização de sistemas de amortização com juros capitalizados, os altos índices de inflação e medidas adotadas por sucessivos planos econômicos levaram inúmeros mutuários à inadimplência e a consequente execução dos imóveis hipotecados. Entende restar configurada a lesão além de grave desequilíbrio técnico, econômico e financeiro nos contratos do SFH. Requer a revisão das dívidas afastando-se a capitalização de juros, bem como qualquer sistema de amortização que de tal capitalização se utilizem, uma vez que é vedada a prática do anatocismo, para tanto, requer a aplicação de juros simples, não havendo razões suficientes para que a decisão não acolha os apontamentos da perícia realizada nos autos. Argui ser ilegal a utilização de índices das cadernetas de poupança como índice de correção monetária nos financiamentos. Afirma que a utilização do PES não apenas como critério de reajuste das prestações, mas também como critério de atualização do saldo devedor, afastaria o desequilíbrio apontado. Redargui serem aplicáveis as normas do CDC ao caso em tela, sendo de rigor a devolução em dobro dos valores pagos indevidamente pelos consumidores. Refere que os réus devem ser compelidos a cumprir a decisão sob pena de configuração do ilícito penal de desobediência, sem prejuízo da fixação de multa diária para as mesmas finalidades, demonstrando de forma transparente a evolução dos contratos, com todas as informações necessárias à evolução dos mesmos.


Em razão de apelação, a CEF e outros, preliminarmente, levantam questão de ordem em relação ao quanto decidido no bojo do agravo de instrumento autuado sob número 2003.03.00.019219-2 e julgado pela Quinta Turma deste TRF da 3ª Região em 16/02/04. Aduzem que o CDC não é aplicável às controvérsias do SFH tendo em vista a existência de legislação especial para tanto. Entendem não ser possível alterar o critério de atualização monetária das dívidas que encontram esteio na legislação e nos contratos firmados entre as partes, não se cogitando de ilegalidade na utilização da TR. Afirmam que o reajuste das prestações para profissionais autônomos deve observar a Política Nacional de Salários. Arguem não haver nulidade na cláusula que prevê a execução pelo rito do Decreto-lei 70/66. Requerem a condenação do IDEC a arcar com os ônus de sucumbência e o recebimento da apelação em ambos os efeitos.


Houve juntada de petição (fls. 3734/3757) pugnando pela ilegitimidade ativa do IDEC ou, prosseguindo no mérito, deverá ser reconhecida a prescrição dos efeitos da decisão para os contratos celebrados em até cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.


O ilustre representante do Ministério Público Federal opina pelo provimento da apelação do IDEC e pelo não provimento das demais apelações.


É o relatório.


VOTO

Inicialmente, cumpre destacar que o agravo de instrumento nº 2003.03.00.019219-2, foi interposto pelas apelantes contra decisão do juízo a quo que determinou a suspensão da eficácia das cláusulas contratuais que autorizam as instituições financeiras a promover a execução extrajudicial prevista no Decreto-lei nº 70/66, além de determinar a sustação daquelas execuções já iniciadas.


Anoto que a E. Quinta Turma deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em data de 16/02/2004, por maioria, deu provimento ao agravo de instrumento nº 2003.03.00.019219-2 (fls. 3071) para o fim de revogar o parcial deferimento da tutela antecipada. Ao prolatar a sentença apelada, o juízo a quo não reiterou a decisão reformada, razão pela qual o aludido acórdão produziu todos os seus regulares efeitos.


Muito embora na fundamentação dos votos proferidos na oportunidade constem alusões a não aplicação de normas consumeristas às hipóteses discutidas nos autos, a questão foi tratada de maneira incidental, apenas com o intuito de justificar o afastamento da decisão que antecipou a tutela e nestas condições, ao contrário do que pretendem aduzir as apelantes, não houve a preclusão apontada, já que a legitimidade ativa do IDEC foi confirmada na ocasião daquele julgamento. Para efeitos da presente apelação, a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor se confunde com o mérito da apelação e com ele será analisado.


Os contratos de financiamento imobiliário regidos pelo Sistema Financeiro da Habitação (SFH) obedecem não apenas às cláusulas estipuladas por acordo entre as partes, mas também a toda uma legislação própria que delimita o alcance dessas cláusulas ao estabelecer parâmetros para o reajuste das prestações, critérios de correção do saldo devedor, taxas de juros, amortização, entre outras, como previsto no artigo 5º da Lei 4.380/64 e artigo 30 da Lei 4.864/65.


A Lei 4.380/64 foi aprovada por rito ordinário e se restringe ao SFH, não estabelecendo normas gerais sobre o sistema financeiro nacional, sendo descabido formal e materialmente cogitar que a referida lei tenha sido recepcionada pela Constituição Federal de 1988 com força de lei complementar (artigo 192).


As fontes tradicionais de recursos para o SFH são a Caderneta de Poupança e o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Aplicam-se para correção do saldo devedor nos contratos do SFH os mesmos índices de remuneração das contas que o custeiam, medida necessária ao equilíbrio e à consistência financeira do sistema. Além das determinações legais, são também de ordem estrutural as razões que determinam a correção do saldo devedor, as quais não podem ser consideradas abusivas, sob pena de se considerar igualmente abusiva a remuneração de suas fontes de financiamento.


Taxa Referencial (TR), Lei 8.177/91


Editada em março de 1991, em contexto de inflação galopante, a Lei 8.177 criou a Taxa Referencial (TR), a qual foi objeto de controvérsias judiciais, a exemplo de tantas outras medidas do período. Nunca foi declarada a incompatibilidade constitucional da TR, mas sim de alguns dos dispositivos daquela lei que objetivavam operar efeito imediato, modificando indexadores de correção monetária de contratos aperfeiçoados anteriormente à sua vigência.


Para os contratos celebrados antes da Lei 8.177/91, se houvesse a previsão de índice não relacionado a correção de poupança, especificamente contratado para a correção do saldo devedor, não se admitiria sua substituição pela TR, em observância ao ato jurídico perfeito e na esteira do que restou decidido na ADI 493.


Se, ao contrário, a atualização monetária do contrato estivesse vinculada à remuneração paga pelos depósitos da poupança, sem previsão de outro índice específico, poderia então ser aplicada a TR, não havendo substituição compulsória de cláusula contratual, mas apenas especificação do índice de correção a ser observado daí em diante, por força do art. 12 da Lei 8.177/91.


Neste sentido decidiu o Supremo Tribunal Federal:


PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. FGTS. DEPÓSITOS EFETUADOS NA CONTA VINCULADA. ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA. APLICAÇÃO DA TAXA REFERENCIAL. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.
1. Esta Suprema Corte, em diversas manifestações de seu órgão plenário, afirmou a legitimidade da Taxa Referencial (TR) como índice de atualização de obrigações, com a única ressalva da inviabilidade de sua aplicação retroativa para alcançar situações pretéritas. Nesse sentido: ADI 493-MC, Rel. Min. MOREIRA ALVES, Tribunal Pleno, DJ de 4/9/1992; ADI 768-MC, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, DJ de 13/11/1992; ADI 959-MC, Rel. Min. SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, DJ de 13/5/1994.
2. Assim sendo, o exame da inaplicabilidade da TR em situações específicas pertence ao domínio da legislação ordinária pertinente a cada caso, a significar que eventual ofensa à Carta Magna seria apenas reflexa.
3. Portanto, é de natureza infraconstitucional a controvérsia relativa à aplicação da TR como índice de correção monetária dos depósitos efetuados em conta vinculada do FGTS, fundada na interpretação das Leis 7.730/89, 8.036/90 e 8.177/91.
4. É cabível a atribuição dos efeitos da declaração de ausência de repercussão geral quando não há matéria constitucional a ser apreciada ou quando eventual ofensa à Carta Magna ocorra de forma indireta ou reflexa (RE 584.608 RG, Min. ELLEN GRACIE, DJe de 13/03/2009).
5. Ausência de repercussão geral da questão suscitada, nos termos do art. 543-A do CPC.
(STF, ARE 848240 RG / RN - RIO GRANDE DO NORTE, REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Julgamento: 11/12/2014)

A reforçar que a aplicação da TR não fere ato jurídico perfeito, esclarecendo as condições de sua aplicação, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 454:


Pactuada a correção monetária nos contratos do SFH pelo mesmo índice aplicável à caderneta de poupança, incide a taxa referencial (TR) a partir da vigência da Lei n. 8.177/1991.
(Súmula 454 do STJ)

No mesmo sentido, o STJ proferiu, ainda, julgamento de Recurso Especial, pelo rito dos recursos repetitivos, como se pode observar:


1. Para os efeitos do art. 543-C do CPC:
1.1. No âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, a partir da Lei 8.177/91, é permitida a utilização da Taxa Referencial (TR) como índice de correção monetária do saldo devedor. Ainda que o contrato tenha sido firmado antes da Lei n.º 8.177/91, também é cabível a aplicação da TR, desde que haja previsão contratual de correção monetária pela taxa básica de remuneração dos depósitos em poupança, sem nenhum outro índice específico.
1.2. É necessária a contratação do seguro habitacional, no âmbito do SFH. Contudo, não há obrigatoriedade de que o mutuário contrate o referido seguro diretamente com o agente financeiro, ou por seguradora indicada por este, exigência esta que configura "venda casada", vedada pelo art. 39, inciso I, do CDC.
(REsp 969129 MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 09/12/2009, DJe 15/12/2009)

Ressalte-se que haveria um desequilíbrio no fluxo de caixa, caso os empréstimos feitos com recursos provenientes da poupança ou do FGTS fossem remunerados por índices diversos, como o INPC ou IPC.


Neste sentido é a jurisprudência desta Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:


CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. SFH. DIREITO À REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. RECURSO NÃO CONHECIDO NESTA PARTE. REAJUSTE DAS PRESTAÇÕES PELO PES/CP. MANTIDA SENTENÇA. LEGALIDADE DO ÍNDICE TR. OCORRÊNCIA. CORRETA FORMA DE AMORTIZAÇÃO DO SALDO DEVEDOR. OCORRÊNCIA. COBRANÇA DO PRÊMIO SEGURO. INEXISTÊNCIA DE ABUSIVIDADE. APLICAÇÃO DO CDC. OCORRÊNCIA. TEORIA DA IMPREVISÃO. INOCORRÊNCIA. APLICAÇÃO DO CES. SEM PREVISÃO CONTRATUAL.
1. (...).
3. O Supremo Tribunal Federal julgou procedente a ADI nº 493/DF, para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 18, "caput" e parágrafos 1 e 4; 20; 21 e parágrafo único; 23 e parágrafos; e 24 e parágrafos, todos da Lei n. 8.177, de 1 de maio de 1991. Assim, não houve proibição de ser utilizada a TR como índice de correção, mas apenas impedimento à aplicação da TR no lugar de índices de correção monetária estipulados em contratos antes da Lei nº 8.177/91.
4. Sendo estabelecido em contrato o índice aplicável às cadernetas de poupança, é legítima a utilização da TR como índice de correção monetária do saldo devedor, mesmo naqueles firmados anteriormente à vigência da Lei n. 8.177/91.
5. Verifica-se dos autos que o contrato foi firmado em 16/10/1991, devendo o saldo devedor ser corrigido mensalmente mediante a utilização do coeficiente de remuneração básica aplicável às contas vinculadas do FGTS, conforme cláusula sétima. Sendo assim, deve incidir a TR por força da Lei nº 8177/91, isto porque os recursos captados para a poupança são remunerados pela TR, bem como os saldos das contas vinculadas do FGTS, que passaram a ser corrigidos com o mesmo rendimento das contas de poupança com data de aniversário no primeiro dia de cada mês. Ressalte-se que haveria um desequilíbrio no fluxo de caixa, caso os empréstimos feitos com recursos provenientes da poupança ou do FGTS fossem remunerados por índices diversos, como o INPC ou IPC.
6. (...).
14. Agravo legal interposto pela parte autora parcialmente conhecido, e, na parte conhecida, negado provimento. Negado provimento ao agravo legal interposto pela Caixa Econômica Federal.
(TRF3, AC 00185639019994036100, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 139470, PRIMEIRA TURMA, Relator Desembargador Federal Hélio Nogueira, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/01/2015)

Plano de Equivalência Salarial, Coeficiente de Equiparação Salarial, Fundo de Compensação de Variações Salariais.


O Decreto-Lei 2.164/84 regulamentou, no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação, o Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional - PES/CP concebido como um critério para a atualização das prestações dos contratos de mútuo habitacional regulados pelas normas do SFH. A redação original de seu artigo 9º, caput, previa que o reajuste das prestações nestes contratos corresponderia ao mesmo percentual e periodicidade do aumento de salário da categoria profissional a que pertencesse o adquirente. O PES foi concebido para se aplicar ao reajuste das prestações, não guardando relação com os índices de correção monetária aplicáveis ao saldo devedor do contrato.


Pela redação original do Decreto-lei, havia um limitador que incidiria sempre que o aumento de salário de determinada categoria profissional superasse em mais de sete pontos percentuais a variação da Unidade Padrão de Capital - UPC, (artigo 9º, § 1º). A alteração da categoria profissional acarretaria a adaptação dos critérios de reajuste das prestações previstos no contrato à nova situação do adquirente, que deveria ser prévia e obrigatoriamente comunicada ao Agente Financeiro (artigo 9º, § 6º).


A Lei 8.004/90, por meio de seu artigo 22, alterou a redação do caput e de todos os parágrafos do artigo 9º do Decreto-Lei 2.164/84, afastando a utilização do UPC e do referido limitador, mas garantindo o direito ao mutuário de, a qualquer tempo, solicitar alteração de data-base nos casos de mudança da categoria profissional (artigo 9º, § 3º). A cláusula PES tem a intenção de preservar a proporção entre o valor da prestação e o salário do mutuário (artigo 9º, §5º) sendo seu ônus comprovar a não aplicação da cláusula ou requerer o recálculo da prestação diante da quebra da relação prestação/renda em virtude de fatores extracontratuais, como a mudança de categoria profissional. Não se trata de índice de correção monetária, e não se aplica, repita-se, à atualização do saldo devedor.


A Resolução do Conselho n. 36/69 do Banco Nacional da Habitação regulou o reajustamento das prestações no sistema financeiro da habitação e criou, propriamente dito, o plano de equivalência salarial. Esta resolução alterou critérios da RC nº 25/67 que criou o Fundo de Compensação de Variações Salariais. Deste modo, ao término do prazo contratual, e uma vez pagas todas as prestações a que se obrigara o mutuário, seria apurado o saldo residual porventura existente e o FCVS o liquidaria junto ao credor. Este saldo residual decorre das condições de amortização do contrato em contraste com a correção do saldo devedor.


Nesta esteira, a Resolução 36/69 criou o Coeficiente de Equiparação Salarial - CES, intimamente ligado ao PES, posteriormente regulado na Lei 8.692/93, para suprir prováveis disparidades entre a adoção de índices e periodicidades diversos na correção das prestações e do saldo devedor dos mutuários. A cobrança de valores a título do CES não está condicionada à vigência da Lei 8.692/93 se antes da sua aprovação havia previsão contratual para a sua cobrança. Em suma, o PES busca majorar o valor das prestações em harmonia com a evolução salarial do mutuário para garantir que a amortização do empréstimo seja bem sucedida.


Em condições normais, a amortização se completa no prazo estipulado, do contrário, subsistindo saldo residual, o FCVS assumiria a responsabilidade de cobrir os valores junto à instituição financeira. Esta, por sua vez, encerrado o prazo contratual e adimplidas as prestações do contrato, tem de certificar a quitação do contrato. A cobertura pelo FCVS, no entanto, não pode ser requerida se o mutuário está inadimplente em relação a prestações originalmente previstas em contrato e não relacionadas ao saldo residual.


O PES não é índice de correção monetária aplicável ao saldo devedor, o CES é um de seus instrumentos e sua cobrança é legítima mesmo antes da Lei 8.692/93, se prevista em contrato.


A corroborar os entendimentos acima expostos, cito jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região.


PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. PLANO DE EQUIVALÊNCIA SALARIAL. PES. REEXAME. SÚMULA N. 7/STJ.
1. O PES somente é aplicável no cálculo das prestações mensais a serem pagas pelo mutuário, sendo, portanto, incabível sua utilização como índice de correção monetária do saldo devedor dos contratos de mútuo regidos pelo SFH, o qual deverá ser atualizado segundo indexador pactuado pelas partes.
2. No caso concreto, a partir da análise do instrumento contratual que rege a relação havida entre as partes, o Tribunal a quo concluiu que os contratantes pactuaram a utilização da Taxa Referencial para a atualização do saldo devedor. A modificação dessa decisão é inviável na instância especial ante os obstáculos erigidos pelas Súmulas n. 5 e 7 do STJ.
(STJ, AgRg no AREsp 417096 / RJ, Agravo Regimental No Agravo Em Recurso Especial 2013/0356020-0, Quarta Turma, Relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, DJe 03/02/2015)

ADMINISTRATIVO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - SFH. FUNDO DE COMPENSAÇÃO DE VARIAÇÕES SALARIAIS - FCVS. AMORTIZAÇÃO. ANATOCISMO. TABELA PRICE. REVISÃO DE FATOS E PROVAS. SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. MATÉRIA JÁ DECIDIDA SOB O REGIME DO ART. 543-C DO CPC. TR. ATUALIZAÇÃO DO SALDO DEVEDOR. IMPOSSIBILIDADE, POIS NÃO PREVISTA A UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE DE CORREÇÃO APLICÁVEL À CADERNETA DE POUPANÇA. MATÉRIA JÁ DECIDIDA SOB O REGIME DO ART. 543-C DO CPC. LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS EM 10%. INEXIGIBILIDADE. MATÉRIA JÁ DECIDIDA SOB O REGIME DO ART. 543-C DO CPC. FORMA DE IMPUTAÇÃO DOS PAGAMENTOS MENSAIS. APLICAÇÃO, NA AUSÊNCIA DE ESTIPULAÇÃO CONTRATUAL EM OUTRO SENTIDO, DO CRITÉRIO PREVISTO NO CÓDIGO CIVIL. APLICAÇÃO DO COEFICIENTE DE EQUIPARAÇÃO SALARIAL - CES. CONTRATOS FIRMADOS ANTES DA LEI N. 8.692/93. APENAS NA HIPÓTESE DE EXPRESSA PREVISÃO NO AJUSTE. PRECEDENTES DO STJ. PLANO DE EQUIVALÊNCIA SALARIAL POR CATEGORIA PROFISSIONAL - PES/CP. COMPARAÇÃO DOS ÍNDICES DE FORMA ACUMULADA E LINEAR. PRECEDENTES DO STJ. VERIFICAÇÃO DE LEGALIDADE OU ABUSIVIDADE DA COBRANÇA DE SEGURO HABITACIONAL. VEDAÇÃO SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. PRECEDENTES DO STJ. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - CDC. INAPLICABILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. DECISÃO MONOCRÁTICA FUNDAMENTADA EM JURISPRUDÊNCIA DO STJ (ART. 557 DO CPC). RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. (...).
5. Quanto ao Coeficiente de Equiparação Salarial - CES, o STJ admite sua cobrança, inclusive nos contratos pactuados antes da Lei n. 8.692/93, desde que expressamente previsto, o que ocorreu na hipótese dos autos. Além disso, a análise da incidência do CES, se de acordo ou não com a previsão contratual, esbarra nas Súmulas n. 5 e 7 do STJ. Precedentes.
6. Por ocasião do julgamento do REsp n. 966.333/PR, realizado sob a relatoria da Ministra Denise Arruda, firmou-se o posicionamento nesta Corte de que a possibilidade de incidência do limitador deve ser verificada sempre que houver aumento salarial da categoria profissional do mutuário, adotando-se, no entanto, a seguinte técnica: (1º) apura-se a variação do limitador (UPC, IPC ou INPC, a depender da previsão contratual ou da legislação vigente) para o período em que o mutuário ficou sem aumento salarial; (2º) esse resultado, acrescido do percentual previsto na norma (+7% ou +0,5%, conforme o caso), deve ser comparado com o índice de variação salarial da categoria profissional do mutuário, prevalecendo o menor para fins de atualização do valor da prestação. Além disso, analisar se a aplicação do PES foi adequada incide no óbice das Súmulas n. 5 e 7 do STJ. Precedentes.
7. (...)
8. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que, nos contratos do Sistema Financeiro de Habitação, com cobertura do FCVS, como a hipótese dos autos, não se aplicam as regras do Código de Defesa do Consumidor. Portanto, como Código de Defesa do Consumidor não é aplicável ao contrato de mútuo habitacional, com vinculação ao FCVS, como no caso em apreço, descabe a restituição em dobro do pagamento indevido. Precedentes
9. Recurso especial não provido.
(STJ, Resp 201402302282, REsp - Recurso Especial - 1483061, Segunda Turma, Relator Mauro Campbell Marques, Dje Data:10/11/2014)

PROCESSO CIVIL - SFH - REVISÃO CONTRATUAL - ART. 50, LEI 10.931/2004 - INEPCIA AFASTADA - INOVAÇÃO DE PEDIDO NA FASE RECURSAL - IMPOSSIBILIDADE - CDC - PES - CES - TR - INVERSÃO NA FORMA DE AMORTIZAÇÃO - URV - ÍNDICE DE 84,32% - DECRETO-LEI 70/66 - CONSTITUCIONALIDADE.
1 - (...)
4 - Nos contratos de financiamento firmados em data anterior a 14 de março de 1990 (data da publicação da Lei 8.004/90), as cláusulas atinentes aos reajustes das prestações mensais encontram-se reguladas pelo Decreto-lei nº 2.164/84, que estabeleceu a atualização pelo Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional (PES/CP). Por esse sistema, as prestações mensais serão reajustadas no mesmo percentual e periodicidade do aumento de salário da categoria profissional a que pertencer o mutuário, mesmo em caso de alteração de categoria ou mudança de local de trabalho, ainda que não comunicada a tempo a instituição financeira.
5 - Nos termos da jurisprudência pacífica do STJ a cobrança do CES é legal, mesmo antes do advento da Lei 8.692/93, desde que previsto contratualmente.
(...)
12 - Apelação da parte autora desprovida. Apelação do réu parcialmente provida.
(TRF3, AC 00417959720004036100, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1256570, Quinta Turma, Relator Desembargador Federal Mauricio Kato, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/07/2015)

Código de Defesa do Consumidor, Contrato de Adesão, Teoria da Imprevisão


As instituições financeiras, enquanto pessoas jurídicas que prestam serviços de natureza bancária, financeira e de crédito mediante remuneração no mercado de consumo, enquadram-se no conceito de fornecedor do artigo 3º, caput e § 2º do CDC.


Anoto ser firme a jurisprudência dos egrégios Supremo Tribunal Federal (ADI 2591) e do Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 297) pela aplicabilidade dos princípios do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de mútuo bancário. Nestas condições, não há que se falar em ilegitimidade ativa do IDEC, já que não há contradição entre as suas finalidades estatutárias e a matéria discutida na presente ação.


Todavia, disso não decorre automática e imperativamente a nulidade de toda e qualquer cláusula tida como prejudicial ao interesse financeiro do consumidor, que firma livremente um contrato com instituição financeira. Mesmo nos casos em que se verifica o prejuízo financeiro, a nulidade pressupõe que o contrato ou cláusula contratual tenha imposto desvantagem exagerada ao consumidor (artigo 51, inciso IV, do CDC), ofendendo os princípios fundamentais do sistema jurídico, restringindo direitos ou obrigações inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio, ou se mostrando excessivamente onerosa para o consumidor, considerada a natureza e o conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso (artigo 51, parágrafo 1º, do CDC).


Cumpre ao autor, portanto, demonstrar as causas concretas e específicas do suposto abuso ou nulidade das cláusulas dos contratos em testilha. Cabe, ainda, ao autor, pretendendo a aplicação da teoria da imprevisão, demonstrar os fatos supervenientes à contratação que teriam tornado excessivamente oneroso o seu cumprimento, conforme o artigo 6º, inciso V, do Código de Defesa do Consumidor.


É de ressaltar que em matéria de contratos impera o princípio pacta sunt servanda, notadamente quando as cláusulas contratuais observam legislação meticulosa e quase sempre cogente. Também por essa razão, não se pode olvidar que o princípio rebus sic standibus, por definição, requer a demonstração de que não subsistem as circunstâncias fáticas que sustentavam o contrato, provocando o desequilíbrio que justificaria o pedido de revisão contratual.


Forma de Amortização


A atualização do saldo devedor anterior à subtração do valor da prestação vencida não é abusiva. Na realidade, configura mecanismo de remuneração do mutuante, sendo, portanto, inerente ao empréstimo de dinheiro, conforme o esclarecedor ensinamento de Edson de Queiroz Penna: "O raciocínio de que a amortização deve preceder o cálculo dos juros é muito singelo e não se sustenta. Após o decurso do primeiro mês, os juros são calculados sobre o valor do financiamento pelo período em que o capital ficou à disposição do tomador - um mês. Admitamos, para argumentar, que o mutuário do exemplo apresentado, após decorrido o prazo de um mês, opte por liquidar integralmente o financiamento pagando $ 11.255,08. Amortizando antes de calcular os juros, o saldo ficaria zerado e, portanto, não lhe seria cobrado nenhum valor a título de juros, mesmo tendo o capital ficado à sua disposição por um mês" (Tabela Price e a Inexistência de Capitalização, Porto Alegre/RS, Editora AGE, 2007, p. 81).


A propósito a Súmula 450, do Superior Tribunal de Justiça, exara o seguinte:


"Nos contratos vinculados ao SFH, a atualização do saldo devedor antecede sua amortização pelo pagamento da prestação".
(Súmula 450 do STJ)

A reforçar o entendimento, o STJ, em julgamento da Corte Especial pelo rito dos recursos especiais representativos de controvérsia, assentou que se aplica aos contratos do SFH a regra de imputação do artigo 354 do CC, segundo a qual, havendo capital e juros, o pagamento imputar-se-á primeiro nos juros vencidos, e depois no capital, salvo estipulação em contrário, ou se o credor passar a quitação por conta do capital.


SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - SFH. FORMA DE IMPUTAÇÃO DOS PAGAMENTOS MENSAIS. APLICAÇÃO, NA AUSÊNCIA DE ESTIPULAÇÃO CONTRATUAL EM OUTRO SENTIDO, DO CRITÉRIO PREVISTO NO CÓDIGO CIVIL.
1. Salvo disposição contratual em sentido diferente, aplica-se aos contratos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação a regra de imputação prevista no art. 354 do Código Civil de 2002, que reproduz o art. 993 do Código Civil de 1916 e foi adotada pela RD BNH 81/1969.
2. Recurso conhecido em parte e, nessa parte, provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08.
(REsp 1194402 / RS, RECURSO ESPECIAL 2010/0088776-9, Corte Especial, Relator Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 14/10/2011)

Capitalização de Juros. Anatocismo


Grande controvérsia envolve a interpretação e a aplicação das regras que disciplinam o anatocismo no Brasil. Não raro, defende-se que a legislação pátria proibiria a utilização de juros compostos, juros efetivos ou qualquer mecanismo que envolvesse "capitalização de juros".


Neste diapasão, estaria configurado o paroxismo de proibir conceitos abstratos de matemática financeira, prestigiando somente a aplicação de juros simples ou nominais, sem necessariamente lograr atingir uma diminuição efetiva dos montantes de juros remuneratórios devidos, já que a maior ou menor dimensão paga a este título guarda relação muito mais estreita com o patamar dos juros contratados que com a frequência com que são "capitalizados".


Em tempos modernos, a legislação sobre o anatocismo, ao mencionar "capitalização de juros" ou "juros sobre juros", não se refere a conceitos da matemática financeira ou a qualquer situação pré-contratual, os quais pressupõem um regular desenvolvimento da relação contratual. Como conceito jurídico, as restrições a "capitalização de juros" ou "juros sobre juros" disciplinam as hipóteses em que, já vigente o contrato, diante do inadimplemento, há um montante de juros devidos, vencidos e não pagos que pode ou não ser incorporado ao capital para que incidam novos juros sobre ele.


Em outras palavras, na data em que vencem os juros, pode haver pagamento e não ocorrerá "capitalização", em sentido jurídico estrito. Na ausência de pagamento, porém, pode haver o cômputo dos juros vencidos e não pagos em separado, ou a sua incorporação ao capital/saldo devedor para que incidam novos juros. Apenas nesta última hipótese pode-se falar em "capitalização de juros" ou anatocismo para efeitos legais.


A ilustrar a exegese, basta analisar o texto do artigo 4º do Decreto 22.626/33, conhecido como "Lei de Usura":


Art. 4º. E proibido contar juros dos juros: esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano.

Se a redação da primeira parte do dispositivo não é das mais cuidadosas, a segunda parte é suficiente para que delimitar o alcance do conceito e afastar teses das mais variadas em relação à proibição do anatocismo.


Feitas tais considerações, é de se ressaltar que não há no ordenamento jurídico brasileiro proibição absoluta para a "capitalização de juros" (vencidos e não pagos). As normas que disciplinam a matéria, quando muito, restringiram a possibilidade de capitalização de tais juros em prazo inferior a um ano. Desde o Artigo 253 do Código Comercial já se permitia a capitalização anual, proibindo-se a capitalização em prazo inferior, restrição que deixou de existir no texto do artigo 1.262 do Código Civil de 1916. O citado artigo 4º do Decreto 22.626/33, conhecido como "Lei de Usura", retoma o critério da capitalização anual.


A mens legis do art. 4º do Decreto 22.626/33, ao restringir a capitalização nestes termos, é evitar que a dívida aumente em proporções não antevistas pelo devedor em dificuldades ao longo da relação contratual. O dispositivo não guarda qualquer relação com o processo de formação da taxa de juros, como a interpretação meramente literal e isolada de sua primeira parte poderia levar a crer. Neste sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (Segunda Seção, EREsp. 917.570/PR, relatora Ministra Nancy Andrighi, DJe 4.8.2008 e REsp. 1.095.852-PR, de minha relatoria, DJe 19.3.2012).


Deste modo, tem-se o pano de fundo para se interpretar a Súmula 121 do STF:


É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada.
(Súmula 121 do STF)

A súmula veda a capitalização de juros mesmo quando convencionada. Veda a capitalização de juros (vencidos e não pagos), mesmo quando convencionada (em período inferior ao permitido por lei).


A Súmula 596 do STF, mais recente e abordando especificamente o caso das instituições financeiras, por sua vez, prevê:


As disposições do Decreto 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional.
(Súmula 596 do STF)

A jurisprudência diverge quanto ao alcance da Súmula 596 do STF no que diz respeito ao anatocismo. De toda sorte, a balizar o quadro normativo exposto, o STJ editou a Súmula 93, segundo a qual a legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite o pacto de capitalização de juros.


Em outras palavras, nestas hipóteses admite-se a capitalização de juros vencidos e não pagos em frequência inferior à anual, nos termos da legislação específica. As normas legais que disciplinam cada tipo de financiamento passaram a ser um critério seguro para regular o anatocismo.


Deste modo, mesmo ao não se considerar como pleno o alcance da Súmula 596 do STF, há na legislação especial do Sistema Financeiro da Habitação autorização expressa para a capitalização mensal de juros desde a edição da Lei 11.977/09 que incluiu o Artigo 15-A na Lei 4.380/64.


Há que se considerar, ainda, que desde a MP 1.963-17/00, com o seu artigo 5º reeditado pela MP 2.170-36/01, já existia autorização ainda mais ampla para todas as instituições do Sistema Financeiro Nacional. A consequência do texto da medida provisória foi permitir, como regra geral para o sistema bancário, não apenas o regime matemático de juros compostos, mas o anatocismo propriamente dito.


O Supremo Tribunal Federal entendeu que não há inconstitucionalidade na MP 2.170-36/01 em razão de seus pressupostos:


CONSTITUCIONAL. ART. 5º DA MP 2.170/01. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA EDIÇÃO DE MEDIDA PROVISÓRIA. SINDICABILIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. ESCRUTÍNIO ESTRITO. AUSÊNCIA, NO CASO, DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA NEGÁ-LOS. RECURSO PROVIDO.
1. A jurisprudência da Suprema Corte está consolidada no sentido de que, conquanto os pressupostos para a edição de medidas provisórias se exponham ao controle judicial, o escrutínio a ser feito neste particular tem domínio estrito, justificando-se a invalidação da iniciativa presidencial apenas quando atestada a inexistência cabal de relevância e de urgência.
2. Não se pode negar que o tema tratado pelo art. 5º da MP 2.170/01 é relevante, porquanto o tratamento normativo dos juros é matéria extremamente sensível para a estruturação do sistema bancário, e, consequentemente, para assegurar estabilidade à dinâmica da vida econômica do país.
3. Por outro lado, a urgência para a edição do ato também não pode ser rechaçada, ainda mais em se considerando que, para tal, seria indispensável fazer juízo sobre a realidade econômica existente à época, ou seja, há quinze anos passados.
4. Recurso extraordinário provido.
(STF, RE 592377 / RS - RIO GRANDE DO SUL, RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. TEORI ZAVASCKI, 04/02/2015)

Ressalte-se que tanto a legislação do SFN quanto a do SFH são especiais em relação à Lei de Usura e às normas do Código Civil.

A reforçar todo o entendimento anteriormente exposto, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 539, nos seguintes termos:

É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.
(Súmula 539 do STJ)

Em suma, não ocorre anatocismo em contratos de mútuo pela simples adoção de sistema de amortização que se utilize de juros compostos. Tampouco se vislumbra o anatocismo pela utilização de taxa de juros efetiva com capitalização mensal derivada de taxa de juros nominal com capitalização anual, ainda quando aquela seja ligeiramente superior a esta. Por fim, a capitalização de juros devidos, vencidos e não pagos é permitida nos termos autorizados pela legislação e nos termos pactuados entre as partes.

Apenas com a verificação de ausência de autorização legislativa especial e de previsão contratual, poderá ser afastada a capitalização de juros devidos, vencidos e não pagos em prazo inferior a um ano. Nesta hipótese, em se verificando o inadimplemento de determinada prestação, a contabilização dos juros remuneratórios não pagos deve ser realizada em conta separada, sobre a qual incidirá apenas correção monetária, destinando-se os valores pagos nas prestações a amortizar primeiramente a conta principal. O mesmo procedimento, não condicionado a autorização legislativa ou contratual, poderá ser adotado em se verificando a configuração sistemática de amortizações negativas na gestão do contrato.

Sistema de Amortização Constante (SAC), Sistema de Amortização Crescente (Sacre), Sistema Francês de Amortização (SFA ou Tabela Price)


O contrato de mútuo é um dos cernes da atividade empresarial praticada pelas instituições financeiras pela qual ofertam quantia em dinheiro em troca de remuneração por juros. Ao efetivar pagamentos parcelados, o mutuário tem de realizar o reembolso do capital que inicialmente lhe foi disponibilizado, além de remunerar o mutuante por meio de juros incidentes em função do tempo necessário para que a dívida seja extinta.


Três são os sistemas de amortização que são utilizados com mais frequência pelas instituições financeiras para operacionalizar a atividade: SAC, Sacre e Price.


A adoção do SAC adota amortização constante, mas para tanto trabalha com prestações variáveis, inicialmente mais altas e decrescentes ao longo do tempo, compreendendo uma quantia decrescente paga a título de juros a cada prestação, e uma quantia total menor paga a título de juros remuneratórios em relação ao Sistema Francês de Amortização.


A Tabela Price, por sua vez, trabalha com prestações constantes, inicialmente menores se comparadas ao SAC e ao Sacre, e amortização variada, crescente em condições regulares. A cada prestação adimplida é reduzida a quantia paga a título de juros remuneratórios, na medida em que diminui o saldo devedor.


O Sacre combina características dos sistemas anteriores. As prestações também são variáveis, inicialmente mais altas, decrescendo por meio de patamares constantes e periódicos. A amortização, por sua vez, é crescente. A parcela paga a título de juros é reduzida de forma progressiva. O Sacre é o sistema pelo qual se paga o menor montante de juros, mas as parcelas iniciais são maiores que no SAC.


Se considerados de maneira isolada, supondo o desenvolvimento regular da relação obrigacional, não é possível pressupor que a escolha de qualquer desses sistemas implique em desequilíbrio econômico-financeiro, enriquecimento ilícito ou qualquer ilegalidade, cada qual possuindo uma configuração própria de vantagens e desvantagens.


É certo que a utilização da Tabela Price implica no pagamento de uma quantia total maior a título de juros, mas essa desvantagem é decorrência da utilização de uma prestação constante e inicialmente inferior a que é utilizada no SAC e no Sacre. As regras da Tabela Price não guardam qualquer relação com o anatocismo, que, como já exposto anteriormente, diz respeito à incorporação ao saldo devedor dos juros vencidos e não pagos.


Como se vê a sua utilização, não implica, de per si, qualquer irregularidade, sendo ônus da parte Autora demonstrar a ocorrência de outros fatores, que, aliados a este sistema de amortização, supostamente provocaram desequilíbrio contratual. É de se ressaltar que mesmo nos contratos que se desenvolvem com uma grande disparidade entre os índices de correção monetária e os reajustes salariais do mutuário, em regra, há a previsão de cobertura pelo fundo de compensação de variações salariais que garantem o equilíbrio econômico financeiro da relação obrigacional.


O mero inadimplemento, reforçado por uma interpretação meramente literal e assistemática da Lei de Usura que questiona a própria lógica dos sistemas de amortização, não é favorável aos direitos do consumidor, ao princípio da transparência e à segurança jurídica, nem é suficiente para obter a revisão de contrato realizado dentro dos parâmetros legais.


PROCESSO CIVIL - SFH - REVISÃO CONTRATUAL - LEI 4.380/64 - LEI ORDINÁRIA - SACRE - JUROS - ANATOCISMO.
1 - (...).
2 - Não há nenhuma ilegalidade na adoção do Sistema de Amortização Crescente - SACRE, até porque referido sistema pressupõe a criação de uma planilha com uma taxa de juros previamente estabelecida e amortização progressiva do saldo devedor.
3 - A diferença de taxa de juros nominal e efetiva decorre do sistema de amortização eleito entre as partes que implica, na prática, o cálculo de juros sobre juros. Os juros embutidos nas prestações mensais, porém, não caracterizam anatocismo vedado por lei, já que esse método de cálculo define o valor das prestações destinadas à amortização do financiamento, mediante a aplicação de determinada taxa de juros e em certo prazo, com capitalização de juros que não encontra óbice na legislação vigente. A ocorrência de amortização negativa não constitui qualquer irregularidade, uma vez que provém de pagamento de valor de prestação que não se mostra suficiente sequer à quitação dos juros devidos.
4 - Apelação desprovida.
(TRF3, AC 00029879620094036103, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1753160, Relator Desembargador Federal Mauricio Kato, Quinta Turma, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/12/2015)

CIVIL - ALTERAÇÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL - CORREÇÃO MENSAL DAS PARCELAS PELO IPC A PARTIR DE JULHO DE 1994 - CORREÇÃO DO SALDO DEVEDOR PELA TR - PLANO REAL - SISTEMA FRANCÊS DE AMORTIZAÇÃO - APLICAÇÃO DO CDC - REDUÇÃO DO PLANO MENSAL DO SEGURO - RECURSO IMPROVIDO - SENTENÇA MANTIDA.
(...)
9. Não se vislumbra qualquer ilegalidade na adoção do Sistema Francês de Amortização - SFA ou Tabela Price, para regular o contrato de mútuo em questão. Trata-se de um sistema de amortização de dívida em prestações periódicas, iguais e sucessivas, cujo valor de cada prestação é composto de uma parcela de capital (amortização) e outra de juros, como previsto no art. 6º, "c", da Lei 4380/64.
10. Esse tipo de amortização, ademais, não acarreta incorporação de juros ao saldo devedor, já que os juros são pagos mensalmente, juntamente com as prestações, não havendo qualquer possibilidade de ocorrer anatocismo.
(...)
(TRF3, AC 00505420719984036100, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 882073, QUINTA TURMA, JUIZ CONVOCADO HELIO NOGUEIRA, e-DJF3 Judicial 2 DATA:13/01/2009)

CIVIL. SFH. PRESTAÇÕES. PES/CP. CES - COEFICIENTE DE EQUIPARAÇÃO SALARIAL. LEI Nº 8.692/93. REAJUSTES CONTRATUAIS. PLANOS ECONÔMICOS. CDC. NORMAS APLICÁVEIS AO CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. TR. SUBSTITUIÇÃO PELO INPC. SALDO DEVEDOR. CORREÇÃO. AMORTIZAÇÃO. LEI Nº 4.380/64. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. DL 70/66. JUROS. CAPITALIZAÇÃO. SEGURO. RECURSO DE APELAÇÃO IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.
(...)
Diversamente do que em geral acontece nos contratos de mútuo, os regidos pelo Sistema Financeiro da Habitação encontram previsão legal de amortização mensal da dívida, como se dessume do art. 6º, "c", da Lei n. 4.380/1964. Dessa disposição decorre para as instituições operadoras dos recursos do SFH a possibilidade de utilização da Tabela Price - bem como da SACRE e da SAC (atualmente os três sistemas mais praticados pelos bancos) - para o cálculo das parcelas a serem pagas, tendo em vista que, por esse sistema de amortização, as prestações são compostas de um valor referente aos juros e de um outro, referente à própria amortização. Os três sistemas importam juros compostos, que todavia encontram previsão contratual e legal, sem qualquer violação a norma constitucional. A capitalização de juros, quando prevista contratualmente, como no caso, tendo sido fixada a taxa de juros efetiva, não importa desequilíbrio entre os contratantes, que sabem o valor das prestações que serão pagas a cada ano.
(...)
Recurso de apelação improvido. Sentença mantida.
(TRF3, AC 00050589020034036100, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1570053, QUINTA TURMA, JUIZ CONVOCADO PAULO PUPO, e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/03/2012)

Amortização Negativa


Como já exposto nessa decisão, nos contratos de mútuo regidos pelas regras do SFH, a cláusula que prevê a aplicação do Plano de Equivalência Salarial tem o escopo de reajustar os valores das prestações do financiamento, não se confundindo com a correção monetária do saldo devedor.


Por serem distintos os critérios de reajuste e os de correção, as condições de amortização nem sempre se desenvolvem nos termos inicialmente previstos no contrato. Se os critérios fossem semelhantes, a extinção da dívida, supondo o adimplemento regular das prestações, seria total ao término das prestações contratadas. Esta constatação reforça o entendimento de que a utilização de um determinado sistema de amortização, como a Tabela Price, por si só, não configura anatocismo.


Se o reajuste da prestação, pela aplicação do PES, for sistematicamente superior à correção do saldo devedor, configura-se uma situação favorável à parte Autora, já que ocorreria uma amortização mais rápida da dívida e menor montante seria pago a título de juros ao término do contrato.


O patamar de reajuste das prestações e o de correção do saldo devedor também pode oscilar, sem que se possa concluir de antemão que essa oscilação necessariamente vá criar desequilíbrio contratual.


Se, no entanto, o reajuste da prestação for sistematicamente inferior à correção do saldo devedor, configura-se a hipótese de amortização negativa, na qual o valor da prestação não é suficiente para pagar os juros mensais e amortizar o capital, com o potencial de majorar o saldo devedor de maneira insustentável. Esta situação não se confunde com o anatocismo em sentido estrito, que diz respeito à incorporação ao saldo devedor de juros devidos e não pagos, já que a amortização negativa pode acontecer ainda que o devedor não deixe de pagar nenhuma das prestações contratadas.


Ainda que não seja consequência de inadimplemento, a configuração sistemática da amortização negativa se assemelha a do anatocismo em sentido estrito, já que na ausência de amortização do capital, valores devidos a título de juros remuneratórios "não pagos", apenas em decorrência do desequilíbrio exposto, são incorporados ao saldo devedor para nova incidência de juros.


Quando a amortização negativa acontece apenas de modo pontual, pode ser considerada consequência corriqueira do contrato de mútuo formulado em condições regulares. Caso, todavia, ocorra sistematicamente, deve ser afastada sob pena de aumentar desproporcionalmente o saldo devedor e eternizar a obrigação.


Para tanto, é crucial levar em consideração se o contrato possui ou não a cláusula do FCVS. Na hipótese positiva, por paradoxal que possa parecer à primeira vista, a existência de um grande saldo residual decorrente das amortizações negativas é pouco relevante para o mutuário que paga regularmente as prestações devidas, já que a responsabilidade pela sua cobertura será do fundo. Neste sentido, por exemplo, a decisão que reconhece a aplicação incorreta da cláusula PES determinando a revisão do contrato para majorar as prestações pode, inclusive, prejudicar o mutuário, que estaria desincumbido da obrigação após pagar, com valor menor, o número de prestações inicialmente contratadas. Se houver no contrato a previsão de cobertura do saldo residual pelo FCVS, haverá interesse do mutuário em obter o afastamento da amortização negativa, caso, por exemplo, reste configurado o vencimento antecipado da dívida.


Na ausência de previsão da cobertura pelo FCVS, porém, o mutuário será o responsável pelo pagamento do saldo residual. Neste caso é nítido o seu interesse em afastar a possível sistemática amortização negativa no contrato. A questão depende de prova e é ônus da parte Autora.


Neste sentido, é a jurisprudência do STJ e deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região:


PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. FCVS. LANÇAMENTO DOS JUROS NÃO-PAGOS EM CONTA SEPARADA, COMO MEIO DE SE EVITAR A CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. POSSIBILIDADE.
1. A utilização do Sistema Francês de Amortização (Tabela Price) pode ensejar a cobrança de juros sobre juros, como, por exemplo, na hipótese de amortização negativa do saldo devedor.
2. Tal situação é explicada pelo descompasso existente entre a correção monetária do saldo devedor, normalmente com base nos índices aplicáveis à caderneta de poupança, e a atualização das prestações mensais, nos moldes definidos no Plano de Equivalência Salarial - PES -, ou seja, de acordo com a variação salarial da categoria profissional do mutuário. Nessa sistemática, o valor da prestação, freqüentemente corrigido por índices inferiores aos utilizados para a atualização do saldo devedor, com o passar do tempo, tornava-se insuficiente para amortizar a dívida, já que nem sequer cobria a parcela referente aos juros. Em conseqüência, o residual de juros não-pagos era incorporado ao saldo devedor e, sobre ele, incidia nova parcela de juros na prestação subseqüente, em flagrante anatocismo. A essa situação deu-se o nome de amortização negativa.
3. Diante desse contexto, os Tribunais pátrios passaram a determinar que o quantum devido a título de juros não-pagos fosse lançado em uma conta separada, sujeita somente à correção monetária, tal como ocorreu na hipótese dos autos.
4. (...)
8. Agravo regimental desprovido.
(STJ, AGRESP 200701182862, AGRESP - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - 954113, PRIMEIRA TURMA, DENISE ARRUDA, DJE DATA:22/09/2008)

CIVIL. ADMINISTRATIVO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. SEGURO HABITACIONAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. PRESCRIÇÃO. TABELA PRICE OU SISTEMA FRANCÊS DE AMORTIZAÇÃO - SFA. LEGITIMIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. COBERTURA.
1. (...)
3. A mera adoção do Sistema Francês de Amortização - SFA, também conhecido por Tabela Price, nos contratos regulados pelos Sistema Financeiro da Habitação não é ilegítima. O Sistema de Amortização Francês ou Tabela Price não enseja, por si só, incorporação de juros ao saldo devedor, uma vez que os juros são mensalmente pagos com as prestações, de modo a impossibilitar o anatocismo e acarretar, ao longo do tempo, o equilíbrio financeiro inicial do contrato. É ônus do mutuário demonstrar a incidência de juros sobre juros, com o aporte de juros remanescentes decorrentes de amortizações negativas para o saldo devedor. (...)
5. Matéria preliminar rejeitada, apelação da Caixa Econômica Federal - CEF parcialmente provida e recurso da Caixa Seguradora S/A não provido.
(TRF3, AC 00153685820034036100, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1711569, QUINTA TURMA, Relator DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/06/2013)

Execução Extrajudicial, Decreto-lei 70/66


O procedimento próprio previsto pelo Decreto-lei 70/66 garante ao devedor a defesa de seus interesses ao prever a notificação para a purgação da mora (artigo 31, § 1º), não sendo incomum, mesmo nessa fase, que o credor proceda à renegociação das dívidas de seus mutuários, ainda que não tenha o dever de assim proceder.


Não é negado ao devedor o direito de postular perante o Poder Judiciário a revisão do contrato e a consignação em pagamento antes do inadimplemento, ou, mesmo com a execução em curso, o direito de apontar irregularidades na observância do procedimento em questão que tenham inviabilizado a sua oportunidade de purgar a mora.


Em razão disso, entendo que o referido decreto-lei é compatível com as normas constitucionais que tratam do devido processo legal. Ademais, a matéria é objeto de ampla e pacífica jurisprudência nesta Corte, em consonância com o entendimento ainda dominante no Supremo Tribunal Federal, segundo o qual o Decreto-lei nº. 70/66 foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988.


CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL.
"Agravo regimental em agravo de instrumento.
2. Decreto-Lei no 70/66. Recepção pela Constituição Federal de 1988. Precedentes.
3. Ofensa ao artigo 5º, I, XXXV. LIV e LV, da Carta Magna. Inocorrência.
4. Agravo regimental a que se nega provimento ".
(AI-Agr 600876/DF, Relator Min. GILMAR MENDES, DJ 23/02/2007, p. 30).

"EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. DECRETO-LEI N° 70/66. CONSTITUCIONALIDADE.
Compatibilidade do aludido diploma legal com a Carta da República, posto que, além de prever uma fase de controle judicial, conquanto a posteriori, da venda do imóvel objeto da garantia pelo agente fiduciário, não impede que eventual ilegalidade perpetrada no curso do procedimento seja reprimida, de logo, pelos meios processuais adequados. Recurso conhecido e provido". (RE 223075/DF, Relator Min. ILMAR GALVÃO, DJ 06/11/1998, p. 22).

No tocante ao regramento do Decreto-lei 70/66, é corriqueira a alegação de irregularidade na execução em virtude da escolha unilateral do agente fiduciário pela mutuante, a qual, todavia, não se baseia em previsão legal ou contratual. A exigência de notificação pessoal se restringe ao momento de purgação da mora, não se aplicando às demais fases do procedimento. Mesmo nesta hipótese, quando o devedor se encontrar em lugar incerto ou não sabido, é possível a notificação por edital, nos termos do artigo 31, § 2º do Decreto-lei 70/66.


É de se salientar que o pedido de suspensão ou anulação de atos relativos ao procedimento de execução extrajudicial com base em irregularidades procedimentais deve ser acompanhado da demonstração pelo devedor de que foi frustrada a sua intenção de purgar a mora, a qual permitiria o prosseguimento regular da relação obrigacional.


A mera existência de ação revisional não garante a suspensão da execução pelas regras do Decreto-lei 70/66, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento pelo rito dos recursos repetitivos, assentou que, para tanto, a discussão deve se fundar em jurisprudência consolidada do STF ou STJ (fumus boni iuris). Estes mesmos critérios valem para a proibição da inscrição/manutenção dos nomes dos mutuários em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, sendo necessário, ainda, o depósito da parcela incontroversa ou de caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz.


A execução ficará suspensa, bem como a possibilidade de incluir o nome dos mutuários em cadastro de proteção ao crédito, no entanto, se existir decisão, notadamente se constituir título executivo judicial, prevendo a revisão de cláusulas do contrato ou que reconheça a aplicação irregular das mesmas. A suspensão nessas condições tem o intuito de garantir a eficácia da decisão e proteger a coisa julgada, quando for o caso.


RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. JULGAMENTO NOS MOLDES DO ART. 543-C DO CPC. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL DE QUE TRATA O DECRETO-LEI Nº 70/66. SUSPENSÃO. REQUISITOS. CADASTROS DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO. MANUTENÇÃO OU INSCRIÇÃO. REQUISITOS.
1. Para efeitos do art. 543-C, do CPC:
1.1. Em se tratando de contratos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, a execução extrajudicial de que trata o Decreto-lei nº 70/66, enquanto perdurar a demanda, poderá ser suspensa, uma vez preenchidos os requisitos para a concessão da tutela cautelar, independentemente de caução ou do depósito de valores incontroversos, desde que: a) exista discussão judicial contestando a existência integral ou parcial do débito; b) essa discussão esteja fundamentada em jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal (fumus boni iuris).
1.2. Ainda que a controvérsia seja relativa a contratos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, "a proibição da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: i) houver ação fundada na existência integral ou parcial do débito; ii) ficar demonstrado que a alegação da cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii) for depositada a parcela incontroversa ou prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz".
2. Aplicação ao caso concreto:
2.1. Recurso especial prejudicado, diante da desistência do autor na ação principal.
(STJ, REsp 200801159861, RESP - RECURSO ESPECIAL - 1067237, SEGUNDA SEÇÃO, Relator LUIS FELIPE SALOMÃO, DJE DATA:23/09/2009)

No caso em tela, não se cogita que a sentença tenha sido proferida ultra petita referente aos limites dos pedidos formulados, os quais, ademais, não poderiam antever minuciosamente os critérios a serem adotados pelo juízo a quo ao acolher parcialmente o pleito dos autores.


No mérito, é de se destacar que houve a realização de perícia técnica contábil (fls. 2633/2665, 2861/2863). Ao se considerar o conjunto probatório constante nos autos, bem como os entendimentos anteriormente expostos, é de rigor reconhecer o pedido para que as dívidas dos mutuários ligados à parte Autora sejam revistas pela aplicação do PES, mediante requerimento do mutuário com a comprovação da categoria profissional a que pertence, sem prejuízo de outros meios que possam demonstrar sua evolução salarial a serem apresentados e avaliados administrativamente ou em sede de execução de sentença.


Quanto aos demais pedidos, para os contratos firmados antes de 31/03/2000, ou para aqueles que foram firmados em data posterior, mas que não tem previsão de capitalização de juros em periodicidade inferior à anual, nos termos da Súmula 539 do STJ, a dívida dos mutuários deverá ser revista observando-se que a contabilização dos juros remuneratórios não pagos, em decorrência de inadimplemento ou de amortização negativa, deverá ser feita em conta separada, sobre a qual incidirá apenas correção monetária pelo período de um ano, destinando-se os valores pagos nas prestações a amortizar primeiramente a conta principal. Os juros de mora deverão incidir somente sobre a quantia referente à amortização do capital. A compensação do saldo devedor ou a eventual repetição do indébito deverá ser apurada em sede de execução de sentença. É válida a cláusula que prevê a execução pelo rito do Decreto-lei 70/66, sua eficácia, no entanto, ficará suspensa enquanto pendente a execução do julgado, considerando o parcial provimento dos pedidos ora reconhecidos.


Prejudicada a apelação da Transcontinental Empreendimentos quanto à imposição de multa, tendo em vista que foi afastada a tutela concedida pelo próprio juízo a quo. Deixo de fixar multa por atraso no cumprimento da sentença, sem prejuízo de que a medida possa ser adotada em sede de execução se assim entender pertinente o juízo de origem. Eventuais divergências quanto às informações apresentadas ou aos cálculos realizados pelas rés deverão ser dirimidas pelas vias corriqueiras em liquidação e execução de sentença. Mantida a sentença no tocante às verbas sucumbenciais.


Por fim, destaco que a decisão proferida STF no RE 573.232-SC em regime de repercussão geral tampouco tem o condão de atingir a legitimidade ativa do IDEC. Eventuais divergências quanto ao alcance da representação para efeitos de execução do julgado deverão ser dirimidas em momento oportuno naquela fase processual.


Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da Transcontinental Empreendimentos e dou parcial provimento à apelação da CEF e outros para reconhecer a regularidade dos índices de atualização monetária previstos em contrato para a atualização das dívidas, bem como a validade das cláusulas que preveem a execução pelo rito do Decreto-lei 70/66, suspensa sua eficácia enquanto pendente a execução do julgado, dou parcial provimento à apelação da parte Autora para alterar a forma de contabilização dos juros remuneratórios não pagos, em decorrência de inadimplemento ou de amortização negativa, nos termos anteriormente apontados, garantida a revisão dos reajustes das prestações pela aplicação do PES, na forma da fundamentação acima.


É o voto.


VALDECI DOS SANTOS
Desembargador Federal


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