D.E. Publicado em 26/09/2018 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, indeferir parcialmente a inicial, em relação à hipótese de rescisão do julgado prevista no inciso VI, do artigo 485 do CPC/1973; e, em juízo rescindendo, julgar improcedente a presente ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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Data e Hora: | 14/09/2018 16:40:15 |
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RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de ação rescisória proposta por JOSE ROBERTO RONCHI em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, com fundamento no artigo 485, VI, VII e IX, do CPC/1973, objetivando rescindir acórdão proferido pela 8ª Turma deste e. Tribunal, a fim de que seja restabelecida sua aposentadoria por tempo de contribuição, mediante reconhecimento de vínculo empregatício no período de 01.10.1968 a 09.09.1977.
Aduziu que o julgado rescindendo se fundou em prova falsa e incorreu em erro de fato, pois, segundo deduziu, referido vínculo empregatício seria verídico. Sustentou a existência de prova nova, consistente na sentença absolutória em processo criminal, na qual se reconheceu restar provada a inexistência do fato.
À fl. 457, foram deferidos ao autor os benefícios da assistência judiciária.
Citado (fls. 460-461), o réu apresentou contestação, às fls. 463-478, alegando, em preliminar, a ausência de interesse de agir e a inépcia da inicial em relação às hipóteses rescindendas relativas à prova falsa e erro de fato. No mérito, sustentou a inexistência de prova falsa, erro de fato ou documento novo, bem como que a absolvição na esfera criminal não implica na comprovação do vínculo empregatício, haja vista a inexistência de início de prova material.
O autor ofereceu réplica (fl. 481-487).
À fl. 489, foram rejeitadas as preliminares suscitadas, dando-se por saneado o feito, tendo sido oportunizada a apresentação de razões finais, juntadas pelas partes, às fls. 490 e 492-498.
O Ministério Público Federal opinou pelo reconhecimento da inépcia da inicial quanto à hipótese rescindenda de prova falsa e, em relação às demais, pela improcedência da ação rescisória (fls. 500-506).
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, verifico que a presente demanda foi ajuizada em 26.03.2013, observado o prazo decadencial previsto no artigo 495 do CPC/1973, dada o trânsito em julgado no processo originário ocorrido em 28.11.2012 (fl. 452).
Acolho a preliminar de inépcia da inicial por falta de causa de pedir em relação à hipótese de rescisão do julgado prevista no inciso VI, do artigo 485, do CPC/1973, uma vez que foi apena citado como fundamento (fl. 14), sendo que a narrativa da inicial se dedica apenas ao reconhecimento do erro de fato e da existência de documento novo para fins de rescisão do julgado.
O autor, portanto, fundamenta a ação rescisória no artigo 485, VII e IX, do CPC/1973, sob a alegação de ocorrência de erro de fato, eis que, no seu entender, os documentos e depoimentos de testemunhas constantes da ação subjacente seriam suficientes à comprovação do vínculo empregatício no período de 01.10.1968 a 09.09.1977, em estabelecimento comercial de sua família. Ainda, sustentou a existência de prova nova, consistente na sentença absolutória em processo criminal relativo à apuração de ocorrência do crime de estelionato para obtenção de benefício previdenciário, no qual se reconheceu restar provada a inexistência do fato. Requereu, portanto, o restabelecimento de sua aposentadoria por tempo de contribuição, haja vista que a suposta inexistência do referido vínculo deu ensejo à revisão do ato concessório na via administrativa, implicando a cessação do benefício.
A fim de melhor retratar a situação tratada nesta demanda rescisória, faço uma síntese do quanto ocorrido no procedimento administrativo, no processo criminal e na demanda subjacente.
DO PROCEDIMENTO DE REVISÃO ADMINISTRATIVA (fls. 130-220/277-294)
Em 03.11.1998, o autor requereu, na APS 21.710.002 (Vila Mariana III), a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição (n.º 110.050.758-0). Embora não conste cópia dos autos do procedimento concessório, verifica-se que o benefício foi concedido, apurando-se tempo de contribuição no total de 30 (trinta) anos e 28 (vinte e oito) dias, considerando-se dois vínculos empregatícios (fl. 147): constante da CTPS n.º 057352, série 635ª, emitida em 15.06.1968, período de 01.10.1968 a 09.09.1977, como balconista, no estabelecimento "Rubens Armazém Secos e Molhados Ltda.", sito à Rua Jordânia, s/n, SP/SP; constantes das CTPS's n.ºs 057352, série 635ª, emitidas em 03.05.1979 e 02.05.1986, período de 15.09.1977 a 03.11.1998, como analista de sistemas do BANESPA. Tendo em vista expressa desistência do segurado, cuja cópia também não se encontra nos autos do procedimento administrativo de revisão, o benefício foi cessado (fl. 153).
Em 21.01.1999, o autor pleiteou novamente o benefício (n.º 110.841.706-7), agora na APS 21.710.004 (Vila Mariana III). Também não consta cópia dos autos do respectivo processo concessório, contudo observa-se que o benefício foi concedido, apurando-se tempo de contribuição no total de 30 (trinta) anos, 3 (três) meses e 16 (dezesseis) dias, considerando-se dois vínculos empregatícios (fl. 132): constante da CTPS n.º 002380, série 10ª, emitida em 10.10.1968, período de 01.10.1968 a 09.09.1977, como auxiliar balconista, no estabelecimento "Rubens Armazém Secos e Molhados SC Ltda.", sito à Rua Jordânia, s/n, SP/SP; constantes das CTPS's n.ºs 057352, série 635ª, emitidas em 03.05.1979 e 02.05.1986, período de 15.09.1977 a 21.01.1999, como auxiliar escriturário do BANESPA.
Requisitada a realização de diligência administrativa para verificação da existência do vínculo empregatício no período de 01.10.1968 a 09.09.1977, esta resultou negativa, uma vez que o auditor fiscal não logrou localizar qualquer informação sobre "Rubens Armazém Secos e Molhados SC Ltda." (consultas realizadas à Telefônica, Sistema Águia (Dataprev), CNIS, JUCESP, 3º Oficial de Registro de Títulos e Documentos de Pessoa Jurídica), conforme relatório de diligência fiscal datado de 29.06.2000 (fl. 163). Diligenciado à rua Jordânia registrou o seguinte:
Em 12.07.2000, foi elaborado relatório sobre o quanto apurado no procedimento de revisão do ato concessório, verbis:
Intimado para apresentar defesa escrita (fl. 170), o autor teve vista daqueles autos (fl. 171) e requereu a juntada dos documentos que fez anexar no processo concessório do segundo benefício (fl. 172).
Referidos documentos consistem em:
- cópia de sua CTPS n.º 057352, série 635ª, emitida em 02.05.1986, constando o vínculo empregatício com o BANESPA, de 15.09.1977 a 30.06.1999 (fls. 175-188);
- declarações que prestou ao Ministério Público Federal, em 20.06.2000 e 03.07.2000 (fls. 189-192):
- sua defesa escrita (fls. 193-198):
- declaração, sem firma reconhecida, datada de 09.02.1973, pela qual Rubens Ronchi declarou ao Colégio Estadual "Brigadeiro Veloso" que o autor era funcionário de seu estabelecimento comercial (secos e molhados, sito à Rua Jordânia, 03, Vila Guilhermina, SP/SP, inscrição estadual n.º 105.578.224, C.G.C.M.F. n.º 60.667.110), trabalhando no horário das 08:00 às 11:00 hrs e das 13:00 às 18:00 hrs (fl. 199);
- declaração, sem firma reconhecida, datada de 14.03.1974, pela qual Rubens Ronchi declarou ao Colégio Estadual "Brigadeiro Veloso" que o autor era funcionário de seu estabelecimento comercial (secos e molhados, sito à Rua Jordânia, 04, Vila Guilhermina, SP/SP, inscrição estadual n.º 105.578.224, C.G.C. n.º 60.667.110/001), trabalhando de segunda-feira a sábado no horário das 08:00 às 18:00 hrs (fl. 200);
- declaração, sem firma reconhecida, datada de 29.01.2001, em que Tiago de Assunção Fernandes, "proprietário a (sic) mais de 27 anos do estabelecimento comercial denominado 'Adega Vila Guilhermina Ltda', situado à Rua Jordânia, nº 183", declarou conhecer o autor "desde a época em que trabalhava com seu pai no 'ARMAZÉM RONCHI' que era estabelecido nesta mesma rua" (fl. 201);
- declaração, sem firma reconhecida, datada de 29.01.2001, em que Oswaldo da Silva, "proprietário do estabelecimento comercial, Materiais de Construção Casa Silva, estabelecido a (sic) mais de 30 anos à Rua Jordânia nº 16", declarou conhecer o autor "desde a infância, não tendo nada que o desabone até a presente data, e que o mesmo trabalhou no BANESPA, mas antes de ingressar no Banespa, trabalhou com seu pai e seu irmão no estabelecimento comercial 'Armazém Ronchi", que existiu nesta mesma Rua, desde o início de suas atividades" (fl. 202);
- declaração da Escola Estadual "Profª. Adelaide Ferraz de Oliveira", datada de 08.02.2001, informando que o autor estudou no período noturno da 5º à 8ª série (fl. 203);
- declaração da EE "Amadeu Amaral", datada de 08.02.2001, informando que o autor cursou no período noturno da 1ª série à 3ª série do 2º grau nos anos de 1972 a 1975 (fl. 204);
- seu histórico escolar do curso de 2º grau, emitido em 19.04.1976, pelo Colégio Estadual "Brigadeiro Veloso", constando anotação de ser o atual EEPSG "Amadeu Amaral" (fl. 205);
- certidão da JUCESP, emitida em 02.02.2001, constando o registro de "Rubens Ronchi Armazém", objeto social "secos e molhados", sito à Rua Jordânia, 04, Vila Guilherme, SP/SP, constituída em 28.10.1969, com início das atividades em 23.09.1968, de titularidade de Rubens Ronchi, constado assentamento de arquivamento, em 28.10.1969, do documento de emancipação do titular, outorgado por Aleixo Ronchi (fl. 206);
- termo de audiência de separação consensual entre o autor e Samia de Almeida Ronchi, datado de 24.03.2000 (fl. 207).
Em 20.03.2001, foi proferida decisão administrativa no sentido da improcedência da defesa apresentada (fl. 210):
Consta, ainda, relatório das conclusões da equipe de auditoria, datado de 28.03.2001 (fls. 217-218):
Em 19.02.2002, a 14ª Junta de Recursos do Conselho de Recursos da Previdência Social negou provimento ao recurso do autor, sob os seguintes fundamentos:
O autor interpôs novo recurso, em 28.05.2002, juntando:
- duplicatas de venda mercantil emitidas em 1980, pelo estabelecimento Rubens Ronchi - C.G.C. 60.667.110/0001-33 (fls. 290-292);
- notificação de multa emitida, em 18.12.1980, pela Superintendência Nacional do Abastecimento (SUNAB) em desfavor de "Rubens Ronchi (mercearia)" (fl. 293);
- comprovante de situação cadastral "inapta", datado de 27.05.2002, relativo a "Rubens Ronchi Armazém", CNPJ 60.667.110/0001-33 (fl. 294).
Não consta informação nos autos sobre o resultado do referido recurso.
DO PROCESSO CRIMINAL (fls. 22-30/402-409)
O autor foi denunciado pela suposta prática do crime de estelionato para obtenção de benefício previdenciário (artigo 171, § 3º, do Código Penal).
Não consta cópia integral dos autos do referido processo (autuado sob n.º 2003.61.81.002905-6), entretanto, do que se depreende da leitura da sentença prolatada, o mesmo foi instruído com os mesmos documentos de defesa já constantes do procedimento administrativo.
Sem testemunhas de acusação, foram ouvidas as seguintes testemunhas de defesa, na audiência de 13.08.2009:
Interrogado o ora autor declarou:
Na audiência, o Procurador da República pugnou pelo julgamento de improcedência da ação penal, ante a inexistência de indícios suficientes de materialidade do delito:
A sentença, prolatada em audiência, julgou improcedente o pedido formulado na denúncia, com base no artigo 386, I, do Código de Processo Penal, entendendo pela absolvição do réu por reconhecer estar provada a inexistência do fato delituoso:
DA DEMANDA SUBJACENTE
José Roberto Ronchi, filho de Aleixo Ronchi e Izabel Maria Garcia Ronchi, nascido em 20.08.1955 (fls. 72/176), postulou na ação subjacente, ajuizada em 16.01.2002, o restabelecimento de sua aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento da regularidade de suposto vínculo empregatício com "Rubens Ronchi Armazém Ltda." no período de 01.10.1968 a 09.09.1977 (fls. 57-69). Apresentou como fundamentos as mesmas alegações de sua defesa administrativa, supra descrita. Para comprovação do alegado, juntou (fls. 94-104) exatamente os mesmos documentos que instruíram sua defesa administrativa, supra discriminados.
A autarquia instruiu sua contestação com cópia dos autos do procedimento administrativo de revisão do ato concessório.
Em réplica, o autor juntou cópia do recurso, e respectivos documentos (supramencionados), interposto contra a decisão da 14ª JR/CRPS.
Foram ouvidas testemunhas, em 20.08.2002 (fls. 322-325):
Em 1ª Instância, o pedido foi julgado improcedente (fls. 340-343), conforme sentença prolatada em 27.05.2003:
O autor interpôs apelação, instruída com novo documento (fls. 379-382), consistente na sua ficha de admissão no Banespa, cujos campos abaixo sublinhados foram preenchidos de próprio punho, em 15.09.1977 (aos 22 anos de idade).
Na referida ficha, o autor declara ter apresentado carteira profissional n.º 070493, série 357ª, emitida em 06.06.1973, em São Paulo/SP (item 2 da ficha). No mesmo item 2, no campo relativo à sua inscrição no PIS, o autor declarou que "não é cadastrado". O item 7, pertinente a empregos anteriores, encontra-se em branco, assim como o item 10, no qual o autor, caso tivesse emprego anterior, deveria ter informado dados relativos à sua opção ao FGTS. Por fim, no item 9, em que lhe foi facultado acrescer "outras considerações a seu respeito que achar necessário", o autor declarou: "Trabalhei sempre com meu pai no ramo de cereais e nunca fui registrado em carteira" (g.n.).
Após a interposição do recurso, já em 2ª Instância, juntou cópia da sentença absolutória no processo criminal, pugnando pelo seu conhecimento "com fulcro nos artigos 462, 492, 302, 302, 303" do CPC/73 (fls. 387-409). Foi dada ciência à autarquia, que se manifestou pugnando pelo desprovimento do recurso, dada a "ausência razoável início de prova material para demonstrar o vínculo empregatício " (fl. 417-423).
Seguiu decisão monocrática proferida pela Juíza Federal convocada Giselle França (fls. 426-433), negando provimento à apelação, verbis:
Os embargos declaratórios opostos pelo autor foram recebidos como agravo, ao qual foi negado provimento, conforme acórdão unânime proferido pela 8ª Turma desta Corte (fls. 444-450), sob o fundamento de que "sem alteração nos pressupostos de fato e de direito do julgado recorrido, mantenho o entendimento nele proferido", nos termos do voto do relator Desembargador Federal Paulo Fontes.
Sem interposição de outros recursos pelas partes, foi certificado o trânsito em julgado ocorrido em 28.11.2012 (fl. 452).
DA PRESENTE AÇÃO RESCISÓRIA
Para o reconhecimento de erro de fato, hábil à rescisão da coisa julgada na forma do artigo 485, IX, §§ 1º e 2º, do CPC/1973, exige-se que, sem que tenha havido controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato, o julgado tenha admitido um fato inexistente ou considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que tenha influído de forma definitiva para a conclusão do decidido.
Ainda, o erro de fato, necessariamente decorrente de atos ou documentos da causa, deve ser aferível pelo exame do quanto constante dos autos da ação subjacente, sendo inadmissível a produção de provas na demanda rescisória a fim de demonstrá-lo.
Nesse sentido, encontra-se sedimentada a jurisprudência dos Tribunais superiores e desta Corte:
É patente a inexistência de erro de fato no julgado rescindendo, seja em decorrência da controvérsia entre as partes quanto ao efetivo exercício da alegada atividade urbana no período de 01.10.1968 a 09.09.1977, seja porque houve pronunciamento judicial expresso e pormenorizado sobre o fato.
A questão controvertida nos autos da demanda subjacente, que consistia seu próprio objeto, dizia respeito à comprovação do suposto vínculo empregatício com a firma individual "Rubens Ronchi Armazém", entre 01.10.1968 e 09.09.1977.
Referido estabelecimento comercial era de titularidade do irmão do autor, Rubens Ronchi, o qual foi emancipado para o exercício da atividade comercial.
Do que se extrai dos depoimentos das testemunhas, tratava-se de empreendimento familiar, sendo que tanto o autor, como seu pai (Aleixo Ronchi), eram vistos no estabelecimento exercendo atividades do comércio.
Não soa irrazoável que o autor, ainda criança e durante sua adolescência, tenha exercido atividades, ainda que eventualmente, no referido armazém. Aliás, dessa conclusão não se afastou o julgado rescindendo, ao ponderar que "para comprovação do efetivo labor urbano em estabelecimento familiar necessário se faz a apresentação de elementos específicos que comprovem a relação de subordinação, a habitualidade e o cumprimento de horário de trabalho".
O que se questionou foi a existência de vínculo empregatício entre o autor e referida empresa individual, para fins de seu reconhecimento como tempo de serviço no âmbito previdenciário. Vale dizer, cumpriu ao julgador originário verificar se restou comprovado que, no exercício da atividade no estabelecimento comercial familiar, a relação jurídica estabelecida se caracterizava pela pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade, na forma do artigo 3º da CLT.
Quanto ao ponto, cabe ressaltar que a legislação previdenciária, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, exige prova material indiciária da atividade laborativa para o reconhecimento de tempo de serviço, na forma do artigo 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, sendo este o mesmo entendimento da jurisprudência pacífica de nossos tribunais (confira-se: STJ, 1ª Turma, AgRg/AREsp 82633, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 09.03.2016; Súmula STJ 149; TRF3, 3ª Seção, EI 00019249820074036105, rel. Des. Fed. Luiz Stefanini, DJe 25.11.2016).
Não é demais lembrar que a concessão dos benefícios previdenciários mantidos pelo Regime Geral de Previdência Social deve observar as estritas hipóteses legais, dado o caráter contributivo do sistema e a necessidade de preservação do seu equilíbrio financeiro e atuarial.
Os documentos apresentados pelo autor para comprovação do suposto vínculo empregatício consistem em declarações escolares, certidão da JUCESP, declarações do suposto empregador (seu irmão) e declarações de terceiros.
As declarações de frequência escolar, indicando que o autor cursou o período noturno, não constituem prova do exercício de atividade laborativa pelo autor no período diurno, tampouco que teria se dado na empresa familiar.
A certidão da JUCESP apenas comprova a existência da firma individual e nada diz respeito à existência de vínculo empregatício com qualquer pessoa, inclusive o autor.
As declarações de terceiros, por seu turno, caracterizam-se como depoimentos unilaterais reduzidos a termo e não se prestam a servir de início de prova material. Além do mais, são extemporâneas e não foram submetidas, na sua produção, ao contraditório.
No que tange especificamente à declaração do suposto empregador, irmão do autor, cabe acrescer que não consta qualquer sinal indicativo de que tenha sido efetivamente emitida na data indicada, não constando reconhecimento de firma contemporâneo ou protocolo na entidade de ensino à qual se destinava.
Assim, a conclusão do julgador originário quanto à ausência de início de prova material do alegado vínculo empregatício não transborda do razoável, conforme devidamente fundamentado.
Cabe ponderar, inclusive, a existência de diversos elementos nos autos que permeiam de incertezas a constatação da existência de relação de emprego.
Há diversas incongruências sobre a existência de registro em carteira do vínculo empregatício.
De início, diferem as informações sobre as carteiras de trabalho que teriam sido utilizadas para inserção do vínculo na contagem do tempo de serviço nos dois procedimentos administrativos concessórios. No primeiro (DER 03.11.1998), o vínculo supostamente constaria da CTPS n.º 057352, série 635ª, emitida em 15.06.1968. No segundo (DER 21.01.1999), estaria registrado na CTPS n.º 002380, série 10ª, emitida em 10.10.1968. A própria numeração, série e data de emissão das carteiras causa estranheza, haja vista que a de numeração mais antiga teria sido emitida posteriormente. Ainda, aquela emitida em 15.06.1968 tem o mesmo número da carteira efetivamente em posse do autor, emitida apenas em 02.05.1986.
Ademais, não se poderia ignorar que, em 15.09.1977, ao ser admitido no Banespa (primeiro vínculo após o suposto registro no armazém), o próprio autor declarou que "nunca foi registrado em carteira". Registra-se, inclusive, que a CTPS do autor, então, era de n.º 70493, série 357ª, emitida em 06.06.1973.
Ressalte-se que o autor, naquela oportunidade, também informou não ser cadastrado no PIS, sendo que, com a instituição do referido Programa pela Lei Complementar n.º 07/70, os empregadores tinham a obrigação de informar a relação de seus empregados para o fim de cadastro dos participantes. Tampouco preencheu o autor campo sobre ser ou não optante do FGTS no suposto emprego anterior, informação obrigatória conforme disposto na Lei n.º 5.107/66.
Outrossim, as testemunhas ouvidas, embora afirmassem conhecer o autor desde criança e que ele trabalhava com o pai no armazém, nada esclareceram sobre a existência de relação de emprego, repiso, com aquelas características de pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade. Há que se discernir que o auxílio prestado no negócio da família por si só não invoca interpretação quanto à existência de vínculo empregatício. Dessa forma, tal como se concluiu no julgado rescindendo, a prova testemunhal se mostrou frágil para efetivamente demonstrar o suposto fato constitutivo do alegado direito do autor.
Certo ou errado o juízo originário analisou e valorou os documentos e a prova testemunhal produzida nos autos da ação subjacente, entendendo, segundo seu livre convencimento, de forma motivada e razoável, que não havia prova material indiciária do exercício da atividade urbana alegada.
O julgado rescindendo adotou uma solução jurídica, dentre outras, admissível, não se afastando dos parâmetros legais e jurisprudenciais que existiam à época. A excepcional via rescisória não é cabível para mera reanálise das provas. Nesse sentido, confira-se precedentes desta 3ª Seção:
Em relação à possibilidade de rescisão da coisa julgada em decorrência de documento novo, tem-se que a prova material nova deve ser, por si só, suficiente para modificar o julgado rescindendo, ainda que de forma parcial.
Não se objetiva reabrir a dilação probatória para, simplesmente, suprir deficiência do conjunto probatório produzido na ação originária, decorrente da não observância pela parte, por desídia ou negligência, de seu ônus processual probatório, mas, sim, viabilizar a apresentação de prova material nova, cuja existência a parte ignorava ou de que não podia fazer uso, bem como, em casos excepcionais, documento cujo valor probatório era desconhecido pela parte em razão de circunstâncias vulnerabilizantes, como aquelas vivenciadas por trabalhadores rurais.
Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:
O autor pretende ver reconhecido como documento novo a sentença que o absolveu no processo criminal, reconhecendo restar provada a inexistência do fato.
Observa-se que o suposto documento novo já havia sido juntado aos autos da demanda subjacente, em fase recursal, não tendo sido conhecido pela intempestividade do ato.
O mesmo motivo que levou ao não conhecimento do documento na demanda subjacente implica seu não acatamento para fins de rescisão do julgado, haja vista que a sentença proferida no processo criminal é posterior à prolação da sentença na demanda subjacente. Falta-lhe, portanto, o requisito da preexistência.
Ademais, ainda que aceita a tese da sua novidade, o documento carreado não seria suficiente à inversão do resultado do julgamento.
Conforme amplamente exposado, a questão trazida na demanda subjacente foi a existência de vínculo empregatício entre o autor e a firma individual "Rubens Ronchi Armazém", para fins de seu reconhecimento como tempo de serviço no âmbito previdenciário, sendo que a legislação previdenciária, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, exige prova material indiciária da atividade laborativa para o reconhecimento de tempo de serviço, na forma do artigo 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91.
De outro lado, a situação discutida no processo criminal dizia respeito à suposta prática de crime de estelionato (obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento) em detrimento de entidade de direito público, previsto no artigo 171, § 3º, do CP. A conduta típica consistiria em na obtenção ilícita de aposentadoria, mediante suposta fraude relativa ao referido vínculo empregatício, sendo o dolo elemento subjetivo do tipo.
O autor foi absolvido, com base no artigo 386, I, do CPP, por ter sido reconhecido estar provada a inexistência do fato delituoso. Isto é, avaliou-se que o autor não agiu de forma dolosa, utilizando-se de fraude, para obtenção de beneficio previdenciário que saberia indevido.
A conclusão do juízo criminal quanto à inexistência do fato delituoso, qual seja a fraude relativa ao vínculo com "Rubens Ronchi Armazém" no período de 01.10.1968 a 09.09.1977, não implica, necessariamente, a admissão desse tempo de serviço para fins previdenciários, com a concessão da aposentadoria pretendida, haja vista que este ponto não restou decidido pelo juízo criminal (inclusive por que lhe faltaria competência para tanto), bem como porque, repiso, a lei previdenciária exige prova material indiciária para tal fim.
Na medida em que os documentos levados ao processo criminal são os mesmos que constaram do procedimento administrativo de revisão do ato concessório e da demanda subjacente resta mantida a situação de ausência de início de prova material do vínculo e, portanto, incabível o restabelecimento da aposentadoria por tempo de contribuição.
Desse modo, também não reconheço a existência de documento novo para fins de rescisão da coisa julgada.
Por fim, registro que, após o término de seu vínculo com o Banespa e mesmo antes da cassação de sua aposentadoria, o autor manteve vínculos empregatícios estáveis, inclusive até os dias atuais, que lhe permitiram a aposentação por tempo de contribuição integral, em 29.06.2016 (extratos anexos).
Ante o exposto, a teor dos artigos 490, I, 295, I e parágrafo único, I, 267, I, do CPC/1973 e 968, § 3º, 330, I e § 1º, I, 485, I, do CPC/2015, indefiro parcialmente a inicial, em relação à hipótese de rescisão do julgado prevista no inciso VI, do artigo 485 do CPC/1973; e, em iudicium rescindens, julgo improcedente a presente ação rescisória, nos termos dos artigos 269, I, do CPC/1973 e 487, I, do CPC/2015.
Custas na forma da lei.
Condeno o autor no pagamento de honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade das verbas honorárias devidas ficará suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
É como voto.
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