D.E. Publicado em 11/10/2018 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer da apelação do INSS e lhe dar parcial provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 28/09/2018 11:41:31 |
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RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço especial, com vistas à concessão de aposentadoria especial.
A r. sentença julgou procedente o pedido para: (i) reconhecer a especialidade de todos os períodos arrolados na inicial; (ii) conceder ao autor o benefício de aposentadoria especial, a partir da data do requerimento administrativo; (iii) determinar os consectários.
Inconformada, a autarquia interpôs recurso de apelação, no qual sustenta a impossibilidade dos enquadramentos efetuados e alega que o laudo técnico pericial é inapto à demonstração da especialidade. Subsidiariamente, impugna os critérios de aplicação dos juros e correção monetária.
Com as contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço da apelação, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, ressalto que vinha adotando a posição de que o enquadramento pela categoria profissional no rol dos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 também era possível até a entrada em vigor do referido Decreto n. 2.172/97. Entretanto, verifico que a jurisprudência majoritária, a qual passo a adotar, tanto nesta Corte quanto no e. STJ, assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/95). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art. 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Busca a parte autora o enquadramento dos seguintes períodos: 28/8/1978 a 14/2/1981 (rurícola), de 24/4/1981 a 17/4/1984 (tratorista), de 25/1/1990 a 21/5/1990 (servente de pedreiro), de 2/7/1990 a 30/9/1992 (frentista), de 1º/9/1994 a 2/6/1995 (auxiliar mecânico), de 3/7/1995 a 10/12/1996 (operador de máquina carregadeira), de 18/2/1998 a 23/11/2000 (operador de máquina carregadeira), de 17/9/2001 a 1º/4/2002 (operador de máquinas), de 5/6/2002 a 9/11/2002 (motorista de caminhão), de 11/4/2003 a 19/6/2004 (operador de máquinas), de 21/2/2005 a 18/4/2005 (tratorista), de 3/5/2005 a 17/12/2005, de 13/1/2006 a 1º/4/2006 (tratorista), de 10/4/2006 a 14/11/2006 (tratorista), de 24/3/2007 a 19/12/2008 (operador de carregadeira), de 15/4/2009 a 9/12/2009, de 22/12/2009 a 28/10/2010 (tratorista) e de 12/4/2011 a 19/4/2012 (operador de máquina carregadeira).
In casu, contudo, é descabida a pretensão de contagem excepcional do labor rural no interregno de 28/8/1978 a 14/2/1981, na função de rurícola.
Não se ignora a penosidade do trabalho rural, cuja árdua jornada começa desde muito cedo, contudo, a legislação não o contempla entre as atividades prejudiciais à saúde e passível de contagem diferenciada do tempo de serviço.
Com efeito, para o enquadramento na situação prevista no código 2.2.1 (trabalhadores na agropecuária) do anexo do Decreto n. 53.831/64, a jurisprudência prevê a necessidade de comprovação da efetiva exposição habitual aos possíveis agentes agressivos à saúde e do exercício conjugado na agricultura e pecuária, situação não visualizada.
A simples sujeição às intempéries da natureza (sol, chuva, frio, calor, poeira etc.), como sói ocorrer nesse meio, é insuficiente a caracterizar a lida no campo como insalubre ou penosa.
Confira-se (g.n.):
Assim, entendo que o mourejo rural em comento não deve ser enquadrado como especial.
No tocante ao intervalo de 24/4/1981 a 17/4/1984, consta CTPS (f. 89), na qual informa o ofício de "tratorista", fato que permite o reconhecimento de sua natureza especial apenas pelo enquadramento profissional, pois a jurisprudência dominante equipara-o ao de "motorista de ônibus" ou de "motorista de caminhão". Nesse sentido: TRF3, 10ª Turma, AC n. 00005929820004039999, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento, DJU 16/11/2005.
De outra parte, em relação aos períodos de 21/2/2005 a 18/4/2005, de 15/4/2009 a 9/12/2009 e de 22/12/2009 a 28/10/2010, em que o autor também laborou como "tratorista", não era mais possível o enquadramento por categoria profissional e não foi apresentado laudo técnico para o reconhecimento da especialidade quanto à exposição ao ruído ou outro documento capaz de comprovar a alegada especialidade. Portanto, o interstício não pode ser enquadrado como especial.
Em relação ao interstício de 25/1/1990 a 21/5/1990, em que o autor laborou como "servente de pedreiro", inviável o reconhecimento da especialidade, uma vez que tal profissão, assim como a de "pedreiro", não está prevista nos decretos regulamentadores, nem pode ser caracterizada como insalubre, perigosa ou penosa por simples enquadramento da atividade.
Vale dizer: a mera exposição a materiais de construção, a simples sujeição a ruídos, a pó de cal e a cimento, decorrentes da atividade (construção e reparos de obra), bem como o esforço físico inerente à profissão, não possuem o condão de denotar a insalubridade ou penosidade aventadas, cuja comprovação ocorre, frise-se, por meio de formulários SBs ou laudos que confirmem a subsunção fática às hipóteses do código 2.3.3 do Decreto n. 53.831/64, ou seja, "trabalhadores em edifícios, barragens, pontes e torres".
Nesse sentido, confira-se (g. n.):
Como se vê, em relação ao período de 25/1/1990 a 21/5/1990, a parte autora não logrou reunir elementos comprobatórios de haver trabalhado com exposição a agentes insalutíferos na função alegada, nos moldes previstos no código 2.3.0 (PERFURAÇÃO, CONSTRUÇÃO CIVIL, ASSEMELHADOS) do anexo do Decreto n. 53.831/64.
Quanto ao intervalo de 2/7/1990 a 30/9/1992, consta formulário (fl. 57), o qual indica a ocupação profissional da parte autora como "frentista", com exposição presumida a tóxicos orgânicos, derivados de hidrocarbonetos e outros compostos de carbono, como gasolina, diesel, álcool e óleo mineral - códigos 1.2.11 do anexo do Decreto n. 53.831/64 e 1.2.10 do anexo do Decreto n. 83.080/79.
Com efeito, a atividade de frentista é considerada perigosa nos termos da Portaria nº 3.214/78, NR-16, Anexo 2 ("Atividades e Operações Perigosas com Inflamáveis"), item 1, letra "m" ("nas operações em postos de serviço e bombas de abastecimento de inflamáveis líquidos") e item 3, letras "q" ("abastecimento de inflamáveis") e "s" ("armazenamento de vasilhames que contenham inflamáveis líquidos ou vazios não desgaseificados ou decantados, em locais abertos"); e o Supremo Tribunal Federal, por força da Súmula 212, também reconhece a periculosidade do trabalho do empregado de posto de revenda de combustível líquido:
Acerca do tema, esta E. Corte Regional já se pronunciou, conforme julgados abaixo colacionados (g.n):
Por outro lado, não há como asseverar a especialidade da função de "auxiliar mecânico", exercida no interregno de 1º/9/1994 a 2/6/1995, pois a simples referência no PPP (fl. 62/63) à exposição, de forma genérica, a "calor", "ruído", "poeira" não conduz ao enquadramento postulado como atividade em condições nocivas à saúde e à integridade física. Nesse sentido: TRF-3, AC: 32.207 SP 0032207-23.2011.4.03.9999, Relator: DES. FED. BAPTISTA PEREIRA, Data de Julgamento: 03/12/2013, 10ªT.
Ademais, o mencionado Perfil Profissiográfico não indica profissional legalmente habilitado - responsável pelos registros ambientais dos fatores de risco citados.
No que diz respeito ao lapso de 3/7/1995 a 10/12/1996, o autor logrou demonstrar, via PPP (280/280v), a exposição habitual e permanente ao fator de risco ruído em níveis superiores aos limites estabelecidos na norma em comento.
No que tange aos interregnos de 18/2/1998 a 23/11/2000 e de 12/4/2011 a 19/4/2012 (posteriores a 5/3/1997), é inviável o enquadramento, uma vez que o reconhecimento da ocupação de "operador de máquina carregadeira", por aplicação analógica do código 2.4.4 do anexo do Decreto n. 53.831/64 e do código 2.4.2 do anexo do Decreto n. 83.080/79, ocorreu somente até 5/3/1997 (Decreto n. 2.172/97).
Ademais, não foram juntados documentos hábeis a demonstrar a pretendida especialidade ou o alegado trabalho nos moldes previstos nos instrumentos normativos supramencionados.
Quanto ao lapso de 17/9/2001 a 1º/4/2002, no qual o autor atuou como "operador de máquinas" também é incabível o enquadramento. Isso porque o PPP (fl. 305/306), além de não indicar responsável pelos registros ambientais, atesta que o ruído estava abaixo do nível limítrofe estabelecido em lei.
No mesmo sentido, em relação ao período de 24/3/2007 a 19/12/2008, não é possível o reconhecimento da especialidade pretendida, tendo em vista que o PPP (fl. 86/87) demonstra que o fator de risco ruído estava abaixo do limite previsto na legislação previdenciária.
Em relação ao intervalo de 11/4/2003 a 19/6/2004, em que o autor laborou na função de "operador de máquinas", não há nos autos quaisquer documentos capazes de ensejar a alegada especialidade.
Por fim, no tocante aos períodos de 5/6/2002 a 9/11/2002 (em que o autor trabalhou como "motorista de caminhão") e de 3/5/2005 a 17/12/2005, de 13/1/2006 a 1º/4/2006, de 10/4/2006 a 14/11/2006 (nos quais o requerente exerceu o ofício de "tratorista"), foi produzido, no curso da instrução, Laudo Técnico Pericial (fl. 390/402), realizado em empresas similares àquelas em que ao autor atuou, o qual demonstrou que o autor esteve exposto habitual e permanentemente a níveis de ruído superiores aos limites de tolerância estabelecidos na legislação previdenciária.
Nessa esteira, cumpre destacar que a perícia por similaridade é aceita pela jurisprudência como meio adequado de fazer prova de condição de trabalho especial.
O E. STJ já se pronunciou nesse sentido, através do aresto abaixo colacionado (g.n.):
Também, no mesmo sentido, esta E. Corte Regional (g.n.):
Dessa forma, somente deve ser reconhecida a natureza especial dos interstícios de 24/4/1981 a 17/4/1984, de 2/7/1990 a 30/9/1992, de 3/7/1995 a 10/12/1996, de 5/6/2002 a 9/11/2002, de 3/5/2005 a 17/12/2005, de 13/1/2006 a 1º/4/2006 e de 10/4/2006 a 14/11/2006.
Por conseguinte, somados os períodos ora enquadrados aos lapsos incontroversos, a parte autora não conta 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial e, desse modo, não faz jus ao benefício de aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 da Lei n. 8.213/91.
Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, condeno ambas as partes a pagar honorários ao advogado da parte contrária, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do Novo CPC.
Todavia, em relação à parte autora, fica suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, conheço da apelação do INSS e lhe dou parcial provimento para, nos termos da fundamentação: (i) restringir o enquadramento da atividade especial do autor aos interstícios de 24/4/1981 a 17/4/1984, de 2/7/1990 a 30/9/1992, de 3/7/1995 a 10/12/1996, de 5/6/2002 a 9/11/2002, de 3/5/2005 a 17/12/2005, de 13/1/2006 a 1º/4/2006 e de 10/4/2006 a 14/11/2006; (ii) determinar a sucumbência recíproca.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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