Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 02/05/2019
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000103-22.2013.4.03.6114/SP
2013.61.14.000103-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal NINO TOLDO
APELANTE : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : SP000001 MARLY MILOCA DA CAMARA GOUVEIA E AFONSO GRISI NETO
APELADO(A) : MERCEDES BENZ DO BRASIL S/A
ADVOGADO : SP138486 RICARDO AZEVEDO SETTE e outro(a)
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 3 VARA DE SAO BERNARDO DO CAMPO > 14ª SSJ> SP
No. ORIG. : 00001032220134036114 3 Vr SAO BERNARDO DO CAMPO/SP

EMENTA

APELAÇÃO. TRIBUTÁRIO. ANULATÓRIA. STOCK OPTION (OPÇÃO DE COMPRA). CONTRATO DE NATUREZA MERCANTIL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. NÃO INCIDÊNCIA.
1. No presente recurso aplicar-se-á o CPC/73.
2. A stock option (opção de compra de ações) é contrato de natureza mercantil, em que o empregador oferece aos empregados a opção de aquisição de ações da empresa, a preço mais vantajoso do que o praticado pelo mercado, com objetivo de incentivar o empregado a desempenhar com maior afinco as suas atividades laborativas, sobretudo na busca de atingir os resultados estabelecidos pela empresa, os quais alavancarão o lucro da empresa e, por consequência, trarão a esperada valorização de suas ações.
3. Natureza remuneratória rechaçada pela jurisprudência do C. TST, razão pela qual não incide contribuição previdenciária.
4. Apelação e reexame necessário desprovidos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e ao reexame necessário, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 23 de abril de 2019.
NINO TOLDO
Desembargador Federal


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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000103-22.2013.4.03.6114/SP
2013.61.14.000103-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal NINO TOLDO
APELANTE : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : SP000001 MARLY MILOCA DA CAMARA GOUVEIA E AFONSO GRISI NETO
APELADO(A) : MERCEDES BENZ DO BRASIL S/A
ADVOGADO : SP138486 RICARDO AZEVEDO SETTE e outro(a)
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 3 VARA DE SAO BERNARDO DO CAMPO > 14ª SSJ> SP
No. ORIG. : 00001032220134036114 3 Vr SAO BERNARDO DO CAMPO/SP

RELATÓRIO

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de reexame necessário e de apelação interposta em face de sentença que julgou procedente a ação ordinária (fls. 177/179), objetivando a anulação de lançamento fiscal a título de contribuição previdenciária, incidente sobre valores recebidos a título de stock option.

A sentença condenou a União ao reembolso das custas e pagamento de honorários advocatícios fixados em 5 % (cinco por cento) sobre o valor da dívida atualizado.

Razões recursais a fls. 182/189, na qual a União reitera a natureza remuneratória da stock option, fato que legitima o lançamento tributário impugnado.

Foram oferecidas contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Esclareço, inicialmente, que, com a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16.3.2015) - NCPC, em 18 de março de 2016, é necessário fazer algumas observações relativas aos recursos interpostos sob a égide do Código de Processo Civil anterior (Lei nº 5.869, de 11.01.1973) - CPC/73.


O art. 1.046 do NCPC dispõe que "[a]o entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973".


O art. 14 do NCPC, por sua vez, dispõe que "[a] norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".


Esse último dispositivo citado decorre do princípio do isolamento dos atos processuais, voltado à segurança jurídica. Isso significa que os atos praticados sob a vigência de determinada lei não serão afetados por modificações posteriores. É a aplicação do princípio tempus regit actum.


Assim, os atos praticados durante o processo, na vigência do CPC/73 não serão afetados pelo NCPC, tais como as perícias realizadas, os honorários advocatícios estabelecidos em sentença e os recursos interpostos.


Portanto, no exame do presente recurso, aplicar-se-á aos honorários advocatícios o CPC/73, pois a sentença, que os estabeleceu foi publicada sob a sua vigência, consolidando-se naquele momento o direito e o seu regime jurídico.


Pela mesma razão, não incide no caso a sucumbência recursal de que trata o art. 85, § 11, do NCPC. Isso, aliás, é objeto do enunciado nº 11 do Superior Tribunal de Justiça, aprovado em sessão plenária de 9 de março de 2016: "Somente nos recursos interpostos com decisão publicada a partir de 18 de março de 2016 será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do NCPC".


Feitos estes esclarecimentos, passo ao exame do recurso.


Em síntese, a divergência está adstrita à análise da natureza do programa de stock option instituído pela autora Mercedes Benz do Brasil S/A, a determinada categoria de empregados.


A União sustenta que a stock option é remuneração, devendo incidir a respectiva contribuição previdenciária. Sustenta, também, que a operação é realizada de modo a disfarçar o caráter remuneratório, sobretudo à vista do "plano de opção de compra de ações", juntado às fls. 98/114, que, em diversas passagens, menciona o termo "remuneração" para apresentar o programa.


Por sua vez, a autora alega que a stock option se trata de uma operação societária, fixada na Lei nº 6.407/76, que garante aos administradores ou empregados de determinada companhia a opção de adquirir, de forma mais vantajosa e em determinado período, ações negociáveis no mercado de capitais.


O professor Diogo Leite Campos definiu a stock option (opção de ação) da seguinte maneira:


"As opções de ações constituem um sistema de complemento retributivo dependente do preço das mesmas, dirigido a administradores, diretores e outros superiores de sociedades. Integram normalmente o pacto remunerativo atribuído a profissionais dotados de alta competência e produtividade, como um meio de interessar nos resultados da empresa. Os Autores apontam como objetivos principais das Stock Options os seguintes: inclusão das stock options entre as modalidades de compensação econômica dos administradores das sociedades de capital (eficiência retributiva); eventual função fidelizadora das Stock Options nos conselhos de administração das sociedades cotadas." (in Stock Options na Relação de Emprego. São Paulo: LTr, 2008, p. 22)


Já o professor Sérgio Pinto Martins, acerca da natureza jurídica da stock option, ensina que:


"Natureza jurídica da opção de compra de ações é mercantil, embora feita durante contrato de trabalho, pois representa mera compra e venda de ações. Envolve a opção um ganho financeiro, sendo até um investimento feito pelo empregado nas ações da empresa. Por se tratar de risco do negócio, em que as ações ora estão valorizadas, ora perdem seu valor, o empregado pode ter prejuízo com a operação. É uma situação aleatória, que nada tem a ver com o empregador em si, mas com o mercado de ações" (Repertório IOB de jurisprudência nº 16/01, página 304).





Vê-se, desse modo, que a doutrina empresta caráter mercantil ao instituto da stock option, na medida em que os empregados não são obrigados a efetuar a opção de compra de ações, bem assim em razão da assunção dos riscos inerentes ao negócio.


O que se tem, na verdade, é um programa de incentivo oferecido pelo empregador com duplo aspecto: 1.) contemplar os empregados com determinada vantagem na aquisição de ações (vendidas com deságio em relação ao preço de mercado); e, 2.) ter a contrapartida de que o optante, com evidente objetivo de conquistar retorno do capital investido, desempenhe com maior afinco as suas atividades laborativas, sobretudo na busca de atingir os resultados estabelecidos pela empresa, os quais alavancarão o lucro da empresa e, por consequência, trarão a esperada valorização de suas ações.


Necessário ressaltar que o TST, em julgados recentes, rechaçou a natureza salarial da stock option. Vejamos:


AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMADA. HOMOLOGAÇÃO DO TERMO RESCISÓRIO FORA DO PRAZO DO ARTIGO 477, § 6º, DA CLT. INAPLICABILIDADE DA MULTA DO ARTIGO 477, § 8º, DA CLT. PROVIMENTO.
(...)
5. PLANO DE AÇÕES. STOCK OPTIONS. INTEGRAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO. Em que pese a possibilidade da compra e venda de ações decorrer do contrato de trabalho, o trabalhador não possui garantia de obtenção de lucro, podendo este ocorrer ou não, por consequência das variações do mercado acionário, consubstanciando-se em vantagem eminentemente mercantil. Dessa forma, o referido direito não se encontra atrelado à força laboral, pois não possui natureza de contraprestação, não havendo se falar, assim, em natureza salarial. Precedente. Recurso de revista de que não se conhece.
(...)
9. Recurso de revista de que não se conhece.
(RR - 201000-02.2008.5.15.0140 , Relator Ministro: Guilherme Augusto Caputo Bastos, Data de Julgamento: 11/02/2015, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 27/02/2015)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. COMPRA DE AÇÕES VINCULADA AO CONTRATO DE TRABALHO. STOCK OPTIONS. NATUREZA NÃO SALARIAL. EXAME DE MATÉRIA FÁTICA PARA COMPREENSÃO DAS REGRAS DE AQUISIÇÃO. LIMITES DA SÚMULA 126/TST. As stock options, regra geral, são parcelas econômicas vinculadas ao risco empresarial e aos lucros e resultados do empreendimento. Nesta medida, melhor se enquadram na categoria não remuneratória da participação em lucros e resultados (art. 7º, XI, da CF) do que no conceito, ainda que amplo, de salário ou remuneração. De par com isso, a circunstância de serem fortemente suportadas pelo próprio empregado, ainda que com preço diferenciado fornecido pela empresa, mais ainda afasta a novel figura da natureza salarial prevista na CLT e na Constituição. De todo modo, torna-se inviável o reconhecimento de natureza salarial decorrente da possibilidade de compra de ações a preço reduzido pelos empregados para posterior revenda, ou a própria validade e extensão do direito de compra, se a admissibilidade do recurso de revista pressupõe o exame de prova documental - o que encontra óbice na Súmula 126/TST. Agravo de instrumento desprovido. (AIRR - 85740-33.2009.5.03.0023 , Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 15/12/2010, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 04/02/2011)

Dessa maneira, refutado a natureza remuneratória da stock option, por decorrência lógica, não há que se falar em incidência de contribuição previdenciária sobre os ganhos repassados pelo empregador a esse título. Nesses termos, inclusive, colhem-se o seguintes julgados dessa E. Corte:

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO. CPC, ART. 1.021. DECISÃO MONOCRÁTICA. NULIDADE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PLANO DE OPÇÃO DE COMPRA DE AÇÕES (STOCK OPTIONS). NÃO INCIDÊNCIA.
1. Não há a alegada nulidade à míngua de demonstração de prejuízo. A decisão monocrática negou provimento à apelação, com fundamento em jurisprudência que admite tal pronunciamento do relator. Ademais, o agravo interno interposto devolve as alegações deduzidas na apelação para apreciação do órgão colegiado.
2. O Programa de Opção de Compra de Ações (stock options) praticado pela parte autora constitui relação jurídica distinta da relação de emprego, cuja adesão depende da voluntariedade dos empregados interessados em assumir o risco do mercado financeiro, não se traduzindo em espécie de contraprestação laboral.
3. Agravo interno não provido.
(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1955449 - 0021090-58.2012.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/10/2016 )
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA VALE TRANSPORTE PAGO EM PECÚNIA. PRIMEIRA QUINZENA DO AUXÍLIO-ACIDENTE. TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS. AVISO PRÉVIO INDENIZADO. PRÊMIO POR DISPENSA INCENTIVADA. PAGAMENTOS FEITOS A COOPERATIVAS. ABONO ASSIDUIDADE. ABONO COMPENSATÓRIO. HORAS-PRÊMIO. BONIFICAÇÕES. LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA. AUXÍLIO-EDUCAÇÃO. AUXÍLIO-QUILOMETRAGEM. ABONO SALARIAL DECORRENTE DE AORDO COLETIVO. STOCK OPTIONS. PLANO DE COMPLEMENTAÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA. NATUREZA INDENIZATÓRIA. NÃO-INCIDÊNCIA DAS CONTRIBUIÇÕES. ADICIONAL DE HORAS EXTRAS. FÉRIAS GOZADAS. SALÁRIO-MATERNIDADE. SALÁRIO-PATERNIDADE. ADICIONAIS: NOTURNO, INSALUBRIDADE, PERICULOSIDADE E TRANSFERÊNCIA. FALTAS ABONADAS. QUEBRA DE CAIXA. NATUREZA REMUNERATÓRIA. INCIDÊNCIA. COMISSÕES E ABONO ÚNICO PREVISTO EM CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO: INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.
(...)
XI - Stock options correspondem a opção de compra futura de ações da empresa pelo empregado, por valor prefixado, em geral abaixo do preço de mercado, após período de carência previamente estipulado. O acréscimo patrimonial percebido a final decorre do contrato mercantil e não da remuneração pela força de trabalho do empregado, o que afasta a incidência da contribuição previdenciária estabelecida pelo art. 22, I, da Lei nº 8.212/91.
(...)
XXIII - Remessa oficial e apelação do impetrante parcialmente providas. Apelação da União desprovida.
(TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 360597 - 0017762-52.2014.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY, julgado em 19/07/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/07/2016)

Tomadas essas considerações, a manutenção da sentença é medida que se impõe.


Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO e ao REEXAME NECESSÁRIO.


É o voto.


NINO TOLDO
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): NINO OLIVEIRA TOLDO:10068
Nº de Série do Certificado: 11A2170626662A49
Data e Hora: 23/04/2019 14:30:31